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Title: Felicidade pela Agricultura (Vol. II) Author: Castilho, Antonio Feliciano de Language: Portuguese As this book started as an ASCII text book there are no pictures available. *** Start of this LibraryBlog Digital Book "Felicidade pela Agricultura (Vol. II)" *** (VOL. II) *** OBRAS COMPLETAS DE A. F. DE CASTILHO --5-- Felicidade pela Agricultura [Illustration] LIVRARIA BARATEIRA LISBOA 34-RUA DO DUQUE-36. Tel. T. 1264 OBRAS COMPLETAS DE ANTONIO FELICIANO DE CASTILHO VOLUME 5.º VOLUMES PUBLICADOS: I--AMOR E MELANCOLIA. II--A CHAVE DO ENIGMA. III--CARTAS DE ECCO E NARCISO. IV--FELICIDADE PELA AGRICULTURA (1.º vol.) V--FELICIDADE PELA AGRICULTURA (2.º vol.) NO PRÉLO: VI--A PRIMAVERA. OBRAS COMPLETAS DE A. F. DE CASTILHO Revistas, annotadas, e prefaciadas por um de seus filhos ====V==== FELICIDADE PELA AGRICULTURA SEGUNDA EDIÇÃO VOLUME II [Illustration] LISBOA EMPREZA DA HISTORIA DE PORTUGAL _Sociedade editora_ LIVRARIA MODERNA TYPOGRAPHIA _R. Augusta, 95_ _45, R. Ivens, 47_ XI Quinto serão do casal Tres novidades aos amigos lavradores SUMMARIO O autor já tinha saudades do Casal.--Onde passou o mez de Maio.--Desencantamento que trouxe da Capital.--Insiste-se na necessidade de representação agricola.--Testemunho que lhe levantam attribuindo-lhe desejos de ser Deputado.--Rasões por que o não deve nem quer ser.--Que fazem e como são os nossos inimigos.--Não se lhes deve oppôr a violencia bruta, mas juizo, e salvarmo-nos por uma eleição de consciencia.--Duas novidades traz o autor da Côrte--Primeira: que a Sociedade de Agricultura Michaelense vai sendo imitada em Portugal.--Segunda: a publicação do _Guia e manual do cultivador_.--Louvor d’esta obra, e de quem a fez.--A Sociedade promotora da Agricultura a coroou--O que os premios produzem de bem.--Torna-se ao projecto da _Ordem do arado_.--Noticia do banquete da Sociedade da Agricultura.--Hymno dos Lavradores. Já tinha saudades de vós, meus bons amigos. Lá passou, e bem a meu pesar, o mez de Maio, sem eu visitar este casal. ¡Maio sem vós! ¡e sem campo! ¡Maio n’uma cidade, e Capital! ¡e das maiores! ¡onde o que só dá flores, mas não para frutos, é a rhetorica dos politicos, e onde, para nada verdejar, nem sequer esperanças já verdejam! ¡Oh meus excellentes lavradores! Quizera eu, não que vos arrancasseis do vosso torrão, para irdes ver o que é uma Côrte, e aprenderdes a amar-vos; mas que ao menos a sonhasseis uma vez, tal como ella é, e como são todas: magnifica de marmores e architecturas, rumorejante de festas e musica, trovejada de carroagens, refulgente de gaz, que supprime a noite, alardeando senhores e principes, remirando-se nos enxames de suas damas; mas, no meio de tudo aquillo, esteril, desencantada, e não tirando de si os olhos com medo de os lançar para o futuro... Pois se fosseis lá com algum pensamento sincero de amor dos homens, com alguma santa loucura de alma desinteressada, d’estas que alguma vez devaneámos na calada das vossas solidões, e que tão faceis foram de realisar; se vos désse em ir mendigar para a civilisação, e para os filhos e netos de nós todos, algum favor muito pequeno, e muito justo, ¡como vos não recolherieis ás vossas poisadas, descrentes e esmorecidos, para nunca mais arredardes d’ellas nem os pés, nem os olhos, nem o pensamento! Meus amigos, meus amigos, deixae falar os nescios, que tão mal vos querem a vós como a mim; e crêde no que vos repito com a mão na consciencia e nos Evangelhos: para que, do meio das leivas rusticas, nos saiam emfim Deputados representantes da terra, semeemos o juizo, se desejamos colher a felicidade; se não fôr já hoje a hora do desengano, medo tenho de que seja amanhan a de acabarmos. ¿Sabeis o que dizem lá nos seus pagodes estes mexeriqueiros ruins, vossos inimigos e meus? ¿estes ingratos, que, devendo-vos tudo, invejam até o pé do inhâme que semeais para os filhos, e, de vaidosos que são, até a figura humana vos tirariam, se podessem? ¿Sabeis? ¿adivinhais, não o que elles pensam, mas o que elles dizem? Dizem, que no dar-vos este conselho, o unico bom conselho que hoje se vos pode dar, só armo á popularidade, para algum dia me ir d’aqui, Deputado feito por vós, sentar-me triumphalmente n’uma cadeira do Parlamento. ¿Então que lhe quereis? Dão o que teem, e fazem o que podem e costumam. ¡E dizer que ha ainda ferrenhos, que não crêem na jumenta de Balaão! Não, boa gente, nem vós, quando escolherdes os vossos pares na lavoira, me haveis de nomear a mim, que desgraçadamente o não sou, nem, que o fizesseis, eu vos acceitaria a nomeação. Essas honrarias, já por mais de uma vez as rejeitei; e não foi para me andar agora á caça d’ellas. ¡Eu Deputado!... ¿Para quê? Aqui, no vosso serão, ou entre outros amigos, n’um colloquio poetico, ou na minha cellasinha phantasiando para um papel alguns amores do coração, tenho o meu préstimo como outro qualquer. Passeio na herdade em que me creei; não tenho medo de me perder. ¡Mas a bordo d’aquella grande náu! ¿Quem me ensinou a mim a sua mareação? ¿E depois ... o enjôo!... ¿Eu na tribuna? ¡eu orador?! Melhor sorte me dê Deus. Sou muito humilde, ou muito soberbo, para lá subir. Assentae bem isto em lettras grandes na vossa folhinha detraz da porta. Votae em amigos vossos, sinceros e desenganados como eu, porém mais sabedores e praticos, do que eu, de vossas coisas, e mais affeitos ao mundo positivo, que o escrevedor de livrinhos, que metade de sua vida a passa por essas nuvens, e a outra metade entre creanças. Affronta vos faria ao bom-juizo, se vos allegasse mais rasões. Quando se trata de lavras, não é a andorinha, nem a cotovia, que vós jungís á canga do arado. Assim, não é do poeta, que vós, gente grave e sizuda, farieis o vosso representante; como tambem o não farieis d’esses descendentes da jumentinha de Balaão, que, sendo muito pobres de cérebro, muito mais o são ainda de coração. A mim já vós me conheceis; mas ¿quereis acabar de os conhecer tambem a elles? Pois ouvi. * * * * * Fundou-se ahi uma Sociedade de Amigos das Lettras e Artes, para fazerem, a bem da instrucção primaria e dos officios mechanicos, o mesmo que em vosso proveito faz a Sociedade da Agricultura. Era santo instituto; ¿não era? Pois declararam-lhe guerra, pozeram-lhe nomes, levantaram-lhe testemunhos pela bocca pequena, enredaram com cartas anonymas, que mandaram imprimir n’outras terras, imprimiram outros aleives aqui mesmo, mas com datas fingidas e de longe, porque tamanhas vergonhas eram, que, sem mascara, nem elles as ousariam; peitaram, por baixo de mão, creancinhas desvalidas a desertarem das nossas escolas, para continuarem a apodrecer na ignorancia; aos que eram seus servos, prohibiram-lhes frequental-as. Quando me eu ia de proposito, viagem de mais de duzentas leguas por esses mares de Christo, para requerer se nos désse aqui um chãosinho em que edificarmos, á nossa custa, uma albergaria para as pobres Lettras e Artes, mandavam elles, atravez de egual Oceano, quem lá fosse pedir que nos indeferissem; quem nos denegrisse bem denegridos; quem patrocinasse e advogasse, por todos os modos (sobre tudo pelos secretos), a causa da ignorancia; quem lidasse por vos perpetuar na condição ignominiosa de servos da gleba, um pouco mais que troncos, um pouco menos que bestas de carga. --«¿E vingaram esses tramas diabolicos?»--perguntareis vós. ¡Quem sabe! talvez sim; o tempo o descobrirá. Ahi tendes o que elles são; guapos corações, e guapissimas cabeças para legisladores; admiraveis amigos da terra em que nasceram, ou que os abortou, e do Povo, que sua de trabalho para que elles suem de praseres, que anda nu para que elles se enroupem com arminhos, e cospe sangue nas mãos por elles, que lhe cospem desprezo sobre ambas as faces. Meus amigos, se queremos ser salvos, é olharmos por nós, e forcejarmos por destecer todas estas cerradas teias de barbarias. Trabalhemos tão activamente, de dia, e ao sol, como elles o fazem de noite, nos esconderijos, com vigilantes expertos e terriveis a guardal-os. Opponhâmos ás mentiras traidoras, e ás cobardes calumnias, a verdade e a franqueza; ao anachronico feudalismo, o seculo XIX, que é o nosso, que é vivo, e que é forte. Nada de violencia; a força bruta nada cria, e ameaça tudo; o incendio, o exterminio, as sublevações, o converter as enxadas em machados, e as arvores, que alimentam, em clavas que derribem, fôra curar a doença com a morte, enredar-se mais nas cadeias, pretendendo sacudil-as, querer subir ao cume, e afogar-se no abysmo. A redempção, toda a redempção, só Leis sabias, e zelosamente mantidas, nol-a hão de trazer; e é para as termos, que eu vos exhorto e vos supplico vos associeis, para darmos a um Povo, que é e deve ser agricola, umas Côrtes agrárias e um Ministerio lavrador; isto é: a um Paiz, que pode e quer produzir, uma providencia e cultura apropriadas. Pelo menos, façâmos o que de nós depende para o bem, como os inimigos fazem quanto podem para o mal. E depois... sahirá o que Deus quizer. * * * * * Por novidades da Côrte me requereis. Das _politicas_, nenhuma vos trago, que não curei d’ellas, nem já entendo essa linguagem. Das operas e passeios, das modas, e do aformoseamento das praças, não curais vós. O que só vos importa, é a terra. Pois bem: duas novidades vos trago quanto á terra, que vos devem ambas aprazer. A primeira, é que a vossa tão bem augurada Sociedade promotora da Agricultura Michaelense, ao mesmo passo que vos fecunda por cá o solo por via da instrucção, faz nascer lá pelo Reino, por via da emulação, outras semelhantes Sociedades, que, se forem avante, e imitarem sempre a sua predecessora, transformarão a final a Patria, de mendiga despresada e decrepita, em abastada, juvenil, e formosa, mediante aquelle Congresso e aquelle Ministerio que já sabemos, e para que ellas hão-de, quando crescerem e se propagarem, contribuir infallivel e irresistivelmente. * * * * * A outra novidade, tambem para alviçaras, é um Livro. Um Livro nem sempre é uma obra; as mais das vezes é palavras, das quaes as obras distam muito. Este, porém, que vos eu annuncio, deveras é obra; custou bom estudo; fez-se com amor e consciencia; allumiará os vossos espiritos; e contém em germes grande copia de frutos, que, em vós querendo, entrarão logo a rebentar pela superficie do vosso solo. Tem por titulo _Guia e Manual do Cultivador, ou Elementos de Agricultura_. Antes que d’elle vos fale, ou para supprir o que d’elle vos poderia encarecer, deixae-me falar-vos do seu autor, que, melhor do que eu, sabeis vós como pela arvore se adivinha o fruto. JOSÉ MARIA GRANDE, Doutor abalisado em Medicina e Philosophia, e Lente ha annos de Botanica e Agricultura na Escola Polytechnica de Lisboa, é um d’aquelles espiritos eleitos, que a Providencia predestina ao bem commum, e que, para melhor se habilitarem ao desempenho do seu sacerdocio, lhe saem das mãos ao mesmo tempo graves, e amenos; sizudos, e poeticos; para a rasão, convincentes; para a vontade, persuasivos. Desde a flor da mocidade o amo eu, que desde então nos conhecemos. N’aquellas famosas festas da Primavera, celebradas nas margens ridentissimas do Mondego, e de que já póde ser ouvirieis falar ou ler alguma coisa, foi elle um dos que mais por engenho se extremaram. D’ahi para cá (e não são tão poucos annos), sem renegar o culto das Musas, que tão dadivosas o prendaram, entrou, comtudo, a combinar com aquelle affecto outro mais alto; com a poesia espontanea da imaginação, que é só rosas e fragrancias, a poesia cultivada e frutifera da Natureza. As sciencias d’ella, foi-as enxertando no talento, foi-as nutrindo e robustecendo com a seiba, assim melhor aproveitada, do seu engenho. Imaginae ¡o que não estarão hoje produzindo! Então, era a primavera, a florescencia, o poeta. Hoje, é o sabio, a meditação, o outono, a abundancia. Então, o rouxinol que enfeitiçava as ociosas noites de luar. Hoje, a aguia que se remonta ás alturas, d’onde abrange largo mundo, e que fita os olhos escrutadores no proprio sol. Coração e indole não lhe mudaram; mas os amores que tinha, ideaes e volateis, concentrou-os no amor grande, no que é bemvindo em todas as edades, e a todas as ennobrece: no amor dos homens. Como Virgilio, passou das cadeias de rosas de Amaryllis, ao magisterio das _Georgicas_, á grave doutrinação dos camponezes. Lavrador elle mesmo, e imbuido copiosamente nas theorias por sua experiencia verificadas, comprehendendo (até onde é dado) os mysterios da Natureza, affeito a explical-os, e sabendo realçal-os ainda com a lucidez e côres do estylo, commetteu com a melhor estreia, e com as fadas mais propicias conseguiu, crear para vós o que de toda a parte, ha muito tempo, se pedia em vão: o codigo succinto, mas completo, dos vossos trabalhos. * * * * * Em dois volumes, e não grandes, é a sua obra repartida. O 1.º anda já no Publico, procurado e festejado; o 2.º não tardará, podendo-se-lhe desde já prophetisar egual fortuna. Presente bem rico vos será já per si o que vos trago. N’elle aprendereis, como introducção ao que vos cabe fazer, para que a fazenda, como dizia Virgilio, satisfaça ás vossas cubiças, parte do muito, e do infinito, que a Divina Sabedoria fez para vós e para todos, ao crear a terra, as aguas, os ares, e as plantas. N’este sentido, o livrinho, sem o dizer, é tambem dos mais religiosos. Descobrir os segredos da Creação é adorar o Creador. Newton, que mais os sondou, nunca de Deus falava sem inclinar aquella grande cabeça, que abrangia mundos. Quando houverdes lido, no vosso _Guia e Manual_, os maravilhosos segredos do nascimento e crescimento, da florescencia, frutificação e reproducção das plantas, da sua alimentação, da sua vida, do seu respirar, do seu dormir, dos seus amores, das suas relações de beneficios mutuos com o ar, com a terra, com os animaes, e comnosco; fico-vos eu que a minima hervinha vos inspirará mais devoção, e vos dará mudamente mais conselhos, que a mais devota Imagem da vossa aldeia. O que no campo vos parecia solidão e ermo, deixará de o ser aos vossos olhos, porque direis: «Tudo isto, que vegeta em derredor de mim, me está amando, e amando a seu modo ao nosso Deus; tudo isto é vivo, tudo isto é sabedoria e bondade em acção.» E depois, com este conhecimento especulativo, que vos ala para as alturas, ¡quantas ideias para applicação e pratica! Cada verdade, cada phenomeno, que se descobre dos entes a dentro, é um raio de luz que nos encaminha no mais acertado modo de os servirmos e os aproveitarmos. A herdade d’aquelle que aprendeu o capitulo da grande Theologia Universal chamado _Botanica_, entre os predios dos ignorantes se distinguirá, como a porção de terreno em que Franklin mandou á Natureza escrever com grandes lettras viçosas um invento prestadio. _Isto foi adubado com gesso_--bradavam aos olhos, no meio de um prado mal fértil, pomposas lettras de verdura. _Isto pertence a quem entende o viver das plantas_--dirá a duplicada fertilidade da vossa lavoira. * * * * * Para que não suspeiteis que é a amisade quem me fascina, quando assim vos exalto o valor e prestimo do livro; ou para que, por ser de extranho á vossa bella arte, me não desdenheis a recommendação, haveis de saber que o mesmo que vos eu digo, foi já sentença de tribunal mui competente, qual é a vossa Sociedade promotora. Tanto a obra lhe cahiu em graça por sua singelez e verdade, por sua sciencia e clareza, pelo mui serviçal que se vem accommodando a esta e áquella necessidade do lavrador, e pela segura sonda com que o autor vai tenteando as novidades antes de as adoptar (o que nem sempre se acha nos agrónomos que só teem por geira a folha de papel, por charrua a penna, por bois os dedos, e por experiencia as suas phantasias), emfim por sua sciencia e consciencia, tanto namorou o livrinho a estes sinceros juizes, que, a par com os louvores e agradecimentos, que já não seriam pequena corôa, lhe decretaram unanimes uma medalha de oiro. Fizeram o que o Governo havia de fazer, se já existira n’elle o que em nossos votos existe ha muito: um paternal Ministro da Agricultura. Em quanto o não ha, nem Côrtes que legislem premios condignos a taes serviços, necessario é que a virtude dos particulares vá pagando, como pode, dividas sacratissimas, que não são só do Estado, se não tambem da Humanidade. ¡A Deus praza que as outras Sociedades agronomicas do nosso Portugal, edificadas com o santo exemplo o imitem, e o subam ainda por sua parte a maior ponto! Os talentos dos que podem escrever para utilidade dos seus semelhantes, são como as flores femininas: conteem no seu ovario, lá bem no fundo do calix, germes optimos; mas o pólen, que os fecunda para frutos, só lhes vem na aura do favor publico. Esse pólen fragrante, que os activa deliciando-os, e encantando a quantos no transito o aspiram, é o louvor e o premio. Flores d’alma hermaphroditas, que a si mesmas se bastem para frutificarem, tambem as ha, tambem; mas são muito raras. Sem premio, nem esperança d’elle, nasceu em verdade, e amadureceu, e está já colhido, o _Manual do lavrador_; mas agora, depois do exemplo, ¿quem póde calcular o que no engenho e saber de outros procreará a louvavel ambição? ¿Lembrais-vos d’aquellas condecorações em que vos eu falava aqui ha tempos, que se deviam instituir com titulo de _Ordem do Arado_, e de que tanto escarneceram os parvos, que, a propôr-se a votos uma Ordem _da maledicencia_, _calumnia_, e _mexericos_, talvez a approvariam? ¿Lembrais-vos, meus amigos? Pois, se tivesse já havido um Parlamento que a decretasse, e tivessemos um Ministerio dos Negocios da Agricultura.... um Commendador da Ordem do Arado para venerações teriamos nós já; e vós m’o direis quando houverdes devorado o livro. * * * * * Antes de nos apartarmos, falemos de outra coisa, que tambem vos toca. Sabereis, que, no dia folgasão do nosso patricio Santo Antonio, teve a Sociedade promotora da Agricultura Michaelense um banquete campestre, muito lauto, muito alegre, mas (o que mais vale, que tudo isso, quanto a mim) muito excitativo para mutuas harmonias de vontades, e muito desafiador de forças para os trabalhos que mais importam. Com vinho patrio se bebeu á vossa saude, á prosperidade da lavoira, e á perseverança e bons fados da Sociedade, que tanto lhe quer a ella, e mais a vós. * * * * * Em nossos precedentes serões, aqui no casal, vos ponderava eu, e vos provava com exemplos, como os poetas foram sempre os mais certos amigos e devotos dos campos e vida rustica. No livro que vos hoje trouxe lá vereis mais uma prova; e agora concluirei com uma recentissima, de minha lavra; é o _Hymno dos lavradores_, que eu apresentei como postre entre os vinhos e fruta da vossa terra, n’aquelle patriotico jantar de nossos amigos e irmãos. Tambem eu, ensinado pelos annos, passei das festas da primavera para as do trabalho. Outros tempos, outros gostos; os mais seguros e abençoados sempre são esses. Ouvi pois o vosso Hymno; se vos aprouvér decorae-o, e no meio de vossos trabalhos entoae-o muitas vezes. Poesia e Musica são uns bons adubos, que se haviam de empregar muito mais a miudo, para estimulo de entendimentos perguiçosos e vontades indolentes. De Poesia e Musica muito se ajuda a civilisação onde ha philosophia, como em terras de Allemanha. Os Antigos por instincto o adivinharam, quando metteram entre as lições de suas fabulas a de Orpheu e de Amphião domando rudezas, amançando feras, e erigindo cidades de cem portas e immenso trato, ao som de suas lyras. O que a minha entoou para inspirar o santo amor dos campos, ainda que não seja de nenhum Amphião nem Orpheu, eil-o aqui. Com mãos limpas vol-o entrego; recebei-o com boa sombra. HYMNO DOS LAVRADORES VOZ Cantae, passarinhos; cantae, arvoredos; cantae, frescas fontes; cantae, virações; cantae, ceos e terra, cantae os segredos da vida inefavel que anima as soidões. CÔRO De espigas e palmas coroemos a enxada, morgado, e não pena, dos filhos de Adão. Mais velha que os sceptros, mais util que a espada, thesoiro é só ella, só ella brasão. VOZ Romper tenta o Sabio do mundo a cortina; ao Bello dá cultos o Artista, o Cantor; o Obreiro transforma; o astuto domina; mas o homem dos campos só é creador. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Da terra sahimos, á terra volvemos; a terra nos veste, nos traz, nos mantem. ¿Quem, mais do que a terra, merece os extremos que obtém dos bons filhos a próvida mãe? CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ É cárcere, e livre se acclama a cidade; infernos de penas, disfarça-os em si. A léda, abundosa, gentil liberdade, sem fausto, sem nome, nos campos se ri. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ As ruas sombrias, as turbidas praças, só brotam miserias, vaidades, motim. No campo a abundancia pululla entre as graças, e adoçam-lhe as lidas delicias sem fim. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Gentil liberdade nos campos impera; nas médas das eiras seu throno reluz; diadema de flores lhe dá Primavera; em choça de colmo tem régia Queluz. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ ¿Quem nutre as cidades, as frotas, e armadas? ¿Quem serve ás mil Artes banquete Real? A mãe do Commercio, rainha das Fadas, a Fada incançavel, a Industria rural. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Esgotam-se as minas; dissipa-se o oiro; perguiça e pobreza lhes crescem de apoz. No solo aos activos poz Deus um thesoiro, tão rico entre netos qual fôra entre avós. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ A aurora dos campos floreja saude, nas faces a rir-nos qual ri na maçan; a terra dá frutos, o Ceo dá virtude, e a lida folguedos á turba aldean. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Os mezes das flores, os soes do ceifeiro, a quadra das frutas, o ocio invernal, são gostos variados, que em vôo ligeiro matizam nos campos o giro annual. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Viver de colono devolve-se em festa; o dia lidado lhe escapa a folgar. Com a alva renasce; repoisa na sésta; triumpha ao sol posto; descanta ao luar. CÔRO De espigas e palmas, etc. VOZ De dia, o trabalho n’um chão florescente. A noite, em bons sonhos, amor e prazer. ¡Ditosa mil vezes a rustica gente, se os bens que disfruta soubera entender! CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Ver Nymphas nas selvas, nas aguas, nos montes, foi de animos gratos delirio em pagãos. Nas serras, nos troncos, nos ventos, nas fontes, Deus sentem, Deus amam, colonos christãos. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ ¿Dos Céos quem, no mundo, quem vive mais perto? Lavrando ou colhendo, medita-se em Deus. Com preces e hosannas palpita o deserto. ¡Oh! Fé, os seus filhos inda hoje o são teus. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ ¡Oh! Tu, que os expulsos do teu Paraiso ás quedas e á enxada fadaste, ¡oh! ¡Senhor! nas lidas põe bençam, nas mentes põe sizo, nos corpos saude, nos peitos amor. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Mantém nas esposas fiel castidade; na prole innocencia; fartura no lar; concede aos visinhos fraterna amisade, e á Patria virtudes que a possam salvar. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ ¡Virtudes á Patria! ¡virtudes ao Povo! !virtudes aos Chefes que dictam as Leis! Já foi sceptro a enxada; que o seja de novo. Diniz lá da campa que a mostre inda aos Reis. CÔRO De espigas e palmas etc. VOZ Aos roucos triumphos das eras antigas, succêda o da Arcadia cantar festival. Da ceifa das palmas á ceifa de espigas volvei, Cincinattos do bom Portugal. CÔRO De espigas e palmas coroemos a enxada, morgado, e não pena, dos filhos de Adão. Mais velha que os sceptros, mais util que a espada, thesoiro é só ella, só ella brasão. Junho de 1840 XII Sexto serão do casal Tristes effeitos da ignorancia SUMMARIO Singular processo de feitiçaria e homicidio.--Como se sentenciou.--Encontradas opiniões acerca da sentença.--Tem para si o autor que n’este crime, como em outros muitos, não cabe imputação.--Brotou-o a ignorancia; e a ignorancia é culpa das Leis e Autoridades.--Todos os cidadãos teem direito a instruir-se, e o Governo, por conseguinte, obrigação de lhes facultar os meios de se instruirem. ¡Processo bem raro para em nossos tempos! No banco dos accusados occupa o primeiro logar uma mulher já de dias, com a serenidade da innocencia no rosto, nos modos, e nas falas. A fama publica e as testemunhas a dizem digna do seu nome: chama-se _Angelica_. A sua casa foi sempre asylo franco a feridos e enfermos, mórmente pobres, que dizem acharam sempre n’ella muita sabedoria, mãos mui primas para curar, e palavras de consolo tão efficazes como os seus remedios; tudo pelo amor de Deus, e esmolas ainda por cima. ¿Que a metteria entre ferros d’el-Rei, onde jaz, faz hoje um anno dia por dia? Matou outra mulher. No banco dos accusados lá estão, não menos, os complices que a ajudaram: o marido e viuvo da victima, que lh’a levou a casa, e lá permaneceu em quanto durou a tragedia; os que a estiveram sopeando de pés e mãos, até que cessou de bulir; o que, por espaço de horas, com uma vella na mão allumiou; os que, depois de consumado o acto, carregaram o cadaver, como um fardo, para cima de uma cavalgadura, para o irem lançar de uns penedos no mar, que a elle lhe servisse de sepultura, e a elles todos de encobridor. O que o mar havia de sonegar á Justiça, o Céo, que vê tudo, o descobriu. Os culpados, a fóra um, que medo ou remordimentos da consciencia trazem a monte, os culpados ahi estão todos no meio do tribunal. ¿Mas quem era a morta? Que fizera para haver tão miseravel fim? Chamavam-lhe feiticeira os visinhos.... sem embargo de ter nome de _Maria_, que dizem preservar de coisas ruins. A artes suas diabolicas se attribuiam muitos achaques, desconcertos de fortuna, e mortes. Todos (até seu marido) aborreciam n’ella o «Espirito immundo», que, para não ser constrangido a desamparal-a, a trazia pertinazmente erradia dos confessionarios. Para a desendemoninhar, a fez a _serva de Deus_ conduzir a sua casa; combateu com as resas e ceremonias que por mais acertadas tinha; exorcismou, á sua moda; ameaçou, espancou o inimigo; em vão. Com a teima d’elle, houve de crescer n’ella o fervor da caridade, e a santa cólera. Lançou-se sobre a infeliz derrubada; recommendou aos circumstantes lhe tolhessem os movimentos, a fim de se não espalharem os feitiços (com o que, todos ficariam perdidos, e voaria a casa pelos ares); e tanto fez, e fizeram, sobre aquelle triste corpo, tanto e por tanto tempo lhe cerrou a garganta ao som de esconjuros, que a pobre expediu de si, não o espirito infernal, mas a propria alma. Lê-se o processo; ouvem-se as testemunhas, os réos, a accusação, a defensa. Ao cabo de dezasseis horas, pelas 2 da manhan do dia 11 d’este mez, publica-se a sentença: Angelica, desterrada por dois annos para fóra da comarca; seus complices, restituidos á liberdade. * * * * * Sem quebra do acatamento que todos devem á Justiça, arvoremo-nos aqui, no casal, em juizes de tal sentença. De injusta, por benigna, a accusam muitos da cidade, e a accusa o proprio Ministerio publico; em quanto cá nos campos, segundo oiço, não falta quem ainda a taxe de cruel. Aquelles, horrorisados com o homicidio, que as circumstancias aggravaram até martyrio, para o expiar invocam o homicidio legal. Estes dão benções, do coração, a quem purgou a terra de uma procuradora e agente dos infernos. Em rasões de humanidade se fundam uns e outros; e a uns e outros, todavia, tem a mesma humanidade rasões que oppôr para defender esta sentença, em que tanto reluz ella como a justiça. E quando não, discursemos chanmente, e com os animos despreoccupados. * * * * * Maria, em verdade, não era feiticeira; não o podia ser; não as ha; não pode havel-as. Foi crença de pagãos a que admittia pactos secretos com espiritos malfasejos, para se obrarem no mundo maravilhas. O Christianismo não a acceitou, que seria negar peremptoriamente a Providencia, e renunciar Deus, renunciando a rasão. Nem a tradição respeitavel da Egreja, nem os escritos dos Santos Padres e Doutores, nem as Decisões dos Concilios, nem os Theólogos, nem, sobre tudo, as Escrituras santas, deram jámais o seu assenso a essas fabulas despresiveis, filhas da velhacaria interesseira, ou da ignorancia crédula, ou, mais ao certo, de uma e de outra. De balde nos argumentarão com as penas estabelecidas contra os que professem a feitiçaria. Nós mesmos, que na feitiçaria não acreditamos, defendemos por sensatas e justas essas penas; porque todo o individuo que se inculca alliado, e braço direito de potencias invisiveis e maléficas, para alterar, em muito ou em pouco, a natural corrente das coisas, calumnía a Deus, mente a si e a seus semelhantes em materia grave e de consequencia; arroga-se, de feito, e pelo terror, um predominio que lhe não cabia; perturba, por querer, a sociedade; lança n’ella novas sementes de fanatismo e crimes. Uma de duas: dando-se por alliado dos demonios, ou não o crê, ou crê-o. No primeiro caso, abusa tirannicamente da rudeza e pusillanimidade alheia. No segundo, teve necessariamente a criminosa intenção de pactuar com os genios das trevas; quiz dar-lhes a alma, a troco do privilegio de malfazer; suppôz ter consumado este pacto nefando, e obrou em conformidade com a sua persuasão. Uma e outra coisa, não podiam as Leis ecclesiasticas, e as civis, deixar de punir rigorosamente. * * * * * Maria não era feiticeira. ¿Mas dava-se ella por feiticeira? Não era esse o processo; não se provou; não o sabemos. Mas, quer se desse quer não, quer tivesse, quer não, abusado de sua alma negociando-a com o inferno, ou dos espiritos de seus visinhos, submettendo-os ao influxo do seu querer, sempre ficava sendo, no conceito da gente rude e desallumiada, um ente muito infeliz para si, para os outros mui perigoso e mui funesto. Era assim que, na sua timorata phantasia, indispensavelmente a devia representar a mulher, cuja vida, já de annos largos, era toda caridade, esmolas, e orações. ¿E que fez? uma grande façanha moral; uma sublime loucura de generosidade. Só escudada de suas orações, resolveu entrar em duello com inimiga, em seu entender tão medonha e tão possante, que tomar-se com ella era tomar-se com o proprio inferno. Duas palmas lhe promettia a consciencia com aquella victoria, se a ganhasse: redimir uma possessa do captiveiro diabolico, restituindo-a á Egreja, ao marido, e a si mesma, á amisade dos visinhos, á quietação interior, e á esperança do Ceo; e desafrontar de adversidades os que as estavam por via d’ella padecendo, ou podessem para o futuro padecer. Eis aqui a magnanima loucura que a seduziu. Aventarmos-lhe outro intuito não é possivel. Das intenções mais santas brotou o homicidio. ¡Mysterios da Providencia! não os sondemos. A morte appareceu ali como o raio, sem ter sido chamada, nem prevista. * * * * * ¿Quem reuniu jámais setenta testemunhas, e na propria casa, e com luz, e em terra populosa, para assassinar?!... ¿Quem, para assassinar, empregou jámais, como unicas armas, resas de longas horas, e mãos inermes?!... ¿Que mulher poderia arrancar a existencia, por querer, a outra mulher, quando n’essa existencia fosse envolta a de um terceiro ente inda não nascido?!... ¿Desde quando se mudou a natureza humana, a ponto de entrar o pensamento e proposito do homicidio mais nefando, mais covarde, mais inutil, e mais perigoso, n’um coração que era todo benevolencia e caridade? * * * * * --«Mas a morte perpetrou-se.» --Sim. --«Perpetrou-a ella.» --Sim, sim, mas sem o querer, sem o pressentir, sem entender ainda agora o como. No delirio do seu fanatismo, julgava-se a braços, não já com uma mulher, senão com o rei dos malfeitores de além-mundo. ¿Que muito que o terror lhe centuplicasse as forças? ¿que as empregasse ás cegas? ¿que destruisse uma vida fragil e atenuada, sem saber? Logo que descobriu debaixo de si um cadaver ¿não cahiu ella quasi cadaver? ¿não lhe fugiu espavorida a razão? ¿não permaneceu por muito tempo n’esse estado entre vida e morte, de que ainda inteiramente não sahiu? Meus amigos, ¿onde está o crime? Uma desgraça, e muito grande desgraça, essa existiu sem duvida. Mas n’aquillo em que se não dá crime, ¿a intenção malfaseja quem a provou? ¿quem a allegou? ¿quem a demonstrará verosimil? ¿quem ao menos possivel? * * * * * Mas, deixando a justiça á Justiça, falemos de coisa quanto a mim mais util, mais fecunda, e mais pratica para entre nós. Os processos são meras formas, sujeitas a opiniões e erros. O que tem importancia real são os factos sobre que elles versam; e mais real importancia ainda as ideias, de que esses factos se derivam necessaria e fatalmente, como a planta da semente, e o animal do ovo. Não ha grande virtude nem grande crine, que antes de ser obra não fosse vontade, e antes de vontade pensamento, e antes de pensamento embrião de ideia; é o pontinho negro e imperceptivel no horizonte, nuncio do tufão que revolve mares e afoga armadas, varre a terra, arranca e arrebata animaes, arvoredos, e habitações. De duas causas, só, proveem quantos males commettidos por homens se podem no mundo deplorar: uma são as ruins vontades, as paixões, os interesses mal entendidos; a outra, a ignorancia, e os erros que d’ella nascem, sendo esta segunda muitas vezes (e quasi sempre) a que virtualmente contém em si a primeira. O Adão da maldade é o absurdo; instruir é fazer a cura adiantada. Não são os terrenos desmoitados e lavradios os que dão plantas venenosas, reptis peçonhentos e feras bravas; formosuras e suavidades com a luz se criam, assim na alma como na Natureza. Metter conhecimentos no Povo devêra ser o empenho dos empenhos para todo o Governo, que tivesse por norte a civilisação. Não é torcendo, decotando, nem enxertando, que se melhora a arvore, que por dentro está enferma, mas ainda não de todo contaminada; é cavando-lhe e medicando-lhe a terra, em que as radículas invisiveis estão de dia e de noite bebendo caladamente. * * * * * ¡Quantas desaventuras na vergonhosa historia que vos acabo de contar, nascidas todas de ignorancia! Um povo laborando em terrores, por julgar existente o que nem sequer era possivel. D’aqui, odios atrozes contra uma pobre mulher, que n’isso de maleficios, de que a accusavam, não era mais incursa do que vós e eu. Logo, ella morta do modo mais afrontoso; e com um filho nas entranhas; e com um marido ao lado, que lhe não pode acudir, que ao desamparo de viuvo sentirá accrescer-lhe o opprobrio de conjugicida. Outra mulher, tornada a subitas e involuntariamente assassina; arrastada de sua casa, onde era procurada e festejada pelos pobres, e de sua terra que a citava com ufania, para uma prisão, para um tribunal, para a publicidade do odio, para todas as humilhações da justiça, para a eterna agonia que precede a leitura da sentença. Além d’estas duas casas, abaladas ou destruidas, seis homens, ou chefes ou filhos de seis outras casas, passando eguaes amarguras, eguaes transes, depois de um anno sem liberdade na sentina moral da cidade, chamada cadeia. ¡Que de dias e de noites já perdidos sem remedio para esta gente! ¡e quantos annos, talvez, do seu futuro já devorados pelo desgosto! ¡Que de despezas inesperadas! ¡que de transtornos nos negocios, nos projectos, nas relações! ¡que brechas na reputação, e talvez na moralidade, pelo trato de annos com entes corrompidos e perversos, em ocio já de si corruptor, e com os brios quebrados, pelo desprezo de quantos viam tranzitar por diante das suas grades! Todos esses desconcertos, e os milhares de outros que d’elles se haverão originado, ¿d’onde provieram? de um erro; como o erro, da ignorancia; a ignorancia, da falta de educação publica; e esta do vergonhoso e criminoso, do vergonhosissimo e criminosissimo desleixo de legisladores e governantes. Para tudo ha Leis; para tudo se andam ellas de continuo a refazer e emendar; mas o codigo cabal, judicioso, sincero, franco, inexoravel, que obrigue todos os cidadãos a aprender, para o serem, e para serem homens; ¿esse código onde o temos? ou quem pensou nunca em o pedir, quanto mais em o fazer? Se alguem quizer edificar na cidade o seu predio fóra do alinhamento e risco municipal, achará quem lh’o coarcte. Se se espairecer nu pela praça em dia ou noite de verão, irá prezo, quándo menos por louco. Como estes, mil outros actos, natural e essencialmente indifferentes, são todavia cohibidos por providencias legislativas. ¿E a minha alma? ¿Esta parte optima de mim mesmo, nascida com a maravilhosa faculdade e com o desejo instinctivo de se aperfeiçoar, a minha alma, hei-de poder deixal-a, de poisio, sem que me constranjam a cultival-a, eu, que para ter obstruida ou immunda a minha testada não sou livre?!! ¿Hei-de poder condemnar o espirito de meus filhos a uma infancia eterna, eu, que não sou livre para lhes mutilar um braço ou um só dedo?! Dizer-se que ha-de o fisco extorquir-me do producto do meu suor, o que ás vezes me não sobeja, para occorrer ás necessidades do Estado, e que o Estado me não ha-de compellir a ter riquezas moraes para com ellas ajudar o patrimonio da felicidade commum!... A soltura do viver silvestre não m’a perdoariam; ¡e o conservar silvestre o entendimento, e conseguintemente silvestre e indómito o coração, com tão estupida magnanimidade m’o relevam!!!... * * * * * Meus amigos: se, como já vos ponderei, é crime contra a Natureza e contra a Sociedade deixar devoluto a terra da Patria, de que o acaso nos fez donos ¡quanto mais apertada nos não correrá ainda a obrigação de lhe não deixarmos improductiva a nossa rasão, fundo muito mais creador e social, mina de muito mais incalculavel opulencia, morgado de instituição divina, superior em nobreza a todos os morgados! Caberia pois ao Parlamento, chão, sizudo, e nacional, que vós algum dia (em Deus o espero firmemente) nos haveis de dar, caber-lhe-hia proporcionar a todos os cidadãos meios faceis de se instruirem, e, proporcionando-lh’os, constrangel-os, sob as mais severas penas, a aproveital-os. Desde então haverá cessado, para sempre, a possibilidade de processos, e desgraças, como estas que hoje vos relatei, opprobrio do seculo, e escandalo da civilisação. Mas não só isso: quando todos formos, mais ou menos, instruidos, cada um segundo as suas faculdades, o seu estado, a sua edade e a sua profissão, a lista dos crimes de toda a especie haverá diminuido. O que em escolas e livros se houver gasto, poder-se-ha forrar em prisões e agentes de Justiça. Não é tudo: ¡Com estes bens negativos, da maior importancia, que de bens positivos e palpaveis se não verão affluir! Os deveres domesticos e civicos, mais bem conhecidos, serão menos incompletamente desempenhados. Os laços da sociabilidade se apertarão e doirarão. Tornar-se-ha a convivencia mais frequente e mais amena. Medrando o numero dos leitores o dos bons escritores crescerá na devida proporção; ir-se-hão opulentando as sciencias, as artes uteis e fabris desenvolvendo-se; a Agricultura allumiando-se e florindo; as Artes chamadas bellas por excellencia acharão o que hoje lhes falta: alumnos, cultores, consumo. Os seis dias da semana deixarão em cada casa dobrados haveres, e um domingo muito mais desejado, e muito mais desejavel. * * * * * ¿Serão isto ainda utopias, como os nescios chamam a tudo quanto nasce da alma e vôa por cima do lodaçal em que se elles afogam? Não são, meus bons camponezes, não são. Vêl-o-hieis já hoje, se as horas nos não appertassem; mas vel-o-heis para a minha proxima visita. Havemos de conversar muito assentadamente sobre isto; porque emfim, ninguem me tira da cabeça, que, pése a quem pesar, ainda algum dia vos hei-de ver legisladores. ¡Oh! quando isso fôr... então é que é pôr luminarias de nove dias, nos campanarios, nas casas das Camaras, nas granjas, nas officinas, nas estradas e nos rios, e nas escolas ¡sobretudo nas escolas! Julho de 1849. XIII Setimo serão do casal Instrucção primaria SUMMARIO Males provenientes da ignorancia.--Panegyrico da Sciencia.--Resumo historico do progresso intellectual.--Seu estado ao presente.--Para todos ha tarefa na obra da illustração.--O Povo concorrerá para ella, elegendo verdadeiros representantes--Retrato d’elles.--Serão autores tambem de um Ministerio especial de Instrucção publica.--Propõem-se algumas Leis ácerca do ensino.--Como se proporcionarão meios para todos se poderem instruir.--I. Novos methodos.--II. Escolas normaes.--III. Escolas primarias fixas.--IV. Bons ordenados aos seus professores.--V. Centro director, e commissarios volantes.--VI. Escolas primarias ambulantes.--VII. Escolas para adultos nos serões e dias santos.--VIII. Cursos especiaes de conhecimentos mais altos.--IX. Escolas primarias para meninas e mulheres.--X. Item para as cadeias.--XI. Escolas espontaneas e gratuitas.--Dados estes meios, como se compellirá o Povo a se aproveitar da Instrucção.--XII. Exhortações.--XIII. Premios.--XIV. Castigos.--Relancear de olhos sobre os futuros da Nação assim illustrada. Assentámos, amigos, em que a ignorancia era a mãe, a avó, e a ama de muitos males, e de quasi todos. O que são para a saude os paúes perguiçosos e pestilenciaes, é-o a ignorancia para a virtude, para a fortuna, para o crédito, para a boa harmonia, para o folgar, para as forças, para a dextreza, para a pericia, para a elegancia, para a formosura, e para a saude mesma; para a do animo, para a do corpo, para a da casa, para a da cidade, para a do presente, para a do porvir. Cuidar que um Povo se poderá bemaventurar sem sciencia, e muita sciencia, é já uma prova palpavel do como a ignorancia nos induz em funestos erros; pois é presumir que sem luz de sol podia ser a terra creadora; quando, só por isso que lhes fallece claridade e calor, é que as regiões dos polos são tenebrosos e gelados desertos, terras ou neves onde nada pensa, nada canta, nada ama, nada vive, nada vegeta, nada produz, nada espera, nada se lembra, e nada abençôa, nem em segredo, o Mysterioso Eterno, que tudo lhes negou com recusar-lhes sol. * * * * * Já houve ruins engenhos, ainda que subtís, que profanaram a penna escrevendo contra a Sciencia, e levantando até ás nuvens o viver silvestre. Mas ¿que se segue d’ahi? Tambem já alguns espiritos destillaram, ao fogo de suas paixões, paginas e paginas a desmentirem a existencia do Espirito; e, bebendo no ar de Deus o seu amor, soltaram do peito esse mesmo ar, convertido em palavras que o negavam. A unica razão, por que um Povo excede a outro Povo, e um seculo vale mais do que outro seculo, é a Sciencia avantajada. Bem sei que estas verdades correm já communs pelos livros e pelas folhas quotidianas, chegando a achar-se a confissão d’ellas na bocca dos que menos possuem de Sciencia. Todavia como a OPINIÃO, de rainha do Universo só tem o nome, e, se algum dia governou, muito ha que a fizeram abdicar, obrigação é de todos, e de cada um, conspirar para a fazermos subir de degrau em degrau até outra vez se assentar no throno. Pelo que, ainda que a necessidade do Saber corra já como aphorismo de bocca em bocca, n’este ponto se ha de bater e teimar, até se convencerem e converterem os proprios Governantes e Legisladores, que são sempre (mal peccado) os ultimos a virem metter a cabeça no Jordão. * * * * * Tempos houve (na historia de todas as civilisações ha esse periodo equivoco e opprobrioso), houve tempos, em que os poderosos fizeram do saber um privilegio para si, ou para os seus; mas sempre, em ultima analyse, para si. As ideias vegetavam então, e se engendravam, enclausuradas como as feras nas coutadas dos senhores; e ai do plebeu mesquinho que n’ellas posesse mira. Para mais segurarem o monopolio, chegaram até a santifical-o. No Egypto os livros recatavam-se no regaço e debaixo do manto de Isis. Antes e depois do Egypto, muito Oriente, com ter sido aquella região o berço da civilisação, como é o do sol, encerrou as luzes entre os idolos e os sacerdotes, no silencio de seus pagodes, nos recessos mais intimos e profundos dos seus palmares. No seio mesmo da Religião da egualdade, mais de uma vez se manifestou em classes poderosas essa tendencia usurpadora, que as fazia, ao menos temporaria e apparentemente, mais possantes. Todos estes factos comprovam que o saber foi sempre havido pelo que é em realidade: por uma força, e uma potencia; e, como tal, ambicionado e enthesoirado pelos mais astutos. A pusillanimidade, a perguiça, a rudeza, a credulidade, a propria penuria e miseria das turbas subjacentes, ajudavam aos usurpadores a manter-se n’aquella posse. Entretanto, a obra de uma Providencia redemptora progredia caladamente. O Saber, sem mão nem autor visivel, ia-se filtrando de camada em camada, até á plebe infima. Os instinctos intellectivos, semelhantes a aquellas sementes cereaes, que ainda hoje se desencantam em sepulcros de dois e tres mil annos, e que apóz tres mil annos ainda não perderam a sua virtude germinativa, e sob influxos favoraveis se desenvolvem e vicejam, os instinctos latentes na alma do Povo começaram a desabrolhar, verdes, vivazes, medrançosos, e taes, como das gramineas (que são a plebe dos vegetaes) diz o grande Naturalista sueco: «Quanto mais calcadas, tanto mais multiplicativas». A luz, crescendo de seculo em seculo, tinha fendido, estalado, e feito cahir em pedaços a lanço e lanço, o vaso terreno e mesquinho em que a haviam encerrado. O dia de Deus era nascido. Elle cresce, e cresce, e já agora crescerá sempre, porque para elle não ha occaso, e o zenith para onde tende é na Eternidade. O Saber já não é aristocratico, nem sacerdotal, nem de classe alguma; o Saber é de tudo que tem alma; é do genero humano. O Saber foi o quinto Evangelista, e o decimo-terceiro Apóstolo, mandado percorrer mundo para radicar e consumar o dogma santo, e já agora imprescriptivel, da egualdade. Deixemol-o ir na sua missão, que a ha-de preencher. Se o esperam ainda trabalhos, mais certas o esperam as corôas. No que já andou, colheu as forças para o que tem de andar. Nos martyrios que soffreu, e de que sahiu illezo, se conteem os seus futuros de triumpho. Deixae-o ir, deixae-o ir, que é a Providencia quem o enviou; é Ella quem lá de cima o sustenta pela mão, e lhe aponta por estrada o Universo. Deixae-o ir, que ninguem o deterá; lançae flores diante de seus passos, apóz elle canticos, por cima da sua cabeça bençãos. Quanto mais derrama com as mãos ambas, tanto mais vai cheio o seu regaço. Quanto mais colhe, tanto mais semeia. Quanto mais liberalisa aos filhos, tanto mais prodigalisará aos netos. Quanto mais se robustece, tanto mais se humanisa. Quanto mais se nobilita e deifica, tanto mais familiar e plebeu se torna de hora a hora. * * * * * Applicae attentamente o ouvido d’alma. ¿Não sentis um rumor geral nas intelligencias, com que a vossa sympathisa, e que a faz mysteriosamente agitar-se como a sensitiva? ¿um rumor, como aquella harmonia, que o sublime sonhador da Grecia percebia nas espheras celestes? ¿um frémito de desenvolvimento e medrança, como se ouve, ou se cuida ouvir, pelas noites de verão, no seio vegetativo da Natureza? Esse frémito, esse rumor sem estrondo e sem nome, ¿quem o produz? São milhões de pennas, a escrever em milhões de retiros, por toda a face da terra; são milhões de espiritos a meditar; são milhões de mãos a esfolhear livros; são milhões de olhos a revolver a Natureza, desde as entranhas da terra até á abóbada dos Ceos; desde o insecto de horas, até á Sempiterna Essencia; desde as origens mais remotas das coisas, até aos ultimos futuros das sociedades; são milhões de erros, preparando, como adubío, o solo para muito maior numero de verdades frutiferas; são os passos dos viajantes que perlustram o globo; são as vozes infantis, que solletram n’uma infinidade de escolas; são os colloquios familiares a alarem-se para não sei que alturas; é a Imprensa, arvore da Sciencia, a chover de dia e noite frutos e flores, e de dia e noite a carregar de mais flores e mais frutos; são os idiomas a permutarem entre si noções e descobrimentos; são os direitos e deveres a quererem passar de abstracções para principios, de principios para Leis, e de Leis para obras; são os elementos de uma felicidade sempre longinqua, a confluirem para embrião; em summa: é o Saber, a sêde e a necessidade do Saber, a transsudar-se de toda a terra, como um vapor vago, e a recahir sobre toda ella como um orvalho fecundo e esplendido. Ora pois: n’esta obra providencial, para todos ha tarefa; e, com salario ou sem elle, todos a devem preencher. Ha tarefa para os Cabeças do Estado, que, segundo dizem, são em grande parte feitura nossa; e ha tarefa para o Povo, que somos nós. D’onde se segue, que, mediata ou immediata, directa ou indirectamente, muito podemos; e se muito podemos, muitissimo devemos a favor da publica instrucção. * * * * * De Jupiter é o principio--diziam os poetas antigos. Do Povo é o principio--podemos nós dizer. Desengane-se elle, uma boa vez, a eleger os seus representantes, a tiral-os de sua consciencia, a escrevel-os de seu punho, em vez de os acceitar do bolso (ou da bolsa) de nomencladores interesseiros; e logo conseguirá, não um milagre, se não mil; não alguns bens, se não todos os bens, e a felicidade. Constitua o seu Parlamento por modo, que n’elle se possa mirar, conhecer-se, e amar-se; venerando Senado, cheirando mais á terra, aos cereaes, e ás hortas, que ás esteiras palacianas, aos theatros, e aos toucadores; mais sollícito de despachar, que de requerer; mais prateado de cans, que doirado de medalhas; mais obreiro, que orador; e mais eloquente nos feitos, que nos ditos; em summa: tire-o do seu seio, da sua maioria e melhoria, dos cultivadores, dos amigos, dos parentes da terra; deixe-os trabalhar, como elles sabem e costumam, e aguarde quieta e animosamente os resultados. Verá como, a par com o suspirado Ministerio da Agricultura, brota logo outro não menos suspiravel Ministerio, o da Instrucção publica, e para um e para outro pululam d’aquelle paraizo legislativo Leis novas, robustas de bom senso, e de prodigiosa feracidade. * * * * * Dos interesses directos da Agricultura não vos quero falar hoje, mas somente das Lettras, que áliás os encerram virtualmente, como encerram tudo. Eis aqui, meus amigos, a substancia de algumas d’essas Leis memoraveis, que, cedo ou tarde, aqui e em toda a parte do mundo, se estão para fazer e executar. * * * * * TODOS SERÃO OBRIGADOS A CULTIVAR O SEU ESPIRITO. A TODOS SE FACILITARÃO MEIOS PARA O CONSEGUIREM. Comecemos por este segundo ponto. * * * * * A quantidade dos mestres das disciplinas primarias é insufficiente; a sua qualidade mais insufficiente ainda; sendo que, sem muitissimos e optimos mestres de taes disciplinas, nem instrucção ulterior é muito provavel, nem o arroteamento e primeira cultura industrial, agricola, e moral do Povo se pode conseguir. Convem e urge portanto: * * * * * I. Promover, pela esperança de premios condignos, a invenção ou introducção de methodos faceis e completos, clarissimos e efficacissimos, para o ensino de ler, de escrever, de contar, de desenho, geometria, physica, mechanica usual, de agricultura, de Religião, de moral, de decencia, etc. * * * * * II. Crear Escolas normaes, em que esses methodos se incutam e gravem profundamente no entendimento, na vontade, no amor dos que hão-de por elles ensinar. * * * * * III. Que haja escolas primarias fixas e permanentes em todas as povoações que d’ellas forem capazes por sua extensão. * * * * * IV. Que os professores recebam salario correspondente, assim ao cançaço como á utilidade do seu trabalho; devendo todos os cidadãos ricos ser obrigados a contribuir do seu para esta obra nacionalissima, socialissima, e christianissima. * * * * * V. Que um Centro director da Instrucção publica traga perennemente Commissarios volantes, de grande illustração e zelo, a visitar as escolas, a corrigil-as, a aperfeiçoal-as em todo o sentido, e a tomar nota do merito comparativo dos professores; para que os mais dignos, no fim de cada anno recebam, não só louvor publico, mas ainda outros premios de sua diligencia, e os ineptos, desleixados, ou viciosos, sem misericordia se despeçam e substituam. * * * * * ¿D’onde virão os cabedaes para tantos premios, para tantas casas e trens de aulas, para tantos centenares de milhares de livrinhos, como será necessario distribuir gratuitamente, para tantos ordenados não mesquinhos, e para tantas viagens? Virão, em pequena parte, dos tributos especiaes, e, na maxima parte, da suppressão de outros gastos, muito mais avultados e dispensaveis do que estes. Logo que um Parlamento lavrador houver, como deve, supprimido o Exercito, desapparecerá a horrenda voragem dos nossos dinheiros, que então chegarão para isto, e para tudo. E já vos não falo nos outros tantos e tamanhos beneficios, que d’ahi se hão-de derivar para o Estado, para a familia, para os particulares; na restituição de braços á lavoira e á industria, que são novas surgentes de haveres para o Reino; na tornada dos filhos para as familias; no accrescimo dos casamentos, e correspondente diminuição nos vicios; na maior probabilidade e segurança da paz, e da liberdade verdadeira. Tapado este sorvedoiro, ao som dos hymnos de alegria dos proprios soldados, que não são menos onerósos a si do que á republica, o vosso Parlamento, circumspecto e calculador, lá verá como sobram cabedaes para a obra santa que propomos. Mas prosigâmos, que a objecção, que parecia insuperavel, com um leve sopro ficou morta. * * * * * VI. Alem d’estas escolas, estaveis e perennes, outras devemos pedir ainda á nossa boa gente legisladora; a saber: escolas ambulantes para os povoados pequenos; professores nómadas, bem estipendiados, que vão, de terrinha em terrinha, dando o seu curso do mais indispensavel das materias primarias; por exemplo: o ler, escrever, e contar, quando mais não seja; para o quê, sendo elles bons, e bons os methodos, tres mezes bastam e sobejam. * * * * * VII. Nas cidades, villas, e aldeias grandes, conviria fundar, com uns ou outros dos sobreditos mestres, escolas só para adultos, cujas lições fossem no serão de cada dia de trabalho, e nas manhans e tardes dos domingos e mais dias santificados; obra cuja caridade e moralisação se não pode assáz encarecer. Estas escolas de adultos devêram principalmente trabalhar desde o descahir do outono, até ao fim do inverno, quando a Natureza põe férias ás fadigas ruraes. Ahi, o que os vicios e intemperanças da ociosidade haviam de consumir, ¡quão mais bello não será aproveital-o em cheio a civilisação! O camponez, depois de cultivar a terra, cultivará o seu espirito; depois de ter dado á sua Patria riquezas physicas, dar-se-lhe-ha a si proprio melhorado, que é riqueza moral muito maior. Ninguem ignora os resultados felizes das escolas dominicaes introduzidas em Inglaterra por Bakes, imitadas já, em mais ou menos copia, por todas as nações cultas. Só na Gran-Bretanha se contam para mais de treze mil d’estas escolas, com mais de milhão e meio de discipulos. Nos Estados Unidos os discipulos excedem de um milhão. Na Alemanha não teem conto. * * * * * VIII. Cursos especiaes, já de moral e decencia, já de direito politico, já de jurisprudencia usual, e rural, deverão ser regidos com a maior lucidez, amenidade, e graça, por mestres muito idóneos, que para esse fim peregrinem de terra em terra, não se detendo em cada uma senão o tempo indispensavel, e ahi forcejando por attrahirem ás suas prelecções o maior numero de ouvintes de um e de outro sexo; preferindo-se para estes agradaveis exercicios, segundo a estação o aconselhe, o adro, a sacristia, ou a egreja mesma, um theatro, uma sala, ou um jardim. Os hortos floridos eram na Grecia viveiros de philosophia, e os pórticos em Roma seminarios de litteratos. Todas as seducções se deveriam empregar para attrahir a estes cursos, e, sobre todas, a musica instrumental, podendo ser; ou, quando menos, o canto em commum. Ainda nos lembra como os piedosos cantares, com que os severos Missionarios abriam e cerravam os seus tremendos e apostólicos discursos, ás vezes n’uma egreja, outras n’um arraial, outras n’um souto profundo de castanheiros, com serem umas solfas muito chans e monótonas, singularmente affeiçoavam e induziam os animos de seus profusos auditorios. * * * * * IX. As escolas primarias para meninos e homens são muito, mas não são tudo; é forçoso creal-as egualmente para meninas e mulheres, e, com mão não mais avara, multiplicar e remunerar as professoras. A educação das mulheres, se bem se adverte, contém em si a dos homens. Ellas são no principio, e por muito tempo, as nossas mestras unicas; ellas nos infiltram em todas as edades as suas ideias; no que temos de bom e benigno, foram ellas que nos modificaram á sua imagem; ellas (sem o parecerem) nos educam e dirigem até ao fim. A mulher, convenientemente educada, será melhor mãe, melhor esposa, melhor ecónoma, melhor amiga, mais proveitosa á casa, mais util aos visinhos, mais benemerita da Patria, sem se lhe mostrar; mais querida de todos, e de si mesma. Ás mães fazem os medicos tomar os remedios que os seus filhinhos de peito necessitam; a virtude benefica lá passa d’ellas para elles disfarçada no suave e candido do leite. O nosso Parlamento de Lavradores ha-de attender muito a isto: as almas feminis já per si mesmas mereceriam ser educadas; que não será, quando sabemos, tão ao certo, que são ellas as que amamentam as nossas! * * * * * X. Se a instrucção é hygiene para a alma, ella lhe serve tambem de medicina. A sociedade tem, e ha-de ter sempre, criminosos, e, em razão d’elles, a fatal necessidade de prisões. Ora as prisões, quaes as temos e teremos ainda longamente, são ao mesmo tempo um semi-remedio ou palliativo, e um veneno. A Liberdade desvia d’ellas os olhos com vergonha; a Virtude as contempla com terror; a Philosophia cruza os braços aos seus hombraes, e emmudece; em quanto a Justiça lhes chapeia e reprega as portas, e o Interesse individual dos cidadãos approva a obra da Justiça. O carcere amputa e enterra os membros pobres da sociedade; mas a podridão d’estes membros, posta em commum, desenvolve um contagio moral, que por derradeiro devora tambem aos innocentes, ou aos menos culpados, que as apparencias ou os caprichos da fortuna para ali arrojam muitas vezes. Nos ares mephyticos do carcere, por todos os poros se aspira o odio dos outros e o desprezo de si mesmo, a selvajaria da linguagem, a bruteza dos sentimentos, a grossaria e obtusidade das ideias. Tratado como fera, ali o infeliz se compraz de aguçar nos varões de suas grades, e na lágea de sua cama, as garras do seu furor, para um dia grande que elle espera sempre. Em quanto elle não chega, cria para se aturdir uma especie de vertigem voluntaria. Tinha, por ventura, um só vicio quando entrou; agora é n’um só individuo um feixe de miseraveis: ébrio, immundo, obsceno, jogador, ladrão, falsario, perjuro, calumniador, conselheiro mestre e missionario de insociabilidade, inimigo apostado das Leis, escarnecedor de Deus, e (por desesperação, por que a sua alma deixou de lhe falar) materialista. A prisão, de que uma eloquente e philosophica penna contemporanea ahi lançou em rasgos mestres um quadro para estudo de legisladores,[1] é um sepulcro infecto de moribundos impenitentes. D’ali não se pode descer senão para o inferno, nem subir se não para o supplicio, nem sahir senão para o desterro, que é supplicio e inferno juntamente, ou para a miseria, para o desprezo, para o crime, veréda espinhosa e pérfida, que outra vez conduz ás suas portas. [1] _O Preso_, romance social por Sebastião José Ribeiro de Sá, 1 vol. de 8.º-335 paginas. Uma escola em cada uma das cadeias fôra resumo de muitas Obras de Misericordia, não só para aquelles malfadados, se não para todo o corpo social; fôra applicar o sal, para tolher os progressos da corrupção. Quando os prezos aprendessem a ler, e lessem em livros muito de industria feitos para os allumiar, para lhes ungir e fomentar o coração, ¿não chegariam pouco a pouco a ressuscitar, reconciliados com a Providencia, com os homens, e comsigo, e talvez melhores e mais nobres que antes da queda? * * * * * XI. Além das escolas pagas, que o Estado deve multiplicar e distribuir por todas as partes onde vir ignorancia, vicios, e crimes, deverá promover, por meio de estimulos honorificos, o apparecimento de novos focos de doutrina, espontaneos e gratuitos. ¿E quem duvida de que ha ainda ahi almas generosas, homens-humanos, e christãos não renegados, que, uma vez levantadas essas nobres competencias de bem fazer, acudirão a abrir suas salas aos pobres ignorantes, a assental-os em suas cadeiras em de redor do seu candieiro, do seu livro, e do seu affecto? Não somos nós dos partidarios da liberdade do ensino, como o não seriamos da liberdade de vender generos avariados, ou venenos;[2] mas se os traficantes e especuladores charlatães de instrucção, que a não possuem, devem ser inexoravelmente prohibidos, nenhuma das rasões que militam contra elles se podem racionalmente applicar aos que offerecem, de graça, as suas horas a instruir o proximo. Os Commissarios volantes, porém, até mesmo essas privadas fontes deveriam visitar, se esses bons professores o consentissem, como de certo consentiriam. [2] Pode-se ver o que sobre isto dissertavamos no Tomo II da _Revista Universal Lisbonense_, pag. 177. * * * * * Temos, graças a estas leis novas, resolvido em cheio o problema de pôr a instrucção ao alcance de todos. Vejâmos se se resolverá o outro, de fazer com que todos a aproveitem. Este me parece ainda mais facil. Apontemos, e apertemos. Eis aqui pois a coisa em poucas palavras; são sementes que atiro; ellas que germinem como podérem. * * * * * Concedo que, apesar da utilidade e facilidade da instrucção, a perguiça, a bruteza, os preconceitos de bom numero de ignorantes, os farão esquivar-se e retrahir-se ao beneficio; e nos primeiros annos, e na primeira geração muito mais que para o diante. Para essas repugnancias, é que tres remedios se estão per si mesmos aconselhando: a exhortação, o premio, e o castigo. * * * * * XII. A exhortação, promova-a o Governo, mas com fé, mas com vontade sincera, mas com perseverança, pelos artigos das suas folhas officiaes, pelas reiteradas recommendações aos Prelados e aos Chefes administrativos; os Bispos, em pastoraes sobre pastoraes aos Parochos; os Governadores Civis em circulares sobre circulares ás Camaras e Administradores de Concelho; os Curas d’almas nas homilias e praticas de todos os domingos; os cabeças dos Municipios e dos Concelhos por todo o seu continuo contacto com o Povo. Promova-a, finalmente, o Parlamento legislando boas retribuições pecuniarias para quantos autores publicarem obras, em que efficazmente se ensine a conhecer e amar a Instrucção. Dêmos que, de tão numerosos agentes, falham na pratica muitos, ou a maior parte, ou por indolentes, ou por nescios, ou por maus. Alguns haverá sempre, que não falhem; e as diligencias d’esses algum resultado hão de surtir. * * * * * XIII. Quanto a premios, afiance-se aos estudiosos, que os que mais se distinguirem serão galardoados com livros uteis (que é fazer dois proveitos em logar de um), e que os seus nomes serão com louvor lançados nos registos publicos, vulgarisados na folha official, pregoados do pulpito da sua freguesia no dia mais festivo, e nos seus requerimentos recebidos como recommendação. * * * * * XIV. Os castigos devem ser graves, e severamente applicados. As pequenas multas em dinheiro arbitradas pela actual Legislação para os remissos que não mandam os filhos á escola, ainda quando á risca se executassem não seriam sufficientes. Ordene a Lei (e cumpra-se) que se não reconheçam direitos cívicos aos que desprezaram, como brutos, a sua alma, aos que, podendo-o, não quizeram instruir-se, ao menos no ler, escrever, e contar; defenda-lhes o administrarem seus bens, o contratarem, o addirem heranças, o testarem, o exercerem commercio ou industria, até mesmo o servirem; sobretudo lhes véde o casamento; e nos mistéres durissimos da republica, para que hoje se costuma prender e forçar, no serviço das armadas, na milicia (se ainda alguma houver), sejam elles, pois assim o quizeram, sejam elles os preferidos, os condemnados. Com o medo e terror d’estes castigos, com a esperança e cubiça d’aquelles premios, e, logo por cima, com todas aquellas paternaes e assiduas exhortações; havendo á mão bons mestres, e sendo o ensino (como pode e deve ser) breve, aprasivel, e gratuito; ¿quem duvida de que em cincoenta annos, em vinte e cinco, e em menos, com o dedo se apontaria homem ou mulher, que não soubesse ler, e que não lesse? * * * * * N’um tal Povo, assim allumiado, ¿qual seria a sciencia, qual a arte, qual o mistér, que deixasse de florescer? A terra e as mãos se tornariam mais productivas; os costumes mais concertados; os praseres, mais delicados e vivos; as familias, mais unidas; o trato, mais urbano; a fortuna, mais segura; as Leis, mais obedecidas; a Religião, mais venerada; os direitos e a dignidade do homem cessariam de ser chimeras, e a paz uma utopia. Só n’um Paiz todo de luz, de trabalho, de benevolencia, poderia fundar-se e manter-se um regimen lealmente representativo, em vez d’estes a-la-moda, a que o nosso publicista europeu, Silvestre Pinheiro Ferreira, não chamava, na candura da sua alma, senão «pseudo-constitucionaes». Por mim vos juro, minha honrada gente do casal, que, a ter eu a desgraça de ser Governo, e a loucura de querer sel-o, havia de fazer tudo por illustrar o Povo. Não haviam de ser as espadas, que me guardassem; haviam de ser as luzes, que eu tivesse accendido em de redor do Throno, até os confins da Monarchia. Agosto de 1849 XIV Oitavo serão do casal Continuação do antecedente SUMMARIO Repiza-se a ideia fixa de um Parlamento de Lavradores, como panacêa.--Explicação do entibiamento das vontades quanto á Politica.--Perfectibilidade.--Convencidos d’ella, obedecemos aos nossos instinctos bons.--Lembrête a malignos.--Entra-se em materia.--Apontam-se muitas pessoas, que podem ser mestres por curiosidade: primeiro para escolas masculinas; depois, para escolas femininas.--Suasoria d’alma a todos esses homens, e a todas essas senhoras.--Tambem se deve recorrer aos ricos para pagarem escolas.--Cita-se o honrado exemplo de Plinio, o moço.--O Methodo de leitura introduzido pelo autor facilitou extraordinariamente a execução de taes projectos.--O autor se offerece a explical-o a quem quer que o deseje professar. Bons e bonissimos eram elles, os alvitres do nosso precedente serão. ¿Mas quando virá cá a sua realidade? Depende ella e carece de um concurso e concerto de tantas coisas, e tão raras, que, sem offensa nem de pessoas nem mesmo dos tempos, bem podemos presumir que essa ante-manhan da civilisação ainda está longe. Receio que muitas gerações tenham de morrer pagans, antes que nasçam Messias e Apostolado, que não só facultem ao Povo o baptismo das Lettras, mas que para lh’o darem o procurem, lhe préguem, lhe instem, o reduzam, e o convertam. Por ora tratam-se outras coisas, que (segundo parece) estão primeiro que a alma, primeiro que o coração, primeiro que as primeiras. * * * * * Vós mesmos, meus amigos, ou me engano muito, ou ainda não bem cahistes na maxima, na summa, na urgentissima importancia de olhardes pelos fundamentos de toda a possivel regeneração: a eleição de verdadeiros representantes vossos para Legisladores. ¿E quereis que vol-o diga? Comquanto vol-o deplore, e muito, não vol-o extranho. De puro cançados com este continuo tecer e destecer da Penélope politica, perdestes a fé na Politica. O almanack dos benemeritos e patriotas, nunca de anno para anno o vistes regular, nem de semestre para semestre. Perdestes a fé em patriotismos e virtudes. Com tantos programmas flammantes, como de continuo brotam, chovem, e ventam de todas as partes, ainda não vistes fim nem diminuição á vossa miseria, e perdestes a fé em promettedores. Em summa: em vós mesmos perdestes a fé; e receio... que na Providencia tambem; pois noto que as eleições dos que vos hão-de representar, isto é, dos que vos hão-de salvar ou perder, a vós e a vossos filhos, á vossa freguezia e á vossa Patria, já á revelia as deixais correr. Desprezais votar, ou votais em quem vos dizem, e até em quem vos não dizem. Lançais na urna dos destinos publicos uns papeis dobrados, que nem lestes nem ouvistes ler. Lançail-os pensando n’outra coisa, lançail-os com a indifferença, com que um ocioso distrahido vaí desfolhando ao longo de um regato um ramo inutil, seguindo com os olhos cada folha em quanto cai, e, logo que na corrente desappareceu, esquecendo-a para sempre; ¡como se cada um d’aquelles papeis não fosse um germen de fortuna ou infortunio para nós todos! Hombridade civica, ou virtude social (perdoae-me que vol-o diga) não a tendes já, ou ainda a não tendes. Sois n’isto como quasi todos somos. ¿E quem é que assim nos fez, ou nos atenuou, ou aniquilou? ¿A quem havemos de amaldiçoar? A ninguem. Foi a fatalidade das coisas. Os primeiros como os ultimos, os Reis como os bagageiros, os estadistas como os idiotas, todos são por ella arrastados. Bons e ruins, sabios e nescios, poderosos e fracos, agitadores, agitados, e inertes, todos n’esta apparente confusão somos empregados, por um Obreiro invisivel, para um edificio em que desde o principio do Mundo se trabalha, e por esses seculos fora se ha-de ir sempre trabalhando. É uma vasta e immensa Pyramide, cujo vértice ha-de ser no Ceo, e na qual todo o genero humano anda como operario, suando e gemendo porque só vê a pedra bruta em que se cança; mas a traça total da architectura, com que se podera consolar, é o Divino Architecto que a tem escondida em sua mente. * * * * * D’aqui, porém, não concluais que se haja de admittir o dogma mahometano, o tenebroso e quebrantador dogma do fatalismo, essa anti-philosophica e insustentavel parodia do dogma augustissimo, fecundo, e creador, da PROVIDENCIA. Vâmos, sim, todos e tudo, n’uma torrente infinita, e que sobe sempre; mas todos com entendimento e liberdade; entendimento, para perceber e julgar; liberdade, para optar e fazer, cada um dentro em seus limites circumscriptos. Logo, assim como na ordem physica o saudavel e o venenoso, o suave e o terrivel, a luz e as trevas, o gelo e o fogo, a atividade e a inercia, a leveza e o peso, o solido e o fluido, o concorde e o discorde, contribuem, por um jogo milagroso de harmonias, para haver dias, noites, estações, plantas, animaes, homens, mundo, e tantos mundos; assim, na ordem moral, esta incalculavel variedade de ideias, de opiniões, de systemas, de affectos, de egoismos e generosidade em todos os graus, de exforços para o bem, de exforços para o mal, de aspirações para a claridade, de aspirações para a escuridão, de instinctos de sociabilidade, de instinctos dissolventes, de pusillanimidade, de virtude, de rudeza, de engenho, de sciencia, de illusões, de sophismas, de absurdos, de verdades, de probabilidades, de prophecias, de experiencias, conspira para que a natureza moral, obedecendo, sem o saber, á Providencia, lá se vá, como cometa enigmatico, composto de luz e envolto de nevoas, progredindo pela sua orbita incommensuravel. Deixemo-nos de queixumes excusados. Tudo obra e ha-de obrar segundo sua natureza. A rosa embalsama; a mancinella envenena; o rouxinol canta e poetisa; o tufão brama e devasta; a montanha medita; o valle ri; a praia entristece-se; o Oceano ruge e devora; a rôla ama e dil-o; o reptil desembosca-se, punge, e foge deixando morte; o raio fracassa e pulverisa; a alvorada retinge e floreja; o sol nos diz «Vida»; a lua, «Ternura»; as estrellas, «Immortalidade»; o menino, «Innocencia»; a mulher, «Doçura e heroicidade para sacrificios»; as cans, «Repoiso e reflexão»; a virilidade, «Energia e emprezas»; em suma: o ambicioso, o vil, o avaro, o pródigo, o caritativo, o perseguidor, o tecelão de enredos, o mineiro de verdades, o que se cança a accender luzes, o que se não cança de apagal-as, os que vozeiam: «Para a frente!», os que gritam: «Alto!», os que murmuram: «Para traz», os que vêem por cima da terra uma abóbada de Ceos, os que para alem da terra nada vêem, os que acreditam nos destinos da humanidade, os que não acreditam senão nos seus proprios, os que usam e os que abusam da sua alma e da alheia, os que usurpam, os que assumem, os que acceitam, os que desdenham, os que menoscabam, os que insultam, os que sullapam, os que perseguem o poder, todos concorrem, ou todos concorremos, com penedos, silharia, areia, cal, barro, cascalho, pórphiro, suor, lagrimas, e sangue, para o edificio providencial, para o futuro palacio no segundo paraizo do genero humano. Com muita ou pouca esperança, obedeçâmos á nossa natureza, e cumprâmos o nosso fadario, nós outros, os que (mercê de Deus) anhelamos pela dita da Patria, que ninguem dirá que não esteja muito enferma, e muito triste. Eu já agora, meus amigos, n’isto hei-de perseverar, requerendo para Ella luz e mais luz, campo e mais campo, trabalho e mais trabalho, até que os obscurantes, obedecendo tambem á sua natureza, e cumprido tambem o seu fadario, me hajam acabado, não com o bom proposito, que o não podem, mas com a vida. * * * * * ¡Se vós bem soubesseis, meus irmãos do casal, o que elles teem urdido, e urdem, e tramam contra o pobre de mim, que nunca lhes fiz mal, nem a ninguem, só por terem visto que, em vez de acudir ao chamamento dos seus _muezzins_, e ir ás suas mesquitas psalmear o seu _alcorão_, só curo da instrucção elementar do Povo!... ¡Se bem soubesseis a feridade e impudor com que me atassalham o nome, e me cospem na sombra, só porque me desarrisquei de bandos politicos! ¡a risivel ociosidade, com que discutem e decretam em seus conventiculos, ora que me envenenem, ora que me prendam e multem, ora que me deshonrem, ora que me dessoceguem e me defraudem do tempo, só porque esse tempo eu o consumo, com parte do meu escaço haver, em fazer que se ensinem as primeiras lettras aos vossos filhos, e aos dos artifices desvalidos! ¡Se adivinhasseis os embustes indignos, as suggestões aleivosas, as ameaças e espancamentos brutaes, com que d’estas fontes de doutrina teem procurado arredal-os! Não sei qual admirarieis mais: se a sua maldade e demencia, se o meu soffrimento e perseverança. Mas, por descargo de consciencia, sempre vos digo, que os admireis antes a elles do que a mim, que já acabei de ser para elles tão generoso como pareço. Não lhes digo o que a lima do ferreiro disse á vibora que a esmordaçava... mas condemno-os a viver. D’aqui avante, zunam e piquem quanto quizerem; de tudo faço registo para um archivo, que a elles lhes está defezo pela Natureza: para a Posteridade. Fundo em bronze todos estes seus feitos magnanimos. Esculpo em ferro os seus retratos, semelhantissimos de asquerosidade, sublimes de hediondez. Por baixo gravo-lhes os nomes; gravo-os fundo e com todas as lettras; e todos estes aleijões de museu, não tanto por vingança, como para escarmento a outros temerarios, hão-de ser em um livro carreados para o porvir. ¿E que duvida? ¿Não é assim que o mundo conhece, ainda hoje, dementes e facinorosos de dois mil annos? Já os tinha avisado. Quizeram-n-o, tel-o-hão. O ferro e o bronze da minha fundição não se acabaram, nem se acabam tão depressa. * * * * * Perdoae-me, boa gente. Descabidas coisas são estas para a amorosissima serenidade do vosso casal; e bem alheias são ellas tambem da minha indole, só propendente para bem querer e muita paz. Venhâmos pois ao que mais nos importa: ao nosso grande ponto das escolas, que são as eiras em que primeiro se prepara o pão da alma. * * * * * A alma tambem, como o corpo, morre á mingua de alimento. Se aquella ruim gente, que detesta e persegue as nossas humanas diligencias, tivesse aprendido, e soubesse, já pode ser que não empregasse tão desalmada e torpemente a sua actividade. Para que os filhos e netos não venham a ter ás Lettras egual odio, antes por ellas cada vez se pulam e amaciem mais, e se façam mais poderosos, mais ricos, e melhores, é que devemos forcejar para que se multipliquem, por campos e cidades, estes sacerdotes e curas de almas infantis, a que dão o humilde mas bello nome de MESTRES DE PRIMEIRAS LETTRAS. Das Côrtes e do Governo, tarde nos virá o remedio, que dizem e repetem não lhes sobrar dinheiro para escolas; e é verdade; só o Exercito devora quasi metade do Erario. Vejamos logo, se, em tamanha mingua e desamparo, nos não podemos ir, como quer que seja, remindo por nós mesmos; bem, completa, e devidamente, não o cuido; mas até certo ponto, emquanto a Providencia não acode, parece-me que sim. Ora vêde: * * * * * Em toda a parte ha sempre, por entre o cardume dos rusticos e ignorantes, alguns individuos mais mimosos da fortuna, que aprenderam alguma coisa, que vivem com certa abastança, e a quem sobram horas para aborrimento ou desmanchos, se as não poserem a juro para a consciencia e para o Ceo. Ha o Parocho; ha o Cura; ha o Doutor, ou Licenciado; ha o proprietario, que traz arrendados os bens; ha o negociante, que chegou á sua conta, e para descançar fechou as portas á fortuna; ha o laborioso, que andou moirejando barras de oiro por terras extranhas, e quiz vir morrer descançado no quarto em que nasceu, e comer as couves creadas deante da sua porta, como em menino; ha o militar aposentado, que não sabe o que faça do anno; ha o professor emérito, a quem ainda ás vezes o ensino lembra com saudade; ha o estudante que veio a ferias, e que está n’aquella edade feliz, em que a alma gravíta com tanta força para a publica estima, como o coração para o amor; ha o velho, que não pode sahir, mas conserva os olhos e ouvidos, a memoria e a voz, e folgaria de ter com que encurtar os dias, tão solitarios e tão longos; ha o Magistrado homem de bem, e o Escrivão honesto, a quem seus officios deixam remanescentes de muito boas e aproveitaveis tardes; ha o Ecclesiastico sem beneficio mas não sem entranhas; ha o ancião Egresso, que perdoou tudo, e, se o não esqueceu é porque deseja bemfazer ao mundo, que o desterrou do ermo para o povoado, continuando e augmentando no mesmo povoado as obras de sua caridade. ¿Ora, por que não haveis vós, os mais velhos e respeitaveis de cada aldeia ou logar em que não ha escola, por que não haveis de ir ter com algum d’estes homens, acompanhados de vossas mulheres e de vossos filhinhos, e supplicar-lhe, pelo amor do Pae Commum, e da sua alma, e de vós, e da Patria, e da Humanidade, abra um ensino de ler, escrever, e contar, nos dias de semana para os pequeninos que ainda não trabalham na terra, aos domingos e aos serões para os grandes já callejados, e para vós mesmos? Se o primeiro se vos excusasse, o segundo vos deferiria. Se o segundo vos repellisse, o terceiro, com mais lagrimas nos olhos do que vós mesmos, vos despacharia e agradeceria a supplica. Depois, era ir de porta em porta, pedindo ás senhoras habilitadas para tão nobre encargo, egual mercê para vossas filhas e esposas, porque (segundo já ponderámos) na instrucção das mulheres se contém a dos homens para o futuro; e logo que as mães souberem ler, não haja medo de que os filhos o ignorem. Para uma Religiosa no seu convento, ¡que gentil e religiosissima occupação, obtida do Prelado a licença para ali se abrirem as portas a uma escola feminil! * * * * * ¡Oh! ¡quem me dera poder estar meia hora, ou um quarto de hora (bastava), ao pé de cada uma d’aquellas senhoras, e de cada um d’aquelles homens, antes que vós entrasseis com o vosso requerimento! Não lhes diria o que a Religião lhes insinuára; não lhes invocaria o patriotismo; não lhes encarecêra mesmo a grandeza de tão facil beneficio, nem a vossa gratidão, nem os respeitos que semeavam na geração nova, nem o thesoiro de consolações que atulhavam para o ultimo praso da vida, em que tudo que se ajuntou se deixa, e só o que se deu se leva para a grande viagem. Pedir-lhes-hia só, que experimentassem a delicia do ensinar, sobre tudo de um ensinar desinteressado, como de pae e mãe a filhos e filhas; ¡o como, n’aquelle trato intimo com a puericia, permitte Deus ás nossas almas rejuvenescer e florir! Na innocencia, na alegria, na lealdade, no affecto perenne, que está ressumbrando em todos aquelles rostinhos, sempre ávidos de saber, sempre distrahidos, sempre buliçosos, veem-nos umas virações de passada bemaventurança, que já foi nossa, e parece prophetisar ainda o que quer que seja. Deliciâmo-nos, como o viandante cuidoso e cabisbaixo, com o cheiro longinquo de rosas vindo de um jardim que se não vê. ¡Horas, horas de éxtase, que por todos os bailes, honras, e thesoiros, seriam bem mercadas! Oh! cultivae, cultivae esses espiritos e corações tão esperançosos. Toda a cultura é saudavel e rescendente; mas nenhuma como essa. Todos os entes alados, em quanto estão, com amorosa febre, aquecendo sob o peito e entre as asas os pequeninos da sua especie, mantendo-os a grãosinho e grãosinho, a verme e verme, e ensinando-lhes a adejar, são, de quantos grupos de felicidade a Natureza encerra, os mais formosos. ¡Oh! o nosso espirito é tambem uma coisa alada como os Anjos. Uma escola, em que os profanos não vêem senão tédio, não ouvem senão sussurro, é aos olhos de todo o bom entendimento um ninho, cem vezes mais carinhoso e interessante que o dos passaros entre as sombras verdejantes da primavera. * * * * * Ha ainda, meus bons amigos, outras pessoas, a quem podeis recorrer (¿Vêdes vós? a Providencia é liberalissima): são os ricos. ¿Que muito é para esses, com um átomo supérfluo do seu oiro pagarem um mestre para os desvalidos? --«¡Mas podiam-n-o ter feito, e nunca o fizeram»--direis vós. É verdade; porém todas as coisas principiam uma vez. Não reflectiram ainda na facilidade e excellencias de tal obra. Não teria ainda chegado a sua hora de acordar; porque lá dizer que o oiro mirra o coração, que não ha poderosos bemfazejos, é calumniar ao mesmo tempo ao homem, e ao seu Autor.[3] ¡Que relvado florído, entre sombras inspirativas, não é este assumpto de conversação, para n’elle a vontade se espairecer! É forçado deixarmol-o por agora. Voltae vós a elle com os vossos sonhos d’esta noite, com os vossos pensamentos de amanhan todo o dia. Cuidae-me e pesae-me bem isto toda a semana; e domingo, depois da Missa, na sacristia mesmo, quando o vosso Parocho se houver acabado de desvestir, puchae com elle a pratica a este proposito; consultae-o, ouvi-o, e fazei-o no negocio procurador vosso, que não o podeis ser mais proprio e natural. [3] ¡Que bom exemplo não é para citar aos ricos o de Plinio o moço, pagão, romano, e dezoito seculos mais antigo que nós! Pedir-lhes-hia que lessem a XIII do Livro IV das suas Cartas, escrita a Cornelio Tacito; talvez se tentasse algum d’elles. Se vos parecer, apontae-lhe, mas que seja por longe, aquelles dois apostólicos varões, Prior e Cura da villa do Nordeste, aqui, na vossa mesma Ilha, que, sobre olharem por todas as necessidades moraes e corporaes do seu rebanho, até a estas do ensino acodem com escolas, diurnas e nocturnas, em que são professores elles mesmos. * * * * * A unica difficuldade, em que tudo isto de escolas podia encalhar, logrei eu, eu obscuro homemzinho, mas muito vosso amigo, a ventura de a aplanar completamente. A difficuldade, que até agora se tem opposto a haver muitas escolas, e em cada uma d’ellas a safra do fruto desejavel, era o ronceiro, o moroso, o semsabor, o imperfeito, do ensino. Com o Methodo de ensino que eu introduzi, em poucos mezes de recreativo exercicio se chega muito adiante do que até aqui em annos largos se conseguia; com o que, já vêdes se desvaneceram as maiores e peores objecções, que ao nosso empenho se podiam pôr. ¡Animo pois, e avante! Teimemos, como vos dizia, nós outros, os amigos dos homens, no nosso bom fadario; e deixar os outros obstinar-se lá no seu. ¿Sabeis uma coisa? Parece-me que esses homens, com o seu odio ás luzes, concorrem a final, tanto como nós com o nosso amor, para se ellas diffundirem. ¿Porquê? porque as suas perseguições nos servem de estimulo; as suas picadas nos amadurecem, como as de certos insectos, que a Providencia fez, muito de industria, para o sazoamento de certos frutos. * * * * * Tomae sentido n’isto: Se achardes, que espero em Deus haveis de achar, quem se promptifique a vos crear uma escola, seja quem fôr, dizei-lhe que eu, o vosso amigo, me dou por obrigado a industrial-o em só uma ou duas lições, para ensinar a ler como por encanto. Se duvidar, pedi-lhe que venha. Verá provas, e ficará sendo prova elle mesmo. Setembro de 1849. XV Nono serão do casal Leituras publicas SUMMARIO Porfia-se na summa precisão que temos de Instrucção primaria.--Bom exemplo que S. Miguel está dando com as suas escolas.--Ellas progridem, e hão-de ir a mais.--O que urge agora, é que os ignorantes conheçam o agrado e préstimo do saber.--Recommendam-se para isto as leituras publicas.--O _Carlos Magno_ nas roças do Brazil tem feito que muitos negros aprendam a ler.--O mesmo nas colonias francezas a novella de _Paulo e Virginia_.--O leitor publico no proprio trabalho tem a recompensa.--Leituras publicas dos Gregos e Romanos, e suas vantagens.--Tem-se grande fé em que não faltará quem se offereça a fazel-as.--Entretanto, o Povo que as sollicite.--Nenhuma estação mais propria para as publicas leituras, que o inverno.--Aponta-se d’onde os livros podem vir, e quaes hão-de ser.--Aconselha-se o traduzirem-se obras estrangeiras e populares.--_Robinson Suisso._--_Colloquios aldeãos_, por Timon.--Os _Colloquios_ vão sahir em vulgar.--O _Robinson_, traduzira-o eu, se podesse.--Digressão sobre o socialismo.--Providencia para haver boas obras populares. Assumptos ha, que, parecendo mui simplices, nunca de todo se esgotam. Isso teem de seu as coisas intrinzecamente boas: que a tantos respeitos e por tantos modos o são, que mais se amam e desejam quanto mais se investigam, e conhecem. Tornemo-nos á nossa instrucção primaria, risonha e amorosa alvorada do dia esplendido e magnifico da civilisação. ¡A ella, com toda a fé e caridade! ¡com toda a esperança e devoção! ¡com todo o ardor e fanatismo! ¡A ella desde hoje! ¡e teimar n’ella, em quanto os que mais o devem e podem não vierem, pelo desempenho do seu officio, desobrigar-nos d’este nosso! E nem ainda então havemos nós de descançar; havemos de nos aggregar a elles como auxiliares livres. Vasta e difficil é a conquista de que se trata; nem elles sem nós, nem nós sem elles a perfariamos. Venha de cima o favor; venham por baixo as diligencias, que sem suor de trabalhadores, e influxos de sol e ares, não ha colheita que se abençôe. * * * * * Por emquanto o que mais urge é, como vos dizia, crear no Povo cubiças, ou mesmo veleidades, de se instruir (quando mais não seja), e deparar-lhe, quando não fontes caudaes para essas sêdes, ao menos alguns caritativos poços, como os dos Arabes nos desertos; quero dizer: á falta de escolas do Estado, com excellentes mestres e grandes meios, ensinosinhos particulares e gratuitos. Esta ideia, que não é minha, nem de ninguem em particular, sim do seculo, já por ahi vai lavrando; e com tão boas mostras, que, a não vir saraivada que a destrua, ainda esta Ilha tem de ser apontada e seguida como exemplar. ¡Que de escolas gratuitas já nascidas e pegadas no seio da Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes! ¡Que de alumnos já aproveitados e instruidos por cada uma d’ellas! ¡Que de outras já a rebentarem pelas vossas villas, e até em aldeias! Os factos que d’este genero me teem vindo ao conhecimento são para grandissima consolação, e para se registarem com summa ufania. ¡Oh! prometto-vos que ainda o hei-de fazer. Os nomes d’esses mancebos generosos, e os d’esses poucos Parochos, que assim acodem ao pregão do seculo, aos gemidos da necessidade, e aos clamores da sua consciencia, ou eu hei de todo esquecer, ou hão de ficar lembrando. Assim, que por esta parte não ha senão que dar muitas graças, e confiar no contagio santo. As escolas espontaneas brotam, e estão crescendo; logo, hão-de continuar a crescer e multiplicar; e não só para leitura, escrita, e contas, mas para outros generos e graus mais subidos de instrucção. Se o duvidasseis, apontar-vos-hia mesmo para fóra da Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes: para a dos vossos amigos especiaes; para a Promotora da Agricultura Michaelense, com os seus cursos de Historia natural, de Botanica, de Physica, e de Chymica. Ha tráfego intellectual, ha; e já superior ao que poderia presumir-se; mas, para que elle dure e se augmente, é que é preciso que os necessitados de aprender conheçam a miseria e vergonha da sua mingua, desejem, queiram, e procurem remedial-a. * * * * * Hoje em dia, a nossa maior carencia não é já tanto de quem tenha vontade de ensinar, como de quem se afervore por aprender. Ha proporcionalmente mais quem dê, ou quem offereça, do que quem peça, ou quem acceite. ¿E como se hão-de ir abrindo as tantas escolas de que ainda havemos mistér, se do nada se não forem evocando os rogos e votos dos que as devem frequentar? O mestre é um medico; o discipulo, um doente. Em quanto o doente se não conhece como tal, em quanto não deseja saude, em quanto não implora soccorro, o medico, ainda que perto more, não apparece para o salvar. Seja o nosso ponto, primeiro que outro nenhum, accender em vós mesmos e em vossos filhos o gosto da leitura; d’elle, como o effeito da causa, virá tudo mais. As ponderações, que já vos fiz, e vos tenho repetido, sobre as conveniencias do ler para o aperfeiçoamento moral, industrial, e agricola, para augmento dos haveres, da saude, dos deleites, e da convivencia, são muito certas, muito claras, e muito irrefragaveis; mas receio que não tenham, só per si, efficacia bastante para vos vencer a natural inercia. Quer-se uma persuasão mais immediata, um argumento, embora menos forte, porém mais presente, e, como tal, menos resistivel. N’uma palavra: quer-se que o ler, já pela sua propria formosura, vos namore, independentemente do que promette e pode dar. * * * * * ¿Sabeis vós que aquelle popularissimo livro de _Carlos Magno_, apesar das suas rematadas loucuras, e nenhuma substancia, tem sido o mais poderoso incentivo de Instrucção Primaria? Pois é assim. Até nos serões das roças e engenhos de assucar, pelos sertões mais sáfaros do Brazil, o _Almirante Balão_, os _Doze Pares_, e a _Princeza Floripes_, dando horas de encantamento a corações simplices e espiritos boçaes, crearam n’elles a inveja, a sêde, o estudo, e logo a sciencia, o gosto, e o costume do ler. O negro que sabe solletrar por aquellas paginas de maravilhas, é respeitado e festejado por todo o auditorio; centenares de negros e negras, de todas as edades, lhe pendem dos labios sem respirar, horas inteiras; se elle cahir doente, cegar, morrer, ou fôr vendido, ¿quem lhes fará esquecer as penas e trabalhos do dia com taes relações estendidas pela noite até deshoras? É por isso, e para que tamanha calamidade se não possa nunca realisar, que todos ambicionam, e muitos logram, aprender, á custa do repoiso e do somno, a maravilhosa Arte, por quem as memorias do _Arcebispo de Turpim_ ainda estão vivas. O que nas roças do Brazil tem operado o _Carlos Magno_, tem-n-o egualmente feito, entre os negros das colonias francezas, aquella prosa-poema, aquelle poema-flor, aquella flor sempre orvalhada de lagrimas, _Paulo e Virginia_. * * * * * Á vista d’estes dois factos, ¿por que não aconselhariamos, se procurasse introduzir o costume das leituras em commum, semi-publicas, ou publicas, nas aldeias e villas, e até nas cidades? ¡Que agradavel, que util, que nobre exercicio para o leitor! ¡Que magisterio tão facil de exercer! ¡Que derramar de beneficios tão sem custo! ¡Que victorias sem combate! ¡e que triumphos sem odios! Com esta bella usança, se formaria entre nós essa arte preciosa de ler, recitar, e declamar; mais conhecida, praticada, e presada pelos antigos, do que em nossos tempos. Os melhores livros dos Romanos, ¿não sabemos nós que eram lidos por seus autores, ora em suas salas perante convidados, ora perante o povo nos theatros? ¿De poetas e oradores Gregos não alcançamos outro tanto? ¿e não é verosimil que por ahi se ajudariam as Lettras dobradamente a subirem a tamanha perfeição? á uma, porque o escriptor, para entrar em duello com o juizo publico, se armava de ponto em branco, e em cada um d’esses combates aprendia e se amestrava; e á outra porque das suas coroas de loiro forçosamente haviam de cahir bagas, que produzissem novos loiros para futuros émulos. Ainda que outro bem se não seguira de taes leituras, já grandemente valêra a pena de as crear e as generalisar, se o nome de _pena_ podera caber ao que é só goso. Mas o principalissimo proveito de tal praxe é o dos ouvintes. Pessoas que nunca leram, nem sabem; outras que não teem livros; outras para quem o mais pequeno volume é um labirynto inextricavel e sem sahida; outras que na solidão de um aposento silencioso nem com Virgilio caberiam, e para quem a sociedade é condição impreterivel do agrado; todos acudiriam á leitura em commum. Todos lhe applicariam mais attenção, porque a attenção é tambem contagiosa. Todos comprehenderiam melhor, e gostariam mais a fundo, porque entendimento e coração, tudo em nós, não sei como, cresce e se melhora na proporção do numero de cabeças que em derredor trabalham no mesmo objecto, dos rostos, ouvidos, e olhos, que escutam as mesmas palavras, dos peitos que identicas paixões comprimem ou dilatam. D’este modo tudo concorrêra para que o succo, expresso do livro por um leitor habil, fosse para cada um dos circumstantes o mais agradavel, o mais copioso, e o mais nutritivo, assim como para que a cubiça da leitura se pegasse aos que nunca a aprenderam; os que a aprenderam mal, se industriassem; e os que por perguiça lhe fugiam, chegando a reconhecer-lhe os feitiços, se lhe entregassem de corpo e alma. * * * * * Meus amigos, se no outro serão nós confiavamos em que não faltaria quem se offerecesse a vos reger escolas, ou pelo menos o acceitasse quando rogado, ¿como não teremos grande fé em que haverá de sobra quem para estas leituras se vos offereça? Um pequeno rol dos que poderiam ser, já vol-o eu apresentei; se vos não acudirem logo, ide-os vós desafiar, e ide affeitos, que vos não hão-de resistir. Não percais tempo; temos á porta as descompassadas noites do inverno. O inverno é, sobre todas, a estação do espirito, do recolhimento, da casa, da sociabilidade. No inverno o Sol, esse grande poeta de Deus, interrompe, para descançar, o seu poema de seis mil annos. A Natureza adormece. Tudo deserta dos campos: as aves, á busca de primavera; os gados, para a quentura do aprisco; os bois, para recobrarem força para a lavoira; os filhos das cidades, para os theatros e assemblêas; vós, para a abhorrida monotonia da lareira. ¡Um leitor! ¡um leitor! ¡o vosso Cura! ¡o vosso Escrivão! ¡o vosso Facultativo! ¡um de vós! ¡seja quem for: um amigo, que vos ajunte com um bom livro n’uma cosinha, n’uma sala, n’uma adega, n’um celleiro (¿que importa onde?)! ¡que vos leia, vos explique, vos oiça as duvidas, vol-as desate, ou vos ajude a desatal-as, vos ensine o que elle mesmo não sabia, vos descubra o mundo que nunca vistes, vos engolfe, pelas catacumbas encantadas dos seculos preteritos, vos leve a peregrinar pelo Universo fora, vos descortine cardumes de maravilhas em que nunca attentastes por terra e ceos, vos revele que tendes lá dentro um coração, vos infunda mais alto respeito de vós mesmos, mais sublime ideia de vossa alma e de vossos destinos, noções mais distinctas de vossos direitos e de vossos deveres, mais ternura para com a familia, mais aferro á Patria, e fraternidade para com o genero humano! ¡Um leitor! ¡um leitor¡ e o vosso inverno vai ser mais florido e harmonioso que a primavera; mais verde, luminoso e accezo que o estio; mais frutifero e scismador que o proprio outono. ¡Um leitor! ¡um leitor! e a quadra que chamavam morta, será para os vossos interesses de todo o genero a mais activa; e, no meio dos folguedos e abastanças das outras tres, a mais recordada com saudade, a mais esperada com alvoroço. ¡Oh! ¡não poder ser eu, eu mesmo, o vosso leitor!.... * * * * * --«Mas os livros--perguntareis vós--¿d’onde hão de vir? ¿e quaes hão-de ser?» Hão-de vir, com summo gosto emprestados por quem quer que os tenha, em quanto de outro modo se não possa. E depois.... ¡tão poucos bastam! ¡A leitura, saboreada como deve ser, funde tanto! Agora, quanto á escolha (porque emfim, grão para semente ha-de ser escolhido), quando por si só o vosso leitor a não soubesse ou ousasse fazer, nada mais facil que tomar conselho com algum erudito sizudo, o qual provavelmente faria mais que indicar-lhe e recommendar-lhe a obra: facultar-lh’a-hia, tendo a; não a tendo, lá lh’a iria desencantar. O catalogo dos livros portuguezes mais proprios para estas leituras é por ora (¡ainda mal!) muitissimo curto. ¡Ah, boa França! ¡ah, boa Inglaterra! ¡ah, boa Allemanha! ¡ah, boa Italia, que os teem em cardumes, e curam da instrucção de meninos e plebeus, como de coisa séria, e de vez. Todavia, ainda aqui mesmo, e de repente, alguns titulos poderiamos citar ao vosso ledor, segundo os diversos interesses que elle tem de servir e prégar: verbi gratia: a _Biblia_, de Pereira; as _Meditações, ou discursos religiosos_, de Rodrigues de Bastos; a _Imitação de Christo_; a _Moral em acção_; o _Bom homem Ricardo_; _Simão de Nantua_; a _Historia de Portugal_; a _Recreação philosophica_; o _Guia e manual do cultivador_; o _Diccionario de Agricultura_, de Soares Franco; a _Hygiene_, de Mello Franco; a _Collecção de receitas_, de Lucio; a _Revista Universal Lisbonense_; o _Agricultor Michaelense_; o _Industriador_; o _Panorama_; o _Archivo popular_; o _Recreio das familias_; o _Universo pittoresco_; o _Robinson Crusoe_, etc. D’estas obras, algumas são inteiramente traducções; outras, traducções em parte; mas essa consideração só por si pouco faz para o nosso caso. ¡Oxalá que muitos outros originaes estrangeiros, dos que merecem ser vulgarisados, se fossem para cá trasladando! Eis aqui dois, bem credores de preferencias, dois, cada um dos quaes pela utilidade vale uma bibliotheca: o _Robinson Suisso_, e os _Colloquios aldeãos_, de Timon.[4] [4] =Entretiens de village=--_par Timon_. (Vicomte de Cormenin). A leitura d’esta obra, de que eu não conhecia mais que o titulo, sobre modo me lisonjeou o amor proprio. Muitos dos meus pensamentos e desejos n’esta serie de artigos, haviam coincidido, e concordam, com os d’aquelle excellente philosopho. Não falando no talento, em que elle me leva notoriamente a palma, no seu livro me vejo como em um espelho. Elle obteve a amisade dos homens de bem, e alguma gratidão dos infelizes; por que não hei-de eu esperar tambem uma e outra coisa? CASTILHO O primeiro é um formoso estudo da Natureza, entresachado com um mellifluo curso de Moral; paginas, que todas resplandecem e palpitam, que todas nos amam, e que todas amamos. O segundo é a alma de um homem humano, que, apoz muito ver, muito meditar, muito enganar-se, e muito desenganar-se sobre a _politica_ e os _estadistas_, vai procurar a felicidade do Povo onde só a pode haver: no querer e bom juizo do mesmo Povo, na morigeração, na diligencia, na economia, na fraternidade, na religiosidade. Os _Colloquios aldeãos_ (dae-me as alviçaras da nova), brevemente os havereis em linguagem chan, sincera, e vernácula, como convem, e é essencial condição em todo o escrito que aspira á honra de ser ouvido, lido, manuseado, aprendido, assimilado, e a final vivído, pela Plebe, pelo Povo, pela Classe média, pela superior, pela Nação, pela Posteridade, pelo Mundo. O _Robinson Suisso_, já d’aqui me obrigára eu a que tambem o houvesseis, e tambem em linguagem vernácula e muito vossa, se a fortuna de quem escreve com a alma deitasse a tanto como lhe chegam os bons desejos. Porque olhae vós: amigos do bem publico não faltam entre os homens que se consagram ao estudo; mas são aguias, a quem a fortuna, parece que por escárneo, se diverte a depennar as azas, ao mesmo passo que, por escárneo tambem, as vai atar, mui brilhantes e espaçosas, em quem não sabe, nem quer, senão dormir. ¡Grande desconcerto! ¡misero e miserrimo desconcerto, o que tão boas e optimas coisas dessemeia, ou calca no embrião, ou afoga á nascença, ou ao desabrochar ou ao florir as torce, as quebra, as arrebata, as confunde, as perde, as aniquila! * * * * * Oh! Quando um pouco n’este desconcerto do nosso estado presente se repara; quando tão claramente se reconhece a perda que ahi vai para o genero humano na anti-providencial discordia dos diversos meios de acção, isto é das riquezas da alma, das riquezas da diligencia, e das riquezas da bolsa, ¡que tentações não veem a um coração generoso de venerar e abraçar (a despeito de todas suas difficuldades) a sublime theoria da numerosa e crescente escola de Fourier! Calumniado nas intenções pelos que nunca o estudaram, o systema da universal harmonia, o systema mais profundamente respeitador das propriedades, a ser exequivel (segredo, que por ora só pertence ao Altissimo), é o mais prenhe de immensos e prosperrimos destinos; o unico, efficaz para regenerar a terra, precavendo e impossibilitando revoluções; o unico, poderoso para realisar superabundante e illimitadamente as promessas charlatans e sempre fallidas dos politicos; o unico, por onde a ideia da PROVIDENCIA se ha-de tornar comprehensivel a todos os entendimentos; o unico, emfim, digno do Homem, digno da Natureza, e digno de Deus, que a elle o fez para ella, como Elle é para ambos e para tudo... * * * * * ...¡Oh! ¡por onde me ia eu agora! ¡quão longe do casal e do serão! ¡por esse Universo e seculos fóra! ¿E a proposito de quê? De bem pouco: de mim, que tenho alma e vontade energica, e alguns meios internos para ser util; que forcejo pelo ser, e, por falta de concurso de meios externos, me gasto, abrazo, e consumo, como moinho sem grão a trabalhar sobre si mesmo. ¿Hei-de acabar, hei-de morrer, como outros muitos, sem haver podido deixar rasto de bem para os meus semelhantes?! eu com faculdades, eu com vocação, eu com valor, eu com empenho, eu com diligencias, eu com a minha missão bem sentida, bem acceita, e bem jurada, e, até onde pude, bem cumprida, de amar aos homens, de collaborar com os obreiros desinteressados, de pospôr mais que o meu individuo, os individuos do meu sangue, ao proveito abstracto e hypothetico, mas fascinador e grandioso, do maior numero, e do porvir?!.... O que havia aqui dentro, e se mallogrou, só Deus o sabe; eu mesmo não o alcanço. O meu destino, como o destino de muitos de vós, como o da maior parte dos homens no actual cahos (alcunhado por antiphrase _estado social_), brevemente será reduzido a cinzas, sem ninguem o ter lido. A Providencia m’o escrevêra do seu punho; a fortuna terrestre com a sua mão sacrilega m’o fechou com sete sellos. Todo o meu trabalhar apenas dos sete rompeu um; espreitei para dentro; deletreei algumas palavras soltas; eram nobres. Amanhan será tudo pó. Depois de amanhan... nem o pó já lembrará. ¡Ó meus irmãos da _Utopia harmonica_, almas generosas e consoladoras, derramae-me, vós ao menos, sobre as chagas do coração o suave balsamo da esperança! Feneça eu embora mallogrado e perdido; mas fazei-me crer, na minha ultima hora, que para os meus descendentes ha-de já ter nascido redempção; que o labyrinto, onde os mais nobres Athenienses eram devorados, vai desabar; que eu, e vós, e os contemporaneos, somos as derradeiras victimas do Minotauro. ¡Outra vez fóra do serão! ¡outra vez fóra do casal! Desculpae-me; agora volto; e ainda que a rasão me chame lá fora, não torno a sahir, que tambem cá dentro a temos, e muito forte, e muito formosa, no grandioso assumptosinho que vinhamos tratando. * * * * * Queriam-se pois para as nossas leituras ou lições populares, além das obras já indicadas outras, e muitas, de Religião, de Moral, de Hygiene, de Medicina caseira, de Agricultura, de Veterinaria, de Physica, de Chymica, de Zoologia, de Botanica, de Mineralogia, de Economia, de Direito publico, de Direito civil, de Direito criminal, de Historia, etc.; opusculos curtos, em linguagem pura (estragal-a, como por ahi a estragam, para populares e meninos é um crime), e finalmente baratos e quasi dados. ¿Parece-vos isto difficultosissimo? pois não é. Homens de saber e engenho para escreverem taes opusculos, não faltam; o que só falta, é a Lei nova, e novos costumes, que lhes afiancem o não perderem, nem o tempo que houverem gasto no estudar e escrever, nem as despezas que houverem feito no imprimir. O costume virá do tempo, da rasão, e da mesma Lei; a Lei muito facilmente poderá vir do vosso e nosso Parlamento. Adopte e sanccione elle o alvitre que ha seis annos publicavamos[5]: ponha tributo de sello ao papel em que se imprimem deploraveis e estragadoras traducções de excusadas e abominaveis novellas francezas, e com o tributo d’esse imposto, mais racional que o do sello nos papeis forenses, faça premios aos escritos illustradores e sociaes. Será queimar ou enterrar as hervas más para adubio de plantas uteis, que é fazer n’um só lanço dois beneficios. [5] _Revista Universal Lisbonense_--Tomo II, n.º 37--1.º de Junho de 1843--artigo 1741. D’esta sorte os autores, seguros da perda, perfarão o que hoje nem ousariam commetter. Pagas de antemão as suas despezas, poderão dar os seus livrinhos por vil preço. A barateza, junta á utilidade, os fará copiosamente vender e reimprimir, com proveito sempre crescente d’elles, com proveito sempre crescente de todo o Publico. Em quanto, porém, essa edade aurea das Lettras, Artes, e Sciencias, nos não chega, os nossos bons leitores publicos que se remedeiem, com o que acharem de melhor para o intento; e mesmo, se a experiencia lhes mostrar ser conveniente, que misturem com aquellas obras de que fizemos rol, e semelhantes, outras de menos substancia e maior agrado, como os dramas e os romances moraes. Este arbitrio para os primeiros tempos, e para fazer pegar o costume, seria por ventura o mais plausivel. * * * * * ¡Que serões! ¡que serões vos não esperam já este inverno! ¡Que deliciosas tardes de domingos e dias santos! ¡quantas coisas prestadias, e para vós novissimas, não tereis já na memoria, no espirito, e no coração, em volvendo a primavera! ¡quantos gastos de dinheiro, de saude, e de paz interior, não haverão forrado muitos d’entre vós, que, a não ser o chamariz da leitura, teriam ido da venda para o arruido, ou para o roubo, de lá para o hospital, para a cadeia, ou para o cemiterio! Pedi, supplicae ao vosso Parocho, ao vosso Administrador do Concelho, a quem mais vosso amigo, e a quem mais homem vos parecer, que ajudem e promovam taes institutos em favor da Religião e da Caridade, em favor da Policia e da Ordem publica, em favor das Familias, e da Patria. ¡Um leitor em cada aldeia, se é possivel! ¡Um leitor, e mais de um em cada villa! ¡Muitos leitores, muitissimos, innumeraveis, em cada cidade! * * * * * ¿Será ainda este mais um grito em deserto sem eccos? Outubro de 1849. XVI Decimo serão do casal Abolição do Exercito SUMMARIO Outros procuram a felicidade, onde a não ha; nós pedimol-a á Agricultura.--O que um Ministerio da Agricultura fará para beneficiar os lavradores.--O Exercito é mal para os individuos, para as familias, para a Patria, para a Humanidade.--O Exercito ou é para conquista, ou para defensa, ou para tranquilidade.--Portugal não pode conquistar; não tem de quem se defenda; tendo, haveria outros recursos; e a paz interior mais se lhe tem com as tropas perturbado, que mantido.--Uma sentença de Felice contra havermos Exercito.--Quanto o Exercito nos custa, no orçamento, e fora d’elle.--Lucros cessantes que motiva.--Retrato do camponez antes de soldado.--O mesmo em soldado.--O mesmo depois da baixa.--Celibato militar.--Pede-se a suppressão do Exercito.--Poucas palavras sobre o como se pode a milicia extinguir sem inconveniencia nem perigo algum.--Nova organisação da força publica.--Guarda nacional.--Lei agraria, com vantagem para o publico e para muitos particulares, e sem lesão para nenhum d’elles.--Acenam-se alguns pontos para uma Lei de organisação de propriedade territorial.--Adoptando-se estes conselhos, as instituições liberaes e o Throno se firmariam. Continuamos na nossa teima de procurar felicidade. Se é loucura, é loucura nobre, e todos os espiritos mais bem nascidos de cada seculo a teem padecido. Uns a fizeram consistir na renunciação de todos os bens terrestres pelo amor do Ceo. Outros, na impassibilidade estoica. Outros, no _elixir de longa vida_. Outros, no Quietismo. Outros, na maxima diffusão das luzes. Os economistas, na maxima producção material, com absoluta abstracção de moralidade. Os politicos, na composição de formas governativas. Nós, em relação ao nosso Portugal, fazemos consistir a felicidade na Agricultura, pois debaixo d’esta palavra comprehendemos, como effeitos na causa, a abundancia, os bons costumes, a paz, a satisfação, e a estabilidade. Dos economistas não esperamos nada; o materialismo foi sempre estéril. Dos financeiros ainda menos; todos os algarismos do mundo não são capazes de crear um átomo; por elles ainda não vieram senão tributos ao Povo, e meia duzia de _alampadas maravilhosas_ para os Aladinos do calculo. E, finalmente, dos politicos tambem não, porque, trabalhando ha tantos annos na procura da promettida _pedra philosophal_, tendo mettido para os seus cadínhos tantas preciosidades, e accendido tanto fogo e tantos fogos, queimado tanto (até do futuro), ainda não fizeram sahir do seu estrondoso laboratorio senão fumo. ¡Se elles, ao menos, tivessem conseguido imitar o alchimista, que deixou na galeria do Gran-Duque da Toscana o prego meio ferro e meio oiro, para admiração de crédulos, e desappareceu!... Mas pelo contrario: a sua sciencia occulta, se alguma coisa tem logrado é transformar o oiro em ferro; o que não impede que, semelhantes aos Albertos Magnos e Cagliostros, appellidem tambem a sua obra «A grande obra». Não, meus lavradores; os unicos alchimistas sociaes, em quem se ha-de pôr a verdadeira esperança de _pedra philosophal_, que faça ao menos prata, e de _elixir_, que, se não prolongar a vida, pelo menos nol-a torne supportavel, sois vós, com o vosso natural bom-senso; sois vós, creando-nos um Parlamento da terra; é esse Parlamento, creando-nos Leis de verdadeira economia, e um Governo agricola; é esse Governo, vosso neto, e para logo vosso protector, illustrando-vos, moralisando-vos, incitando-vos ao trabalho, nobilitando-vos na vossa mesma estimação, facilitando-vos transito por todo o vosso territorio, promovendo companhias a quem vendais os generos com segurança, e de quem recebais adiantado para os amanhos, descobrindo e ensinando-vos, por uma continua investigação dos portos e mercados de todo o mundo, quaes as culturas velhas que deveis largar, quaes diminuir, quaes acrescentar, quaes aperfeiçoar, quaes experimentar, quaes introduzir com affoiteza; que para isso traga embaixadores muito escolhidos, mui zelosos, mui portuguezes, e mui vossos, por todas as partes do mundo; que em summa comprehenda e creia firmemente, que tudo aquillo que a terra nos não der, a poder de sciencia, de arte, e de trabalho, nada seria já capaz de nol-o dar. Para esse Governo, para esse Parlamento, e para vós, continuemos pois a discursar sobre o que está para fazer. * * * * * Falemos hoje do Exercito, com licença dos vossos lares e das vossas arvores, que sempre em ouvindo tal palavra se estremecem e horrorisam. Um serão para tal assumpto carecia de ser mui largo; noite de S. João levada de vela lhe não bastára. Emfim: apontemos; o vosso recto juizo desenvolverá depois. Cerrae a porta, que ha ahi alguns visinhos de andares altos, que já murmuram sermos nós ruins gastadores de tempo. Assentae-vos com animo despreoccupado; e, se vos parecer, ide apontando ahi com carvão, por essa parede da vossa conversavel cosinha, as principaes rasões da pratica, a fim de se vos não desluzirem da memoria, para quando fôr tempo. * * * * * ¿Que é um Exercito? É um mal, complexo de males sem numero, e que só por uma necessidade absoluta se póde tolerar. O soldado é ora um escravo, ora uma victima; a familia do soldado uma orphan, esbulhada de parte do seu haver mais sagrado. A Patria não tem carga mais onerosa, nem a Humanidade coisa que tanto a vexe e lhe repugne. Todas as considerações sociaes, economicas, moraes, religiosas, scientificas, litterarias, e artisticas, todas sem excepção veem jurar contestes no processo contra o Exercito. ¿Para que tem logo havido em todos os tempos exercitos? ¿e para que os ha ainda hoje em tantas partes? Umas vezes, para a conquista; outras, para defensa contra invasores; outras, para tranquilidade interna. No primeiro caso, é o Exercito uma arma em mão de salteador. A Historia chama-lhe um brasão. Portugal, como todas as nações heroicas, o teve, e com elle se engrandeceu. No segundo caso, é um escudo, que está afrontando e esmagando ao proprio corpo que defende. Do mal, o mal: das armadas invasoras procederam fatalmente as armadas defensivas. No terceiro caso, é um remedio violento e dispendiosissimo, para doença que em parte se devia prevenir pela hygiene, ou, chegando-se a declarar, acudir-se com menos ruido e mais efficacia. ¿Podemos nós ser conquistadores? Não. Logo, se temos Exercito, não é para conquista. ¿Temos que nos defender de extranhos? Não. Rasões de mais alta e geral politica são as que per si nos defendem, e hão-de defender; e, quando ellas cessassem, ou fossem vencidas, não haviam de ser estas nossas fileiras que nos salvassem, mas sim o Povo todo: os fortes, e os fracos, os decrépitos, as creanças, as mulheres. As nossas armas seriam o ferro, os troncos, o fogo, as pedras; o nosso soldo, a vista das casas que defendemos; as nossas bandeiras, os campanarios das nossas freguesias; os Evangelhos do nosso assentar praça, as lembranças das nossas victorias sobre Romanos, sobre Arabes, sobre Castelhanos, sobre Francezes. Povo que se defende na terra em que nasceu, é leão e leôa no seu bosque diante do covil dos filhos. O Ceo, com a santidade da nossa causa nos protegeria; e, se nos fosse indispensavel auxilio humano, elle no-lo depararia no braço de alguma Nação, que defendesse nos nossos os seus interesses. Logo, não é tambem como escudo, que mantemos um Exercito. ¿Será portanto para obviar a tumultos? para cohibir sedições? ¿para conservar boa ordem e regimento no Estado? A esta pergunta não precisamos de responder; bem respondida que ella está n’uma pagina de cincoenta leguas de largo e cem de alto, que ha cincoenta annos temos cem vezes escripto, respançado, e tornado a escrever com sangue de irmãos. Logo, se com um Exercito nos consumimos, não é para bem da paz domestica. * * * * * «Os pequenos Principes--diz Felice--querendo arremedar os grandes potentados, teem exercitos, que para brinquedo são de mais, e para deveras de pouco servem.» A segunda parte d’esta sentença bem provada e contraprovada nos está por factos; e a primeira é verdade não menos manifesta. Perguntae aos orçamentos (e ainda esses não sabem, ou não dizem tudo): ¿emquanto nos importa o Exercito? ¿os soldos e comedorias da soldadesca e dos estados maiores? ¿os uniformes, os armamentos, o calçado, a remonta e sustento da cavallaria, as fabricas de polvora e balas, os arsenaes, os quarteis, as obras de fortificação, as marchas e conducções de bagagens, os transportes por mar, os roubos e extravios do material, as secretarias, os commissariados, as inspecções, os tribunaes militares, as boticas, os medicos, os cirurgiões, os enfermeiros, os moços, os invalidos, as musicas, etc.? Os orçamentos do Ministerio da Guerra d’estes ultimos nove annos dão, termo medio, uma despeza annual de 2:758:580$410 reis. Se porém considerarmos que a Marinha é, por sua natureza, parte e complemento da Guerra, e nos tem custado, tambem termo medio no mesmo periodo 944:475$851 reis, teremos annualmente uma despeza de reis 3:703:056$261. Pelo exame dos respectivos orçamentos, todas as restantes despezas do Estado, termo medio, não teem subido no mesmo periodo de reis 6:560:419$590. Coisa espantosa! Mais de um terço dos haveres publicos devorado pela Guerra, que ou é um nome vão, ou, quando tem a sua funesta realidade, é por esse mesmo desperdicio que nasce e se alimenta! Despeza ainda mais desgraçada, quando se olha para o desamparo da Instrucção Primaria, para a falta de estimulos e premios á Agricultura, á Industria, ás Artes, ás Sciencias. Despeza inqualificavel, quando se repara em que, á proporção que nós minguamos, que nos afogamos na divida, vai ella a crescer de mais em mais. ¡E, como se este infinito fôra ainda pouco, lá baixam de vez em quando das Secretarias novos padrões de uniformes, como de París veem figurinos para os toucadores das casquilhas! no que, ao desperdicio accresce ainda o indecóro, ao indecóro a dureza, pois que essas vaidosas despezas, dos proprios militares vão sahir; classe que, empobrecendo-nos a nós, está bem longe da opulencia. * * * * * Além d’estas despezas carregadas na massa commum, perguntae ás terras, por onde, ha meio seculo, nos andam, quasi de continuo, transitando corpos, ¡quanto lhes não tem custado a ellas o Exercito em aboletamentos, em hospedagens, em dilapidações, descaminhos, e estragos, em seáras taladas e comidas pelos cavallos, em oliveiras, séves e alfaias campestres queimadas, gados comidos, bestas e carros apenados, trabalhos ruraes retardados ou supprimidos, etc., não falando já em damnos de outra natureza, muito maiores e mais irreparaveis! Esmae tudo isto a monte. ¡Arripiam-se as carnes!... E todavia, ainda ha mais: a todos estes damnos immergentes, ¡que de lucros cessantes não accrescem, com a existencia de um Exercito, aos particulares e ao Publico! ¡quantos braços arrancados á lavoira, aos mistéres, e ás artes! ¡que desfalque no total da producção! ¡que augmento no salario dos jornaleiros! ¡em milhares de casaes que mingua de pão, por ausencia de quem o ganhe! * * * * * Viremos agora a questão por outro lado. Chega o recrutamento. ¡Lá vai o coração de uma pobre familia arrancado! Lá entra pela primeira vez, e prezo como um criminoso, na cidade, a quem elle queria servir de longe com a enxada na mão, um mocinho, innocente, cheirando á terra, ao feno, e á flor do matto; simples e viçoso como ella, temente a Deus, amante de seus paes, de suas irmans, de seus irmãos, bemquisto dos visinhos, laborioso como abelha, sentindo e expirando de si a poesia da Natureza, como o passarito do silvado em flor por uma antemanhan de Maio. Approvado pelos medicos n’um exame, onde o fizeram corar pela primeira vez, passa de repente da liberdade para a escravidão; da luz e fragrancias do seu campo, para a escuridade fétida de um quartel; d’entre rostos benévolos, para entre semblantes carrancudos; do rebanho que pastorava, para a escola e chibata do instructor, para as conversações grosseiras, mortiças e fumosas da tarimba. Com violenta mão lhe limam á pressa todo o cunho da sua individualidade: rentearam-lhe o cabello, como a todos os seus camaradas; vestiram-n-o e calçaram-n-o como todos elles; constrangeram-n-o a tomar a mesma figura e movimentos, a dar os mesmos passos contados, a comer á mesma hora, e do mesmo pão, a dormir e a acordar á voz metallica da mesma trombeta. ¡Individualidade!? ¿elle? até o nome lhe tiraram; é um _numero_; e esse numero nem mesmo designa um ente sobre si. As suas armas, o seu fardamento, e elle, são tres elementos inseparaveis, cuja somma é _o soldado_. Se a bayoneta soubesse ouvir e obedecer, e a espingarda atirar, não as teriam complicado com aquelle appenso vivo, que é para ellas o que é a carreta para o canhão, ou os cavallos para a carreta.[6] [6] N’um volume de romances moraes, que o meu amigo o snr. Luiz Filippe Leite está para dar á estampa, com o titulo de _Supposições que podem ser realidades_, ha uma pintura das miserias da vida militar. O autor copiou o seu soldado do natural, o seu desenho é bello, as suas côres verdadeiras. É um soldado esse, que serve de efficaz auxiliar á nossa doutrina. CASTILHO. * * * * * O mais rigoroso de todos os codigos das Nações, e o mais altamente offensivo da dignidade humana, é aquelle que o soldado, com a mão sobre os Evangelhos, jura cumprir. E o peor é que essa antinomia a todas as ideias de Liberdade, é uma fatal condição, e inseparavel, da existencia de exercitos. --«¡Ao menos, é uma vida gloriosa a das armas!»--dizem. ¿Mas não será esse dizer uma arteira seducção armada ao espirito, assim como a purpura das bandas, o accezo dos pennachos, as côres vivas das golas e canhões, o oiro das dragonas e das chapas, o lustroso das correias e dos ferros, são outra calculada seducção para os olhos, e outra as estrondosas musicas para os ouvidos? Nos sacrificios dos pagãos enfloravam-se as victimas. ¿Por que razão Marte não enfeitaria tambem as suas? «¿Gloriosa vida a do soldado?!...» A consciencia d’elle que o diga. O seu entendimento entorpeceu-se no meio da monotonia da sua agitada ociosidade. Tudo n’elle é vulgar. Os seus actos, até quando arrosta com as balas ou vôa á brécha, são sem merito, porque não são livres. A reflexão lhe é defeza. O sopro de um clarim o despára para a morte, ou para a victoria, como a descarga do obuz arremeça a bomba, que vai despedaçar, despedaçando-se. Mandado, combate hoje pelo vermelho contra o azul; amanhan, mandado, combaterá pelo azul contra o vermelho. Mandado, expõe-se n’uma sentinella perdida, pela segurança dos seus camaradas. Mandado, irá, em se recolhendo d’ali, espingardear o seu camarada predilecto, sem uma pergunta, sem uma lagrima. Mandado, poria fogo, sem hesitar, á egreja onde o baptisaram, á aldeia em que nasceu, á choupana d’onde sua mãe entrevada não pode fugir. Tudo isto lhe murmurará tristemente a consciencia, quando á sua profissão ouvir chamar _gloriosa_. ¡Que fiel, que horrorosamente fiel, não é o retrato, que do soldado, olhado a esta luz, pintou a negro Alfredo de Vigny! * * * * * Ao viver monastico teem reprehendido philosophos os seus tres votos, como anti-naturaes. ¡¿E o soldado?! ¿O soldado é livre para casamento? ¿O soldado não geme em forçada pobreza? ¿O soldado, sobretudo, não é o prototypo da obediencia servilissima? No monge, ao menos, a pobreza descalça, a continencia sobrecarregada de cilicios, a abnegação do querer, tinham por compensação a esperança de thesoiros, de delicias, e de um throno para a eternidade. ¿E o soldado? ¿Que lhe promettem, ou que espera, por tantas renunciações? ¡Oh! a sua humildade, se fosse livre, seria inquestionavelmente de todas as heroicidades humanas a mais estupenda. Mas não é livre. Mais, do que no Religioso opera a esperança do premio, opéra n’elle o seu unico movel: o medo do castigo. O cenobita padece e canta; o soldado padece, e nem ousa suspirar. Aquelle canta porque na phantasia lhe riem Céos; a este negrejam-lhe na ideia o calaboiço, as varas, a grilheta, a farda rasgada, o fusilamento. * * * * * Depois de annos de uma tal vida de _gloria_, ¿como volverá ao seu torrão o mancebinho innocente, que d’ali arrancaram, por entre tantas lagrimas dadas e recebidas, se por ventura lá volver? Nem a namorada do seu coração, se a teve, o reconhecerá. O aborrimento da miseria n’uma condição obscura, e na familiaridade com entes sem educação nem principios, lhe fez contrahir muitos vicios ignobeis, que o levaram mais de uma vez, ora ás prisões, ora aos hospitaes[7]. As suas mãos perderam o geito e gosto dos trabalhos naturaes e primitivos. Rescendia ás flores do matto; hoje cheira á polvora, tem o perfume das batalhas, como as aves carniceiras o fortum cadaveroso. Tinha Fé, desbarataram-lh’a; indole affectuosa, affizeram-n’o, por dever, á theoria e á pratica do homicidio. Nos contos do serão, tudo o fazia estremecer; agora, é elle que infunde espanto aos ouvintes, pelo impassivel com que a sua voz rouca descreve as carniçarias que viu, e que ajudou, o lanço da cidade que voou com a explosão da mina, a população inerme que passaram á espada. [7] Verdade reconhecida pelo snr. Capitão João Maria Fradesso da Silveira no seu honrado artigo sobre a lei do recrutamento, na _Revista Militar_ de Fevereiro de 1849. CASTILHO. ¿Por que assim é desprezador da vida? Porque d’ella só conhece as durezas e amarguras. O seu valor, se o tem, é uma qualidade negativa: despréza a morte, porque não sente a alma. Breve: o Exercito custa ao Thesoiro, que devora; ás provincias, que fatiga; ás casas, que desfalca de filhos; ás terras, que priva de braços; ás artes, que despója de obreiros; aos individuos, que esbulha do seu quinhão de liberdade, a quem quebranta mil fóros e immunidades essenciaes do homem, a quem, finalmente, de homens converte em machinas de destruição. E mais, e muito mais, custa ainda o Exercito, se avaliarmos as graves consequencias, positivas e negativas, directas e reflexas, do seu celibato; ponto esse, em que já d’outra vez tocámos, e que por si mesmo se está commentando. * * * * * Ora, se tanto custa o Exercito, e se tão inutil é, como já vimos, ¿por que não insistiremos para os Legisladores, e para os que os hão-de eleger, no alvitre (que tambem já outra vez suscitáramos) de se extinguir este grande, este immenso, este inutil, este estéril e esterilisador, convento militar? ¿Não se dá baixa ao soldado quando já não póde com a milicia? ¿Não se lh’a dá? até em tempo de guerra? ¡quanto mais em paz! Pois então, ¿por que se não ha-de a baixa conceder já já a este triste velho de Portugal? As suas armas visivelmente o assoberbam e debilitam de anno para anno. ¿Aguardaremos que o acabem de matar, para então lh’as despirmos? Elle já não tem que ir fóra a conquistar. De fóra não hão-de vir accommettel-o. ¿Logo, de que lhe servem, se não fôr para se ferir? Arrancae-lh’as; ou antes: deixae-lh’as depôr dos braços pizados, sangrentos, e cadavericos, que é tudo quanto elle mesmo vos supplíca. Tem o torrãosinho que mercou, e muito caro; permitti-lhe remoçar-se n’elle, cultivando-o com desafogo. Quando Herminia, no formoso poema da _Jerusalem resgatada_ envérga armas sem ser guerreira, ¡a que perigos e terrores a não expõe essa loucura! Mas quando emfim, vai armada dar assim áquelle campestre retiro, onde o pastor ancião está rodeado da familia, embebido em seus rusticos exercicios, que os meninos fogem, assustados de a ver, e só voltam quando ella, desquitando-se do elmo, se lhes descobre gentil, pacifica e amorosa, donosissima allegoria! Escutae o que a boa Herminia diz, ou o que diz, por sua bocca, a alma do grande Poeta: _Seguite,--dice--avventurosa gente, Al Ciel diletta, il bel vostro lavoro, Che non portano giá guerra quest’armi All’opre vostre, ai vostri dolci carmi._ Assim deve já dizer aos nossos agricultores a nossa milicia, desfazendo-se de armas excusadas e improprias: Gente amada do Ceo, ditosa gente, ¡avante em vossos plácidos lavores! Já dispo as armas; animo recobrem a lida vossa, os vossos brandos versos. * * * * * Até aqui são axiomas. Qualquer entendimento os percebe. D’aqui para diante pertence aos Estadistas, mas aos Estadistas sinceros, philosophos, e humanos, propôr: primeiro, o modo de fazer a suppressão, sem expôr a contingencias funestas; depois, o modo de organisar, mais efficaz e menos dispendiosamente, a necessaria força publica. Nós, que não somos Estadistas, só poucas palavras nos permittiremos sobre estes dois assumptos. * * * * * A abolição do Exercito seria recebida pela grandissima maioria d’elle com alvoroço, ou muito nos enganamos. A soldadesca, se a consultassem, approvaria talvez unanime. Ao subir d’ella para a officialidade, é que haviam de principiar as repugnancias, crescendo tanto mais, quanto mais se fosse pelos postos a subir. Era logo licenciar a soldadesca toda, e da officialidade quantos o desejassem. Os restantes empregar-se-hiam, ou nos serviços, ainda militares, de que logo falaremos, ou em outros quaesquer, em que, segundo suas habilitações, o Governo entendesse aproveital-os. As vacaturas, por morte ou outras causas, diminuiriam de mez para mez este resto de onus, ainda grande para o Thesoiro; até que em poucos annos haveria cessado totalmente. Os soldados sôltos das Bandeiras seriam preferidos, em egualdade de circumstancias, para mil pequenos empregos da republica: policia municipal, guardas de barreira e de alfandegas, correios, serviço inferior de tribunaes e estações publicas, trabalho braçal nas officinas nacionaes e nas dos contratos que a Nação arrenda, tráfego nas quintas exemplares e experimentaes, tripulação e mais officios na Marinha, de que alguma parte sempre ficaria provavelmente subsistindo. * * * * * Quizera-se tambem que uma Lei nova, regulando mais assizadamente a propriedade do solo, em ordem a fazel-o subdividir, e aproveitar até á ultima polegada, proporcionasse conceder-se aos que houvessem sido bons soldados um pequeno chão, com o adiantamento de instrumentos, sementes, e algum dinheiro para os primeiros annos, sendo casados, ou obrigando-se a casar; e apresentando fiador que respondesse pelo valor que se lhes entregava. Os terrenos nacionaes poderiam d’este modo ser aproveitados com grande vantagem, e mesmo os baldios dos Municipios, mediante contratos equitativos, e de interesse mutuo. ¿Que lucrou o Estado com tão consideravel quantidade de solo tomado ás Ordens religiosas? Elle nada. Crearam-se ahi meia duzia de principados, contra todos os aphorismos da Economia. Com a divisão em pequenos lotes, ¡que familias indigentes se não houveram aventurado! e o Thesoiro teria recebido já hoje vinte vezes mais do que assim obteve. Pela mesma Lei, os grandes proprietarios que não cultivam, por não poderem ou não quererem, seriam certamente obrigados a arrendar em lotes, e por preços racionaes. Os morgados... Mas este objecto é sobejo largo e importante; não cabe aqui. O que apontámos sobra para mostrar que, reformadas as Leis no que ellas teem de mais flagrantemente anti-social, nenhum receio podia haver de que faltasse trabalho e pão para quem quer que fosse. * * * * * Já podemos portanto pressuppôr acceita e agradecida pelo proprio Exercito a sua suppressão, na qual, segundo se acaba de vêr, nada ha de violento nem odioso, se não que é tudo paternal. A ulterior organisação da força publica figura-se-nos ainda mais facil. Não é invenção nossa; é do seculo; é da philosophia; é da Lei do Estado; é a GUARDA NACIONAL. Para allivio d’esta nas cidades grandes, podia haver tambem, como em Lisboa e no Porto, uma Guarda estipendiada pelo Municipio; ainda que, ao vermos Londres, a mais populosa cidade do Mundo, manter sem nenhuma tropa, e só com meia dusia de paizanos velhos, a sua admiravel Policia; não podemos dissimular, que muita coisa está ainda por imitar de Estrangeiros, de quem, pelo commum, só o indifferente ou o inapplicavel traduzimos. «Paiz mais florescente que a Hollanda nunca eu vi em minhas viagens--diz Bernardino de Saint-Pierre.--Na Capital encerra pelo menos cento e oitenta mil almas. Com o immenso tráfego de mercadorias que em tal cidade negoceiam, ¡se faltarão n’ella com que se tentem as cubiças! Pois sem embargo, não se ouve lá falar de um roubo; nem guardas ha de soldados. Em 1762 que eu lá estive, havia já onze annos que se não tinha suppliciado ninguem; e não é dizer que não sejam severas as Leis; mas como o Povo acha facilmente em que ganhar a vida, não tem por que as quebrante; e advirta-se que este Povo tem ganhado milhões a imprimir quantas extravagancias ahi se escrevem em França sobre Moral, Politica, e Religião. Assim mesmo, ainda não desdiz das crenças e costumes que d’antes tinha. A razão é porque vive contente com a sua sorte. OS CRIMES SÓ NASCEM DA INDIGENCIA E OPULENCIA EXCESSIVA.[8]» [8] Da primeira vez que este artigo se imprimiu no _Agricultor Michaelense_, não levava a presente transcripção dos _Estudos da Natureza_. Foi depois de dado á estampa, que eu li esta admiravel obra; digo _li_, por que ao devorar folhas na puericia não se chama _ler_. Os meus encontros em affectos, em pensamentos, até em imagens, com Bernardino de Saint-Pierre n’esta e n’outras suas obras, não obstante o que vai de talento a talento, que (ainda mal para mim) é quasi infinito, se por uma parte me podiam lisonjear o amor proprio, por outra me confirmam n’esta, para quem escreve, tristissima verdade de que nada ha de novo debaixo do sol. Censura de plagiato, que é a mais gabadinha dos ignorantes, difficultosamente a ousára fazer quem tiver composto e estudado. Veja-se a minha Nota sobre _Originalidade_ no fim do drama _Camões_. CASTILHO. * * * * * Uma Guarda Nacional, urbana e rustica, de pé e de cavallo, segundo uma Lei prudente, mas francamente liberal, seria uma força respeitavel pelo seu numero, e mais que sobeja para os tempos ordinarios. Para a hypothese, mais que inverosimil, de invasão estrangeira, esta mesma Guarda seria Exercito, como se observassem duas precauções; a saber: ter constantemente uma bella Escola militar, viveiro de officiaes para as armas scientificas, e obrigar os batalhões civicos a revistas, exercicios, paradas, e passeios militares, com instructores idoneos. Soldados taes, ¿em que differiriam dos de linha? Em duas sós coisas: em custarem menos, e em valerem mais. O que pode o homem defendendo o solo conhecido, e a que chama seu, já o ponderámos; mas se provas quereis, perguntae á Germania, ás Gallias, á Britannia, á Helvecia, á Lusitania, e a todas as Hespanhas velhas, pelas legiões Romanas; á mesma Hespanha, pelos Saguntinos, pelos Asturianos, pelos Gaditanos, por cada uma das suas provincias; á França, pelos Parisienses, pelos Bretões, pelos Vendeanos, por suas comarcas; á Grecia, pelas Thermópylas, por Missolunghi, por toda a sua historia antiga e moderna; á Belgica, por Anvers; á America, pelos Estados-Unidos; ao Norte, pela Polonia, pela Hungria, pelo Caucaso; a Portugal, pela Terceira, pelo Porto, por cada palmo do seu territorio. Emfim: interrogae affoitamente a todos os seculos, sobre todos os povos do Mundo. Sobre o torrão materno, todos são Antheus; podem ser vencidos, mas é por braços de Hercules, e só depois de mil vezes renovada a lucta. ¡Oh! de que loiros se não cingira o Ministro da Corôa que o ousasse propôr! ¿Onde ha ahi Camões, nem Homero, para lhe fundir a estatua com as devidas dimensões? O Throno e as Instituições deixariam de vacillar. Duas égides celestes os cobririam: a ellas, o sentimento da Liberdade; a elle, o amor, amor centuplicado pela gratidão. Aos roucos triumphos das eras antigas succeda o da Arcádia cantar festival! Da ceifa das palmas, á ceifa de espigas, volvei, Cincinatos do bom Portugal. De espigas e palmas coroemos a enxada, morgado, e não pena, dos filhos de Adão. Mais velha que os sceptros, mais util que a espada thesoiro é só ella, só ella brasão. * * * * * ¡Meu Deus! ¿Será possivel que estejam a paz, a abundancia, e o amor a bater-nos ás portas, e lhes não abrâmos? ¿que a felicidade nos ria dos ares, dos valles, dos montes, dos rios, do Oceano, e lhe fechemos os olhos? ¿que este solo nos grite de todos os pontos «Pedi-me, e recebereis», e lhe arranquemos os filhos? ¿que aos brados da Industria e da Agricultura respondâmos sempre _politica_? ¿aos gemidos da Moral, que pede para si trabalho, fartura, casamentos, instrucção, e festas, _politica_, sempre _politica_, nada senão _politica_? Aos jogadores e empalmadores da boa sorte do Povo, a esses, que lhe reprezam em seus cofres o oiro, que tantas coisas podia fecundar, não perguntemos que vale ou significa o oiro; mas aos magnates do Estado, ¿como deixaremos de perguntar que vale ou que pode essa _politica_, esse demonio incubo, sem olhos, sem ouvidos, sem entranhas? ¿Que tem feito? ¿que faz? ¿que ha-de fazer? ¿que sabe fazer? Dispam-lhe a purpura, que é sangue. Amarrem-lhe os pulsos, que é harpia. Tapem-lhe a mentirosa bocca de sereia. Desterrem-n’a, ou enterrem-n’a, que os dias da credulidade já passaram. Para o seu logar subam, ao som de vivas universaes, o amor da verdade, o amor da actividade, o amor da justiça, o amor da fraternidade, o amor das virtudes e dos talentos, o amor dos homens, das mulheres, dos meninos, e dos ainda não nascidos. Só amores pedimos. ¡O pedil-os é tão justo!... ¡e o concedel-os é tão facil!... Novembro de 1849. XVII Festa da Redempção 25 de Dezembro Nada mais inexplicavel, que a opposição constante, que de muito fazem ao Christianismo tres raças de homens, todos influentes: os chamados Liberaes, os chamados Philosophos, ou sabios, e os chamados Mundanos, ou partidarios dos deleites. Os primeiros deviam ver n’elle o santo dogma da egualdade e fraternidade; os segundos, a chave que abre todos os enigmas, e o unico principio da Moral; os terceiros, as unicas verdadeiras alegrias concedidas á terra, a serenidade do animo, as esperanças infinitas, a beneficencia mutua e universal, a arte divina de converter os tormentos em gosos, as humiliações em glorias, a velhice em alvorada, e a morte em triumpho. Os que, não podendo chamar outra coisa ao Christianismo, para o deshonrarem lhe chamaram triste, não tinham jamais comparado os rostos da multidão pobre e humilde, que pela manhan cedo sai do templo mui serena, aos semblantes do tropel, que, pelas horas mortas, vem golfando dos espectaculos, das assemblêas, das espeluncas da crápula e do jogo, cançado, aborrido, parte melancolico, parte cuidadoso, parte ébrio; uns vazios do oiro que lhes havia de sustentar os filhos; outros, opulentados a subitas, para se arremessarem mais affoitos á ruina; estes, com a fama denegrida; aquelles, com a alma hydrophóbica ainda a babar veneno; frutos de cinza e fel dentro em casca brilhante; favos escondidos no escuro vão de um tronco. * * * * * Todas estas excellencias nos traz epilogadas a festa grande, que prende ao fim do anno velho o principio do anno novo, e que é uma como absolvição do preterito, e santificação do porvir. N’estes treze dias temos em formoso drama um symbolo completo da origem, da indole, e dos fins, da Religião do Nazareno; é a apotheóse da humanidade; a subversão das pompas vans; a infusão do Ceo na terra, e a escada mystica da terra aos Ceos, que apparece resplandecente no meio das trevas com as azas prateadas de todos os Anjos, e ressoando com os córos de ¡GLORIA E PAZ; GLORIA AOS CEOS, E PAZ AOS HOMENS DE BOA VONTADE! * * * * * ¡Que risonha e que magnifica não é, ao mesmo tempo, a primeira scena d’este drama, annunciado e preludiado, largos seculos havia, pelos grandes lyricos da Fé, os Prophetas! Eis o presepio de Belem. Os mysterios, em tão pequeno espaço contidos, adoram-se com o silencio. Adoremol-os. Mas como o dia é de jubilos e boas-festas, chamemos pelos nossos camponezes, como os Anjos chamaram pelos da Judêa, para que venham, primeiro adorar, como nós, e depois alegrar-se com ufania. Não foi nos palacios, não foi em Roma, não foi no Capitolio, que o Filho do Senhor de tudo quiz nascer; foi nos campos, foi na mais rustica poisada; não entre Principes, se não entre pobres. Os animaes, symbolos da lavoira e do trabalho, lhe fazem côrte. Os primeiros convocados para o verem, os primeiros que o louvam, o beijam, e o querem, são os pastores. Os primogenitos do Ceo fostes vós, e soil-o ainda, homens simplices e laboriosos. Os das pompas, os da riqueza, os da sciencia, virão tambem prostrar-se a este Menino, que ennobrece a tudo quanto se prostra; virão, que o destino d’Elle é a dominação universal; mas só chegarão depois de vós. Para vós, bastou um convite melodioso; para elles será necessaria uma revolução nos astros. ¡Eil-os emfim, os Reis! * * * * * Noite de Natal, ¿quem te não ama?! Noite das virgens e das mães, dos meninos e dos velhos, dos camponezes e dos Soberanos, noite dos Anjos e dos homens, ¿qual será o coração que tu não alvoróces? Até o incrédulo se alegra, vendo refulgir no meio das trevas o templo enflorado, e escutando-lhe os cantares triumphaes. Do alto dos campanarios rebentam á porfia os repiques, luctando com os ventos impetuosos do inverno, e vencendo-os, e indo levar uma saudade, ainda suave, ao leito solitario do paralytico. Toda esta musica, toda esta claridade, todo este calor, toda esta vida no coração do inverno, e á meia-noite, condizem com uma Religião, que venceu o inferno, os Cesares, os deuses; que triumphou, triumpha, e triumphará sempre, dos temporaes da perseguição, das trevas da ignorancia, e das trevas, muito mais trevas, da presumpçosa Sciencia. Sim, sim; o presepio, tal como ainda ao presente o vemos reluzir allumiado, até por sotãos e cabanas, o presepio com todos os seus chamados anachronismos, com os seus castellos artilhados, os seus monges, os seus Romanos antigos, os seus pastores modernos, os seus camellos carregados de oiro, as suas gentis damas, e os seus pavilhões campestres inglezes; embora nescios o commentem por delirios e absurdos artisticos, é a mais verdadeira de todas as Historias, e de todas as Prophecias a mais infallivel: é um espelho longinquo, no qual todos os pontos da terra e todas as edades se estampam, convergindo para a adoração do CREADOR UNIVERSAL. 1849. XVIII Undecimo serão do casal Despedida SUMMARIO Adeus para sempre a S. Miguel.--Saudades.--Como é o coração de um poeta.--Continua a ambicionar a vida rustica.--Panegyrico d’ella, extrato de um livro inédito.--Memora os bons desejos que teve a bem da Ilha.--Excusado sermão a estadistas.--O que o autor tentou, além de alvitramentos.--Sociedade dos Amigos das Lettras.--Escolas.--Novo systema de leitura.--Tratado de versificação.--Mnemonica.--Curso de poesia; outro para damas.--Curso de Latim.--A Sereia, jornal projectado.--Gravura em madeira.--Lithographia.--Typographia.--Excitação na mocidade.--Applicação da poesia a assumptos serios.--Hymnos da Industria, das Escolas, dos Lavradores.--Curso de Hygiene.--Conselho industrial.--Caixa economica, Banco industrial e Montepio.--Commissariado dos estudos.--Solar de Artes e Lettras, e dotação.--Insiste-se fortemente n’esta ideia civilisadora. Hora solemne e triste é esta para mim; e ¡oxalá que para vós tambem o seja um poucochinho! Após tão amigavel convivencia de dois annos, trago-vos despedidas, e para sempre. Sequer, estamos nas espaçosas noites de Dezembro; e como já me vêem com a cinta prestes, o escaço fardel ás costas, e o bordão de peregrino outra vez em punho, não me hão-de levar a mal se n’esta derradeira pratica por ventura me dilatar. ¡Custa tanto a arrancar os pés d’onde os tivemos por decurso de oito estações! ¡mais de cem semanas! ¡mais de setecentos dias e outras tantas noites!... Quando um coração chega a fazer cama (mas que fosse entre espinhos) já não sabe como se erga. Qualquer lado do horizonte, por mais risonha luz que de lá o chame, lhe faz medo. ¡E então o coração de um poeta, que é a mais amoravel coisa de quantas Deus cria!... O coitado lançaria radiculas para se apegar, até a um rochedo! Em não achando a quem ame, logo muito de pressa o inventa. Faz lembrar esse animalzinho bemdito, que do seu interior fia a seda em que se envolve; esconde-se na sua doirada ou prateada esphera, tão macia e mimosa, livre das distracções da luz, dos sons, dos cheiros, dos calores, dos frios, e dos toques lá de fóra; rico de sua pobreza, vive vida encantada de mysterio, de que só ha-de sahir morto, ou com as azas esplendidas para voar aos céos, depois de ter aboiado em fragrancias e raios de sol, por cima de labyrintos de flores... Boa sina parecerá aquella, mas ninguem a inveja. Só pelos espaços da phantasia é que o enjeitado da fortuna, chamado poeta, pode encontrar alguma vez com que assim se console. A vida real por todas as juntas lhe doe; todo o movimento o afflige e dilacera; quantas vezes se aparta e muda, tantas se fina. * * * * * Quando a Sociedade promotora da vossa Agricultura me commetteu escrever para vós o seu Jornal, que eu me estreei conversando logo comvosco largamente como amigo com amigos, foram estas (ainda me lembra) as minhas ultimas palavras n’essa introducção: «Se aqui, para onde a fortuna me arrojou, tão longe do meu ninho, está escrito que haja de acabar a cançada vida, quero que em minha pedra raza, se a tiver, se possa escrever: AMOU A TERRA ONDE JAZ, COMO SE D’ELLA FÔRA. QUANTO POUDE E SOUBE, TUDO LHE DEU DE BOA-MENTE.» Era em Janeiro de 1848. Em todo esse anno, que andei comvosco, e em todo este, que só vos visitei, dizei se desmenti, com as obras a promessa. Não desmenti, não. Quanto soube e pude tudo de muitissimo boa-mente dei á vossa terra, e amei-a como oxalá os seus filhos a amem sempre. Entretanto, a sepultura, que eu principiava a entrever aqui, era mais uma illusão, se a morte em poucos dias me não tomar. Vou procural-a mais longe, muito longe, pois só a desejo ter onde os meus trabalhos me houverem grangeado um prediosinho, em que me enterre eu mesmo antes que me enterrem, e, morto para o mundo, viva ainda alguns dias para os meus, para mim, e um pouco para a posteridade, se podér ser. _Res non relicta sed parta._ Quero teimar até ao cabo n’esta minha humilde ambição já de muitos annos. * * * * * Se vos não enfada ouvir louvores do vosso viver, do unico viver a que tenho inveja, vou dizer-vos o que eu na minha terra, que bem grande é, bem formosa, e bem cheia de delicias, escrevia ha tres annos, com toda a sinceridade do meu coração, como agora e como sempre. Escutae, escutae:[9] [9] O seguinte é excerpto do Preambulo do _Presbyterio da Montanha_ a pag. 80 e seg. Por ainda se não achar publicado, nem de todo impresso tal livro, e por fazer muito ao meu proposito, me permitti a transcripção. CASTILHO. «¡Se jamais virá tempo de eu poisar em torrão meu, debaixo de sombras minhas, a cabeça encanecida e regalada! ¡Uma barraca de poucas braças, mas revestida de rosas e limas, como o presbyterio! á roda, tanto de fazenda... quanto o filhinho mais pequeno atravessasse correndo de um só fôlego; mas isto em solidão bem solidão, onde só os astros me enxergassem, só as estações me visitassem, e da banda do mundo nada me chegasse, senão o vento, já expurgado, e esquecido de humanas vozes. «Tal casa e tal quinta, ser-me-hiam mais que morgado, mais que palacio e reino: paraizo terreal, e digno vestibulo de outro melhor. «Ahi me reverdecêram o coração e mais o espirito, que me elles por cá trazem tão lastimosamente desfloridos e murchos. Por si se retingiriam os cabellos com o franco sol, remoçador de quanto existe. A lyra interior volveria a cantar espontaneamente, como harpa eólia entre jasmineiros, pendente em hombral de gruta ás virações da primavera. «Ainda á farta me vingára dos tantos annos, que em tarefas ephemeras e sem gloria, posto que não sem consciencia e diligencia, se me desbarataram na galé da Imprensa periodica; ou (com mais propriedade) nas palhas d’essa doidinha, que a si mesma se venéra por soberana do Universo, soberana com diadema de papel, e sceptro de lapis. Só não rira d’ella, quando me lembrasse que me engoliu, com os annos que me tomou, outros tantos da minha existencia para o diante, pois em cada tomo de periodico, sincera e honradamente redigido, se podia escrever este epitaphio:--_Aqui jazem um anno de fadiga e dois de vida de... Orae por elle._ «Vendem-se ainda primogenituras por menos que prato de lentilhas. «Vingára-me (¡oh se me vingára!) de tão bons dias mallogrados; e ainda por ventura alguns livrinhos, menos maus que todos os meus precedentes, appareceriam de novo (mas sem mim) no povoado. Como Ovidio aviava os seus do desterro, aviaria eu os meus do meu eden: _Parve, nec invideo, sine me, liber, ibis in Urbem._ --«¿A que vem tomar-nos tempo com a fabula pueril dos teus gostos e desejos?--dirá, e ha-de dizer, algum d’estes que sabemos, e que nunca faltam, escoimadores _ex officio_ do alheio. «Senhor meu--lhe respondo eu já--pois é por isso mesmo de não passarem de fabulas os meus gostos e desejos, que se me ha-de relevar o dar-lhes eu largas no papel. Se eu vira agora cahir-me do ceo o meu tugurio e o meu quintal coroados de ermo, como o Evangelista, nas praias nevoentas de Pathmos, viu baixar do Empyrio a sua Jerusalem abraçada de muros de oiro, o tempo, que n’estas palavras gasto, aproveitára-o melhor em correr para o meu refugio, beijal-o, replantal-o, aformosental-o; e em lá vindo o florido Maio, ride-vos de pagão que brindasse os seus Lares com mais fé ou egual amor. «¡A Liberdade!... ¿Onde ha hi liberdade que nem por longe se pareça com a de um viver remançado, em casa sem numero nem espias, ao som da Natureza, á lei da propria inclinação, sem ouvir horas, que nos chamem, sem encontrar conglosadores, que nos aboquem no ar acções e palavras, para nol-as tingirem de branco em preto, nem cahir nas garras de ociosos, que vos emprasarão para toda uma tarde de Junho, ou toda uma noite de Dezembro; isento da praga de reformadores velhacos, que são a peor salada que o diabo temperou e mecheu em horas de aborrimento; seguro, emfim, de ser pizado nas ruas por soberbias de quem vos não vale, tremolando-lhe na botoeira do vestido refulgente epigramma de esmalte contra meritos e virtudes, e de noite interrompido na meditação, ou cortado no melhor do somno, pelo retroar de carroagens, que em fluxo e refluxo continuo levam e trazem, sempre a correr para nada, pygmeus histriões da farça séria d’este mundo. «Se algures ficou sobre a terra a Liberdade, que irmana, segura, ennobrece, e concilía os hómens, na montanha encontrareis mais depressa coisa a ella parecida, do que não por estas almotaçadas metrópoles, onde se blasona que ella tem o seu templo, e n’elle as suas festas. Sempre são festas acompanhadas de vinte orgãos, a entoarem solfas diversas ao mesmo tempo: este o _Te Deum_, aquelle o _De profundis_, um o _Quômodo cécidit cívitas plena populo_, outro o _Cantemus Domino_, qual o _Miseremini mei_, qual o _Ecce sacerdos magnus_. «Se alguma vez se incensou presente n’este orbe a Liberdade, derrubaram-n-a do seu pedestal as aguas do diluvio de Noé, quando rojavam cada coisa para seu cabo. Ao que havia de ser cidades, ficou o pedestal razo com o formoso nome d’ella em lettras de oiro. Ao que tinha de ser ermo, pertenceu, mas sem nome nem titulo, a figura quasi inteira. Aqui pregôam-n-a; lá disfrutam-n-a:, assim vai tudo. «E quando não, mettei bem por dentro a mão na consciencia, e, deixado o palavrorio, que não sôa muito senão por ser vazio, como tambor de foliões, dizei me, ou dizei-o a vós mesmos: ¿Quem mais livre, que homem que desperta recobrado ao romper d’alva, por se lhe ter o somno acabado, e não porque ruins pezares lhe repiquem, ou o estremunhem alvoroto de praças, e reboliço de visinhos, pois diante de suas janellas o que só se meneia e conversa são arvores, e por cima do seu tecto não moram senão hervas, que mal ciciam, e só recebem de visitas passarinhos ou borboletas? ¿Quem mais livre? «Acordado, encommenda a Deus o dia novo, veste o que na vespera despiu, sem ter de consultar a ventoinha do figurino, o camareiro, o cabelleireiro, o espelho, o gosto da namorada, o rol das visitas, e dos convites. ¿Quem mais livre? «Talha para si, para sua mulher, para cada um de seus filhos, as occupações de todo o dia. ¿Quem mais livre? «Entre o trabalhar, que lhe grangeia forças, saude, bons somnos, pão, e para conduto um apetite desenganado, entre o trabalhar, repito, canta, ou traz o espirito a monte, a sabor de suas chyméras (que tambem as tem como qualquer outro); e é este o mais invejavel privilegio do trabalho corporal, sobre tudo do que tem por materia prima a terra: não captivar senão os braços; cavando, podando, ceifando, se podem, sem prejuiso da obra, estar armando doiradas torres no ar, ou conversar rasgado e rir com os companheiros, ou cevar em silencio a tristeza que se ama, ou a alegria que se esconde. «Este _deus in nobis_, divindade campestre, em que se pode crer, perguntae, se não será para muitas invejas aos taciturnos enxames que pejam escriptorios e secretarias; perguntae-o a quasi todos os que remam á consciencia o seu remo na galé baloiçosa do Estado. ¿Quem mais livre? «Posto o sol, pregoadas as tréguas das lidas pelo sino das Aves-Marias, o meu rustico se recolhe, sem golilhas de seda ao pescoço, para folgar entre eguaes, em quanto a ceia, bem mercada se lhe acaba de coser ao lume que o aquece. Não tem de ir fazer sala a ninguem; respira a peito cheio; não ha ciar-se de mulher e filhas, que não dá a terra óperas nem bailes; filhas e mulher á roda lhe serôam, tão satisfeitas como elle. Não se levanta ali jogo, que, por tentação ou falso pondonor, o obrigue a pôr n’uma carta o casal, a vergonha, e mais a vida. Não o compellem a ajudar com desatinos seus os alvitristas regedores do mundo em sêcco; nem menos a ouvir ler, n’uma coisa malcheirosa chamada periodico (especie de cogumellos da Imprensa, em que entre os não maleficos tantos ha de sapo), o artigo famoso, no qual, sem quê nem para quê, lhe levantam falsos testemunhos para entretenimento de vadios na hora do chylo. Quem não tem com que incite invejas, seguro está de vis praguentos. ¿Quem, finalmente, mais livre? «Deita-se em cama barata, mas de bons sonhos, com as janellas e portas destrancadas, sem medo a malfeitores, que, sobre não creal-os o sitio, nada reluz na poisada que os attráia. «Entretanto lhe vão caladamente amadurecendo os pães para a tulha, o vinho para a adega, o azeite e os frutos para a dispensa, a hortaliça para a panellinha de barro, as filhas para o casamento, os rapazes para lhe pagarem na velhice a divida da infancia, e elle e sua mulher para o Ceo, onde crêem de fé que os estão seus parentes esperando. «¿Então, será, ou não será, este um viver dez vezes mais livre e afortunado que o nosso? Pois não disse eu d’elle tudo que poderia, nem o direi, ainda que já talvez me hajam de arguir de prolixo, que não deixei na materia udo nem miudo; ¡como se miudos houvera no que são condições de boa ventura! «Se n’isto me dilatei (e confesso que sim) um tanto fóra do meu proposito, foi por ver se dava uma aldrabada de mansinho ao coração de alguns d’estes, que vivem na Côrte por fadario, por vezo, ou por inercia, sempre mal-contentes, pesarosos, abetumados; possuindo, ou podendo, se uma hora olhassem para si, adquirir, sem nenhuma difficuldade, o que eu, e outros taes, tão baldadamente supplicamos á fortuna: uma vivenda campestre, uma existencia natural, serena, commoda, florescente, risonha para a pessoa, dadivosa e exemplar para os visinhos, manancial de riqueza privada e publica, abonadora de bons costumes e de afortunada descendencia; uma existencia, em summa, que a de mais de retemperar corpo, animo e coração, para se n’ella saborearem, até aos renunciados praseres da Cidade refina o gosto, quando por acaso, de longe a longe, e de passagem, se volve a elles.» * * * * * Aqui estão, ó meus morgados do trabalho, ó meus fidalgos da gleba, aqui tendes as minhas ambições, que, de esperança em esperança, e de poiso em poiso, depois de me haverem trazido até aqui, me levarão até aos fins do mundo. Onde quer porém que me ellas conduzam, ou a Providencia m’as realise, ou o meu lidar continue a ser vazio de futuro, sempre entre as minhas saudades vicejará a vossa Ilha; aqui, onde eu, pensando em vós, devaneei os meus mais entranhados devaneios de humanidade, e com tanta fé, que ousei declaral-os, sustental-os, defendel-os; a vossa Ilha, a nossa lustrosa esmeralda engastada na saphira immensa dos mares, e em que o ceo e as terras de longe se estão revendo; a vossa Ilha, este açafate de frutos, onde, se não encontrei o sepulcro ao pé da choupaninha (como desejava), sei que deixo bons amigos, que me defenderão o nome, quando alguem, por não ter acabado de me conhecer, m’o atassalhar. ¡Não depender de mim, como de outros depende, o bemaventural-a! ¡O bemaventural-a era tão facil! a ella, e a todos os dominios d’esta nobre, d’esta memoranda, d’esta desbaratada (mas ainda não perdida) Monarchia; tão facil, tão suave, tão seguro, tão glorioso, tão divino! ¡Dizer que ha pessoas, que teem nos destinos do mundo uma especie de omnipotencia, e que esta lhes não influe nem um vislumbre do amor infinito! Vê-se, e não se acaba de entender. * * * * * Quando um potentado desce os degraus do seu jazigo, ¿que que é o que leva? ¿Os palacios, de que já outros estão tomando posse? ¿Os canticos dos lisonjeiros, que lhe deram costas logo que cessou de assignar graças? ¿Os saccos de oiro, que não cabem por aquella portinha? ¿Os cordões e gran-cruzes, que a mortalha repulsa, porque é séria? ¿Os loiros das victorias, que n’essa hora aterram, porque se vêem claramente suar sangue? Não. Para dentro d’aquelle carcere pomposo, por entre aquelles hombraes estreitos, por onde se entra e se não sai, nada passaria com elle, para derradeiro consolo, senão a claridade das luzes que lá por fóra deixasse accezas, senão os eccos das benções, que para si andasse semeando no semear para os outros felicidade. ¡Oh! ¡quão poucos, quão poucos pezam isto em quanto podem! ¡e quão menos, quão menos ainda, deixarão de o pezar, e ha de pezar-lhes quando já não fôr tempo! * * * * * ¿Quereis vós saber como todo o mundo se faria de repente bemaventurança? Era se Deus ordenasse antecipada, e já agora, a ressurreição dos mais ruins Principes, Ministros, legisladores, chefes de provincias, Prelados, em summa, de todos os perversos ou negligentes maioraes de nações, de povos, de tribus, de hordas, de familias; e, ressuscitados com a experiencia da agonia e sciencias de além-mundo, lhes ordenasse recomeçarem seus governos. Os unicos rostos tristes e pallidos sobre toda a superficie da terra, seriam os d’estes penitentes do poder. Quanto mais Neros, mais Titos; quanto mais Caligulas, mais Trajanos; quanto mais Claudios, mais Aurelios; quanto mais demonios na primeira vida, tanto mais Anjos e Semideuses sahiriam na vida nova. Ó gente esquecida dos outros, e de vós, e de vossos filhos, ó somnambulos que não acordais aos clamores dos povos, e ao estrépito das aldeias que se arruinam, nem ao ranger ameaçador das cidades que apoz ellas se virão a baixo sobre vós, ¿não ha já em vosso coração fibra que não esteja dormente?! ¿nem a do egoismo? ¿Não haverá, com valentia para vós despertar, senão a trombeta do dia ultimo? Lazarones da _pseudo-politica_, vós sonhais estirados ao sol sobre a terra inculta; e essa terra inculta já foi lava; e por baixo d’essa lava ainda rugem vulcões. * * * * * ¡Que dó, não poderem estas vozes de tanta verdade, de tanta lealdade, de tanto e tão entranhado amor, não poderem sahir do colmo rôto do casal! Agora, que tudo é sizudo e meditativo, agora que estas arvores despojadas pregam desenganos, agora que o rugir das folhas sêccas sob os pés agoira vaidades, agora que o anno expirando induz a deitar contas, agora que o seculo termina a sua primeira metade, estes cincoenta annos tão de sangue e de cinzas, para poderem fecundar os cincoenta que ainda lhe restam, ¡não poderem agora estas vozes tão benévolas, ser tomadas por algum dos Seraphins, que de noite espalham em segredo os bons conselhos, para irem ser depostas de mansinho onde ha forças de sobejo para milagres!... ¿Essa gente não verá estrellas lá por cima? ¿Voarão tanto as suas carroagens, que lhes não deixem perceber a fome que gira pelas ruas? O vinho, que lhes jorra de crystaes doirados em seus festins, os frutos que lhes rescendem em prataria lavrada, ¿nunca lhes trariam á lembrança o pobresinho do rustico, de quem tudo isso, e tudo, lhes veio, e que Deus sabe se tem pão para o filhito que desmama? Deixal-os lá... A Providencia os fará seus quando fôr tempo. ¿Quem sabe se elevados a poderosos vós e eu valeriamos mais do que elles? Parece-me que as almas são n’isto como as arvores: as mais agigantadas estão nos valles infimos; quanto mais costa acima pelas serranias, tanto mais se apoucam. Segredos do Altissimo, não os havemos nós de julgar. Dêmos-lhe graças de termos nascido na planicie. * * * * * De mim sei eu que, se não tenho feito nenhum bem aos meus semelhantes, não é á mingua de muito bons desejos; d’estes, quando são verdadeiros, e se provam, pode um homem, sem pejo, gloriar-se. Mas hoje comvosco só quero falar do que hei desejado em vossa mesma terra; e não é tanto por vangloria (ainda que talvez poderá esta andar tambem ahi sem o eu cuidar), como que para estes pontos aqui recordados á pressa, em forma de testamento nuncupativo, se reconsiderem, e os que parecerem de préstimo se levem por diante. ¡Como eu não applaudirei lá ao longe cada nova de progresso da vossa Ilha! No Prologo do vosso _Agricultor_ escrevia eu, se vos recordais, estas palavras: «Sizudamente discutimos comnosco, se os intereses moraes haviam de ser tambem aqui representados, como em a nossa _Revista Universal_; e entendemos como a Sociedade, que sim, mas que só fosse de longe a longe. Dentro na fazenda está a casa; dentro na casa o colono, e dentro no colono espirito e coração. «A Natureza, com a necessidade do trabalho, para que se vivesse, creou a necessidade de repoiso, para que se meditasse. A Religião, sobre cada seis dias de servir, impôz, como corôa, um de cantos, de preces, e de amor. O exercicio do animo e do corpo mutuamente se aliviam. «A virtude e o prazer, a moral e a litteratura, poderão vir nas boas horas, alguma vez, semear de boninas suas estas paginas tambem suas. ¿E por que não? Deus, que fez as arvores, madeiras, cortiça, frutos, resinas, oleos, gommas, cera, farinhas, pão vestidos, medicamentos, ¿não lhes disse tambem--Verdejae, flori, espalhae sombras como tendas, murmurios como harpas, fragrancias e delicias como noivas? ¿E não lhes disse sobre tudo--Apontae sempre com os vossos braços dadivosos para o meu Ceo?» ¿Ora não procurei eu preencher tal promettido durante os dois annos que então começaram e findam hoje? A par com as propostas de culturas e creações uteis, de introducção ou aperfeiçoamento de industrias faceis, da inauguração d’um Conselho agronómico, etc. ¿não pugnei com ardor pela Instrucção primaria, pela Educação moral, pelas festas civilisadoras, pelos premios e animações aos meritos, pela rehabilitação do Clero e das mulheres, pela abolição do tributo de sangue, pelo aperto dos laços das familias e dos cidadãos, pela substituição da verdade franca e honrada ás ficções e cavillações da pseudo-politica, pelo aperfeiçoamento do homem em todos os sentidos? Com documentos o provo, e ninguem com documentos m’o negaria. * * * * * Mas as minhas diligencias não pararam em alvitramentos; até onde se podia, sem os grandes meios externos, fui eu. Confederámo-nos, os sollicitos; fundou-se e prosperou uma Sociedade de Amigos das Lettras e Artes, foco e excitamento de convivencia, de trabalho, de instrucção; d’ella brotaram escolas variadas, festas, exposições; tres fontinhas, todas preciosas, de ulteriores progessos, e que, até como exemplo, teem já sido proveitosas. A vossa villa da Ribeira-grande lá está com brilhantes serões musicos e escolas primarias. Ha-as na villa de Alagôa; ha-as nascidas n’outras partes, e em quasi todas estão despontando. Na vossa terra organisei um novo systema de leitura facillimo, já approvado para todo o Reino. N’ella compuz um novo Tratado de versificação e poetica, tambem já approvado para o mesmo fim. N’ella, um de Mnemonica. Tres livros elementares, não sem prestimo. Da Poesia abri curso, de que sahiram dois poetas lyricos de esperanças; e outro curso do mesmo haveriam as damas tido se o quizessem; offereci-lh’o. Offereci-me tambem ao ensino rapido do Latim e Portuguez ao mesmo tempo; se não acudiram alumnos, não foi minha a culpa. Como invite ao foragido espirito de sociabilidade espancado pelas ruins _politicas_, tentei um jornal litterario e poetico para os domingos e para as salas, _A Sereia_; tambem lhe não deram a mão, e ahi se mallogrou. Introduzi a Gravura em madeira. Tentei a Lithographia. Fiz dar, talvez, um passo de adiantamento á Typographia. Expertei em alguns mancebos d’alma o amor do Bello e do Bom; por onde espero que as novas escolas que elles vos regem, com fervor exemplar e fanatismo santo, se hão-de arraigar e permanecer. Commetti o que em terras portuguezas se não commettêra: applicar a Poesia e a Musica, d’antes só desbaratadas em amores e vaidades, a concitar os espiritos para coisas serias e uteis; d’ahi, o _Hymno do trabalho_, o _da Infancia nos estudos_, e o _dos Lavradores_. Obtive da amisade de um dos nossos primeiros medicos um curso popular de Hygiene. Provoquei a creação de um Conselho industrial, que acudisse com o fruto dos seus estudos ás consultas dos mechanicos indoutos. Sollicitei a formação, ainda pendente, de um estabelecimento mixto de Caixa economica, Banco industrial, e Monte-pio. Acceitei o Commissariado dos Estudos n’esta Ilha, sem interesse, antes com dispendio de fazenda e tempo, pelo mero empenho de apressar a Instrucção, antepondo aos methodos e praxes tradicionaes, methodos e praxes mais do seculo; agra tarefa, de que eu não houvera aberto mão, se barbara e ingratamente m’a não houvessem pago, logo ao principio, com desgostos. Finalmente, puz peito a que a verdadeira mola real de todos os desejaveis e possiveis beneficios, a nobre Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes, assegurasse a sua duração. Requereu-se chão nacional, onde, por generosos donativos da Sociedade e da Ilha, se edificasse e dotasse um magnifico solar de Artes e Lettras; requerimento que eu acompanhei incançavel, e em cujo favor, porque era em favor da civilisação, invoquei, e continuo a invocar, Ceos e Terra. ¡Oxalá o defiram, antes que as vontades aqui se descoroçôem e percam totalmente! Mais tarde... poderão semear n’esse chão aveia ou luzerna, ou deixarem-n’o para escalracho e cardos; dará tudo, menos instrucção. Felizmente, deixei-lhe na Côrte protectores intelligentes, zelosos, e de valimento; ainda restam esperanças. Com esse palacio, se se chega a levantar, espaçoso, commodo, claro, ridente, pintado, ornado, ajardinado, alegre por todas as janellas, convidativo por todas as portas, bondoso e dadivoso em todos os recantos, com aulas de Religião e moral, de escrita, de leitura, de contas, de geometria, de desenho, de pintura, de linguas, de historia, de geographia, de musica, de dança, de hygiene, de civilidade, com theatro para declamação, baile, e opera, com sala para saraus, com basar para productos artisticos, com vergel e sombras para passeio e exercicios gymnasticos, com museu e bibliotheca para estudiosos, ¿quem não vê que haverá ali uma irresistivel attracção para todos os Socios, a qual, junta á ideia do proveito commum e publico, e á diminuição ou cessação de prestações continuas, pela preexistencia de um capital seguro e sufficiente, os trará perennemente reunidos e gostosos? É por isso que, se hoje nos chegasse a boa nova de se nos haver outorgado aquelle solo, hoje mesmo começariamos a mendigar como Religiosos, para as obras da nossa Terra-santa. Amanhan lhe estariamos, por nossas proprias mãos, uns cavando os alicerces, outros acarretando as achêgas, outros cortando as madeiras, outros serrando ao som do Hymno do trabalho. O Prelado, nosso consocio, cedendo ao nosso convite, e ao de sua consciencia, viria ao primeiro alvor da madrugada abençoar o chão; as autoridades, lançar nos fundamentos as primeiras pedras; as damas e os meninos, flores. Com taes estreias, a edificação pularia por entre cantos, todo o dia á luz do sol, toda a noite á dos archotes. S. Miguel em poucos mezes teria para amostrar a todo o mundo um monumento. Teria; e ha-de ter, ou de todo é morta já a alma nas terras de Portugal. Orae, meus amigos, orae, para que não caia mais essa vergonha em nossa edade. * * * * * E agora, que vos hei deixado tudo quanto me restava, que eram votos e preces pela vossa prosperidade, a que eu já não hei de assistir senão em espirito, agora vos abraço; e com a fronte inclinada sobre as trevas do destino, quando eram bem horas de repousar, recomeço a peregrinação. Dezembro de 1849 NOTAS DO AUTOR I Pag. 03.--=Abolição do Exercito= A pequena dissertação, que se leu sob este titulo, acerca da verdadeira, urgente, urgentissima e indeclinavel necessidade de supprimirmos a força armada, tal como entre nós existe, sahiu a lume a 20 de Novembro de 1849. Na Ordem do Exercito n.º 3, datada de 9 de Janeiro d’este anno de 1850 vemos, se não reformas radicaes e absolutas, quaes as pediramos, e as pede já de muito a consciencia publica, pelo menos o annuncio de uma economia. Ahi se lê a pagina 6: «Pelo orçamento que acompanha o Plano se observará que, comparado o quadro legal do Exercito, com o proposto, ha uma differença a favor da Fazenda Publica de réis 193:719$425.» Estas palavras, quando mais nada fossem que palavras, seriam ainda, como são, uma solemne homenagem tributada pelo Poder á grande e salvadora verdade que defendemos. II Pag. 129, lin. 18--=Ilha, açafate de frutos, onde, se não encontrei o sepulcro ao pé da choupaninha, como desejava, sei que deixo bons amigos.= Estas palavras postas no ultimo Serão do casal, em que eu dava a S. Miguel a despedida, traziam a proposito de _Amigos_ o seguinte em nota, que eu tomára republicar em milhões de exemplares: Provadamente sei que os tenho. Descompassada sahiria a nota, se n’ella os houvesse de nomear com as devidas explicações; testemunho é esse, que fica reservado para outra parte, e mais accommodada conjunctura. Duas memorias porém não posso eu deixar de antecipar já aqui, por conterem exemplo moral, sempre raro, e hoje rarissimo. O sr. Joaquim José de Oliveira, natural da villa da Figueira, em Portugal, negociante ha annos estabelecido n’esta cidade, pessoa que eu não conhecia, e que nem o meu nome ouvira nunca, dois dias após, o meu desembarque teve a bondade de me mandar offerecer, com grandes instancias para que acceitasse, uma linda vivenda sua, no sitio da Fontinha, de que desejava me servisse todo o tempo que permanecesse n’esta Ilha; accrescentando que, pois me achava em terra alheia, e para o diante, ou já então, poderia carecer de alguma coisa, com muito gosto punha a sua bolsa á minha disposição, rogando-me que nos apuros a preferisse a qualquer outra. Não lhe acceitei as casas; ficou magoado. Veio occasião de me ser indispensavel um emprestimo, por se me haver aqui represado o pagamento da minha pensão, achei-o promptissimo; excedendo quasi sempre a cifra das suas remessas á das minhas requisições. Se não sou já hoje seu devedor pecuniario, folgo de confessar diante do mundo, que em affecto e admiração o haverei sempre por meu crédor. Ainda agora, havendo sabido da minha resolução de passar á America, mandou offerecer-me, para me transportar com toda a minha familia, o brigue que traz n’essa carreira. Ha homens, a quem se gosta de ser obrigado; o sr. Oliveira é um d’esses poucos. Do segundo exemplo, só me é licito dizer, que em nada cede a este primeiro em galhardia. É um homem extraordinario, que, depois de me haver estendido mão de verdadeiro amigo, em mais de um lance apertado e terrivel, me obrigou, por minha palavra, a lhe não descobrir o nome. É uma gratidão, que, por não a poder desabafar, me queima por dentro de dia e de noite. Nas minhas memorias posthumas me vingarei; pois só me obriguei ao silencio durante a vida. Estes dois factos são brilhantes; mas se os meus leitores vissem as contraposições escuras que os fazem resahir!... Aquelles, a quem esta nota, por nimio pessoal, fôr tediosa, lembrem-se de que era esta por ventura a ultima occasião, que eu tinha, para consignar actos, que illustram e edificam, e que eu, sob pena de infamia, não podia deixar occultos. Além d’isso, como a desfortuna (que não o talento) me tem feito mais conhecido do que seria rasão, e alguns biographos por esse mundo me teem feito a desmerecida honra de me historiar a vida, quiz deixar-lhes assim, com que intercalarem n’ella a pagina mais util e bella de quantas até agora me lá teem posto. O povo mais feliz, diz Montesquieu, é aquelle cuja historia enfastia; grande verdade, que se pode applicar aos individuos. Os infortunios e trabalhos são os que mais captivam as attenções. A minha historia completa seria já hoje mais interessante que a do pobre Camões. Resta aguardar-lhe o fim. Segue-se o quinto e ultimo acto do meu drama. III Pag. 133, lin. 24.--=A Natureza, com a necessidade do trabalho, para que se vivesse, creou a necessidade do repoiso para que se meditasse. A Religião, sobre cada seis dias de servir, impoz, como corôa, um de cantos, de preces, e de amor. O exercicio do animo e do corpo mutuamente se alliviam.= Os economistas em todos os seus calculos parecem transcurar o elemento _alma_. Os moralistas quasi que outro tanto fazem a respeito do elemento _corpo_. O artista crê na lyra, e ri dos algarismos. O financeiro jura pelos calculos, e escarnece dos deleites ideaes. No congresso de todos está a razão, e só parte d’ella em cada um. Os individuos, que pensem, falem, e obrem, cada qual no sentido de sua vocação; d’essa discordia é que resulta a harmonia. Os Governos porém, sob pena de degenerarem de agentes providenciaes em usurpadores, em assoladores, em antichristos politicos, não podem dispensar-se de promover simultanea e egualmente todas as forças dispartidas pela Natureza ao genero humano: a lavoira, como a poesia; a musica, como a mechanica; o commercio, como a oração; o theatro, como as escolas. «Não só de pão vive o homem»--tinha dito o Divino Philosopho Nazareno. Este principio de toda a sociabilidade é para mim Evangelho desde muito. Nos quatro annos que redigi a _Revista Universa Lisbonense_, não passou um dia, que não pugnasse em favor do espirito, do coração, e das commodidades corporaes; o mesmo credo tenho conservado nos escritos, e um pouco tambem nas obras, desde que desembarquei n’esta Ilha; e outro tanto póde ser que faria ainda, se para a Cafraria me arremeçasse a fortuna. Este livro, e o outro meu livro do _Camões_, sommados e completando-se um pelo outro, explicam e documentam o que allego. No _Camões_, e nas vinte notas que o seguem, a religião da Poesia; na _Felicidade pela Agricultura_, a prosperidade do viver principalmente. Conclusão Hoje, 22 de Fevereiro de 1850 se acaba de imprimir este livro, assim como o meu estudo historico-poetico intitulado _Camões_. Um e outro como eu lá noto, e pela razão que lá dou, vão múi diminutos do que poderam ser. A disposição de animo com que os termino, differe tanto da disposição de animo com que os encetei, como da manhan a noite. N’um e n’outro suppliquei, de mãos postas e longamente, a Deus e aos homens, venturas para a minha terra; e não as tivera implorado assim, se não as reputasse mui possiveis. Agora, tantos desenganos me rebentaram a subitas debaixo dos pés, que já nem para ella peço nada, nem espero, nem mesmo sei se o desejo. Tapam-me a bocca com a esponja de fel e vinagre; e, só porque amei, alanceiam-me o peito ¡Fartar, phariseus, fartar! Correndo por alto as paginas que atraz ficam, vejo verdades uteis confessadas com brio, delirios generosos, abnegação de personalidade, fanatismo de affecto para com o genero humano, rancor para com os especuladores da politica, aversão, desprezo, nojo, para com os mesquinhos, que apagariam o sol de Deus a seus irmãos, se o podessem. Nada mais, nada mais descortino por todas essas paginas. Se alguma vez pareci desabrido, e por isso contradictorio comigo mesmo, relevem a um filho do pó um longe do que o _Filho de Deus_ executou por sua mão sobre as espaldas dos profanadores do seu Templo. ¿E não é templo a felicidade publica, e de todos os templos o mais augusto? Mais haviam de fazer do que revelar-m’o; haviam de m’o louvar, se bem conhecessem a villanagem, que ha perto de tres annos me anda estorvando, empecendo, perseguindo nas trevas com uivos e latidos... A final, sempre alcançaram o que elles teem por victoria, pois a muitos, e a mim tambem, mataram a fé e a esperança... Por minha parte, receio ter emmudecido para sempre. O meu testamento de Portuguez, de Homem, e de Christão, aqui o cérro. Possam almas de bem, lá para o anno de 1900, acceitar-m’o a beneficio de inventario. INDICE N. B.--A numeração romana designa o tomo; a arábiga, a pagina. A =Açoriano (O)=--Periodico de Ponta Delgada, I, 149 =Administradores= de concelho, governadores civis e bispos, devem proteger as sociedades agricolas, I, 48 =Affonso Henriques (El-Rei D.)=--O seu sceptro guerreiro perdeu-se, I, 77 =Agostinho (Santo)=--Refutação do seu anathema contra os deuses da antiga mythologia, I, 23 =Agricultor (O) Michaelense=--N’esse jornal sahiu esta obra em 1.ª edição, I, 11 =Agricultura=--Sua nobreza e utilidade, I, 15 Mãe das industrias, dos exercitos, das armadas, I, 16, 17 A ella se deve o papel, a penna, a impressão d’este livro, I, 18 Se a supprimissem morria a Humanidade, mãe dos povos, das industrias, e do commercio, I, 19 Filha primogenita de Deus. Sua uberdade inexhaurivel, I, 20 Deve ser a verdadeira politica de Portugal, I, 38 Fundação necessaria de um Ministerio dos Negocios da Agricultura, I, 56 Quanto lucraria com a abolição do exercito, I, 58 =Agricultura=--Vide _Associações de Agricultura_. =Alleluias (Procissão das)=--Festas altamente poeticas do Christianismo, I, 26 =Allemanha=--Florescencia das suas escolas dominicaes, II, 50 =Alma=--Tambem (como o corpo) morre á mingua de alimento, II, 61 =Amigos das Lettras e Artes=--Vide _Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes_. =Angelica=--Mulher accusada de assassina. Conta-se o seu processo em Ponta Delgada, II, 25 =Arithmetica=--Em coisas moraes, é muita vez erronea, I, 85 =Artigo= no «Diario do Governo», de 7 de maio de 1849 sobre a Sociedade dos Amigos das Lettras, I, 180 =Arvore=--Para o pagão foi Nympha; para a Sciencia é um microcosmo de maravilhas, I, 29 =Associação=--É a mãe dos prodigios, I, 66 =Associações agricolas=--Quanto podem em bem do camponez, I, 34 Como se podem formar, I, 46 =Autoridades=--Quanto podem, pela exhortação, ajudar os progressos da instrução, II, 56 B =Bakes=--Cita-se, II, 50 =Barão Thénard=--Cita-se o seu relatorio de 1845 sobre a exposição industrial parisiense, I, 69 =Barbosa=--Vide _Vilhena Barbosa (Ignacio de)_. =Baroneza de Stael=--Menciona-se, I, 30 =Bentham (Jeremias)=--Cita-se, I, 30 =Biblia=--N’elle se acham a cada passo pinturas da vida rustica, I, 21 =Bispos=--Como presidirão ao seu clero, I, 99 e seg. =Bispos=, governadores civis e administradores de concelho, devem proteger as sociedades agricolas, I, 48 C =Camões=--Cita-se uma oitava dos _Lusiadas_, I, 143 Citam-se dois versos seus, I, 149 =Campo=--É um grande consolador para os dissabores da alma, I, 128 É o centro de unidade da especie humana, I, 136 =Campo e cidade=--Sua fraternisação, I, 123 =Camponezes=--Como as sociedades agricolas os podem civilisar e melhorar, I, 35 =Campos=--Povoados de deuses indigetes pelas mais antigas nações, I, 23 N’elles nasceu a Poesia, I, 135 =Canto=--Quanto ajuda o ensino em commum, II, 51 =Canto= (=José do=)--Menção de uma sua proposta sobre bancos ruraes, I, 63 =Carta= de Castilho ao jornal «A Verdade», I, 183 =Castigos aos= remissos em mandarem os filhos á escola, II, 57 =Christianismo=--Como as suas crenças consagraram os trabalhos campestres, I, 26 =Cidade e campo=--Sua fraternisação, I, 123 =Cidades=--São filhas do campo, I, 16 Nada mais nobre do que ellas, depois dos campos, I, 19 =Civilisação geral=--Onde e como se escuta o seu crescer, II, 43, 44 Tudo conspira para ella; bons e maus, sabios e ignorantes, II, 61 =Clero catholico=--É de instituição divina, I, 94 Sua apologia, I, 95 A pouca competencia de alguns dos seus membros não prejudica a venerabilidade d’essa instituição, I, 95 Deveria ser de eleição popular confirmada pela Santa Sé, I, 97 Quadro dos beneficios que pode espalhar como civilisador do Povo, I, 101 =Colloquios aldeões=--Traducção portugueza dos _Entretiens de village_, de Cormenim, II, 85 =Colombo= (=Christovão=)--Era um só contra toda uma armada, I, 85 =Commissarios de instrucção=, volantes, II, 48 =Conde Alfredo de Vigny=--Cita-se o seu livro _Grandeur et servitude militaire_, II, 103 =Congressos scientificos=--Quanto são uteis, I, 87 =Constituição=--De algum dos seus artigos descrê o autor, I, 12 =Cormenin=--Vide _Visconde de Cormenin_. =Correio= (=O=)--Periodico de Ponta Delgada. Menciona-se, I, 149 =Côrtes agricolas=, I, 73 Sua utilidade, II, 10 =Costa de Sousa de Macedo= (=D. Pedro da=)--Governador civil de Ponta Delgada, I, 149 Menção honrosissima do seu serviço no districto, I, 155 =Cursos= de varias disciplinas, regidos periodicamente de terra em terra, II, 50 D =Dalhunty=--Vide _Vidal Dalhunty_. =Delille=--Menciona-se, I, 30 =Deputados= ás Côrtes agricolas. Quadro ideal d’esses homens bons e sinceros, I, 87 =Despedida= do autor á Ilha de S. Miguel, II, 119 =Deuses campestres=--Bemfeitores invisiveis dos lavradores, I, 24 =Deuses da gentilidade=--Foram consagrações mythologicas de grandes bemfeitores da Humanidade, I, 23 =Diario do Governo=--Menção, I, 149 =Diniz= (=El-Rei D.=)--O seu sceptro lavrador deve resuscitar hoje, I, 77 E =Edade de oiro=, I, 135 =Egypto=--Ahi a classe sacerdotal monopolisava o saber, II, 41 =Eleições=--Taes como hoje se praticam, são inuteis e illusorias, I, 79 =Ensinar=--Deliciosa occupação, II, 69 =Escolas ambulantes= para os povoados pequenos, II, 49 =Escolas dominicaes=--Sua utilidade no campo, II, 49 =Escolas femininas=--Sua alta importancia e significação, II, 51 =Escolas normaes=--Devem-se crear, II, 47 =Escolas particulares= regidas officiosamente por homens generosos, II, 54 =Escolas primarias= fixas; sua creação, II, 47 =Escrever e ler=--Apologia d’essas artes, I, 113 =Estados Unidos=--Nas suas escolas dominicaes os discipulos passam de um milhão, II, 50 =Exercito=--Devora o succo vital do paiz, I, 57 É um mal complexo de muitos males, II, 96 Ou é para conquista, ou para defensa, ou para tranquilidade interna, II, 97 Propõe-se a sua aboliçao, II, 106 e seg. =Exposição= da Industria michaelense em 1848 e 49, I, 160 F =Familia cidadan=--Quadro da sua abalada para o campo, I, 124 =Feitiçaria e homicidio=--Caso triste acontecido em S. Miguel, II, 25 =Felice=--Cita-se esse autor, II, 98 =Felicidade= do Povo é a felicidade dos seus governantes, I, 90 =Felicidade publica=--Procura-a cada um por um caminho diverso, II, 93 =Frades=--Foram expulsos do claustro para a fome, I, 58 =Fradesso da Silveira= (=João Maria=)--Cita-se um seu artigo, II, 105 =Franklin= (=Benjamim=)--Cita se um facto da sua vida, II, 14 =Franzini= (=Marino Miguel=)--Menciona-se, I, 149 G =Galileu=--Era um só contra a opinião de todo o mundo, I, 85 =Gessner=--Menciona-se, I, 27 =Governadores= civis, bispos e administradores de concelho devem proteger as sociedades agricolas, I, 48 =Grande= (=Dr. José Maria=)--Antigo amigo do autor; bosquejo do seu retrato moral e intellectual, II, 12 Menciona-se o seu livro Manual do cultivador, II, 11 e 13 =Gregorio (S.) Nazianzeno=--Citam-se palavras suas, I, 97 =Guarda Nacional=--Propõe-se, em vez do Exercito permanente, II, 112 =Guia e manual do cultivador=--Bom livro, II, 11 H =Historia=--É mestra da vida, I, 115 =Homero=--Nas suas obras se acham a cada passo pinturas da vida rustica, I, 21 =Homero e Moisés=--São mananciaes de pensamentos poeticos, I, 136 =Homicidio e feitiçaria=--Caso triste acontecido em S. Miguel, II, 25 =Hymno de Santa Cecilia=--Poesia de Castilho, I, 170 =Hymno dos lavradores=--Poesia de Castilho, II, 18 =Hymno do trabalho=--Poesia de Castilho. Considerações a seu respeito, I, 164 I =Ignorancia=--Foi a causa de um triste caso de feitiçaria e homicidio succedido em S. Miguel, II, 31 É a mãe, a avó, e a ama de quasi todos os males, II, 39 =Imprensa=--Como pode auxiliar a civilisação publica, I, 45 =Inglaterra=--Conta mais de treze mil escolas dominicaes, II, 50 =Instrucção=--Pode tornar-nos poderosos, I, 13 É a hygiene da alma, II, 52 A Lei deve tornal-a obrigatoria, II, 34 =Invocação a Deus= antes de começar o estudo. Poesia de Castilho, I, 169 J =Jornalismo= que não for missionario do progresso é um mal, I, 46 =José= (=El-Rei D.=)--O seu sceptro perdeu-se, I, 77 K =Klopstock=--Grande poeta. Menciona-se, I, 27 L =Lei=--Deve haver uma que obrigue os cidadãos a receberem instrucção, II, 34 =Leis=--Devem fazer-se efficazes para obrigar o Povo a instruir-se, II, 46 =Leite= (=Luiz Filippe=)--Cita-se o seu livro _Supposições que podem ser realidades_, II, 102 =Leite= (=Pedro de Alcântara=)--Menciona-se, I, 162 =Leituras=--Seu agrado para os ouvintes, II, 79 =Leituras publicas= de livros bons para o Povo, II, 79 Praticadas de Gregos e Romanos, II, 81 D’onde deverão vir os livros para ellas, e quaes, II, 83, 84 =Ler=--Agradavel e nobre exercicio para quem lê em publico livros bons, II, 80 =Ler e escrever=--Apologia d’essas artes, I, 113 =Liberdade de ensino=--O autor não é d’ella partidario, II, 54 Cita-se um artigo da _Revista Universal_ sobre o assumpto, I, 55 =Liga= promotora dos interesses materiaes em 1849. Segundo o autor, não bastava para o fim que se propunha, I, 63 =Lisboa=--Para esta cidade parte Castilho, de S. Miguel, a 21 de fevereiro de 1849, I, 147 D’esta cidade sai Castilho, chegando a S. Miguel em 24 de Maio do dito anno, I, 147 =Livro= (=Este=)--Desleixo da sua forma, confessado pelo autor, I, 14 =Luxo=--Devora muitas forças de Portugal, I, 62 M =Macedo=--Vide _Costa de Sousa de Macedo_ (_D. Pedro da_). =Madeirense=--Periodico do Funchal.--Menciona-se, I, 33 =Magalhães Mexia Saleme=--Vide _Sande de Magalhães_. =Maio de 1849= passado pelo autor em Lisboa, II, 6 =Mancebo= inglez moribundo; é salvo pelo campo, I, 74 =Mancebos= enviados lá fóra a estudar agricultura, viriam depois evangelisal-a em Portugal, I, 68 =Manual= do cultivador, II, 11 =Manuel= (=El-Rei D.=)--O seu sceptro opulento perdeu-se, I, 77 =Memorial= de Castilho á Camara dos Deputados, I, 179 =Mestre=--É um verdadeiro medico moral, II, 78 =Mestres= de primeiras lettras. São verdadeiros curas d’almas, II, 66 =Methodo de leitura= inventado pelo autor. Menciona-se, II, 72 =Methodos de ensino=--Premios para elles, II, 47 =Mexia Salema=--Vide _Sande de Magalhães Mexia Salema_. =Ministerio dos Negocios da Agricultura=--Propõe-se a sua fundação, I, 56 =Ministerio dos Negocios da Guerra=--Seu orçamento. Examina-se, II, 99 =Ministerio dos Negocios da Instrucção Publica=--Deve crear-se a par do de Agricultura, II, 46 =Missionarios=--Com a cantoria auxiliavam muito os seus prosélytos religiosos, II, 51 =Moisés e Homero=--São mananciaes de ideias poeticas, I, 136 =Moraes Pereira= (=João Luiz de=)--Autor da musica do _Hymno do trabalho_, I, 164 Menciona-se, I, 171 =Moralidade=--Pode contribuir muito para a união da familia portugueza, I, 13 =Mulher=--A instrucção d’ella tem as mais elevadas vantagens sociaes, II, 51 Escravidão em que a opprimem os codigos em todo o mundo, I, 105 A civilisação moderna ainda a não emancipou, I, 107 Pede-se para ella uma justa alforria, I, 109 Advoga-se para ella o direito de suffragio, I, 110 Podem ser Rainhas, e não podem ser votantes? Absurdo, I, 111 =Musica e Poesia=--O que podem a bem da civilisação popular, II, 18 N =Natal de 1849=--Artigo religioso, II, 115 =Nogueira=--Vide _Sá Nogueira (Ayres de)_. O =Ordem do Arado=--Propõe-se esse galardão aos promotores da Agricultura, I, 71 =Ovidio=--Citam-se palavras suas, I, 77 Rapido quadro da sua personalidade social e poetica, I, 136 Amostra do seu poema _Os Fastos_, I, 139 Introito do Livro IV dos _Fastos_, I, 145 P =Papel=--Sua missão civilisadora como vehiculo das ideias, I, 113 =Parlamento=--Deve conter a representação de todas as classes, mas em maioria a dos lavradores, I, 84 Ha-de emancipar a mulher portugueza, I, 109 =Parlamento agricola=--Quadro ideal d’essa nobre corporação, I, 78 Deve fazer Leis que obriguem o Povo a instruir-se, II, 35 =Particulares=--Como podem promover e auxiliar a instauracão de escolas, II, 67 =Patria portuguesa=--Sua actual decadencia, I, 73 =Patriarchas= da antiga Lei. Distribuiam justiça no meio da Natureza, I, 21 =Penélope=--Tecia e destecia. Assim é a Politica, II, 60 =Pereira=--Vide _Moraes Pereira_. =Pharol= (=O=)--Periodico de Lisboa em 1849, I, 189 Artigo seu acerca de Castilho, I, 190 =Plinio, o moço=--Romano bom e benefico. Cita-se uma sua carta, II, 71 =Poesia=--Nasceu nos campos, I, 135 =Poesia e Musica=--O que podem a bem da civilisação popular, II, 8 =Politica=--A maior das politicas deve ser para Portugal a Agricultura, I, 38 O autor não faz politica no sentido estreito da palavra. Sua profissão de fé, I, 41 O que é politica no mau sentido da palavra, I, 119 A politica não faz senão tecer e destecer como Penélope, II, 60 =Povo portuguez=--Pode renascer pela Agricultura, I, 42 =Premios= para os que promoverem por qualquer forma a Agricultura, I, 67 =Premios= de livros aos rapazes estudiosos, II, 56 =Presbyterio (O) da montanha=--Extratos do prologo d’esse poema de Castilho, II, 122 e seg =Prisões=--Como se podem melhorar com a instrucção ministrada n’ellas, II, 52, 53, 54 =Professores=--Devem receber salario condigno da sua faina, II, 47 =Propriedade=--Não é direito natural, mas é direito, I, 120 =Proprietarios=--Deveriam ser obrigados por Lei a residencia temporaria nos seus dominios rusticos, I, 122 Q =Quintas exemplares=--Sua creação, I, 67 R =Recruta=--Abala da casa paterna para o Exercito, II, 101 =Rei=--Lucra com uma exacta representação nacional, I, 87 =Reis=--Não são as espadas que os defendem, mas sim as luzes da instrucção geral, II, 58 =Representação nacional=--Tal como se pratica hoje é chimerica, I, 80 =Requerimento= de Castilho á Camara dos Deputados, I, 174 =Revista Universal Lisbonense=--Cita-se esse periodico, I, 149 =Revoluções=--Não as fazem os livros, mas os actos dos governantes, I, 12 O autor não as ama, I, 12 =Ribeiro= (=José Silvestre=)--Dedicatoria do Livro a elle, I, 9 Menciona-se, I, 149 =Ribeiro de Sá= (=Sebastião José=)--Carta de Castilho a elle, I, 150 Outra I, 153 Cita-se o seu romance _O preso_, II, 53 =Ricos=--Quanto lhes seria facil felicitar os camponezes, I, 30 =Robinson Suisso=--Admiravel obra deleitosa e instructiva, II, 86 =Rogações de Maio=--Festas poeticas do Christianismo, I, 26 =Romanos=--Quanto prezavam a Agricultura, I, 22 =Rosseir=--Vide _Smith Rossier_. S =Sá=--Vide _Ribeiro de Sá_. =Sá Nogueira= (=Ayres de=)--Presidente da Liga promotora dos interesses materiaes, I, 63 =Saber=--Foi monopolisado antigamente por certas classes. Hoje é democratico, II, 41 A Providencia a pouco e pouco o foi infiltrando em todas as camadas sociaes, II, 42 =Sacerdocio=--Vide _Clero_. =Saint Pierre= (=Bernardino de=)--Cita-se o seu livro _Etudes de la Nature_, II, 111 =Salema=--Vide _Sande de Magalhães Mexia Salema_. =Salomão=--Menciona-se, I, 30 =Sancho I= (=El-Rei D.=)--O seu sceptro povoador deve hoje reviver, I, 77 =Sande de Magalhães Mexia Salema=--João de, I, 149 Discurso seu na Camara dos Deputados, I, 177 =Sciencia=--Como consegue poetisar a Natureza, I, 27 Teem-n-a combatido alguns ruins engenho, II, 40 Quanto auxilia e desenvolve a intelligencia, I, 116 =Sementeiras= (=Festa das=)--Fragmentos do poema _Os Fastos_, I, 139 =Serviços= de Castilho á Ilha de S. Miguel, II, 134 e seg. =Silveira=--Vide _Fradesso da Silveira_ (_João Maria_). =Smith Rossier= (=D. Carolina=)--Autora da melodia da _Invocação a Deus_, I, 169 =Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes=--Noticias a seu respeito, I, 147 Desejou a concessão de um terreno em Ponta Delgada, I, 147 Menção de commettimentos seus, I, 159 e seg. Foi muito contrariada na propria ilha, II, 8 Seus serviços, II, 77 =Sociedade promotora da Agricultura michaelense=--Como nasceu, e que produziu, I, 34 Foi imitada no Reino por outras sociedades, II, 11 Confere uma medalha de oiro ao _Manual do Cultivador_, II, 15 Festeja o dia de Santo Antonio em 1849, II, 17 Seus serviços, II, 77 =Sociedades agricolas=--Vão-se creando no Reino, I, 37 Rapido desenho da sua constituição e do seu mechanismo, I, 49 Sociedades mães e sociedades filhas, I, 54 Lembranças varias a seu respeito, I, 66 =Soldados=--O que são, II, 96 Deveriam ser transformados em forças vivas, para a Agricultura, I, 58 =Sousa de Macedo=--Vide _Costa de Sousa de Macedo_ (_D. Pedro da_). =Stael=--Vide _Baroneza de Stael_. T =Tasso= (=Torquato=)--Cita-se um trecho do seu poema Jerusalem, II, 107 =Término=--Fragmento dos _Fastos_ de Ovidio, I, 141 =Terra=--Pode enriquecer-nos, I, 13 Não ha direito para a deixarmos improductiva, I, 121 =Thénard=--Vide _Barão Thénard_. =Timon=--Vide _Visconde de Cormenin_. =Trabalho=--Castigo da desobediencia do primeiro homem, I, 26 =Tributos=--São uma necessidade, I, 39 Se os Governos os podem exigir, devem facultar aos contribuintes os meios de os pagarem sem sacricio, I, 39 V =Verdade= (=A=)--Periodico de Ponta Delgada, I, 158 =Vidal Dalhunty= (=D. Leonor=)--Autora da melodia do Hymno de Santa Cecilia, I, 170 =Vigny=--Vide _Conde Alfredo de Vigny_. =Vilhena Barbosa= (Ignacio de)--Menciona-se, I, 149 =Visconde de Cormenin=--Autor do livro _Entretiens de village_, II, 85 Z =Zimmermann=--Menciona-se o seu _Tratado da solidão_. FIM Obras completas de A. F. de Castilho 3--=Cartas de Ecco e Narcizo=, verso. 4-5--=Felicidade pela agricultura=, 2 vols. 6-7--=A primavera=, verso, 2 vols. 8 a 15--=Vivos e mortos=, spreciações morais, literarias e artisticas, 8 vols. 19-20--=O presbyterio da montanha=, prosa, 2 vols. 21-22--=O outomno=, verso, 2 vols. 27-28--=Novas escavações poeticas=, verso, 2 vols. 29 a 32--=Theatro=, Camões, drama e notas, 4 vols. 33--=Theatro=, Canáce, tragedia original. 34--=Theatro=, Um anjo da pele do diabo--O casamento de oiro, comedias. 35--=Theatro=, Aristodemo, tragedia. A volta inesperada, farça. 36--=Theatro=, A festa do amor filial. A filha para casar, comedias. 37-38--=Palestras religiosas e consolações=, presa e verso, 2 vols. 39 a 45--=Casos do meu tempo=, prosa, 7 vols. 46--=Estrelas poeticas=, para o ano de 1853, verso. 47 a 50--=Télas literarias=, prosa, 4 vols. 51--=Os ciumes do bardo=, As flores, e a confissão de Amelia, verso. 52-53--=Mil e um misterios=, romance dos romances, 2 vols. 54--=A noite do castelo=, poema. 55--=Tributo portuguez á memoria do Libertador=, prosa. 58 a 60--=Novas télas literarias=, prosa e verso, 3 vols. 61 a 63--=Methodo Portuguez de Leitura.= Directorio do mesmo, 3 vols. 64-65--=Castilho pintado por êle proprio.= As escolas dos asilos de Infancia desvalida, 2 vols. 66--=Felicidade pela instrução.= 67--=Ajuste de contas.= 68--=Noções rudimentares para uso das escolas=, 2 vols. 70 a 72--=Resposta aos novissimas Impugnadores do Methodo portuguez=, 3 vols. 73 a 75--=Tratado de Mnemónica=, 3 vols. 76--=Ou eu ou eles=, e Tosquia de um camelo. 77 a 80--=Cartas=, 4 vols. IMP. LUCAS & C.ª--RUA DIARIO DE NOTICIAS, 61--LISBOA *** End of this LibraryBlog Digital Book "Felicidade pela Agricultura (Vol. II)" *** Copyright 2023 LibraryBlog. All rights reserved.