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Title: Resumo elementar de archeologia christã
Author: Silva, Joaquim Possidónio Narciso da, 1806-1896
Language: Portuguese
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Library of Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal).)



RESUMO ELEMENTAR

DE

ARCHEOLOGIA CHRISTÃ

POR

POSSIDONIO DA SILVA

1887



Antigo edificio religioso de Santarem

LISBOA--Museu de Archeologia do Carmo



RESUMO ELEMENTAR

DE

ARCHEOLOGIA CHRISTÃ

POR

_Possidonio da Silva_



MEDALHA CONFERIDA EM 1869


LISBOA
LALLEMANT FRÈRES, IMPRENSA
1887



Á

MEMORIA DE MEU PAE

Reinaldo José da Silva


TESTEMUNHO DE RESPEITO E GRATIDÃO

O Auctor



AO LEITOR


Inaugurando-se agora nos seminarios de algumas dioceses de Portugal
cadeiras para o ensino de archeologia christã, estudo que ha muito era
urgente crear-se no nosso paiz, proponho-me publicar os elementos
principaes d'esta sciencia, afim de facilitar os estudos a quem desejar
possuir esses conhecimentos indispensaveis para curar da conservação dos
objectos do culto e evitar o ignorante modo de se restaurarem os
edificios religiosos dos differentes estylos, que pertencem á nação;
pois já é tempo de não se continuar a praticar nos edificios concertos
mal pensados, que alteram o caracter respectivo da sua architectura, e
causam tambem desdouro ao avaliar-se a nossa civilisação.

Ainda que não façamos um compendio completo, comtudo, talvez possa ser
de algum auxilio para se divulgarem as instrucções principaes d'esta
natureza afim de pôr cobro aos vandalismos que têem destruido tantas
antiguidades e objectos preciosos do culto.

Muito embora não se consiga desde já o proficuo resultado d'este ensino,
todavia ficará registado, no final do seculo XIX, o empenho que
illustres Prelados têem tomado para obstar a serem illudidos os parochos
nas substituições das alfaias, e para se opporem ás defeituosas
restaurações dos monumentos religiosos do nosso paiz. Darei por bem
empregada esta minha modesta publicação, se por ventura conseguir este
empenho patriotico e artistico a que tenho constantemente dedicado a
maior parte da minha existencia.

Possidonio da Silva.



INTRODUCÇÃO[1]


Os monumentos historicos ou simplesmente artisticos são os marcos que
assignalam os passos, mais ou menos firmes, vagarosos ou apressados, que
os povos vão dando no caminho da civilisação. Porém não se pense que,
relativamente a esses padrões, a cultura de uma nação deva ser avaliada
sómente pela significação d'elles, por mais gloriosa que seja, ou por
mais que se aprimorasse n'elles a arte, mas sim tambem pelo apreço e
respeito com que essa nação vela pela sua conservação.

Sobreleva Portugal a todas as nações na alta significação dos seus
monumentos, porque não commemoram unicamente façanhas militares e
virtudes christãs e civicas, communs a outros povos. Não recordam só mil
acções de valor, de coragem e de abnegação, praticadas na defensa da
patria, ou para alargamento das suas fronteiras, ou para honra e lustre
do seu nome. Mas fallam tambem os nossos monumentos d'essas
arrojadissimas emprezas de navegações e descobrimentos, com que os
portuguezes abriram de par em par as portas á moderna civilisação,
levando a luz do evangelho, atravez de mares ignotos, ás mais longinquas
regiões do globo.

Quasi todas essas glorias, que doiram as paginas da nossa historia,
foram memoradas por nossos maiores com a fundação de um templo, acanhado
e singelo, ou grandioso e opulento, segundo o permittiam a rudeza dos
tempos, ou a florescencia da nação, bem como o animo e posses dos
fundadores.

As convulsões do sólo, a pouca illustração dos reedificadores, e
modernamente a sanha brutal dos demolidores, têem destruido ou
desfigurado muitas d'essas auctorisadas testemunhas dos tempos heroicos
de Portugal. Este vandalismo, que nos degrada do gremio das nações
cultas, não está, infelizmente, ainda de todo proscripto d'entre nós. Os
poderes publicos ainda não prestam aos nossos monumentos toda a attenção
e vigilante solicitude que, para a sua conservação, elles demandam, e a
honra e bom nome do paiz com tanta justiça reclamam. E não basta que se
attenda á conservação dos monumentos commemorativos dos grandes factos
historicos, e ao mesmo tempo opulentos d'arte. Merecem o nosso apreço e
cuidados todos os padrões que interessam, de qualquer maneira, aos
annaes da nação e á historia da arte.

Não obstante os differentes elementos de destruição, que tem actuado
entre nós, ainda existem de pé n'este reino não poucas egrejas
anteriores á fundação da monarchia, ou contemporaneas do nosso primeiro
rei, ou construidas sob o sceptro dos seus immediatos successores. São
pequenos e de construcção mesquinha todos esses templos, tendo por
feição principal a mesma simplicidade e pobreza, que distinguiam n'essa
epocha o viver da nação. Todavia, embora o acanhamento das proporções, e
a simplicidade da architectura corram parelhas com a pobreza das
memorias historicas, todas essas egrejas são exemplares de subido valor
para a historia da arte em Portugal, tanto mais quanto é tristemente
certo, que os grandes templos, levantados nos principios da monarchia,
têem sido mascarados e desfigurados, por occasião das reedificações,
como aconteceu ao de Alcobaça, á Sé de Lisboa, e a outros, ou
desappareceram, como o de Santa Cruz de Coimbra e o de S. Vicente de
Fóra, em Lisboa, para em seu logar se edificarem outros mais vastos e
mais sumptuosos.

Pois essas preciosas reliquias de tão remota antiguidade que têem
resistido ao duro embate das tempestades no correr de tantos seculos,
zombando até agora dos cataclysmos da natureza e dos furores do
camartello, acham-se presentemente ameaçadas, pelo menos algumas
d'ellas, de perderem, em reconstrucções dirigidas sem amor da arte, e
sem respeito aos monumentos de remotas éras, as suas primitivas e
venerandas feições.

E ao mesmo passo vão desapparecendo das velhas parochias sertanêjas as
suas antigas alfaias, vendidas por uma bagatella, a titulo de alcançar
meios para reparação do edificio, e os seus vasos sagrados dos seculos
anteriores ao XVIII, de muita belleza e primôr artistico, a troco de
outros de fabrica moderna, mais luzentes e vistosos, porém destituidos
da formosura e elegancia das fórmas, e da delicadeza e perfeição do
trabalho esculptural, que dão fóros universaes de preeminencia á
ourivesaria, principalmente dos seculos XV e XVI.

Os compradores d'objectos d'arte e de industria, antigos, que vem a
Lisboa todos os annos do estrangeiro, sobretudo de França e da
Allemanha, percorrem as nossas provincias em todas as direcções;
apparecem em todas as cidades, nas villas e nas proprias aldeias,
tentando com dinheiro á vista os possuidores d'essas preciosidades, que
não sabem aprecial-as, desconhecendo-lhes o valor.

É mister por honra do paiz, e por exigencia imperiosa dos interesses
publicos, que se trate de pôr algum côbro, quando não possa obstar-se
inteiramente, á assolação ou deformação d'aquelles monumentos da
antiguidade, e a esta continua expropriação das nossas riquezas
artisticas, documentos irrecusaveis do alto grau de florescencia nas
artes, e por conseguinte de civilisação, que Portugal attingiu n'esse
glorioso passado.

Um dos meios inquestionavelmente mais adequado, seria oppôr a essa
torrente devastadora a illustração e o zelo dos parochos, illustração e
zelo provenientes de conhecimentos especiaes para saberem apreciar
aquelles objectos, ricos d'arte e de memorias piedosas, que os estranhos
nos cobiçam, e que os nacionaes malbaratam por ignorancia.

Se os parochos tivessem algumas noções de archeologia religiosa, não
consentiriam, certamente, que as suas egrejas perdessem, com feições
bastardas, o typo primitivo que as ennobrecia, nem haviam de tolerar,
que fossem despojadas, por compra ou troca, dos seus vasos sagrados e
alfaias antigas, que são nos templos verdadeiros brazões da sua nobreza,
e testemunhas authenticas, eloquentes na sua propria mudez, do amor da
religião dos nossos antepassados, que n'elles se casava com o amôr da
patria. E não limitariam esses parochos a sua acção benefica, sem
duvida, a salvaguardar as preciosidades artisticas das suas egrejas; mas
não deixariam tambem, em casos identicos, de dispensarem aos parochianos
os conselhos do seu saber e da sua experiencia.

Foram estas considerações retemperadas pelo affecto que todos devemos á
terra, que nos serviu de berço, e ás Santas Crenças, que recebemos dos
maiores, que moveram a Real Associação dos Architectos e Archeologos a
elevar ao esclarecido juizo dos Prelados Portuguezes o pedido de
instituirem nos seus respectivos seminarios uma cadeira de archeologia
religiosa.

É uma sciencia muito complexa a archeologia, não ha duvida, pois que
cada uma das partes, que a compõem, e que se subdividem, a seu turno, em
outras partes de materia amplissima para o estudo, constitue um ramo
importante dos conhecimentos humanos, que demanda muita applicação para
ser bem sabido.

Porém, no que diz respeito á archeologia religiosa é um estudo muito
limitado, facil e agradavel, e que póde restringir-se, querendo
abrevial-o, estabelecendo o ponto de partida da invasão dos povos
septemtrionaes e destruição do imperio romano; ou dos tempos mais
proximos da fundação da monarchia portugueza. O que é mister é que se dê
nos seminarios aos futuros parochos a instrucção precisa para que
conheçam os differentes estylos architectonicos, empregados nos templos
do christianismo; a epocha da sua introducção em Portugal, e as
modificações, que tiveram aqui, determinadas pelo estado da nossa
civilisação e pelos habitos e costumes da sociedade. É indispensavel,
tambem ministrar-lhes eguaes conhecimentos em relação á ourivesaria
religiosa, e ás mais artes liberaes e mechanicas, que, no correr da éra
christã, têem concorrido com os seus productos para o serviço dos
altares, e para a ornamentação das egrejas.

Os parochos assim instruidos não deixarão de apreciar devidamente, e de
velar com verdadeiro zelo pela conservação dos edificios e dos objectos
concernentes ao culto, venerandos pelas tradições religiosas e pela
consagração dos seculos, e dignos de grande estima pelo seu valor
artistico ou archeologico.

Ignacio de Vilhena Barbosa.



Resumo elementar de archeologia christã



CAPITULO I

Principios da arte christã no Occidente


PRIMEIRO PERIODO



CAPITULO II

/#
     *Summario.*--Descripcão das catacumbas de Roma--Principios
     artisticos e classificações das pinturas das catacumbas--Symbolos
     ou allegorias dos primitivos christãos--Representação de Jesus
     Christo e de Nossa Senhora--Imagens dos Santos--Monogramma de
     Christo--Lampadas--Sarcophagos christãos--Vasos de
     sangue--Monumentos christãos fóra das catacumbas--Edificios
     religiosos construidos nos tres primeiros seculos--Cemiterios á
     superficie do solo--Alfaias e instrumentos do culto.
#/


Os mais numerosos monumentos christãos que se offerecem para o estudo da
archeologia christã são os cemiterios subterraneos da cidade de Roma. Os
christãos continuaram a escavar nas antigas pedreiras da cidade novas
catacumbas depois do reinado de Constantino, e durante os quatro ou
cinco seculos seguintes, transformaram as catacumbas em logares de
peregrinação. Fizeram-se restaurações e embellezamentos n'estes
sanctuarios até ao fim do seculo VIII.

As catacumbas eram destinadas a tres fins: o primeiro e principal era
servirem de cemiterio aos christãos. Os tumulos ficavam dispostos nas
paredes uns por cima dos outros formando fileiras de tres a doze. Os
corpos eram collocados em nichos oblongos, fechados por tampas de
marmore, ou por tijolos ordinariamente em numero de tres, ajustados
perfeitamente com cal.

N'estas galerias veem terminar em muitos sitios camaras sepulchraes. São
especies de covas funerarias, no fundo das quaes se encontra muitas
vezes, debaixo de uma abobada, um tumulo encerrando os restos mortaes de
algum martyr illustre. Estes tumulos serviam de altar no dia
anniversario do martyr, em que os christãos vinham fazer as suas
orações.

A fórma dos sepulchros era variadissima: ha-os circulares,
semi-circulares, octogonaes, hexagonaes e pentagonaes; comtudo a maior
parte são quadrados.

O segundo fim a que destinavam as catacumbas era servirem de logar de
reunião para ahi celebrar as ceremonias do culto. Foi para fazerem as
suas assembléas religiosas que os primitivos christãos construiram, nos
seus cemiterios subterraneos, oratorios, compostos a maior parte das
vezes de dois ou tres sepulchros contiguos, e que se designam pelo nome
de _basilicas das catacumbas_.

O terceiro fim das catacumbas era tambem servirem de retiro ao
Pontifice, ao clero e aos fieis no tempo da perseguição.

A historia das catacumbas póde dividir-se em tres periodos principaes: o
periodo da formação, o periodo da restauração e de visitas piedosas, e o
periodo de explorações scientificas.

O primeiro periodo abraça os quatro primeiros seculos. No decurso do
seculo IV viu-se diminuirem as sepulturas subterraneas pelo augmento dos
tumulos á superficie do solo. Depois do anno 410 não se encontram
sepulturas nas catacumbas.

O segundo periodo estende-se desde os primitivos annos do seculo V até
ao principio do seculo IX.

Chamam-se cryptas historicas as camaras sepulchraes em que repousavam os
restos de martyres illustres.

O ultimo periodo, de explorações scientificas, data do anno de 1578.

No mez de maio de 1578, uns trabalhadores que se occupavam em extrahir
pozzolana n'uma vinha, a duas milhas da cidade de Roma, descobriram uma
abertura que dava para um cemiterio christão decorado de pinturas, de
sarcophagos e de inscripcões.

Estas pinturas pertencem a epochas differentes, e algumas ao primeiro
seculo da nossa éra. As do seculo II são mais numerosas, porém as do
seculo III são ainda em muito maior numero.

A maior parte das decorações das paredes das catacumbas foram executadas
a fresco, sendo feitas algumas com mosaicos em limitado numero.

Os antigos artistas contentavam-se em traçar a silhuêta dos personagens
e dos objectos, enchiam em seguida o espaço comprehendido entre os
contornos por côres lisas ou illuminuras, e indicavam convencionalmente
as rugas dos fatos com traços cheios e as saliencias com traços finos.
Faziam o contrario do que se praticava desde o seculo VI, desprezando,
na representação dos assumptos, os accessorios.

As pinturas dos tumulos, em fórma d'arco, apparecem sobre um fundo
ornado,--um assumpto com muitas figuras traçadas dentro de molduras de
fórma quadrada ou semicircular.

Os ornatos são na maior parte imitações de objectos usuaes, açafates com
fructos ou grinaldas de flores, sendo imitado este genero de decoração
de pintura da arte pagã.

Nas catacumbas representava-se ordinariamente Jesus Christo debaixo da
fórma do Bom Pastor.

As imagens do Redemptor não se encontravam isoladas, apresentando todos
os caracteres das pinturas posteriores a muitos seculos á conversão de
Constantino.

A Santa Virgem é figurada nas pinturas das catacumbas sobre os vidros
dourados e os sarcophagos dos seculos primitivos, estando sentada, com o
Menino Jesus ao collo.

A adoração dos Magos recordava aos fieis tres dogmas: a vocação dos
infieis, a Divindade de Nosso Senhor, e a Maternidade Divina.

Os primitivos christãos representavam tambem a Virgem com ou sem o
Filho, debaixo da forma d'uma _orante_, isto é, em pé e levantando os
braços n'uma attitude de supplica. Muitas imagens são anteriores ao
seculo IV.

_Jesus Christo multiplicando os pães_: figura a Santa Eucharistia, como
sendo alimento das almas.

O Salvador é representado em geral debaixo da figura d'um mancebo
imberbe vestido com manto e tunica ornada com duas bandas de purpura.

_O paralytico curado_ é representado no momento em que, deixando a
piscina, leva a sua cama ás costas. Está vestido com uma tunica e cinta
e uma especie de ceroulas.

_Jesus resuscitando Lazaro_: é representado Lazaro debaixo da fórma
d'uma pequena mumia envolvida em pequenas fitas e collocada na posição
vertical á entrada do tumulo, que tem a fórma de um edificio ou pequeno
templo.

As representações de refeição dividem-se em duas classes conforme
symbolisam a Eucharistia, ou a felicidade dos predestinados á
bemaventurança.

A felicidade dos predestinados é symbolisada por um banquete ao qual
servem o Amor e a Paz, porque estes dois gosos eram tidos como os
principaes do Paraiso.

_Jesus Christo rodeado dos seus discipulos_: representa o ensino dado
aos apostolos e a celebração da ultima ceia do Senhor.

As imagens dos Santos encontram-se nas cryptas historicas, e todas em
geral são posteriores á conversão de Constantino. Muitas são ornadas de
resplendor, que só foi dado aos Santos no principio do seculo VI.

A scena do Orpheu tocando lyra, tirada da mythologia, é muito commum nas
pinturas das catacumbas e sobre os monumentos christãos dos primeiros
seculos.

Entre os primeiros christãos, Orpheu deleitando os animaes ferozes com
os sons da sua lyra, era um symbolo de Jesus Christo domando as paixões
dos homens e attrahindo-os com os encantos da sua doutrina.

Os primeiros christãos reproduziam de differentes maneiras as quatro
estações sobre as paredes das catacumbas e sobre os sarcophagos, porque
as estações symbolisavam aos olhos dos christãos a futura resurreição.

Os primitivos christãos serviam-se dos symbolos, em primeiro logar, para
subtrahir á irrisão dos infieis as mais augustas verdades da religião, e
em segundo logar, para se conhecerem entre si. Os mais antigos d'estes
symbolos eram a pomba, o peixe, a barca, a lyra e a ancora.

Durante os primeiros tres seculos da Egreja, o peixe era um dos symbolos
mais divulgados entre os christãos para significarem Jesus Christo.
Empregava-se de dois modos, como nome e como figura. A palavra _ichtus_,
que significa peixe, fornece as iniciaes das palavras _Jesus Christo
Filho de Deus_.

O peixe representado sobre os monumentos pintados ou esculpidos tinha a
mesma significação, era um signal hyerogliphico lembrando aos christãos
a palavra grega e todas as verdades que ella symbolisava. Tanto o
acrostico como o peixe symbolico, era principalmente gravado sobre as
pedras e sobre os objectos portateis para o uso da piedade dos primeiros
christãos.

A Cruz que se encontra nos monumentos christãos dos quatro primeiros
seculos apresenta-se com fórmas dissimuladas, de ancora, que era ao
mesmo tempo o symbolo da esperança, e serve desde o primeiro seculo para
recordar aos fieis o signal da Redempção.

Empregou-se desde os primeiros seculos o cordeiro para representar Jesus
Christo.

Os primitivos christãos tinham por costume orar em pé, com os braços
estendidos e levantados para o ceu. Na maior parte dos monumentos
christãos primitivos vêem-se fieis dos dois sexos, e principalmente
mulheres em attitude de _orantes_.

A _orante_ symbolisa a alma christã admittida no ceu e considerada
esposa de Jesus Christo. As duas arvores que em alguns monumentos se
encontram aos lados, designam o paraiso ou a felicidade eterna.

Encontra-se frequentemente nos primitivos monumentos christãos de toda a
especie a pomba, e principalmente nos epitaphios dos seis primeiros
seculos da nossa éra. Nos tumulos symbolisa ordinariamente a alma pura e
innocente dos fieis. A oliveira que está ao seu lado ou o ramo d'esta
arvore, que muitas vezes tem no bico, são o symbolo da paz que gosa a
alma, e equivale á formula _in pace_, tantas vezes empregada nos
epitaphios.

A _palma_ tem sido em todos os tempos o symbolo do triumpho; os
christãos primitivos collocaram-n'a nos seus tumulos para recordar a
victoria ganha pelo defuncto aos inimigos da fé.

O _monogramma de Constantino_ ou simplesmente _monogramma_ são as duas
letras gregas X P ligadas da seguinte maneira:

[Figura]

Outro _monogramma cruciforme_ parece ter existido no Oriente e tem a
letra X com a fórma d'uma cruz [Símbolo] onde está ligada na perpendicular
superior a barriga da letra P:

[Figura]

As duas fórmas tambem se empregaram no Occidente.

A partir do meado do seculo IV, o monogramma é muitas vezes acrescentado
com mais duas letras gregas A e [Grego: Omega], a primeira e a ultima do
seu alphabeto.

O monogramma data da conversão de Constantino que mandou fazer o
_lábaro_, que era encimado pelo monogramma.

Durante os primeiros seculos da Egreja, o altar era apenas uma taboa de
madeira, servindo de mesa aos apostolos para celebrar os divinos
mysterios.

As catacumbas forneceram-nos mais tarde o typo dos altares em fórma de
tumulo. As tumbas _em arco_ tinham uma prateleira horisontal cobrindo os
restos do santo martyr; sobre esta prateleira é que se dizia a missa.

As lampadas que se encontraram nas catacumbas tinham a fórma das
_lucerncae_ dos antigos. Assemelham-se a uma barquinha, que era um dos
symbolos mais usados na Egreja primitiva. A maior parte são de argila;
tambem se encontram algumas de bronze. Estas ultimas pertencendo a uma
epocha menos remota, são quasi todas munidas de cadeias que serviam para
as suspender nos tectos das capellas.

Chama-se sarcophago (palavra derivada de _sarcos_ carne e _phagos_ eu
como) um tumulo de marmore ou de porphyro mais ou menos ornado de
esculpturas.

Podemos classifical-os em _simples_, _mixtos_ e _ricos_.

Os sarcophagos _simples_ apresentavam a fórma de um cofre rectangular
sem ornamentação.

Na maior parte os sarcophagos eram adornados de um ornato que se chamava
_strigiles_.

Os _strigiles_ são canneluras de fórma sinuosa, imitando o raspador,
instrumento de que os antigos se serviam para tirar, na occasião de se
banharem, a humidade e os corpos estranhos espalhados na superficie da
pelle.

Os sarcophagos _ricos_ têem as quatro faces, ou pelo menos tres, ornadas
de esculpturas em baixo, ou em alto relevo. Quando se reproduzem sobre
uma mesma face muitas scenas ou figuras, são justapostas simplesmente,
ou separadas por columnas ornadas de pampanos e de pequenos genios
colhendo fructos.

Muitos sarcophagos têem, no centro da face principal, um medalhão
circular, onde se vê em busto a figura do defuncto. Os tumulos que
serviam de sepultura a dois esposos, têem dois bustos, e algumas vezes
uma arcada central apresentando, com a mesma significação, dois
personagens em pé dando a mão e chorando.

Os sarcophagos _mixtos_ são ornados parte com strigiles e parte com
figuras gravadas a traço ou esculpidas em relevo.

Os sarcophagos dos tres primeiros seculos foram escolhidos nas officinas
pagãs, ou esculpidos por artistas christãos, segundo modelos profanos.

As scenas da Paixão propriamente dita, taes como a flagellação, o
coroamento de espinhos e a crucificação, não se encontram representados
em monumento algum do primitivo christianismo.

Os christãos dos primeiros seculos punham muitas vezes nas sepulturas
objectos que tinham pertencido ao defuncto.

Encontram-se nos tumulos dos fieis: tecidos d'ouro, anneis, bracelêtes e
bijoterias, brinquedos de creança, relicarios portateis, vasos de vidro
ou d'argila collocados ordinariamente perto das cabeças dos cadaveres,
instrumentos de supplicio.

_Vasos de sangue_. Entre os signaes certos do martyr o principal é o
vaso de vidro ou d'argila, que serviu para recolher _o sangue do
martyr_, collocado dentro do tumulo, ou no exterior do nicho sepulchral.

_Objectos collocados no exterior do tumulo_. Entre estes objectos, uns
são executados pela mão do homem, outros não o são. Podem
classificar-se, na primeira cathegoria, os _baixos relêvos_, as
estatuetas, os pequenos _bustos_, e os fragmentos de esculpturas em
pedra e em marmore, os cacos de louça, os fragmentos de _vasos_ de
_crystal_ e de _vidro esmaltado_ e _dourado_, os prismas e as pequenas
_placas_ de _mosaico_, os anneis, os collares, os bracelêtes, e um
grande numero d'outros objectos de _toilette feminino_, d'ambar, ouro,
marfim e nacar, os brinquedos de creança, as folhas de taboa de
escrever, as placas de bronze, as guarnições e os ornamentos para portas
e cadeiras, d'ouro, marfim, bronze e ferro, os camapheus, as moedas e as
medalhas, os utensilios de cosinha; n'uma palavra, tudo desde o objecto
mais ordinario até ás joias mais preciosas.

Encontram-se tambem fragmentos brutos de toda a especie de substancias,
os mais diversos objectos naturaes e os mais extravagantes; pedaços de
tufo, estilhaços de pedra ou de tijôlo, caróços de fructos, folhas
d'arvore ou de planta, dentes e ossos d'animaes, caracoes, cascas de
mexilhão e d'ôstra, conchas, etc.

Estes objectos fixos ao cimento, eram dispostos de maneira que podessem
desenhar figuras de que facilmente se podesse fazer idéa.


_Outros monumentos christãos dos tres primeiros seculos além das
catacumbas_. Occupar-nos-hemos dos edificios religiosos construidos
sobre a terra, dos cemiterios construidos ao ar livre, dos paramentos
sagrados e dos instrumentos do culto, anteriores á abjuração de
Constantino.

Sabemos por documentos historicos que muitas pessoas abastadas tinham em
seus palacios oratorios onde os soberanos Pontifices vinham celebrar os
Santos Mysterios na presença da multidão dos fieis. Muitos d'estes
oratorios foram substituidos, depois da abjuração de Constantino, por
basilicas, ás quaes deram o nome das pessoas piedosas que haviam cedido
á egreja o direito de propriedade; e se mais tarde estas pessoas ficavam
consideradas no numero dos Santos, estas basilicas eram-lhes dedicadas.

A mais remota menção d'um templo christão data do tempo de Alexandre
Severo, que foi imperador desde 222 até 235.

Não é conhecida a fórma nem a distribuição interior d'estas primitivas
egrejas.

Os unicos monumentos notaveis dos tres primeiros seculos, até hoje
conhecidos, são as _cellas_ dos cemiterios, ás quaes se deu tambem o
nome de _basilicas_, desde o principio do IV seculo.

Estes pequenos edificios, construidos nos cemiterios, serviam para ponto
de reunião dos fieis.

_Cemiterios ao ar livre_. As sepulturas christãs foram estabelecidas,
desde o principio, ao ar livre.

Estes cemiterios, designados em geral pelo nome de _d'areae_[2] eram, do
mesmo modo que as catacumbas, situados fóra das portas das cidades;
porque as leis romanas prohibiam severamente as inhumações dentro dos
muros.

Depositavam-se os cadaveres, quer em simples fóssas, algumas vezes
revestidas interiormente de tijólos e de lages, quer em pias de pedra,
ou caixões de madeira mettidos debaixo da terra. As paredes dos tumulos
mais ricos eram, dadas certas circumstancias, rebocadas de argamassa, ou
estucadas e decoradas com pinturas _a frêsco_, semelhantes ás das
galerias e capellas sepulchraes das catacumbas.

_Paramentos e objectos do culto_. Parece certo que, durante os primeiros
seculos, os paramentos sagrados não se differençavam dos fatos
ordinarios, nem pela fórma nem pelo talhe.

Do mesmo modo que aproveitavam para os sagrados paramentos as fórmas e
os pannos dos fatos ordinarios, assim tambem aproveitavam para o serviço
dos altares os vasos ricos e preciosos que haviam servido aos usos
profanos.



CAPITULO III

/#
     *Summario.*--Estylo Latino--Estylo Bysantino--Fórmas das
     Basilicas--Origem da Basilica Christã--O Narthex--Orientação das
     Basilicas e Egrejas Christãs--Egrejas cruciformes, circulares e
     polygonaes--Cryptas--Baptisterios--Oratorios domesticos--Templos
     pagãos e edificios profanos apropriados em Egrejas
     Christãs--Systema e regras de construcção--Decoração
     monumental--Narthex, fachadas e portaes das Basilicas--Janellas e a
     maneira de as vedar.--Madeiramento do cume dos
     edificios--Torres--Pinturas representadas em mosaico--Pavimento nos
     edificios--Altares--Ciborium--_Ambon_, Tribuna para as leituras da
     Biblia--Poltrona para os bispos e bancos para os
     sacerdotes--Cemiterios--Monumentos funerarios--Sarcophagos--Tumulos
     subterraneos--Objectos com symbolos christãos achados nas
     sepulturas--Alfaias religiosas--Calices e
     Patenas--Custodias--Relicarios--Pombas e torres--Accessorios do
     altar--Corôas de metal precioso suspensas sobre o
     altar--Dipticos--Encadernação dos livros dos Evangelhos--Estofos
     religiosos--Paramentos sacerdotaes--Jesus Christo sob fórmas
     symbolicas--Os Apostolos S. Pedro e S. Paulo.
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_Periodo Latino e Bysantino_. A architectura christã póde considerar-se
dividida em dois ramos perfeitamente distinctos. O primeiro, que se
poderá chamar o _Estylo Latino_, foi adoptado pela egreja Latina, isto
é, na Italia, na Illyria, na Dalmacia e em toda a Europa Occidental. É
caracterisado pela imitação mais ou menos correcta da architectura
classica, greco-romana. O outro estylo, formado por elementos orientaes
e romanos, nasceu em Constantinopla, e ahi se desenvolveu, formada sob a
influencia Oriental, uma configuração inteiramente nova: deram-lhe o
nome de _Bysantino_.

O Estylo Latino predominou no Occidente até ao principio do seculo VIII;
e o Estylo Bysantino no Oriente, até á tomada de Constantinopla pelos
Musulmanos, em 1453.

Chamou se _Latino_ o estylo do imperio do Occidente, em primeiro logar
porque, derivando do Estylo Romano ou Classico, foi empregado nos paizes
em que a lingua _latina_ era a lingua ecclesiastica e vulgar; em segundo
logar, porque existiu tanto tempo como aquella lingua, approximadamente.

O Estylo _Bysantino_ tem o nome derivado de Bysancio ou Constantinopla,
capital do imperio do Oriente.

_Estylo Latino_. A architectura greco-romana chegou ao seu apogêo
durante os dois primeiros seculos da era christã. A sua decadencia
começou no seculo III, afastando-se da nobre simplicidade do Estylo
Classico.

No seculo IV, ainda mais se pronunciou a sua degeneração.

Começaram então a desmanchar os antigos monumentos para em seu logar
construir e decorar mais facilmente os novos. Tal era o estado da
architectura no Occidente, quando foram construidos os primeiros
monumentos christãos do periodo _Latino_.

_Fórma das basilicas_. As _basilicas profanas_ eram vastos edificios
construidos no _Forum_, ou nos arredores das praças publicas. Serviam
para ponto de reunião dos vendedores, assim como de outros individuos
que se occupassem de negocios. Era n'ellas que os magistrados
administravam Justiça.

As _basilicas christãs_ foram construidas segundo o modêlo das basilicas
profanas; sómente, em vez de se construirem ao longo das praças
publicas, eram precedidas de um pateo quadrado, com o fim de as afastar
do ruido e do tumulto da rua. Tinham, como as basilicas profanas, a
fórma d'um rectangulo mais ou menos alongado e compunham-se de tres
partes principaes--o _pateo_ ou o _atrium_; a _nave_ e o _Sanctuario_.

O _narthex_ abria-se ao fundo do atrium. Era uma especie de vestibulo,
propriamente dito, formado pelo portico transversal contiguo á fachada
da basilica.

Esta primeira parte da basilica era occupada, durante o officio, por
aquelles a quem as leis ecclesiasticas prohibiam tomar parte nas
assembléas dos fieis.

Do _narthex_, entrava-se por uma, tres ou cinco portas para a basilica,
que era ordinariamente dividida em tres naves por duas ordens de
columnas.

A da direita, reservada para os homens, e a da esquerda para as
mulheres.

Avançando pela nave dentro, encontravam-se os _ambons_, pulpitos
destinados á leitura dos Santos Evangelhos para as prédicas, e á
promulgação das leis ecclesiasticas.

Entrava-se emfim na terceira parte da basilica, a parte mais Santa e
mais veneranda, aquella onde os seculares não podiam penetrar, e que se
chamava o _Sanctuario_.

O altar occupava a parte central do Sanctuario, e tinha frente para uns
poucos de lados.

Atraz do altar desenvolvia-se o _abside_ de fórma semi-circular e
coberto ordinariamente com uma meia cupula.

A cadeira do Bispo era collocada ao fundo do _abside_, e para ella se
subia por uns poucos de degraus. Aos lados da cadeira episcopal, se
achavam, contiguos ao hemicyclo do abside, os assentos ou bancos
destinados aos padres, que assistiam aos Officios Divinos.

A alteração mais notavel, que a disposição interior das basilicas
soffreu com o andar do tempo, foi o accrescentamento do cruzeiro ou nave
transversal, entre o abside e a nave propriamente dita.

_Orientação das basilicas e das egrejas christãs_. Chama-se _orientação_
uma disposição particular, segundo a qual o eixo longitudinal d'um
edificio, d'um tumulo, etc., se dirige do Occidente para Oriente.

Desde a primitiva que a egreja christã adoptou o costume de orar
voltando o rosto para o Oriente.

O costume de orientar as egrejas foi dos primeiros seculos do
Christianismo.

Ha dois modos inteiramente oppostos d'orientar as egrejas. N'um, usado
antigamente, a fachada principal forma a parte Oriental do edificio e a
capella-mór do lado do Poente. N'outro, que preponderou mais tarde, a
posição de todas as partes da egreja é completamente trocada, a fachada
está voltada para o Occidente, e a capella-mór para o Oriente.

O primeiro modo d'orientação não durou muito tempo. Nos seculos V e VI,
a começar no V, se construiram muitas egrejas com a capella-mór voltada
para o Oriente. No Occidente a mudança effectuou-se lentamente, pois só
se completou durante o seculo XIII.

_Cryptas_. A maior parte das basilicas foram edificadas nos mesmos
sitios onde tinham sido sepultados os restos mortaes d'um Martyr, ou de
qualquer Santo illustre.

Nas primitivas basilicas, o altar era situado mesmo sobre a sepultura.

As galerias e capellas subterraneas, que mais tarde foram substituidas,
tiveram o nome de _cryptas_, da palavra grega que significa, _eu
escondo_.

Estas galerias abobadadas transformaram-se muito tarde em verdadeiras
capellas, ou egrejas subterraneas, por debaixo de todo o _presbyterium_;
bastante vastas para necessitarem o emprego de columnas que recebiam os
arcos das abobadas, formando assim muitas naves.

_Baptisterios_. Distinguem-se tres especies de baptismo: o baptismo por
_immersão_, o baptismo por _aspersão_, e o baptismo por _infusão_ ou
_affusão_.

O primeiro ministra-se mergulhando na agua todo o corpo; no segundo e
terceiro, o ministro, de longe ou de perto, lança a agua sobre a cabeça
do neophito. O baptismo por immersão foi usado até ao seculo XII; a
começar d'esta épocha, principiou a ser substituido, na egreja Latina,
pelo baptismo por infusão, do qual até ali se não serviam, a não ser
para os doentes em perigo de vida.

Primitivamente era reservada aos Bispos a administração do Solemne
Baptismo. O Bispo mergulhava tres vezes o neophito, invocando de cada
vez uma das Pessoas da Santissima Trindade.

Depois da abjuração de Constantino, quasi se generalisou por toda a
christandade o baptismo ministrado nos edificios particulares situados
ao lado das principaes egrejas, e especialmente das cathedraes.

Os baptisterios tinham em geral a fórma circular ou octogona, mas alguns
havia quadrados, e outros ainda em fórma de cruz grega. As pias
baptismaes eram muito grandes, porque muitas vezes se ministrava a
adultos o baptismo por immersão.

_Templos pagãos e edificios profanos convertidos em egrejas christãs_.
Os templos pagãos não se prestavam em geral para o culto christão, em
consequencia das suas diminutas proporções.

Entretanto alguns foram convertidos, com ligeiras modificações, em
egrejas christãs, e outros foram-lhes encorporados.

A maior parte d'estas transformações datam do reinado do imperador
Theodosio (383-385), e dos seus successores immediatos.

Tambem houve monumentos civis que foram transformados em egrejas
christãs; taes como as thermas e os banhos, que entre os romanos
excediam em magnificencia os proprios templos.

_Caracteres do Estylo Latino_. As basilicas christãs foram muitas
d'ellas construidas, aproveitando para isso monumentos mais antigos. Mas
em consequencia das basilicas serem muito mais vastas do que os templos
pagãos, tornava-se por isso não raras vezes necessario desmanchar muitos
d'esses monumentos para construir uma só basilica.

A architectura estava n'uma tal decadencia, que muitas vezes chegavam a
reunir fragmentos de dimensões e estylos differentes, e ajustavam-nos o
melhor que podiam.

Se, por exemplo, se tratava de columnas provenientes de diversos
monumentos, não pertenciam muitas vezes á mesma Ordem d'architectura;
tendo portanto os fûstes e os capiteis de alturas differentes,
enterravam os fustes, ou os collocavam sobre soccos. O desvio e a
distancia relativa das columnas variavam dentro de limites excessivos.

A unica innovação d'alguma importancia introduzida nas construcções, foi
a substituição da _arcada_ pela architrave.

Nas regiões onde escasseavam monumentos antigos, os edificios do periodo
Latino eram em geral muito pequenos, baixos e pobremente decorados,
muitos até de madeira.

Apezar do que acabâmos de expôr, no seculo V e VI, construiram-se em
Ravenna muitos monumentos importantes (dos quaes ainda alguns se
conservam), sem que fôsse necessario recorrer á devastação que tiveram
os anteriores; o que prova existir n'aquella epocha em Ravenna uma
brilhante escola de habeis constructores.

_Materiaes de construcção_. As basilicas e os monumentos do periodo
Latino eram construidos com pedras d'alvenaria regulares, quasi sempre
quadradas, de mediano preparo, e tambem com tijolos chatos, ficando
separados por uma espessa camada de cimento. Muitas vezes tambem os
muros eram formados por cordões de uma, duas ou muitas faxas de pedras
d'alvenaria alternadas com outras compostas de uma ou duas fiadas de
tijolos.

_Decoração dos monumentos_. O periodo Latino não foi epocha de esplendor
para a architectura ornamental.

O _ábaco_ dos capiteis recebeu, durante o periodo Latino, dimensões e um
esvasamento taes que muitas vezes parecia ser um capitel sobrepôsto
sobre outro. A frente do ábaco era adornada, do lado da nave principal,
com um symbolo, que algumas vezes era o monogramma do fundador, e em
geral havia uma Cruz d'ordem Trina isolada, ou inscripta n'um circulo.
Chama-se Cruz de Ordem Trina aquella cujos braços são mais largos nas
extremidades do que no ponto de intersecção dos ramos. Esta cruz, quer
só, ou entre dois cordeiros, ou entre dois passaros, com a frente um
para o outro, foi um dos symbolos christãos mais usados durante o
periodo Latino.

_Narthex, fachadas e portaes das basilicas_. O narthex interior occupava
o fundo do atrio, e era formado pelo portico contiguo á fachada
principal da basilica. Communicava pelos extremos com as galerias que
rodeavam o atrio; como se observa na egreja de Villarinho de S. Romão,
na provincia do Douro.

Nas basilicas latinas, quando a configuração do terreno não permittia
estabelecer o atrio e o narthex, substituiam algumas vezes estes, por
galerias altas collocadas no interior do edificio ao longo da nave.

Os portaes das basilicas eram construidos segundo o modelo dos portaes
ricos do estylo classico.

As portas dos portaes das basilicas eram de bronze ou de madeira.
Algumas das portas de bronze, das primeiras basilicas, provieram de
monumentos pagãos. No seculo IX, a egreja de Santa Maria Maior, em Roma,
tinha portas de prata.

_Janellas e vidraças_. As janellas das basilicas eram rasgadas d'alto a
baixo, e de volta inteira.

Serviam de vidraças a estas janellas grandes laminas de marmore ou de
pedra, atravessadas de buracos para por elles penetrar a luz no interior
dos edificios. Mais tarde, estas laminas foram vasadas de maneira que
offereciam á vista os mais complicados desenhos. Na Europa Occidental e
Septemtrional, em que as laminas de pedra e de marmore escasseiavam,
guarneciam as janellas com caixilhos de madeira.

As clara-boias muitas vezes não tinham cobertura, principalmente nos
paizes meridionaes; e n'outros eram vedadas com laminas de pedras
translucidas ou de placas de alabastro.

Desde o seculo VII que começou a haver vidraças com vidros brancos e
esverdeados, e até mesmo com vidros de differentes côres. Não appareciam
ainda figuras, nem ornatos alguns, pintados sobre os vidros; as vidraças
com vidros de côr eram formadas por um grande numero de vidros
coloridos, cortados de differentes modos e que se reuniam de certa
maneira, a fim do conjuncto representar figuras de fórmas regulares.

Desde o reinado de Constantino, os grandes edificios apenas se cobriam
com madeira.

A maior parte d'esta construcção ficava visivel no interior dos
edificios. Em alguns, as naves tinham tectos de madeira com pinturas
diversas, representando caixões ricamente adornados e dourados.

Raras eram as basilicas que desde a sua fundação tinham possuido torres.
Os campanarios que hoje se vêem proximo das antigas egrejas de Roma, são
quasi todos posteriores ao seculo VIII. As torres do _periodo Latino_
são na maior parte de fórma circular ou octogonal.

Nas grandes basilicas as abobadas esphericas do abside e o Arco
Triumphal, e algumas vezes tambem as paredes comprehendidas entre as
janellas altas da nave e das arcadas que ligam as columnas, ficavam
revestidas com vistosos mosaicos.

Os materiaes mais ordinariamente empregados n'este genero de trabalho,
eram folhas de marmore e pedaços de vidro.

Em muitas basilicas de Roma, o abside abobadado em forma de esphera tem
ao centro a imagem de Jesus Christo em pé ou sentado, com o braço
direito erguido, ou lançando a benção, e com um rolo de papel ou um
livro collocado á sua esquerda. Aos lados do Salvador estão
representados os Apostolos, ou outros Santos. O sólo que pisam é o da
Judeia, o que se conhece pela representação do rio Jordão, cujo nome é
muitas vezes inscripto debaixo dos pés de Jesus Christo, e pela presença
das palmeiras, que foram, desde o primeiro seculo da era christã, o
symbolo da Terra promettida. Logo abaixo do abside se estende, em toda a
largura, uma zona estreita, no centro da qual se vê o Cordeiro Divino
coroado com ou sem a Cruz, collocado sobre um outeiro d'onde brotam os
quatro rios do Paraíso: Geham, Phison, o Tigre e o Euphrates, symbolos
dos Evangelistas. Doze cordeirinhos, seis de cada lado, se dirigem para
o cordeiro symbolico, e parecem sahir das cidades Santas de Jerusalem e
Bethlem, que occupam os extremos da composição, e se acham representadas
por varias portas e muralhas com ameias. Estes cordeirinhos symbolisam
os fieis.

Alguns mosaicos representam o sonho de S. João, isto é, os quatro
animaes, symbolos dos Evangelistas; e os vinte e quatro velhos, vestidos
de mantos brancos, offerecendo coroas ao Cordeiro.

Para piso das basilicas, os primitivos christãos serviam-se dos
differentes processos de empedramento, como os romanos usavam. Mais
tarde, estes processos foram substituidos por um trabalho de novo
genero, chamado _opus alexandrinum_, assim designado por ter sido usado
primeiramente na Alexandria. Estes empedramentos consistiam em um
conjuncto de variados marmores em que predominavam os porphyros verdes e
vermelhos; pareciam como um rico tapete estendido no sólo. O
empedramento _alexandrino_ foi muito pouco empregado na Europa
Occidental e Septemtrional.

Havia tambem empedramentos em que sobresahia a prata e outros metaes
preciosos.

Parte do piso do Sanctuario da basilica do Vaticano é de palhetas de
prata; mas o da capella de S. Pedro, da mesma basilica, é de palhetas de
ouro.

Nas catacumbas era mesmo sobre os tumulos dos martyres que se celebravam
os Santos Mysterios; porém, a começar do seculo III, este uso foi
approvado tambem pela Egreja.

No Occidente, o altar era quasi sempre erigido sobre o tumulo d'um
martyr. Os restos mortaes do Santo collocavam-se immediatamente debaixo
do altar n'um sarcophago, e ainda, na maior parte dos casos, ficavam
depositados n'uma crypta collocada debaixo do Sanctuario. Tanto na
Grecia como no Oriente, nunca em tempo algum, e até mesmo em nossos
dias, se fez d'um tumulo um altar, mas sim d'uma mesa, que recordava
aquella sobre a qual o Salvador instituiu a Eucharistia. Um altar
_nunca_ encerrava _reliquias_. Desde o tempo de Constantino, que data a
maior parte dos altares das egrejas do Occidente. No principio do seculo
VI (517) o concilio de Épona prescreveu, que todos os altares fossem de
pedra, os quaes foram adoptados pela razão symbolica de ser considerado
o Salvador a pedra angular.

Os altares de pedra d'essa épocha eram sempre formados por uma especie
de prateleira quadrada ou rectangular, para constituir a mesa do altar
propriamente dito. Esta mesa, muitas vezes, cobre um sarcophago ou um
tumulo de madeira; outras é sustentada por um pé central em forma de
cippo e ainda outras posta em quatro, cinco e mesmo até seis
columnellos.

Havia altares formados de tres lages, das quaes duas se collocavam
verticalmente, servindo de supporte á terceira, collocada
horisontalmente, a fim de formar a mesa do altar. Encontram-se tambem
altares formados de cinco placas, tendo, pelo seu conjuncto, a fórma de
um cofre de pedra.

A Auréola era formada de folhagens e sustentada por quatro anjos; Nosso
Senhor Jesus Christo fica collocado entre dois Cherubins, que facilmente
se reconhecem pelas suas asas abertas. Uma mão figurada no remate
superior da Auréola, é para indicar a presença de Deus. É tambem
adornada de flores, para indicar que o assumpto se passa no Céu.

As esculpturas mostram que esta arte estava muito decahida no seculo
VIII. Essas figuras com posições grotescas e forçadas, teem todas o
rosto de frente, e os membros desproporcionados, sendo tudo d'uma
imperfeição tal, que é difficil imaginar-se nada mais grosseiro e rude.

A inscripção, muito mal escripta, e n'uma linguagem quasi
inintelligivel, não é mais esmerada do que as esculpturas.

Quando as faces dos altares das basilicas das grandes egrejas não tinham
esculpturas, eram então revestidas de laminas de ouro e de prata, com
engastes de pedras preciosas, ficando cobertas de colchas bordadas,
representando algumas vezes assumptos sagrados.

Desde o seculo IV até meiado do XII, que as mesas dos altares eram
muitas d'ellas escavadas em fórma de bandeja em toda a extensão do plano
superior, tendo um rebórdo de alguns centimetros de altura; às vezes
tinham ornatos esculpidos. Muitas mesas eram furadas nos angulos, com um
ou muitos buracos, cuja serventia ainda não foi possivel descobrir. O
altar era encimado por um _ciborium_, especie de docel ou baldaquim,
sustentado por quatro columnas de madeira ou de marmore e de metal.

Entre as columnas do _ciborium_ havia umas cortinas ou reposteiros de
corrediça, que se corriam para occultar o officiante e o altar durante a
consagração.

O _ciborium_, que data do seculo XII, tem uma fórma um tanto differente
da que foi posta em uso durante o periodo Latino.

As cortinas dos antigos _ciboriums_ eram em geral de preciosissimos
damascos de seda e ouro, ou com ricos lavores, guarnecidos de perolas,
pedrarias e mesmo laminas de ouro e de prata.

Primitivamente, cada egreja apenas tinha um altar. Comtudo mais tarde
houve egrejas no Occidente, que tinham muitos.

Os gregos e os orientaes nunca tiveram senão um altar nas suas egrejas.

Os _altares portateis_ antigos compunham-se, bem como os mais recentes,
de uma prancha rectangular de madeira, de pedra ou de metal, algumas
vezes munida de uma moldura de ouro ou de prata, e tendo no extremo um
appendice para servir de punho. Não se acharam altares portateis do
periodo Latino, não obstante parecer indubitavel que deveriam ser
communs n'aquelle periodo.

Uma tribuna, collocada no meio da nave principal das basilicas, era
destinada á leitura dos Santos Evangelhos e aos sermões. Algumas egrejas
possuiam tres: uma para o Evangelho, outra para a Epistola e outra para
as prophecias.

A tribuna do Evangelho tinha regularmente duas escadas. Perto d'ella
havia um enorme candelabro que servia para supportar uma grande tocha
chamada _o facho do Evangelho_.

Nas basilicas christãs, o sanctuario e o côro eram separados da nave por
uma divisão, umas vezes occultando o recinto, e outras ficando
rendilhado, á altura de metro e meio a dois metros acima do chão. Esta
divisão, chamada _cancello_, era muitas vezes de marmore.

A cadeira episcopal ou _cathedra_ occupava o fundo do abside. Era de
pedra de marmore precioso, e elevada tres degraus, pelo menos, acima do
presbyterio.

Havia tambem cadeiras de marfim.

Aos lados da cadeira episcopal, e ao longo da parede do hemicyclo,
achavam-se os bancos destinados aos padres, chamados algumas vezes
_exedrae_, pelos auctores antigos. Eram muito simples, e durante o
officio cobriam-se com almofadas.


A partir do meado do IV seculo caíu a pouco e pouco em desuso o
enterramento nas catacumbas; e no principio do seculo seguinte,
desappareceu completamente. Os cemiterios estabeleciam-se á roda da
capella-mór das egrejas e das basilicas, situadas fóra dos muros das
cidades, com os seus tumulos quasi sempre orientados.

N'estes cemiterios depositavam-se a maior parte das vezes os cadaveres
em covas de pedra e cal. Entre duas paredes parallelas e distantes entre
si 70 centimetros, pouco mais ou menos, abriam-se, por meio de lages ou
simples tijolos, nichos de tamanho sufficiente para receber um cadaver.
Estes nichos chegavam ás vezes a disporem-se em dez ordens, umas sobre
as outras. Este systema foi o adoptado para as sepulturas dos cemiterios
do IV, V e VI seculos.

Algumas vezes tambem os cadaveres eram encerrados em sarcophagos, que em
seguida se cobriam com terra, ou se collocavam tanto ao ar livre como
debaixo de abobadas, no interior das egrejas e das basilicas.

Foi sómente no VII seculo que a Egreja começou a permittir, ou antes a
tolerar, as inhumações, não precisamente no interior, mas em redor dos
templos situados dentro das cidades. Unicamente os bispos haviam até ali
gosado do privilegio de serem enterrados nas suas egrejas Cathedraes.

Durante o periodo Latino foram muito raros os edificios isolados que se
construiram para servir de sepultura aos grandes personagens.

As esculpturas dos sarcophagos começaram a modificarem-se no meiado do V
seculo. Os assumptos biblicos desapparecem a pouco e pouco, e são
substituidos por imagens de Santos. A Cruz da SS. Trindade ou o
monogramma de Christo occupa, muitas vezes, o centro da face principal
dos sarcophagos, destinada antes para o logar do Salvador, tendo aos
lados pombas, pavões, palmeiras, parras e outros symbolos.

As tampas são ornadas de Cruzes da SS. Trindade, formadas pelo
entrelaçamento de Cruzes gregas e de Cruzes de Santo André, isto é, em
fórma de X.

O meio da face principal d'alguns sarcophagos é occupado pelo monogramma
de Christo, que d'este modo preenche o logar do Salvador. Os pavões aos
lados do monogramma são os emblemas dos Apostolos, e as pombas, bicando
os cachos de uvas, symbolisam os fieis alimentando-se do vinho
eucharistico. A maior parte dos sarcophagos eram de pedra ou de marmore;
no entanto alguns havia de chumbo e até mesmo de gesso.

Os _sarcophagos do IV seculo_ tinham todos a mesma largura e a mesma
altura nas extremidades; do V seculo, apparecem muitos tendo o lado da
cabeça mais largo que o dos pés.

As _campas sepulchraes_ são em geral indicio de uma sepultura
subterranea. O seu uso é muito remoto. As lages tumulares, assentes
sobre os tumulos subterraneos ou nos nichos ao longo das paredes, eram
já empregadas no V seculo, sendo muitas vezes esculpidas em relevo, e
tambem algumas ornadas com desenhos só a traço. Por vezes ajustavam na
parede, onde existia qualquer sepultura, uma placa de marmore ou de
pedra, sobre a qual se gravavam symbolos, o nome do defuncto, a sua
idade, ou tambem o dia do seu fallecimento.

Os _tumulos_ dos cemiterios primitivos podem-se dividir em tres classes,
segundo os objectos que n'elles se encontram. A primeira classe
comprehende aquelles em que, além do esqueleto, se não encontra mais
objecto algum, a não ser ás vezes uma pequena faca: estes tumulos são os
dos servos ou pessoas de condição servil. Nos tumulos da segunda classe,
o esqueleto é acompanhado do grande alfange de ferro, chamado
_scramasaxe_: são estes os dos homens livres ou senhores feudaes. O
homem livre gosava do privilegio de trazer á cintura este instrumento,
que com elle era tambem depositado no tumulo. A terceira classe era
constituida ordinariamente por um certo numero de tumulos ricos em
coisas de toda a especie, principalmente em armas e objectos de toilette
feminina: são esses os tumulos dos chefes militares, dos guerreiros e
membros da sua familia.

O homem de guerra era sepultado com todo o seu equipamento, e ao lado
depositava-se a sua esposa, adornada com todas as joias que tinha usado
durante a vida.

As fivelas (fibules), que se encontram em tão grande numero n'essas
sepulturas tinham duas serventias.

As maiores serviam para fechar o boldrié de coiro onde se suspendia o
_scramasaxe_. Quasi todas são de ferro, sendo algumas marchetadas de
prata ou revestidas de laminas de prata, com lavores representando
folhagens ou figuras. Encontram-se algumas de bronze, e são as mais
bellas.

Ha tambem umas fivelas de bronze e de menores dimensões, que serviam
para ligar o vestuario á roda dos rins, para individuos dos dois sexos.
Estas fivelas eram em geral menos lavradas que as do cinturão. Algumas
havia tambem de ferro.

Os alamares, broches ou _fibulas_, destinadas a unir sobre os hombros ou
sobre o peito as duas extremidades do vestuario, são sem duvida os
objectos mais interessantes que se encontram nas sepulturas dos
cemiterios. Ha-os de ouro, de prata, de bronze, e encontram-se sobretudo
nos tumulos de mulher.

Encontram-se tambem frequentemente nos tumulos de mulher, pregos para
segurar o cabello, com cabeças de aperfeiçoado trabalho. Ha-os de ouro,
de prata e de bronze, com grandes comprimentos.

Os brincos das orelhas são em geral, assim como os pregos para o
cabello, pequenas obras primas de ourivesaria. Compõem-se quasi sempre
de um annel de grande diametro, ao qual está ligado um pequeno botão de
ouro cheio de filigranas e de vidrilhos embutidos. Os _collares_ que
frequentemente se encontram nas sepulturas de mulher, compõem-se de
contas, de fórmas e dimensões differentes, enfiadas n'um cordel. As
contas são de vidro e de loiça de diversas côres, e de coral natural ou
arredondado; tem-se tambem encontrado, mas raras vezes, contas de ouro
massiço. As de vidro e de loiça são, em geral, pintadas com differentes
camadas de côres juxtapostas, que adherem pela cozedura, reprezentando
zig-zags, e outras muitas figuras estriadas. As côres que predominam,
são o vermelho, o amarello, o verde, o pardo, o azul, o branco e o
preto.

As _vasilhas de barro_ constituem o complemento obrigado de todos os
tumulos antigos. Encontram-se, quasi sempre, uma ou duas aos pés do
esqueleto. Parece que estas vasilhas serviam aos pagãos para conterem
agua lustral. Em seguida á sua crença na verdadeira fé, os convertidos
ao Christianismo continuaram a encerrar vasilhas nos tumulos, porém
mudaram a significação d'esta ceremonia funebre, substituindo a agua
lustral pela agua benta.

A maior parte d'estas vasilhas são de barro preto e vermelho. Muitas
apresentam a fórma d'uma pequena urna, tendo na parte superior do bojo
ornatos de estylo muito rudimentar, feitos em volta e por meio da ponta
d'um instrumento cortante.

As _vasilhas de vidro_, de fórmas elegantes e variadas, que se encontram
nas sepulturas junto á cabeça ou aos pés do esqueleto, mostram que a
arte de vidraceiro já tinha attingido um elevado gráu de perfeição. O
maior numero são de vidro, d'um amarello esverdeado, soprado ou moldado;
algumas têem como ornato riscas delgadas, brancas ou de côr, feitas
depois da sopragem ou misturadas com a massa vitrea.

A introducção do Christianismo entre os Francos data do fim do seculo V.
Não é por isso para admirar o encontrarmos nos seus tumulos objectos
ornados com symbolos christãos.

O _calice_ occupa o primeiro logar entre os vasos sagrados. Já os
Apostolos se serviam de calices para a celebração dos Santos Mysterios.

Nos primeiros seculos da egreja, os calices eram de madeira, de vidro e
até mesmo de chifre.

Depois da conversão de Constantino, é que se começou a generalisar o uso
dos calices de ouro e de prata. Muitas vezes eram tambem ornados de
pedrarias.

Existem calices de differentes especies. Os calices ordinarios, que se
compõem, como os de todas as idades posteriores, de uma taça, um nó e um
pé, tinham, em geral, a taça de fórma cylindrica, mais ou menos vasada,
muito estreita e profunda. Os calices da segunda especie eram os calices
ministeriaes, que serviam para distribuir aos fieis o precioso sangue,
quando estava em uso a communhão de duas especies na Egreja. Este uso
foi abolido no XIII seculo. Os calices ministeriaes, em geral, de
grandes proporções, tinham duas asas.

Havia ainda os calices das offerendas, _calices offertorii_, nos quaes
os diaconos recebiam as oblações de vinho; os calices baptismaes, que
serviam para dar aos novos baptisados uma mistura de leite e de mel; e
os calices de adorno, que nos dias solemnes eram suspensos na egreja,
nas proximidades do altar, ou collocados sobre a credencia.

A _patena_, assim chamada do verbo latino _patere_, _estar aberto_, em
consequencia da sua fórma larga e pouco profunda, é um prato de metal,
de vidro, ou de qualquer outra substancia, no qual se colloca a Hostia,
durante a Santa Missa. O seu uso é tão remoto como o do calice.

As patenas eram redondas, quadradas ou polygonaes e munidas d'um
rebórdo.

O uso de reservar a Santa Eucharistia para os doentes e ausentes, provém
desde a origem do Christianismo.

Pouco depois, quando os _altares_ foram augmentados com o _ciborio_,
suspendiam a reserva Eucharistica encerrada em vasos com a fórma de
torres e pombas. Os vasos para as Sagradas Particulas tinham
primitivamente a fórma de uma pomba. Quasi todos eram de ouro, de prata
e de cobre dourado. A pomba Eucharistica encerrava-se geralmente em um
Tabernaculo com fórma de torre.


Durante o período _Latino-bysantino_, os corpos dos Santos eram
cuidadosamente encerrados em sarcophagos, e depositados em cima d'um
altar ou n'uma crypta subterranea.

O Relicario para o Santo Lenho tem quasi sempre a fórma de pequenas
Cruzes peitoraes, concavas interiormente, e abrindo-se em toda a sua
altura, por meio d'uma dobradiça collocada no vertice superior da Cruz.

As _chaves da confissão de S. Pedro_ são assim chamadas, porque se diz,
que serviam para dar ingresso no tumulo do principe dos Apostolos, na
crypta da basilica Vaticana. As chaves são grossas, ovaes, ôcas e de
lavores rendilhados.

Os Soberanos Pontifices dos primeiros seculos tinham por uso distribuir
aos reis, aos principes e aos bispos, parcellas das cadeias de S. Pedro,
dentro de anneis, cruzes, e principalmente em preciosas chaves.

Desde o IV seculo que começaram a importar de Jerusalem os oleos
provenientes das lampadas que ardiam de noite e de dia no Santo
Sepulchro, e em outros logares Santos.

Os Papas e os Bispos enviavam estes oleos ás egrejas, aos soberanos e ás
pessoas de distincção. Eram conservados e remettidos em pequenos vasos
de vidro ou de metal, circulares, e achatados, com gargallo.

Durante os primeiros seculos, a Mesa do altar estava inteiramente livre
e a descoberto, e só se punha em cima o pão, o vinho e os Vasos Sagrados
necessarios para o Santo Sacrificio.

_Os Crucifixos_ e os castiçaes _eram desconhecidos_ durante os primeiros
seculos. N'essa épocha apenas algumas vezes se via uma cruz ao lado
direito do altar.

_Corôas de altar_, geralmente de _metal precioso_ e ornadas de pedrarias
engastadas, constituiram, durante todo o periodo latino, o mais rico
accessorio do altar.

As mais notaveis corôas de altar, que foram descobertas em 1858 e 1860,
em Toledo (Hespanha), são em numero de onze, todas de ouro e cravejadas
de pedras.

Algumas vezes, principalmente a partir do IX seculo, deu-se o nome de
_regnum_ ás corôas votivas dos altares, para as distinguir das de
illuminar. Tambem ás vezes se penduravam Cruzes proximo dos altares.

As luzes que se empregavam com profusão, durante os Officios Divinos,
eram collocadas proximo dos altares, quer sobre uma mesa, quer sobre
candelabros, ou ainda mais vezes sobre lustres, em fórma de corôa,
suspensos no côro, no Sanctuario e até mesmo no meio da egreja.

Os _diptycos_ são de épocha muito remota. Ao principio eram formados de
duas pequenas taboas de madeira ou de marfim, dobrando-se uma sobre a
outra, e cuja parte interior continha uma camada de cera, sobre a qual
se escrevia. Estas taboas eram rodeadas com uns fios de linho, sobre os
quaes se deitava cêra que se imprimia com um sinete. Serviam assim para
as missivas secretas.

Desde a sua origem que a Egreja Christã teve diptycos. Eram tabellas ou
catalogos, sobre os quaes se inscreviam certos nomes que deviam ser
lembrados e lidos, pelo menos em parte, nas reuniões sagradas dos fieis.

Podêmos pois, conforme a origem, distinguir duas especies de diptycos
sagrados: os diptycos consulares adaptados á liturgia, e os diptycos
puramente ecclesiasticos.

Os diptycos puramente ecclesiasticos eram de marfim ou de metal. Tinham
nas faces exteriores esculpidos ou cinzelados a imagem de Christo e a da
Santa Virgem, ou assumptos tirados da historia do Velho e Novo
Testamentos, e outros symbolos christãos.

Quando a leitura dos diptycos começou a deixar de se usar nos officios
sagrados, transformaram-se as taboas esculpidas ou cinzeladas, em capas
para livros liturgicos.

Desde o tempo de S. Jeronymo que começaram a ornamentar, o mais
ricamente possivel, o livro dos Evangelhos; notava-se esta riqueza tanto
no exterior como no interior do volume.

Muitas vezes o texto sagrado era escripto com letras de ouro sobre
membranas côr de purpura.

Exteriormente os livros dos Evangelhos eram ornados com todo o esmero;
nas capas abundavam o ouro, a prata, os vidrilhos, as pedrarias e as
perolas, e durante muito tempo, foi costume encerral-os em estojos ou
cofres, _capsae_, ricamente trabalhados.

As capas dos Evangeliarios podem-se dividir em duas classes: as de
laminas metallicas e as de marfim.

Entre as primeiras, umas eram simples, sem figuras e até mesmo
desprovidas de toda a ornamentação, outras cravejadas de pedras e
esculpidas em relevo, representando assumptos religiosos.

Os assumptos das capas dos Evangeliarios de marfim e de metal não
differem dos que têem as dos diptycos. São symbolos ou scenas extrahidas
do Novo Testamento e principalmente da vida e da paixão de Nosso Senhor.

_Estofos preciosos_. Durante os primeiros seculos da era christã, os
fatos ordinarios eram de tela, ou, na maior parte das vezes, de lã.
Depois da conversão de Constantino, o uso dos tecidos de seda para as
vestes liturgicas generalisou-se bastante, a ponto tal, que o Soberano
Pontifice S. Silvestre, contemporaneo d'este imperador, foi obrigado a
abolil-o nas roupas brancas de altar chamadas _corporaes_.

Além dos tecidos unidos, ha outros ornados com figuras ordinariamente
multicolores, obtidas umas pela applicação de variegadas côres depois da
tecedura, outras durante a tecedura, por meio de certas combinações dos
fios da cadeia e da trama.

Durante o periodo Latino, o fabrico textil da seda era completamente
desconhecido na Europa meridional e occidental. Provinham da Asia, do
Egypto, da Grecia e de Constantinopla, os tecidos de seda. É por este
motivo que muitas vezes se chamavam _estofos transmarinos_, e mais tarde
tambem, estofos dos Sarracenos, porque os arabes mahometanos forneciam
para o Occidente uma grande quantidade.

Os estofos mais antigos não raras vezes eram decorados com medalhões
circulares ou ovaes, no genero de _Maestricht_, obtidos ou pela
tecedura, ou por bordados applicados posteriormente.

A ornamentação dos tecidos, que vinham do Oriente e sobretudo da Persia,
consistia em assumptos em que predominavam o reino animal e o vegetal, e
até por vezes na propria mythologia d'este ultimo paiz. Em vão
procurariamos o symbolismo christão n'estas representações tão variadas.
Apenas ali se encontra o producto da imaginação dos artistas orientaes,
que confeccionaram esses tecidos.

Os symbolos e os assumptos christãos só excepcionalmente apparecem sobre
alguns productos das fabricas gregas ou bysantinas, e isso mesmo em uma
épocha relativamente recente; consistem em pequenas Cruzes Gregas da
Trindade, inscriptas em circulos, animaes symbolicos, taes como o leão e
o pavão, e raramente um personagem isolado. As scenas historicas do
Velho e Novo Testamentos não começaram a representar-se sobre os estofos
senão durante o VIII seculo.

Desde o meiado do IV seculo, que a egreja começou a servir-se d'este
meio, para representar, sobre os tecidos empregados nas ceremonias
sagradas, assumptos religiosos extrahidos do Velho e do Novo
Testamentos, ou da historia dos Santos.

O ouro, a seda e as perolas, abundavam em todos estes bordados, que
consistiam muitas vezes em medalhões circulares ou ovaes e que
applicavam sobre tecidos preciosos, para lhes imprimir um caracter
religioso.

Desde o VI seculo que a arte de bordar foi, na Europa occidental, a
principal occupação das mulheres nobres, e no seculo seguinte, esta arte
elevou-se a um tal gráu de prosperidade, nas Ilhas Britannicas, que
durante toda a idade media não deixou de florescer.

Desde os primeiros seculos, que se ornavam com bordados de purpura, ou
de qualquer outra côr brilhante, as vestes de lã branca dos padres e dos
diaconos. Estes bordados foram mais tarde substituidos por brocados de
seda. Serviam-se tambem dos pannos d'essa qualidade, para armação nas
basilicas e nas egrejas.

Estes ricos pannos tinham ainda outro uso. Antes de serem collocadas nos
ataúdes, as ossadas dos Santos eram rodeadas de pelles de camello e
envolvidas em tecidos os mais ricos, de linho, seda e ouro. A maior
parte dos estofos antigos que se conservaram até aos nossos dias, foram
tirados de sepulturas de Santos.

_Paramentos Sacerdotaes_. A Egreja manteve escrupulosamente, para os
ornamentos sagrados, as fórmas adoptadas pelos primeiros christãos,
emquanto que a fórma e o talhe dos fatos profanos se modificaram
invencivelmente.

Em geral, os paramentos sagrados dos padres e dos ministros inferiores
eram brancos. O uso das côres variadas manifestou-se primeiramente nas
_casulas_ e nas _capas d'asperges_.

As cinco côres liturgicas de que se servem hoje, foram estabelecidas
pouco mais ou menos no IX seculo, e definitivamente consagradas dois
seculos depois.

Os paramentos dos padres são as casulas, a _capa d'asperges_, a
_estóla_, o _manipulo_, o _cinto_, a _ópa_ e o _amicto_. As principaes
vestimentas, proprias para os ministros inferiores, são a _dalmatica_ e
a _tunicella_.

A casula primitiva era uma vestimenta sem mangas, muito ampla,
envolvendo todo o corpo desde o pescoço até aos pés, e formando uma
especie de barraca, _casula_, em torno da pessoa que a vestia. Tinha
apenas uma abertura para passar a cabeça.

A _estóla_ deve o seu nome e origem ao vestuario que os romanos chamavam
estola.

A Egreja adoptou como paramento a _estóla_, de que se fazia uso por toda
a parte, na occasião em que se estabeleceu o Christianismo.

O _manipulo_ não se usava durante os primeiros seculos da Egreja. Foi S.
Gregorio o Grande, (590-604) quem primeiro fallou, em seus escriptos, do
manipulo como paramento sagrado.

A _capa_ é um paramento commum ao padre e a alguns dos ministros
inferiores. Primitivamente serviam-se da capa para se resguardarem da
chuva nas procissões; é tambem por este motivo que ella se chama muitas
vezes _pluvial_.

A _alva_ e o _cinto_ devem a sua origem á _tunica talar_ dos antigos,
que era um vestuario de linho, munido de mangas e apertado á roda do
corpo com um cinto.

A _alva_ era vestida nas funcções sagradas pelos bispos, padres e todos
os ministros inferiores.

O _amicto_ é uma espécie de téla de que os padres e os ministros se
servem para cobrir o pescoço. A origem d'este vestuario não vae além do
VIII seculo.

Durante os tres primeiros seculos, os diaconos trajavam o _colobio_, que
era uma especie de tunica longa e estreita, ordinariamente sem mangas.
Foi no principio do IV seculo, que o Papa S. Silvestre substituiu o
_colobio_ pela _dalmatica_.

A _dalmatica_ era uma bluse comprida, feita de lã da Dalmacia.

Até ao VII seculo, os sub-diaconos da Egreja do Occidente não eram
vestidos senão com a alva, com o cinto e com o amicto.


*Mosteiros Latinos*


Foi no principio do VI seculo, que começaram a maior parte dos
religiosos a reunir-se em communidade, e a viver juntos, debaixo do
mesmo tecto. Vivia então S. Benedicto.


*Iconographia do periodo Latino*


Muitos monumentos do periodo Latino, sobre tudo os mais antigos
mosaicos, conteem personagens em pé e attitude respeitosa, tendo nas
mãos, envoltas nas rugas do manto, uma corôa em fórma de circulo, que
offerecem ao Salvador. Este é representado sob a fórma symbolica do
Cordeiro, do monogramma, da Cruz, e até mesmo d'um simples espaço vazio.

Christo, debaixo da fórma symbolica do Cordeiro ou do monogramma, no
meio de doze cordeirinhos ou de doze pombas, que os monumentos do
periodo Latino nos offerecem frequentemente, symbolisa o Salvador
rodeado dos seus discipulos, isto é, a Egreja triumphante no Céu,
recebendo na terra o ensino do seu Divino Fundador.

Tambem muitas vezes se encontra um cordeiro, uma Cruz Trina, ou o
monogramma de Christo entre dois cordeiros, duas pombas, dois pavões ou
dois veados; isto symbolisa o Salvador sob a fórma humana no meio dos
Apostolos e d'outros Santos, ou sob a fórma symbolica do Cordeiro e do
monogramma no meio de doze cordeirinhos ou doze pombas.

Vê-se tambem uma taça ou um cacho de uvas no meio de dois pavões ou de
duas pombas, o que nos parece uma allusão mais directa ao regosijo dos
que vão para o Céu.

Alguns monumentos do periodo Latino, principalmente os mosaicos do V e
VI seculos, teem um throno, com ou sem docél, e em que ha uma almofada,
um cortinado cahindo diante da cadeira e algumas vezes o livro dos
Evangelhos. Um monogramma ou uma Cruz, geralmente da Trindade, occupa o
meio do throno e domina toda a composição. Muitas vezes vê-se, ao lado
do throno, os doze Apostolos em pé, ou sómente S. Pedro e S. Paulo. Em
todos estes assumptos o throno representa o Salvador.

Mais tarde, principalmente no Oriente, acrescentaram a esta
representação novos signaes iconographicos: nas extremidades da almofada
collocavam á direita da Cruz a lança, e á esquerda a esponja na
extremidade d'uma lança; algumas vezes tambem se entrelaça a corôa de
espinhos em torno da Cruz. A partir d'este momento, a _cathedra_ da
doutrina torna-se o throno do julgamento final e a Cruz o signal do
Filho do Homem.

S. Pedro, collocado ao lado do Salvador, sustenta ordinariamente sobre o
hombro esquerdo uma cruz de haste comprida; outras vezes recebe com a
mão direita um volume desenrolado, que Nosso Senhor lhe apresenta. Desde
a primeira metade do V seculo, que elle conserva as chaves na ponta do
seu manto.

S. Paulo é quasi sempre representado recebendo um ou dois rolos,
symbolos da Lei Evangelica.

Muitas vezes tambem collocavam uma phenix sobre uma palmeira. A Phenix é
a figura da resurreição futura.


*Caracteres do estylo Bysantino*


O plano e a disposição das egrejas bysantinas apresenta-se com tres
typos distinctos: 1.^o, com a basilica coberta de madeira, similhante á
basilica Latina do Occidente; 2.^o, com a rotunda ou egreja circular;
3.^o, com a basilica bysantina propriamente dita, abobadada e sobreposta
d'uma ou de muitas cupulas. A basilica bysantina abobadada distingue-se
perfeitamente de todos os monumentos dos tempos anteriores, pela cupula
sobre abobadas pendentes, e construida ao meio d'uma nave, mais ou menos
alongada.

As fachadas das egrejas bysantinas differem das que têem as basilicas
Latinas. Estas terminam em geral por um frontespicio triangular; as
fachadas das egrejas orientaes, pelo contrario, terminam ou por uma
fachada horisontal á maneira d'uma cornija, ou por uma serie de
corôamentos semicirculares.

O systema de construcção das egrejas bysantinas distingue-se pelos
seguintes traços. O tijolo é geralmente empregado para todas as
edificações. Mesmo nos paizes em que a pedra é abundante, os architectos
bysantinos preferiam, a maior parte das vezes, o tijolo aos materiaes de
grandes dimensões. O caracter distinctivo das egrejas bysantinas, sob o
ponto de vista da construcção, consiste na presença de uma ou de muitas
cupulas elevadas, sobre abobadas pendentes.

Chamam-se _abobadas pendentes_ umas certas saliencias nas abobadas do
cruzeiro, que pela sua fórma se approximam do sector espherico e que
serve para fazer passar uma construcção de quadrado a octogono ou a
plano circular.

A decoração exterior das egrejas bysantinas, sobretudo no IV e V
seculos, era pobre e simples. Do VII seculo ou do VIII seculo em diante,
os ornamentos exteriores das paredes e archivoltas das janellas são
bastantes vezes como os dos edificios Latinos, formados por fiadas de
pedras alternadas com uma ou muitas fiadas de tijolos. As archivoltas
ornadas de molduras ficam em resaltos umas sobre as outras, e
representadas nas paredes por cordões feitos de tijolos de fórma e côr
variaveis.

A decoração _interna_ consiste em revestimentos de diversas naturezas,
marchetados de marmores ou mosaicos, applicados sobre os pilares,
paredes e abobadas. O caracter essencialmente superficial da esculptura
bysantina consiste regularmente em folhagens lisas e angulares.

Os ornatos que os bysantinos gostavam de esculpir nas almofadas de
marmore com que decoravam o interior das egrejas, eram entrelaçamentos
de linhas rectas e curvas, ás quaes juntavam cruzes da Trindade, florões
e algumas vezes figuras de animaes tanto reaes como chimericos.

A começar no VIII seculo, as pinturas a fresco das egrejas bysantinas
foram muitas vezes substituidas por mosaicos e por embutidos em estuque;
acabaram por ser completamente substituidas.

A influencia bysantina fez-se sentir primeiramente no começo do IX
seculo e mais tarde, no fim do X. Foram construidas muitas egrejas sob a
influencia bysantina dos monumentos typos.

No reinado de Justiniano (527-565) o estylo bysantino ficou
definitivamente constituido com os caracteres acima definidos. Santa
Sophia em Constantinopla constitue o seu typo por excellencia.

Leão, o Isauriano, prohibiu, em 726, a reproducção de qualquer figura,
quer pela esculptura, quer pela pintura nas paredes das egrejas, quer
nos objectos do culto. Esta prohibição, confirmada em 754, por um
conciliabulo heretico, subsistiu até 842. N'este ultimo anno, depois da
morte de Theophilo, ultimo imperador iconoclasta, a imperatriz Theodora
substituiu os editos de Leão o Isauriano e restabeleceu o culto das
imagens.

A épocha mais florescente da arte bysantina foi no X seculo e mais
particularmente no reinado de Constantino Porphyrogeneta.

No XI seculo, uma serie de graves acontecimentos precipitou a decadencia
do imperio bysantino e trouxeram por consequencia o enfraquecimento das
artes. No XIII, XIV e XV seculos, as artes continuaram a desfallecer,
até que, em 1453, os turcos, apoderando-se de Constantinopla, causaram a
decadencia da arte bysantina.



CAPITULO IV

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     *Summario.*--O estylo Roman desde o VIII até ao seculo
     X--Caracteres do estylo Lombardo--Planos das
     Egrejas--Cryptas--Baptisterios--Systemas de
     construcção--Abobadas--Pilares e
     columnas--Bases--Capiteis--Fachadas--Cornijas--Decoração
     monumental--Architectura, antes do seculo XI, nos outros estados
     sem ser na Lombardia: Italia central e meridional, Belgica e
     França--O estylo Roman durante o XI e o XII seculos--Caracter da
     Architectura Roman--Plano e distribuição das
     Egrejas--Cryptas--Baptisterios n'este seculo--Materiaes e modo de
     construir--Sepultura monumental--Fachadas--Portico das
     egrejas--Portaes--Portas e suas ferragens--Janellas e
     rosaceas--Maneira de resguardar da chuva as janellas e as vidraças
     pintadas--Absides--Pilares, columnas--Bases e capiteis--Arcadas e
     arcarias menores--_Triforium_--Cornijas e
     modilhões--Abobadas--Contrafortes--Madeiramentos--Torres--Modo de
     se lagearem os edificios--Pinturas muraes--Inscripcões
     lapidares--Altares--Piscinas--Tribunas--Cadeiras do côro e a
     separação da capella mór do corpo da egreja--Capellas
     funereas--Tumulos visiveis e occultos--Campas--Pias
     Baptismaes--Gradamentos--Alfaias religiosas--Calices e
     patenas--Custodias--Relicarios--Corôas suspensas nos
     altares--Lustres de forma de corôas--Cruzes para os altares e
     procissões--Castiçaes e tocheiros--Evangeliarios--Capas dos livros
     do Evangelho--Thuribulos--Pias para agua benta--Pentes
     liturgicos--Cadeiras para os sacerdotes--Baculos--Calçado
     liturgico--Mitras--Tecidos bordados--Vestuarios sacerdotaes.
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*Periodo Roman*


O periodo roman estende-se desde o VIII seculo até ao fim do XII. O
estylo roman formou-se e desenvolveu-se debaixo da influencia combinada
de tres elementos: 1.^o, o estylo classico e latino, cujos monumentos
existiam espalhados pela Europa meridional; 2.^o, o estylo bysantino,
cujos principios foram importados do Oriente; 3.^o, o genio particular
dos povos barbaros que invadiram a Europa desde o V seculo.

O estylo proveniente da influencia combinada d'estes tres elementos,
chamou-se _roman_, porque a sua origem e duração coincidem pouco mais ou
menos com a da lingua romanica. Por conseguinte a palavra _roman_
indica, do mesmo modo que na lingua romanica, o elemento barbaro que
contribuiu para a formação d'este estylo.


*O estylo Roman desde o VIII até ao X seculo*


A decadencia completa das bellas artes foi o effeito necessario dos
movimentos politicos que a Europa soffreu durante tres seculos. Só os
padres e os religiosos luctavam no meio d'este chaos, contra a barbarie
e a força brutal dos invasores. O renascimento das artes foi lento, e do
mesmo modo o das lettras, porque o solo da Europa occidental estava
juncado de destroços amontoados, dos monumentos antigos; as tradições
artisticas tinham-se perdido, e os principios haviam cahido em
esquecimento.

Para a architectura e para as artes, a Lombardia foi, desde o VII até ao
fim do X seculo, o principal centro d'este renascimento. O estylo
formou-se n'esta épocha, ao norte da Italia, e recebeu o nome de
_Lombardo_.


*Caracteres do estylo Lombardo*


O estylo Lombardo, ou o estylo Roman do norte da Italia, reinou n'este
paiz desde o VIII seculo até ao fim do XII.

O plano da basilica Latina foi geralmente adoptado nas egrejas
lombardas.

Na maior parte das grandes egrejas lombardas, as paredes internas são
construidas com galerias.

As cryptas das egrejas lombardas estendem-se por baixo de todo o
presbyterio, e formam verdadeiras capellas subterraneas, com muitas
naves abobadadas.

Os baptisterios isolados, geralmente octogonaes ou circulares, usaram-se
durante o periodo lombardo.

A maior parte dos edificios lombardos são construidos de tijolo.

_Abobadas_. A abobada em fórma de _berço_ consiste n'um semi-cylindro
concavo e sem penetração alguma.

A abobada de _*aresta*_, assim chamada porque apresenta quatro arestas
no intradoz, é formada pela intersecção ou penetração de duas abobadas
de berço, com a mesma abertura e reunindo-se em angulo recto.

Os architectos lombardos fizeram grandes progressos na construcção das
abobadas. Antes do seu tempo não se conhecia além da cupula senão duas
especies de abobadas: a abobada de berço, e a abobada de aresta romana.

As abobadas lombardas apresentam todas uma elevação em fórma de
zimborio, particularidade que pertence ao systema de construcção seguido
pelos architectos lombardos. Esta elevação dá ás abobadas das egrejas
lombardas um aspecto particular.

Nas egrejas lombardas de tres naves, a principal tem sempre dobrada
largura.

Como dissémos, as abobadas da nave principal exercem sobre os seus
pontos de apoio não sómente uma pressão vertical, mas tambem uma obliqua
e lateral, que tende a fazer inclinar para fóra os pilares e as muralhas
superiores. Nos edificios lombardos, esta pressão acha-se equilibrada
pelo encontro opposto das abobadas altas e baixas das naves lateraes e
em parte apoiada sobre os contrafortes exteriores, pelos arcos-butantes
das naves lateraes e pelas porções de parede que supportam estes arcos.

Nos edificios antigos e nas basilicas latinas serviam-se de columnas
cylindricas, pouco espaçadas e recebendo directamente as pressões
verticaes de entablamentos d'um peso relativamente pouco consideravel.
Os constructores lombardos substituiram o pilar composto de columnas
pelo simples supporte cylindrico da basilica coberta de madeira.

Os caracteres dos pilares lombardos pódem resumir-se da seguinte
maneira: 1.^o Os pilares apresentam uma secção rectangular ou quadrada e
são ornados de pilastras ou de columnas envolvidas, recebendo as bases
das nervuras e dos arcos-butantes. 2.^o Não têem todas a mesma grossura,
umas são menos, outras mais fortes, segundo recebem ao mesmo tempo as
bases de todas as abobadas, ou das naves lateraes sómente. Foi desde a
primeira metade do seculo VIII que appareceram os pilares ornados de
columna, desconhecidos na arte classica e empregados com profusão no
Occidente pela arte na edade media. As columnas e as columnatas são
ordinariamente construidas por fiadas de desigual altura de medio e
pequeno apparelho; raramente são monolithas.

Essas columnatas dos pilares, quasi sempre delgados e muito elevados,
chegam muitas vezes sem interrupção até á origem das abobadas, e
constituem um facto capital na historia da arte, porque são um dos
elementos mais caracteristicos e fundamentaes de quasi toda a
architectura da edade media.

As bases lombardas approximam-se sensivelmente, pela sua fórma, da base
attica propriamente dita.

Estas bases são muitas vezes munidas d'um ornato destinado a ligar o
tóro inferior com os angulos do plintho e a dar d'este modo uma
apparencia de maior solidez dos angulos. Este ornato ou appendice
recebeu o nome de _garra_ ou _pata_.

As garras mais antigas são muito simples, as de data posterior
representam ordinariamente cabeças d'animaes.

Os capiteis lombardos, assim como os bysantinos, têem ordinariamente a
fórma de açafate esvasado ou cubico.

Uma transformação se opéra insensivelmente e a arte lombarda adquire uma
certa originalidade. Os seus typos são variadissimos; o cinzel do
esculptor dá ali provas de fecundidade. Mais tarde esta transformação
continúa lentamente, e durante o X seculo, as esculpturas tornam-se mais
salientes, as folhagens são augmentadas e as extremidades arredondadas.

Em relação á esculptura d'ornato que cobre o açafate, podem
distinguir-se duas especies de capiteis: os capiteis _ornados de
folhagens_ e os capiteis historicos ou legendarios. Os capiteis
historicos são muito communs nas egrejas lombardas que datam do VIII
seculo.

Chamam-se historicos e legendarios os capiteis que são ornados com
esculpturas que representam scenas tiradas da historia ou da lenda e até
mesmo algumas vezes têem animaes symbolicos ou phantasticos.

O abaco enorme em fórma de capitel, que se encontra nos edificios
Latinos, só raramente se vê nas egrejas Lombardas; é substituido por
grosso abaco, mas pouco elevado, de profil muito acentuado e muitas
vezes talhado em pedra differente do corpo do capitel.

Em opposição ao principio geralmente admittido pela antiguidade e pela
edade media, as fachadas das egrejas Lombardas não indicam exteriormente
a fórma das naves lateraes.

Compõem-se d'uma grande parede que chega até aos dois lados obliquos que
a terminam, e na qual não apparece o resalto na nave principal por cima
das naves lateraes.

Os campanarios das egrejas Lombardas ficam ordinariamente separados do
edificio da egreja, e compõem-se de uma serie d'andares quadrados, todos
da mesma largura e pouco mais ou menos da mesma altura, separados uns
dos outros por cornijas. Estes andares são ornados com faixas muraes e
pequenas arcadas fingidas, cujos arcos se apoiam sobre modilhões.

As cornijas dos edificios lombardos apenas apresentam uma pequena
saliencia das faces das paredes. São quasi sempre collocadas sobre
arcaduras fingidas, de volta inteira, assentando em modilhões de fórma
muito simples.

As arcaduras constituem uma das fórmas caracteristicas da architectura
Lombarda; encontram-se, não só debaixo das cornijas dos telhados, mas
tambem debaixo das outras cornijas das fachadas; e até mesmo nas
platibandas horisontaes dos edificios.


*Decoração monumental*


Os bysantinos cobriam com marmores e mosaicos as paredes interiores das
suas egrejas. Os lombardos, pelo contrario, mostram no seu systema
decorativo uma certa preferencia quasi exclusiva pelas esculpturas, a
qual derivando da bysantina, foi por algum tempo sua imitação; porém,
mais tarde, a começar no IX seculo, principiou-se a abandonar esse modo
de decorar.

Nos primitivos edificios lombardos nota-se uma grande incorrecção nas
esculpturas das figuras, quer verdadeiras, quer phantasticas. Mais
tarde, encontram-se, em todo o periodo do estylo Lombardo, nos seus
edificios, animaes chimericos, ora isolados ora em frente uns dos
outros, e acompanhados, e tambem entrelaçados de folhagens.

As esculpturas não cobrem só os capiteis, mas tambem as archivoltas e os
tympanos, assim como as faces dos altares, dos doceis, etc.

Os embutidos e os revestimentos de marmore são raros no interior dos
edificios lombardos.

Desde o IX seculo que se substituiram os embutidos em marmore pelas
pinturas a fresco e por mosaicos de pequenos cubos.

Em quanto o estylo Lombardo se desenvolvia no Norte da Italia, o Latino
continuava a ser seguido na Italia central e meridional.

A maior parte das egrejas do VII e do VIII seculos eram construidas de
madeira, o que explica os frequentes incendios d'essas egrejas.

No principio do seculo IX, o imperador Carlos-Magno tentou fazer reviver
as bellas artes na Europa Occidental; quiz restabelecer o renascimento
da arte romana.


*O estylo Roman durante os seculos XI e XII*


O estylo Lombardo, inteiramente constituido no Norte da Italia desde o
seguinte seculo, exerceu uma grande influencia sobre a architectura
roman dos paizes cisalpinos no XI e XII seculos. No fim do X seculo, e
no principio do seguinte, os monges introduziram o estylo Lombardo na
Allemanha, na Suissa, e nas provincias da França visinhas da Italia,
d'onde irradiou para o Norte e Oeste.

O estylo roman da Europa Central não é outra coisa mais que o estylo
Lombardo transportado áquem dos Alpes e modificado occidentalmente pelo
proprio genio dos differentes povos que occupavam esta região. O
elemento Gaulo-romano tomou tambem grande parte na formação do estylo
roman.

O roman inglez recebeu o elemento Lombardo por intermedio dos Normandos,
que, depois de terem conquistado a Inglaterra, para ali levaram o estylo
do Occidente da França.

A rapida propagação das ordens religiosas durante o seculo XI,
contribuiu poderosamente para a diffusão e desenvolvimento da
architectura Roman. Foi n'este seculo, que as ordens religiosas, graças
a abundantes recursos, cobriram em pouco tempo a Europa Central e
Occidental com um grande numero de egrejas e mosteiros. Estes
monumentos, não obstante apresentarem todos os mesmos caracteres geraes,
taes como o emprego das abobadas de volta inteira e d'um mesmo systema
de construcção, differem comtudo entre si, em certos caracteres
especiaes, proprios de cada região.

O estylo roman do seculo XI differe do estylo do XII por uma
ornamentação mais simples, contornos menos correctos e execução
geralmente inferior.

No seculo XII, abundam os ornatos tanto no interior como no exterior dos
edificios. No final do seculo XI, estabeleceram-se, na Europa
Occidental, duas escolas de architectura, animadas de diversas
tendencias. Uma na ordem de S. Bento, que tinha o seu centro principal
na abbadia de Cluny, desenvolvia uma magnificencia e um luxo quasi
extraordinario na decoração dos edificios religiosos, cuja construcção
lhe era incumbida; a outra, pelo contrario, procedente da Ordem de
Cister, quasi que não admittia ornatos alguns e levava a singeleza até á
severidade. Em todos os paizes em que existiam edificios romanos por
occasião da formação do estylo roman, a sua existencia exerceu grande
influencia na decoração dos edificios. Pelo contrario nos paizes em que
escasseavam aquelles monumentos, diligenciaram imitar, a maior parte das
vezes, na esculptura monumental os variados tecidos importados do
Oriente.


*Caracteres da architectura Roman*


As egrejas romans apresentam ordinariamente em planta a forma d'uma Cruz
Latina, cuja frente representada pelo côro é voltada para o Oriente.
Têem geralmente tres naves formadas por duas ordens parallelas de
pilares, e algumas vezes de cinco. Depois do seculo XI, o côro das
egrejas cathedraes, abbaciaes (exceptuando as da Ordem Cistersiense e
collegiaes), tem maiores dimensões que nas basilicas Latinas e
Lombardas.

Quando o côro não era rodeado de capellas, terminava por um abside
semi-circular ou por uma parede recta. Encontram-se, nas margens do
Rheno e em outras partes da Allemanha, egrejas Romans com dois absides
semi-circulares, um a Leste e o outro a Oeste.

Algumas das grandes egrejas Romans têem os lados do corpo da egreja
divididos por galerias.

Todas as egrejas Romans, sem excepção, são orientadas.

Muitas das mesmas egrejas têem cryptas quasi sempre situadas debaixo do
côro, e formando capellas subterraneas, com tres a cinco naves, cujas
abobadas de barrete veem assentar sobre duas ou quatro ordens de pilares
pouco elevados.

Desce-se para a maior parte das cryptas por duas escadas collocadas aos
lados da que do transepte conduz ao côro. Nas que não têem senão uma
entrada, acha-se ordinariamente diante do côro mesmo no eixo da egreja.

O uso de construir cryptas só deixou de existir desde o seculo XIII.

Durante o periodo Roman, ainda se construiram, ao pé das cathedraes e
das grandes Egrejas abbaciaes e parochiaes, baptisterios isolados, de
fórma polygonal e circular.

Todavia, logo que a solemne ministração do baptismo caiu em desuso, não
se construiram mais baptisterios proximo das novas Egrejas parochiaes
que se edificaram. A pia baptismal foi então transportada para a nave
principal, proximo á porta de entrada da egreja nas naves lateraes, ou
então em uma capella do lado occidental, proximo da porta principal.

A natureza dos materiaes influe poderosamente sobre o modo de
construcção adoptada; assim nos paizes em que a cantaria é resistente,
construe-se com grandes dimensões, o apparelho é mais grandioso, as
fiadas são altas; emquanto que, nas localidades em que os materiaes são
menos resistentes, e em que o trabalho de preparar a cantaria é portanto
mais facil, o apparelho tem menor dimensão.

No seculo XI, a esculptura monumental toma repentinamente um
desenvolvimento extraordinario pela influencia combinada do estylo
Lombardo, dos monumentos Gaulo-Romanos; dos tecidos e outros objectos
d'arte importados do Oriente pelos cruzados.

Em cada paiz ou quasi que em cada provincia, a decoração Roman offerece
caracteres particulares, devidos á aptidão dos habitantes, á variada
natureza dos materiaes e a outras influencias locaes. Em geral, em todos
os paizes onde se encontravam documentos romanos ricamente decorados, a
influencia Lombarda se liga e se combina com a d'estes monumentos.

No Noroeste da França, principalmente na Normandia, e até mesmo na
Inglaterra, a decoração consiste principalmente em estrellas e outras
figuras geometricas. A ornamentação Roman da Allemanha compõe-se
sobretudo de galões entrelaçados, cujas extremidades acabam em folhas
com tres a cinco lobulos. Estes galões, algumas vezes ornados de
perolas, parecem ordinariamente ligados com fitas ou reunidos por
anneis.

Na Belgica, onde principalmente se manifestou a influencia da escola
Cistersiense, os monumentos do periodo Roman não têem as decorações de
trabalhos custosos e variados, que se encontram n'outros paizes.

Assim como nas basilicas Latinas, as fachadas das egrejas Romans indicam
em geral a forma transversal das naves; só no seculo XI, começaram a
ornal-as com mais cuidado e esmero. A sua decoração architectural
consiste nos portaes, ordinariamente tres, construidos em profundas
arcadas de volta inteira mais ou menos carregadas de molduras de
architectura; as galerias, verdadeiras ou fingidas, eram formadas por
uma ou muitas ordens de arcadas fingidas ou rendilhadas; e emfim em
grandes rosaceas vasadas, por cima da porta principal.

Raras vezes se encontram fachadas romans decoradas com estatuas.

Antes do seculo XI, os atrios que succederam aos narthex das basilicas,
apresentavam-se d'ordinario sob a fórma d'um portico, geralmente pouco
profundo e occupando toda a largura da fachada da egreja; havia alguns
tambem, ainda que pouco numerosos, que eram construidos na fachada
Occidental.

Os atrios Romans dos seculos XI e XII dividem-se em fechados e abertos;
os primeiros tomaram, em varios paizes, um desenvolvimento de tal modo
importante, que formavam de alguma maneira uma nova egreja construida em
frente das naves propriamente ditas, como havia na egreja de S.
Francisco de Santarem.

Nos grandes monumentos do seculo XI, e especialmente do XII, os portaes
mais notaveis, e até mesmo algumas vezes os secundarios, são ornados
profusamente de esculpturas de todo o genero.

Quando as archivoltas dos portaes são cobertas com muitas esculpturas, o
tympano é quasi sempre ornado d'um baixo relevo, representando Jesus
Christo sentado e sob uma aureola. Em alguns casos o Redemptor offerece
as mãos a dois Santos coroados e ajoelhados cada um do seu lado; em
outros, lança a benção com a mão direita e segura um livro com a
esquerda; n'este caso a aureola é muitas vezes cercada de animaes
symbolicos representando os Evangelistas.

Nos mais importantes monumentos, os batentes dos portaes eram
ordinariamente de bronze ou de qualquer outro metal.

As ferragens das portas, que a principio não serviam senão para
consolidar todas as travessas da porta, forneceram desde o seculo XI, no
estylo Roman, um dos mais bellos modelos de ornamentação.

Encontram-se tambem, nos edificios de architectura Roman, portaes com
batentes de madeira esculpidos em baixo relevo. As janellas d'estes
edificios mais antigos são pequenas e quasi sem ornamentação alguma.

No meado do seculo XI, augmentaram os vãos das janellas á proporção que
mais se generalisava o uso do vidro. No final d'este seculo e durante
todo o XII, as archivoltas exteriores das janellas dos grandes
monumentos são executadas com o maior cuidado, e compostas de arcos com
muitas ordens de pedras lavradas symetricas, varias vezes com o feitio
de tóros, ficando assentes sobre grupos de pequenas columnas ou sobre
pés direitos ornados de uma imposta com esculptura. Estes tóros têem
tambem muitas vezes ornatos.

No seculo XII, apparecem as janellas geminadas de dois vãos, separados
por uma humbreira em fórma de columna, e servindo-lhe de moldura um arco
commum de resalva. Vêem-se tambem janellas mesmo de tres vãos reunidos
debaixo d'um unico arco. N'estas ultimas ou o vão do meio é mais alto
que os dos lados, ou então é o tympano formado pelo grande arco, no qual
ha um oculo, inteiramente aberto ou em fórma de trêvo, de quatro folhas
e ás vezes com seis e mais lóbulos.

Tambem se encontram nos edificios romans do seculo XIII, olhos-de-boi e
que não servem de ornamento aos vãos de janellas. Chamam-se rosaes e são
compostos de differentes maneiras.

Nos paizes meridionaes continuaram a vedar os vãos das janellas com
caixilhos rendilhados, de madeira ou de marmore. Os desenhos produzidos
pelos recortes das travessas apresentam fórmas mais variadas e em
harmonia com a ornamentação Roman; compõem-se quasi sempre de figuras
geometricas. Os caixilhos recortados foram empregados até ao seculo XVI,
na Grecia, Italia e Hespanha e ainda hoje no Oriente.

Na Europa Occidental e Septentrional preferiam tapar as janellas com
vidros pequenos assentes em caixilhos de madeira, mas, desde o seculo X,
reunidos por meio de filetes de chumbo. Algumas vezes estes vidros,
differentemente coloridos, formavam um mosaico transparente, no qual
ainda não havia figuras nem ornatos pintados sobre o vidro.

O emprego de vidraças com varios assumptos e personagens pintados,
começou provavelmente no final do seculo X.

Em muitas egrejas, o côro e mesmo algumas vezes os braços do transepto
terminam por um abside semi-circular ou polygonal.

O abside está ordinariamente ligado por um abside circular coberto d'um
tecto quasi sempre mais baixo que o do côro.

As paredes exteriores dos absides são a maior parte das vezes ornadas
d'uma ou de muitas ordens de arcadas separadas por faixas de pequena
saliencia; columnas ou pilastras envolvidas, ligadas entre si por arcos
de volta inteira. As janellas, ordinariamente em numero impar, são
abertas debaixo das arcadas.

Os absides de quasi todas as egrejas Romans das margens do Rheno
apresentam junto ao tecto uma galeria aberta, formada por uma serie de
pequenas arcadas de volta inteira e sustentadas por pequenas columnas.
Estes absides receberam o nome de absides _rhenanos_. Serviam outr'ora,
e servem ainda hoje, em alguns sitios, para a exposição das reliquias.

Os edificios construidos na Europa Central, no fim do seculo X e
principio do XI, não apresentam, muitas vezes, mais do que pilares muito
simples, de secção circular, quadrada ou rectangular. No seculo XI,
tambem se introduziu, áquem dos Alpes, o uso dos pilares com angulos
reintrantes para collocar duas ou quatro columnas envolvidas, de que os
constructores Lombardos se serviam já no seculo VIII.

As egrejas, parochias ruraes, de menor importancia teem muitissimas
vezes pilares quadrados, curtos, sem base nem capitel, ou tendo por
ornamento unicamente uma ou duas molduras pouco salientes que fazem
parte do capitel.

Durante o periodo Roman, principalmente no seculo XII, muitos dos fustes
das columnas foram cobertos de esculpturas variadas, consistindo em
figuras geometricas, espiraes, torçaes, galões, botões, folhagens,
cordões, animaes e mesmo representações de assumptos historicos ou
legendarios. Estes ornatos são communs principalmente no Sul da Europa.

No fim do periodo Roman e no principio da época Ogival, as columnas são
_anneladas_, isto é, formadas d'uma especie de tóro á roda do fuste.

As columnas _anneladas_ constituem um dos caracteres dos monumentos da
transição do estylo Roman para o estylo Ogival. Tambem se encontram
d'estes anneis nas nervuras das abobadas. No seculo _XII_, as columnas
são tambem ás vezes duplas ou enfeixadas.

As bases das columnas são variadissimas.

Muitas das que se encontram nos edificios mais antigos assimilham-se ás
bases Lombardas, mas sem ter garras.

As bases ornadas com esculpturas, muito communs no Sul da Europa, são
raras nos paizes do Norte.

Foi no meado do seculo XI que começou a apparecer, áquem dos Alpes, o
ornato chamado _garra_, que os lombardos já tinham usado muito tempo
antes.

A garra Romã tem em geral a fórma d'uma folha applicada sobre o tóro
inferior da base no angulo do plintho, e tambem ás vezes, a d'uma
carranca ou d'um animal phantastico.

Desde o principio do seculo XII, os constructores romans achatam a forma
do tóro inferior, quando a base se approxima da forma Attica; um pouco
mais tarde apparece entre os tóros das bases, a moldura concava,
bastante profunda, que fórma um dos caracteres distinctivos dos
monumentos do fim do seculo XII e da primeira metade do XIII.

Os capiteis de architectura Roman são variadissimos. Ha uns que apenas
se compõem de duas ou tres molduras curvas ou chanfradas, imitando o
capitel toscano ou dorico.

A cornija dos capiteis é umas vezes elevada e coroada com um ábaco
saliente, e outras baixa, tendo um ábaco que não resalta o fuste da
columna.

Encontram-se, em muitos monumentos Romans, capiteis chamados _cubicos_,
porque têem a configuração d'um cubo. Estes capiteis são algumas vezes
chanfrados nos angulos inferiores e em geral arredondados na parte
inferior.

A parte inferior do capitel cubico _Rhenano_, do seculo XII, era muitas
vezes dividida em quatro porções de esphera, formando assim um grupo de
quatro capiteis reunidos debaixo de um mesmo ábaco, mas foi ainda
augmentado o numero das subdivisões, produzindo d'este modo os capiteis
cubicos _canellados_ ou com resaltos redondos, que se encontram
principalmente na Inglaterra e no Noroeste da França.

No tempo da formação do estylo Roman, a arte da esculptura estava quasi
totalmente perdida áquem dos Alpes. Os que primeiro tentaram manejar o
cinzel esforçaram-se em reproduzir, melhor ou peior, os antigos ornatos
que tinham á vista; as producções d'estes artistas improvisados são
imperfeitas e grosseiras.

Encontram-se em muitos monumentos Belgas do seculo XII, capiteis cuja
ornamentação, simples e rudimentar, consiste unicamente em folhas
applicadas sobre o açafate, e algumas vezes contornadas em voluta
debaixo dos angulos do ábaco.

Os capiteis de quasi todos os grandes monumentos dos seculos XI e XII,
são decorados de esculpturas ou de pinturas de côres carregadas. Os
ornatos consistem em galões imitando perolas, folhagens encrespadas,
florões artisticamente executados, animaes symbolicos, animaes
phantasticos isolados ou em grupos, assumptos tirados da lenda ou da
historia, principalmente do Velho e Novo Testamentos.

O capitel de _crochets_ usou-se na Belgica e em algumas partes da
Allemanha desde o fim do periodo Roman. Dá-se o nome de _crochets_ e
algumas vezes tambem o de _baculo vegetal_, ás folhas mais ou menos
compridas, recurvadas em voluta na sua extremidade.

Chama-se _arcada_ toda a abertura, real ou simulada, contornada por uma
archi-volta; e _arcadura_, uma arcada de pequenas dimensões.

Até ao seculo XI serviam-se geralmente do arco de volta inteira ou
formado por um semi-circulo para ligar duas columnas ou os dois pontos
extremos d'uma arcada. Nos seculos XI e XII, começam a apparecer novas
formas d'arcos: 1.^o, o arco _elevado_, cujos dois ramos descendentes se
prolongam verticalmente abaixo do centro gerador; 2.^o, o arco em fórma
de ferradura produzido por uma parte da circumferencia que excede o
semi-circulo; 3.^o o arco de volta abatida ou em aza de cesto, formado
por uma semi-ellypse cortada segundo a direcção do eixo maior; 4.^o, o
arco de tres lóbulos cujo intradoz é composto de tres lóbulos.

As paredes interiores lateraes das egrejas, as capellas, as casas
capitulares são em geral ornadas, na sua parte inferior, com arcaduras
sustentadas por pequenas columnas mais ou menos embebidas no pé-direito
e firmadas sobre um sócco de pedra collocado em roda de todo o edificio.

As arcaduras tambem são muitas vezes empregadas, no exterior dos
edificios, para a decoração das fachadas. Encontram-se egualmente sobre
as outras partes dos monumentos arcadas pouco salientes, cujas
extremidades assentam sobre modilhões muitas vezes executados apenas de
feitio chanfrado, e ainda ás vezes ornadas de esculpturas. Em alguns
casos foram os modilhões substituidos por grupos de columnas embebidas.

As arcaduras servem principalmente para ornamentar as partes lisas das
paredes debaixo das cornijas, os parapeitos das janellas e as
platibandas de que se servem para as ligar entre si pelas faixas muraes.

Estas arcaduras foram imitadas do estylo Lombardo. Tambem se encontram
principalmente nos edificios romans da Allemanha, da Inglaterra e
d'algumas partes da França.

Chamam-se _Triforiums_ as galerias mais ou menos largas, que ficam por
cima das arcadas das naves lateraes das egrejas, ou simplesmente por
cima das archivoltas das grandes arcadas que ligam dois pilares
contiguos.

Encontram-se _Triforiums_, que abrangem todo o comprimento do corpo da
egreja, nos edificios Lombardos.

Os _Triforiums_ estreitos são posteriores ao seculo XII, e só durante o
periodo Ogival é que se generalisou o seu emprego.

A cornija compõe-se d'uma pedra mais ou menos saliente sobre a face das
paredes de maior ou menor grandeza, segundo a maior ou menor dureza dos
materiaes de que dispomos.

A cornija é sustentada por consólas ou modilhões collocados regularmente
por baixo das juntas das pedras que formam as cornijas. Os modilhões
têem a fórma d'um curvo ou d'um florão. Chama-se _curvo_ um modilhão
simples, que fica saliente sobre a face d'uma parede ou d'um pilar e que
tem as duas faces lateraes parallelas e perpendiculares á mesma parede;
e com feitio de florão, é uma consóla que não tem as faces nem
parallelas, nem perpendiculares á parede. Ás vezes são os curvos e esses
florões ornados de esculpturas representando cabeças humanas, figuras
grotêscas, carrancas, monstros, volutas, etc.

A maior parte dos edificios do periodo roman não tinham abobadas senão
no abside do côro, no pavimento inferior dos campanarios e algumas vezes
ao de cima das naves lateraes. A nave central era ordinariamente coberta
com um simples tecto de madeira. As abobadas que hoje se vêem em muitas
egrejas do estylo roman foram construidas em epoca bem mais recente.

Nos edificios religiosos que tinham a nave principal coberta d'abobadas,
eram estas d'aresta geralmente em nervuras; e como succede nas egrejas
lombardas, a cada arco da nave central correspondiam nas paredes
lateraes dois arcos de menores dimensões. Para supportar a pressão
obliqua, exercida sobre os pilares e sobre as altas paredes da nave pela
abobada da nave central, os architectos romans seguiram dois systemas.

Uns, imitando os constructores lombardos, construem as paredes lateraes
quasi da altura da nave e dispõem as abobadas de maneira que supportem a
curva da abobada central. Outros construem nas paredes lateraes abobadas
semi-circulares ou de quarto de cylindro, cuja parte inferior assenta
sobre as paredes mestras do edificio, e a parte superior vem apoiar-se
contra a principal parede da nave central no logar onde começa a sua
abobada.

Até ao principio do seculo XII, os arcos duplos compõem-se de uma ou de
duas ordens de cunhas de cantaria geralmente sem molduras nem ornatos, e
apresentam uma secção quadrada ou rectangular. No fim do periodo roman,
e mais tarde ainda, os angulos do intradoz do arco dobrado têem
regularmente o feitio de tóros.

As nervuras das abobadas d'aresta consistem em um simples tóro, algumas
vezes acompanhado de dois ou quatro tóros de menor espessura. No fim da
época Roman, e durante o periodo da transição, o tóro principal foi em
certos paizes achatado e composto de uma aresta viva no intradoz. As
nervuras das abobadas do estylo Roman são muito mais toscas que as das
Ogivaes.

Os architectos dos seculos XII, XIII e XIV decoravam algumas vezes o
nascimento das nervuras das abobadas superiores ao capitel com molduras
geometricas.

Chamam-se _contrafortes_ aos pilares embebidos nas paredes exteriores
dos edificios, e que servem para sustentar e diminuir a pressão das
abobadas, ou supportar o peso do madeiramento do telhado. Estes apoios
correspondem sempre exactamente (nos monumentos que não têem abobadas)
aos pontos onde assentam as asnas do madeiramento, e nos edificios
abobadados, aos pontos onde vem exercer-se a pressão combinada dos arcos
duplos e das nervuras das abobadas.

Nas construcções de architectura Roman, especialmente nas mais antigas,
os contrafortes apresentam-se algumas vezes com a apparencia de uma
pilastra semi-cylindrica.

No XI, e principalmente no seculo XII, apresentam os contrafortes
variadissimas fórmas. Uns são muito largos na base, e diminuem
successivamente em cada um dos seus tres lados isolados; outros, mais
delgados, têem sempre a mesma largura entre as duas faces lateraes e
parallelas, e não diminuem senão na face exterior, em que essa
diminuição se faz successivamente em diversas partes na sua total
elevação. Alguns ha que têem sempre as mesmas dimensões em todas as
faces, sem saliencia nem resalto algum, desde a base do edificio até á
cornija.

Os madeiramentos nos telhados dos edificios do estylo Roman são raros.

Na Europa Occidental os telhados conservaram até ao seculo XII uma
pequenissima inclinação.

É só no meiado d'este seculo, e até mesmo mais tarde, que se encontram
declives com excessiva correnteza nos telhados dos edificios da edade
média.

As _Torres_, tanto na Europa Central como na Occidental, anteriores ao
seculo XI, são em geral quadradas, e sem nenhum ornamento, ou apenas
ornadas com simples arcadas, e ordinariamente cobertas por um telhado de
quatro abas de fórma concava, formando uma pyramide obtusa.

Os campanarios do seculo XI, e sobretudo do XII, são mais elevados e
ornamentados que os dos seculos precedentes. Compõem-se de dois e mais
pavimentos, que se sobrepõem, e cujas dimensões vão muitas vezes
diminuindo successivamente. A sua fórma e aspecto geral variam de um
paiz para outro.

Os campanarios isolados, que são quasi exclusivamente proprios da
Italia, distinguem-se por mais duas especies.

Ha uns construidos no ponto de intersecção do transepte com a nave
principal, e ainda outros edificados ora sobre a fachada, ora sobre as
extremidades do côro ou do transepte. Os primeiros assentam sobre quatro
grossos pilares: os segundos erguem-se perpendiculares sobre os seus
quatro lados; ou são sustentados por arcadas abertas sobre uma, duas e
até mesmo tres das suas faces.

Os campanarios centraes têem em geral differentes fórmas. Ha-os
quadrados, octogonaes, e ainda com muito maior numero de lados; existem
tambem alguns em fórma de cúpula.

Os campanarios da fachada, e os construidos proximo do côro ou dos
transeptes das egrejas, apresentam ainda fórmas mais variadas que os
centraes. Os mais simples são quadrados e divididos tanto interior como
exteriormente em dois ou mais pavimentos. Outros, elevando-se sobre uma
base quadrada, tornam-se em polygonos de maior numero de lados logo no
primeiro ou segundo andar, tendo em geral a fórma octogonal.

No XI e no XII seculo eram os campanarios cobertos de madeira com feitio
de flecha ou de pyramides construidas de pedra; quadrados ou octogonaes,
eram pouco elevados e acachapados. Os angulos das pyramides de base
quadrada eram ás vezes ornados com pequenos campanarios. Muitos remates
de cantaria foram destruidos pelas chuvas e pelos gêlos, e depois
substituidos nos seculos XIII e XIV pelas flechas esguias.

Algumas torres tinham por cobertura um telhado apenas com duas abas,
terminando por uma empêna em cada um dos lados. As torres cobertas por
este modo só se usaram durante uma parte do periodo Ogival.

Os pavimentos em _opus alexandrinum_ continuaram a usar-se na Italia e
em todos os paizes aonde havia marmore. Na Allemanha, na França e na
Belgica, por exemplo, serviam-se de tijolos de terra, cota esmaltada, ou
de pedras gravadas e com embutidos de massa colorida. Até ao fim do
seculo XII cada tijolo tinha a sua côr propria. As côres que se
encontram nos pavimentos do fim do periodo Roman, são a preta, cinzenta,
vermelha, e principalmente amarella e verde-escuro. As duas ultimas
predominam em quasi todos os trabalhos d'este genero do seculo XII.

No Oriente e no Sul da Europa, os edificios historicos, legendarios e
symbolicos eram bastante communs no seculo XII; tambem se viam alguns na
Europa Occidental.

Se, na sua origem, a pintura das paredes imitou as mesmas fórmas que
tinha o mosaico, e se inspirou dos principios d'esta arte, não podia
tardar muito que ella tomasse mais livre desenvolvimento e adquirisse
certos principios que lhe fossem especiaes em consequencia da propria
natureza dos seus processos e da maneira por que estes satisfazem a
vontade do artista.

Com effeito, a pintura liga-se ás fórmas da architectura até nas mais
delicadas molduras; e por conseguinte de um modo mais intimo que o
mosaico. Desde os primeiros seculos até á época da Renascença, a pintura
das paredes pôde, sem duvida, modificar o estylo do desenho, e variar o
tom e a harmonia das côres empregadas, seguindo o progressivo
desenvolvimento da arte de construir, mas ficou sempre subordinada á
architectura.

A pintura monumental differe muito da que se emprega ordinariamente n'um
painel.

Um painel, no sentido moderno da palavra, não é mais do que uma scena
mostrada nos limites de um quadro, atravez de uma janella aberta. A
pintura monumental, pelo contrario, é uma arte convencional na qual a
imitação da natureza, a reproducção das suas fórmas e dos phenomenos
atmosphericos que ella apresenta, quasi que por assim dizer não existem.

A figura humana e as composições em que esta apparece em grupos são
geralmente reservadas para as grandes superficies planas das paredes; só
muito raramente se encontram nas pilastras e nas columnas. Por toda a
parte o symbolismo ou a allegoria constitue um dos grandes caracteres
tanto da pintura das paredes como de todas as artes em geral durante o
periodo de que nos occupamos.

As pinturas historicas eram tratadas da maneira mais simples. O artista
apenas faz figurar o numero de figuras estrictamente necessario para a
composição do assumpto de que trata. As côres são applicadas com tintas
eguaes, sem indicar sombras nem os differentes accidentes da luz, de
fórma que é muitas vezes impossivel determinar qual o lado por onde o
artista teve em vista que a scena fosse illuminada. As partes salientes
dos corpos são regularmente indicadas por traços finos, e os contornos
são representados com linhas cheias.

A pintura a _fresco_, que tem a vantagem de produzir tons agradaveis,
foi a preferida para as pinturas historicas e legendarias. A
_encaustica_ foi tambem escolhida para certos trabalhos. A intensidade e
a harmonia dos tons que resultam do emprego da cêra, a possibilidade de
nos occuparmos indefinidamente do trabalho já começado fizeram com que
muitas vezes fosse adoptado este processo. Com effeito até mesmo a
pintura a oleo é tambem muito antiga. Durante toda a edade média eram
preferidos os outros processos, por meio dos quaes, obtendo-se tons
baços, evitavam o reflexo tão desagradavel na pintura das paredes.

Durante a edade média a primeira pedra do alicerce dos edificios
religiosos era regularmente ornada com uma cruz e uma inscripção. A sua
collocação era feita com grandes solemnidades: um prelado ou um
dignitario ecclesiastico a benzia publicamente, e elle proprio a
collocava na base de um dos principaes pontos de apoio da construcção.

Tambem muitas vezes se serviam de inscripções lapidares para conservar a
memoria da fundação do edificio e o nome do architecto ou do mestre da
obra. Em algumas egrejas encontram-se pedras com dedicatorias indicando
a data da consagração, os nomes dos santos cujas reliquias se acham
depositadas no altar, e até mesmo o nome do orago da egreja.

Os altares eram uns fixos e outros portateis.

_Altares fixos_.--As mesas dos altares fixos, ordinariamente de marmore
ou de pedra, e de fórma quadrada ou rectangular, continuaram até meiado
do seculo XII a ser vasadas em fórma de bandeja, como já se usára no
periodo Latino.

O supporte da mesa do altar consiste, muitas vezes, em uma simples base
cubica de alvenaria sem ornamentação alguma, e algumas vezes tendo em
roda uma inscripção e um simples rebordo. Nos dias solemnes cobriam-se
estes altares com alfaias de lã e seda ou de outros tecidos preciosos.

Outras vezes o altar é sustentado por uma ou muitas pequenas columnas.

Os altares de fórma cubica eram muitas vezes revestidos de oiro e de
prata e esmaltados, tendo tambem pedrarias, ou ornados com esculpturas e
pinturas.

A face dos altares, com esculpturas, ou pintados, era em geral dividida
em tres compartimentos com a fórma de arcadas mais ou menos ricamente
decoradas. Jesus Christo lançando a benção, de pé ou sentado, occupa
ordinariamente a parte central, que é muitas vezes a mais elevada, ou
com a fórma de uma auréola oval ou de quatro lóbulos. Nas arcadas
lateraes vêem-se figuras de santos e os symbolos dos evangelistas, que
se acham dispostos ou em torno do compartimento do meio, ou nos fundos
das arcadas.

O altar principal das grandes egrejas era muitas vezes, como succedia no
periodo Latino, encimado por um _ciborium_, e o mesmo acontecia com
alguns dos altares lateraes.

No final do XI seculo começou o uso dos retabulos, isto é, dos paineis
ou quadros assentes verticalmente ao fundo dos altares propriamente
ditos. O retabulo não constitue por si só uma parte essencial do altar,
mas sim um accessorio. O seu primitivo e principal fim é promover a
devoção entre o padre que offerece o santo sacrificio e os fieis que a
elle assistem, fazendo-lhes ver assumptos religiosos produzidos pelo
cinzel, esculptura, pintura, etc.

A principio era pouco elevado, attingiu uma excessiva altura no fim do
periodo ogival e na época da Renascença.

Representavam-se nos retabulos os mesmos assumptos que nas alfaias:
Christo, sentado ou em pé, occupava em geral o painel do centro, tendo
imagens de Santos e assumptos tirados da Historia Sagrada, ou da lenda,
em arcadas lateraes, ou em medalhões de diversas fórmas, collocados em
redor da imagem do Salvador.

A maior parte dos primitivos retabulos eram de oiro, prata ou cobre
doirado e esmaltado: todavia alguns se encontravam, ainda que em menor
numero, construidos de pedra e de madeira pintada ou esculpida. Estes
ultimos só se generalisaram no fim do periodo roman e no principio da
época ogival.

A principio os retabulos serviam tambem para encerrar os relicarios
quando elles não tinham mais ornamentos, ou para os emmoldurar quando os
seus frontaes eram ricamente adornados. Parece ter sido nos mosteiros
que este uso teve principio. Durante o XI seculo, a maior parte das
abbadias da Europa Central e Occidental mudaram a disposição interior
das egrejas no que diz respeito ao logar reservado aos religiosos
durante a celebração do Santo Officio: as cadeiras ou bancos dos padres,
que d'antes occupavam o proprio côro do abside, foram transportadas para
o transepte, e desciam ordinariamente até á segunda ou terceira arcada
da nave principal, como na egreja d'Alcobaça.

Ao fundo do Sanctuario, proximo á curvatura do abside, elevava-se o
altar das reliquias, atraz ou debaixo do qual eram expostos os restos
mortaes dos Santos, que até ali se tinbam conservado religiosamente nas
cryptas das egrejas.

Algumas vezes as reliquias eram encerradas em caixas ou cofres e
collocadas no interior do altar.

Tambem se expunham mesmo sobre os altares, como succedia no IX seculo;
mas não é facil actualmente determinar se esta exposição era permanente
ou temporaria, isto é, durante certas solemnidades religiosas
extraordinarias.

Comtudo, está provado que existia em muitos paizes o costume de se
conservarem os relicarios sobre os altares. Este costume pouco a pouco
se foi generalisando, pelo menos em alguns d'elles. Quando esta
exposição se realisava por detraz dos altares, o cofre era collocado
pouco mais ou menos dois metros acima do piso e sustentava um dos lados
triangulares sobre o proprio altar, ou então sobre um retabulo de pedra,
collocado em cima d'aquelle, mas pouco elevado, e o outro sobre uma
consola ou um grupo de columnas junto á parede absidal ou interior da
egreja.

Os fieis podiam circular em torno do altar e vir collocar-se
directamente debaixo das reliquias. O uso de passar debaixo dos
relicarios, quer de pé, quer de joelhos, ainda hoje existe em muitos
paizes catholicos. Quando a parte superior da urna, que vinha assentar
sobre o altar, era desprovida de qualquer ornato, cobria-se então com um
retabulo de metal ou de pedra; se pelo contrario, como succedia com as
urnas de oiro, de prata ou de cobre doirado e esmaltado, tinha figuras
primorosamente executadas, ficava inteiramente livre e visivel por
detraz do altar. Construia-se então por cima da urna uma especie de
tabernaculo ou de baldaquino. Algumas vezes ornamentavam a parte central
do lado triangular, com um retabulo de metal precioso.

O altar-mór das cathedraes assim como das collegiaes que não possuiam
grandes reliquias, só veiu a ter retabulo no XIV seculo. Tanto no XII
como no XIII seculo, se collocavam n'estes edificios retabulos sobre os
altares secundarios do transepte e das Capellas absidaes. Estes
retabulos eram de pouca espessura, não se lhes podendo collocar em cima
nem crucifixos, nem candeeiros.

_Altares portateis_.--Apresentam ordinariamente, bem como os do periodo
Latino, a fórma de um parallelogrammo rectangular, e são compostos de
uma lagea de marmore ou de pedra mettida n'um caixilho de carvalho e
guarnecida com bordados de oiro ou de prata, de modo a não tornar
visivel senão a parte superior da placa.

A lagea que constituia o altar propriamente dito era de porphyro, de
jaspe, de onyx, de crystal de rocha, de pedra preta e até mesmo de
ardosia. Tambem algumas vezes constava de uma pedra preciosa unicamente
como recordação historica que a ella estava ligada, por exemplo, um
fragmento das lageas tintas com o sangue de S. Thomaz de Cantorbery.

As reliquias, cuja presença é de rigor em todo o altar, encontram-se
entre a lagea de marmore ou de pedra e o caixilho de madeira: algumas
vezes era este concavo em fórma de recipiente. Em geral os altares
portateis são de pequena altura, apenas alguns têem a fórma de um
pequeno cofre sustentado por pés pouco elevados. As laminas de metal que
constituem os adornos são muitas vezes cobertas com filigranas, de
pedrarias, de folhagens gravadas, ou de figuras esmaltadas.

Usaram-se estes altares até ao final do seculo XIII.

_Piscinas_.--A ablução das mãos, tanto antes como depois do sacrificio
da missa, foi sempre um dos preceitos dos padres. Deitava-se nas
piscinas não sò a agua de que o padre se servia para a ablução das mãos,
mas até mesmo aquella de que os ministros se serviam para lavar tanto os
calices ordinarios como os ministeriaes em seguida á communhão do padre
e dos fieis.

N'esta época o padre não tomava as abluções do mesmo modo que
actualmente.

Algumas piscinas, que são as mais antigas, têem apenas uma abertura ou
concavidade para dar passagem á agua; ha porém outras que têem duas, uma
para escoadouro das aguas ordinarias, e outra para receber as abluções
das mãos.

As primeiras chamam-se _piscinas simples_, e as segundas _duplas_. As
mais antigas são de uma grande simplicidade, pois muitas vezes apenas
constavam de uma bacia, ou escavada no proprio banco de pedra que havia
junto á parte inferior das paredes, ou sustentada por uma pequena
columna isolada, ou por muitas formando grupo. As piscinas que são
sustentadas por columnas chamam-se _pediculadas_.

No XII seculo começou-se a collocar _piscinas_ em nichos abertos nas
paredes exteriores da egreja. As piscinas duplas só no fim do XII seculo
appareceram.

_Doceis_.--Foi durante o periodo roman que maior uso tiveram os doceis.
Em geral consistem n'uma especie de cúpula quadrada ou polygonal, de
marmore, de estuque, ou de pedra. Muitas vezes têem um leão sentado
entre a base e o fuste das columnas. A face anterior da cúpula é quasi
sempre munida de uma estante, sobre a qual o diácono ou o leitor
collocava o livro sagrado.

Esta estante assentava ordinariamente na cabeça de uma aguia, symbolo do
Evangelista S. João; e algumas vezes na de um homem munido de azas,
emblema de S. Matheus. Quando a estante assentava sobre a cabeça de
aguia ou de homem com azas, os symbolos dos outros evangelistas estavam
tambem, ás vezes, representados nos angulos da base da cúpula.

Nas egrejas mais ricas havia mesmo doceis cuja cúpula era revestida de
oiro, de prata, e de laminas esmaltadas, ou decorada com esculpturas
sobre marfim.

_Cadeiras episcopaes ou do clero_.--A cadeira episcopal nas cathedraes,
ou do celebrante nas egrejas inferiores, achava-se regularmente, como no
periodo Latino, no fundo do abside do côro, contiguo á muralha; e aos
lados estendiam-se os bancos ou cadeiras destinadas ao clero. Esta
disposição, que foi conservada até nossos dias em algumas egrejas
romans, era a que havia em todas as egrejas seculares, tanto cathedraes,
como collegiaes e parochiaes.

Havia, já o dissemos, algumas excepções a esta regra, como succedia com
certas collegiaes que possuiam um altar das reliquias no fundo do côro,
e com as egrejas monasticas. N'estas ultimas cedo foram mudadas as
cadeiras para o transepte, e mesmo para o corpo da nave; sem duvida por
causa do grande numero de religiosos, que era impossivel collocar
convenientemente na curvatura do côro.

Durante a maior parte do periodo roman os bancos dos padres foram de
marmore ou de pedra como anteriormente. As cadeiras ou _fórmas_,
_formulae_, de madeira, foram raras até ao fim do XII seculo; apenas se
encontram algumas que escaparam á destruição. Vê-se perfeitamente que
estas cadeiras, apezar de bem feitas em madeira, imitam todavia
exactamente as antigas de pedra.


*Capellas funerarias, tumulos e pedras tumulares*


_Capellas funerarias_.--Construiram-se algumas vezes, nos cemiterios e
na proximidade das egrejas, capellas funebres, de fórma circular ou
polygonal, á similhança da rotunda construida pelo imperador Constantino
sobre o Santo Sepulchro, ou o mausoléu de Theodorico em Ravenna
(Italia).

_Tumulos_.--O costume de encerrar em sarcophagos os restos mortaes das
pessoas ricas e poderosas existiu no Norte da Europa até ao XII seculo,
e nos paizes meridionaes, isto é, no Sul da França, na Italia e na
Hespanha existiu pelo menos até ao XIV. Estes sarcophagos constavam,
como no periodo antecedente, de cofres oblongos, de pedra ou de marmore,
muitas vezes mais estreitos para o lado dos pés, e fechados por uma
tampa convexa ou em fórma de telhado de duas aguas. Eram esculpidos com
ornatos e symbolos; florões, folhagens, monogrammas, cruzes e alguns
assumptos allegoricos. Collocavam-nos habitualmente sobre pequenos
pilares grossos, ou sobre columnas curtas só com o fim de os isolar do
solo.

Durante o periodo roman tambem foi adoptado o uso dos _cenotaphios_ que
consistem em sócos de pedra, macissos d'alvenaria ou grupos de columnas,
assentes sobre uma sepultura subterranea e sustentando ou um sarcophago
simulado ou a effigie do defunto. Em tôrno do sóco ou do macisso
d'alvenaria acha-se disposta uma serie de pequenas columnas. Umas vezes
são unidas por meio d'arcos, outras, o rebordo da grande lage que corôa
o sóco é apoiado sobre as columnas. No XII seculo, os cenotaphios
começaram a ser encimados pela effigie do defunto, esculpida em relevo e
ás vezes até mesmo gravada ao traço ou representada em esmalte. O
personagem é geralmente collocado estendido sobre um leito e tem todas
as insignias da sua dignidade; os bispos estão com a mitra e o báculo
pastoral; os reis e os principes, com o sceptro e a corôa. Estas
estatuas deitadas não apresentam o aspecto d'um morto; porque têem os
olhos abertos, os gestos e attitudes de pessoas vivas.

Alguns anjinhos fazem balancear thuribulos ou sustentam a almofada sobre
que assenta a cabeça do personagem.

_Tumulos não apparentes_. Consistem, como os do periodo anterior, em
cofres de pedra ou de alvenaria mais largos do lado da cabeça que dos
pés e fechados por uma tampa chata ou prismatica. No interior do cofre
encontra-se algumas vezes, principalmente do XI até ao XIV seculo, um
espaço circular destinado a receber a cabeça do cadaver. Alguns têem no
fundo dois regos, no prolongamento dos quaes está feita uma abertura
destinada a dar vasão ás materias viscosas.

_Pedras tumulares_. O uso das pedras tumulares continuou durante o
periodo roman. Em geral têem a fórma d'um trapezio; algumas tambem, as
mais antigas, são rectangulares. A sua decoração em geral consiste em
figuras geometricas, folhagens ou figuras symbolicas, e raras vezes se
lê o nome do defuncto, e a causa e data do seu fallecimento.

_Pias baptismaes_. As pias baptismaes eram de grandes dimensões durante
todo o periodo roman, por isso que se continuou a administrar o baptismo
por immersão até ao XII seculo. As pias eram em geral de pedra; comtudo
algumas havia de bronze e outras de cobre. Em França e especialmente na
Inglaterra tambem as havia de chumbo.

As pias romans eram de variadissimas fórmas; sendo algumas similhantes a
uma vasilha.

O grande impulso que na Allemanha teve a arte da ourivesaria durante o
XI seculo, longe de affrouxar no seculo seguinte, pôde conservar-se na
vanguarda do movimento artistico da Europa Central e Occidental.

Com a applicação do _esmalte_, os objectos d'ourivesaria mudaram
completamente d'aspecto no XI e XII seculos. Até ali a accumulação das
pedrarias ligadas por folhagens de filigranas constituia todo o segredo
d'ornamentação dos ourives do Occidente; desde o fim do X seculo que as
laminas duplas e lavradas alternam a maior parte das vezes com laminas
esmaltadas. Estas encontram-se não só nas grandes peças d'ourivesaria,
taes como as molduras e as alfaias dos altares, mas até nos menores
objectos.

Os primeiros esmaltes fabricados na Allemanha foram engastados em ouro e
prata, semelhantes aos que os Bysantinos fabricavam durante a segunda
metade do X seculo; mais tarde tambem se empregou o cobre com o qual se
douravam as partes que ainda ficavam visiveis depois da incrustação do
esmalte. Foi a começar no XI seculo que em algumas localidades
substituiram o esmalte introduzido no rebaixo pelo dividido em
separação.

Até meado do seculo XII, a influencia Bysantina é apparente nos
esmaltadores Rhenanos. Durante bastante tempo, com effeito, os
esmaltadores allemães imitaram o estylo Oriental, reproduzindo mais ou
menos fielmente typos bysantinos, modificando-os comtudo segundo o seu
proprio engenho. Os seus processos technicos tambem se resentem da
origem Bysantina da arte allemã: é assim, por exemplo, que, nos esmaltes
em separação, e até mesmo nos mais antigos esmaltes executados em
rebaixos, as carnações são substituidas pela pasta vitrea, a exemplo do
que se praticava em Constantinopla. Com tudo isto, os esmaltadores das
margens do Rheno não tardaram em gravar sobre metal reservado, as
figuras de pequenas dimensões, emquanto que para as grandes, continuaram
ainda, durante algum tempo, a esmaltar as roupas; e n'este caso só se
serviam da gravura para as carnações. No final do XII seculo, para
proceder sem duvida d'uma maneira mais expedita, começaram a gravar
figuras inteiras, ainda mesmo que tivessem uma certa grandeza, e quasi
que não era preciso gravar com esmaltes os entalhos, muitas vezes
grandes e profundos da gravura.

Em França, os ourives do XI seculo e dos primeiros annos do XII,
continuaram a servir-se exclusivamente, para a decoração das suas obras,
de placas cinzeladas ou até simplesmente estampadas, e d'applicações de
pedrarias ligadas com filigranas. Até 1145 os ourives francezes
ignoravam o modo de gravar do esmalte; tanto que, quando no principio
d'esse anno, _Suger_, abbade do mosteiro de S. Diniz, proximo de Paris,
quiz mandar fazer uma peanha e cobril-a de placas de esmalte engastadas
sobre cobre, viu-se obrigado, segundo elle mesmo conta, a chamar em seu
auxilio ourives da Lotharingia, em numero de cinco ou sete, que tiveram
o trabalho de terminar esta obra em dois annos.

As producções dos primeiros esmaltadores francezes apresentam grandes
analogias com as dos allemães do Rheno, que vieram ensinar a arte de
esmaltar, em França.

Uma vez começado, o gosto pela ourivesaria esmaltada em breve foi
augmentando em França, e deu logar a que, em 1160, se creasse uma
celebre escola de esmaltadores em cobre cuja séde foi em Limoges.

Nos primeiros ensaios, os ourives de Limoges procuraram dar aos seus
esmaltes o aspecto do dos allemães; representavam as figuras inteiras,
até as proprias carnações, com côres d'esmalte; só aproveitavam o metal
para lhe fazer traçar as principaes linhas do desenho. Em pouco tempo,
para mais rapida e mais barata producção, renunciaram a este processo e
principiaram a gravar logo sobre o metal, todas as figuras e a esmaltar
_apenas_ o fundo. Muitas vezes até substituiam as partes gravadas por
figuras em alto relevo de bronze fundido e cinzelado. Os esmaltadores de
Limoges cederam em parte a sua obra ao gravador, ao esculptor, ao
fundidor e ao cinzelador, limitando assim o seu trabalho á simples
decoração dos fundos, operação que se tornava pouco difficil.

Pelo lado artistico o esmalte rhenano é muito superior ao de Limoges. Os
esmaltes fabricados no XI e no XII seculo nas margens do Mósa, em Liêge,
Maestricht, Stavelot, em Waulsort e em Gembloux têem os caracteres da
escola rhenana, cujo principal centro de fabrico era em Colonia,
constituindo por isso uma variedade dos esmaltes rhenanos. As
differenças que se encontram entre os esmaltes com rebaixo de Limoges,
os do Rheno e os do Mósa são estas: nos primeiros predominam as côres
azul e verde claros, em quanto que nos outros são o verde e o azul
carregados. Os esmaltadores do Rheno e os do Mósa servem-se d'algumas
côres que lhes são proprias; o bello azul de torqueza, o branco de
leite, o vermelho de purpura muito vivo e o preto. Os tons são mais
harmonicos na Belgica e na Allemanha, e mais vivos e asperos na França.
Os esmaltes do Rheno e do Mósa reproduzem scenas em que toma parte um
grande numero de personagens, com inscripções latinas em verso, gravadas
e encrustadas de esmalte; nos de Limoges não se encontram inscripções a
não ser apenas um ou outro nome. Os differentes lavôres que os
esmaltadores do Rheno e do Mósa executavam sobre o cobre e com as
incrustações de esmalte, são notaveis pelo bom gosto e variedade de
assumptos, qualidade que se não encontra entre os de Limoges.

Os objectos, grandes ou pequenos, ornados com esmaltes do Mósa ou do
Rheno apresentam geralmente uma particularidade que se não observa na
ourivesaria franceza contemporanea. Têem, além das placas esmaltadas,
filigranas e pedrarias, placas de cobre vermelho com ornatos e
inscripções douradas sobre campo brunido ou vice-versa.

_Calices e patênas_. Conservou-se, durante o periodo roman, o uso dos
calices ordinarios e ministeriaes.

Os calices ordinarios do VIII e do IX seculo, têem muitas vezes, como os
do periodo Latino, a taça profunda e estreita, o pé pequeno e ligado á
taça por um simples nó sem haste.

No IX seculo começou a usar-se a taça maior, e ás vezes de fórma
espherica e com azas. O pé conserva-se ainda n'este seculo com as mesmas
dimensões que nos precedentes.

Os calices do XI e do XII seculos têem a taça e o pé muito grandes, o nó
bastante grosso e a haste curta quando a têem.

Na Allemanha encontram-se calices do XII seculo que têem o exterior da
taça inteiramente coberto de medalhões, de esmaltes, de pedrarias e de
filigranas; estes ornatos são apenas interrompidos por um pequeno espaço
semi-circular destinado para o padre applicar o labio inferior durante a
communhão.

Os mysterios da vida e da paixão do Salvador e principalmente a sua
crucifixão, eram os assumptos que os artistas mais gostavam de
reproduzir sobre os medalhões circulares ou ovaes com que decoravam a
taça e o pé dos calices.

Em geral compõem-se d'um reservatorio sustentado por um grosso fuste
cylindrico, ou mesmo por um pilar quadrado, e tambem se encontram alguns
cujos angulos se apoiam sobre quatro columnas.

Estas pias baptismaes, exteriormente quadradas, são os reservatorios
circulares e ovaes, tendo as faces externas esculpidas com florões,
folhagens, arcos, animaes phantasticos, carrancas e até é facil vêrem-se
assumptos legendarios ou historicos.

_Grades_. Os romanos faziam muitas vezes grades fundidas em bronze. Na
Italia e no Sul da Allemanha ainda se empregaram até ao XI seculo. estas
grades.

Carlos Magno empregou o bronze nas grades da egreja de Aix-la-Chapelle
que foram, assim como o edificio de que fazem parte, uma importação
meridional.

Durante o XI e XII seculo, as grades eram compostas de montantes
verticaes mettidos n'uma moldura e encerrando ornatos formados de
barras, de secção quadrada ou rectangular; estes ornatos consistem em
geral em curvas entrelaçadas.


*Alfaias religiosas*


No seculo VIII estavam as artes e as sciencias inteiramente decahidas no
Occidente, em consequencia das continuas guerras provocadas pelas
invasões dos barbaros. Os processos technicos das artes industriaes e
mais faceis d'adoptar tinham quasi caído no esquecimento. No imperio do
Oriente, pelo contrario, o culto das artes não cessou de prosperar desde
Constantino Magno até ao XI seculo inclusivamente, graças á protecção
generosa dos imperadores bysantinos. Tambem, logo que se seguiram os
primeiros momentos de socego depois das tempestades politicas, pensou-se
na Italia e no resto do Occidente em dotar d'alfaias convenientes as
egrejas, e basilicas que se acabavam de construir ou de restaurar e para
isso foram obrigados a dirigirem-se a Constantinopla tanto para procurar
os objectos que desejavam como para obter artistas aptos que annuissem a
vir trabalhar no Occidente.

Durante muito tempo os artistas verdadeiramente dignos d'este nome,
pintores, esculptores, ourives e outros, continuaram a vir de Bysancio,
e quando no principio do IX seculo, Carlos Magno quiz decorar com
mosaicos e enriquecer com vasos sagrados e outros objectos d'arte o
edificio religioso que elle acabára de construir em Aix-la-Chapelle,
teve que se dirigir a artistas gregos ou aos discipulos que se haviam
formado na Italia, particularmente em Ravenna.

Com os inferiores successores d'este principe, a arte cessou de ter
desenvolvimento, retrocedendo tanto na Europa central como na
Occidental, ao mesmo estado de barbaria em que se achava antes dos
esforços empregados por Carlos Magno para restabelecer o seu progresso.

No fim do X seculo, produziu-se no Occidente um movimento util nos
estudos artisticos; os artistas gregos foram ainda aqui, como mais tarde
na Italia, os iniciadores que presidiram a este movimento instructivo.

A restauração artistica, começada sob a influencia dos artistas
bysantinos, foi extremamente rapida na Allemanha. Desde o fim do X
seculo, a escola de Trèves, dirigida pelo bispo Egberto, deu nascimento,
no territorio germanico, a muitos outros centros artisticos creados
pelos bispos nos seus palacios episcopaes, ou pelos abbades nos seus
Mosteiros. Santo Henrique que governou o imperio do Occidente durante o
primeiro quartel do XI seculo, foi tambem um dos grandes promotores da
restauração artistica na Allemanha.

Os _calices ministeriaes_ conservaram, durante o periodo roman, a mesma
fórma que tinham tido anteriormente. A sua decoração é a mesma que a dos
calices ordinarios. São munidos d'azas com a fórma de folhagens, ou de
dragões e d'outros animaes phantasticos.

Nos medalhões sobre a taça representavam-se scenas da vida do Salvador;
nos do pé, as quatro virtudes Cardeaes e assumptos tirados da historia
do Velho Testamento; e nos medalhões do nó mostravam-se as
personificações dos quatro rios do Paraizo.

As patênas, ordinariamente muito simples, tinham a configuração d'um
pires com um esvasamento circular no meio. O fundo interior era liso,
com adornos de buril; os bordos, por vezes lavrados em relevos ou
gravados ao buril, eram de pequenas dimensões. Encontram-se comtudo
algumas patênas da época roman, sobre as quaes abundavam os ornatos e as
esculpturas.

_Custodias eucharisticas: pyxides e ciborios_. Desde o XI seculo que as
pombas eucharisticas foram substituidas em geral pelas pyxides, cuja
origem alguns auctores reputam ser do V seculo. Dá-se o nome _pyxides_ a
pequenas caixas de marfim, d'onyx, d'ouro, de prata ou de cobre
esmaltado, nas quaes se guardavam as Sagradas particulas. Suspendiam-se,
debaixo do docel do altar, n'uma bolsa de tecido precioso, ou então
collocavam-se n'um pequeno nicho aberto em parede proxima do altar.

Durante os primeiros seculos do periodo roman as pyxides de marfim
empregavam-se em concorrencia com as pombas eucharisticas de metal.

Consistiam regularmente em pequenas caixas cylindricas, tendo muitas
vezes no exterior esculpturas em relevo.

As pyxides do XII e do XIII seculo são ordinariamente de cobre dourado e
esmaltado; compõem-se d'uma pequena caixa cylindrica encimada por uma
tampa de fórma conica ligada ao cylindro por uma charneira. Muitas
d'estas pyxides sairam das officinas dos esmaltadores de Limoges.

As pyxides romans têem algumas vezes um pé, e são em geral tanto umas
como outras de pequenas dimensões, por isso que apenas servem para
guardar um pequeno numero d'hostias necessarias para dar o Sagrado
Viatico aos doentes em perigo de vida.

Todas as pyxides anteriores ao XVI seculo, com raras excepções, têem a
tampa ligada ao cylindro por meio de charneira.

_Relicarios_. Consideraram-se primeiramente como reliquias os restos
mortaes dos Santos, porém, hoje têem um sentido mais lato;
considerando-se tambem como taes os paramentos e outros objectos usados
por elles durante a sua vida mortal. A Egreja professou sempre um grande
respeito pelas reliquias, prestando-lhes um culto particular. Em vista
d'isto não é para admirar que nos primeiros seculos se fabricasse um tão
grande numero e diversidade de relicarios, afim de conservarem estes
preciosos thesouros e expôl-os á veneração dos fieis.

_Relicarios da verdadeira Cruz_. A maior parte dos relicarios que
contéem parcellas da verdadeira Cruz foram trazidos do Oriente na época
das Cruzadas, ou fabricados na Europa segundo os modêlos bysantinos. São
ricamente cravejados de pedraria e d'esmaltes, e têem muitas vezes a
fórma de uma dupla cruz chamada cruz do Santo Sepulchro, de Lorrena ou
de Caravalla. Como a travessa superior d'esta cruz é menor que a
inferior, leva isto a suppôr que o que parece uma repetição dos braços
seja simplesmente o _titulo_ da cruz, pelo qual os Gregos e os Orientaes
sempre tiveram especial veneração.

Tambem muitas vezes se collocavam as reliquias da Sagrada madeira n'uma
cruz com uma simples travessa.

As reliquias da verdadeira Cruz, encerradas n'uma cruzeta, muitas vezes
com duas travessas, eram tambem muitas vezes emmolduradas n'uma placa
metallica ricamente ornada e fixa sobre um centro de madeira. Estes
relicarios, com a fórma d'um pequeno quadro rectangular ou d'um
triptyco, eram mettidos em ricos estojos guarnecidos d'esmaltes,
filigranas e pedras preciosas.

Não eram só os relicarios da madeira da verdadeira Cruz, que tinham a
fórma d'uma cruz com duas travessas horisontaes; os proprios edíficios
em que se conservavam estes relicarios eram muitas vezes encimados com
uma cruz do mesmo genero. Nas parochias em que os campanarios tinham a
dita cruz, eram collocadas sobre os tumulos n'ellas existentes, cruzes
de madeira ou de pedra com a mesma fórma.

_Urnas_. A urna é uma especie d'um cofre dentro do qual são guardadas as
reliquias d'um Santo. O emprego das urnas vulgarisou-se desde o XI
seculo. Ha-as _grandes_ e _pequenas_. As grandes urnas têem o feitio
d'um pequeno edificio rectangular, com a fórma de telhado de duas
vertentes; ha algumas, como a dos Reis Magos em Colonia, que imitam uma
egreja com as suas paredes exteriores.

Em geral são cobertas de placas de metal ornadas com filigranas,
esmaltes e pedrarias. Christo lançando a benção, sentado ou em pé, só ou
no meio de dois Santos, occupa ordinariamente uma das faces extremas, e
na outra face a Santissima Virgem entre dois Santos cujas reliquias a
urna encerra. As faces lateraes são divididas por arcadas de volta
inteira ou abatida, debaixo das quaes se vêem as figuras dos Apostolos
ou d'outros Santos; emfim, as vertentes da imitação de telhado são
decoradas com baixos relevos. Os esmaltes servem de caixilhos aos
differentes assumptos e cobrem tanto as archivoltas como as columnas das
arcadas. Ha tambem urnas exclusivamente feitas de placas esmaltadas.

As urnas pequenas, muito triviaes nos seculos XII e XIII, têem a fórma
d'um cofre oblongo, coberto com uma tampa semelhante a um telhado de
duas aguas. Compõem-se em geral de placas de cobre vermelho, esmaltadas
segundo o processo do buril. Tanto as quatro faces da urna, como a tampa
são adornadas de figuras e algumas vezes com assumptos completos.
Merecem attenção as figuras pela gravura em relevo ou pelo seu modo de
execução especial.

Sobre muitas d'estas urnas se vêem em relevo as cabeças e as mãos ou
sómente as cabeças; nas mais antigas, em vez de serem simplesmente
gravadas, são incrustadas de esmalte.

D'ordinario o trabalho é rude e barbaro e o desenho deixa muito a
desejar com relação a correcção.

A tampa é geralmente terminada por uma lamina de cobre recortada em
fórma de crista.

Pertencem em geral estas urnas ao trabalho dos esmaltadores de Limoges.

Tambem se têem encontrado urnas romanas de pedra, marfim e mesmo de
madeira.

_Estatuêtas_, _bustos_, _braços_, _pés_, etc. No seculo X, começou-se a
collocar as reliquias em estatuêtas, bustos, ou relicarios de metal
ricamente ornamentados e imitando a fórma do corpo humano a que ellas
haviam pertencido. Assim, quando queriam guardar os ossos d'um pé, ou
d'um braço, dava-se ao relicario a fórma de qualquer d'estes dois
modelos. Continuaram a usar-se estes relicarios durante os seculos
seguintes, tornando-se bastante vulgares.

_Urnas de marfim_. Encontram-se, com frequencia, nos thesouros das
egrejas e nas collecções d'objectos antigos, cofres de marfim cobertos
de esculpturas decorativas e legendarias. As que offerecem assumptos
religiosos ou alguns signaes de symbolismo christão, e que por
consequencia foram executadas para o serviço do culto, são extremamente
raras. Isto prova que primitivamente eram destinadas aos usos profanos,
por exemplo, para guarda joias. No entanto não é para admirar que se
encontrem nas egrejas, pois que umas foram cedidas ás egrejas como obras
artisticas offerecidas por bemfeitores generosos; outras, executadas no
Oriente, serviram aos cavalleiros cruzados para trazerem as reliquias de
Constantinopla e da Terra Santa. As reliquias vindas do Oriente, ficaram
encerradas em pequenos cofres, adquiridos por alto preço no Egypto, na
Syria e na Asia Menor. Estes pequenos cofres, que sahiam d'officinas
musulmanas ou indianas, são regularmente cobertos de figuras
geometricas, d'arabescos d'animaes phantasticos e algumas vezes
d'inscripções Orientaes.

_Frascos de crystal de rocha_. D'entre os varios objectos de que os
cruzados se serviam como relicarios, para trazerem reliquias para o
Occidente, devemos especialmente mencionar os pequenos frascos de
crystal de rocha. Estes frascos, cuja altura raras vezes excedia dez
centimetros, eram ou muito simples ou com fórmas d'animaes phantasticos.
Muitos estiveram guardados, durante o periodo ogival, em ricos estojos
de ouro ou de prata.

_Diversos relicarios_. Ha-os com diversas fórmas architecturaes
imitando, em metal ou em marfim, as principaes partes das egrejas
romans, e até mesmo as dos edificios civis.

_Corôas suspensas nos altares_. Estas corôas conhecidas com o nome de
_votivas_ eram por devoção offerecidas a Deus e aos Santos, ou em
cumprimento d'algum voto. Já existiam durante o periodo latino; como
então, compunham-se de um circulo de metal precioso, muitas vezes
adornado com o brilho de pedrarias e de esmaltes. Fabricou-se grande
numero d'estas corôas directamente para o serviço dos altares; todavia
os antigos chronistas designam-nas tambem muitos como offertas feitas
por reis e principes, de corôas d'ouro e de prata e que elles
precedentemente cingiam como insignia de realeza.

_Corôas para luzes_. As corôas para luzes continuaram a usar-se durante
o periodo roman e as mais bellas que a idade media nos legou são d'esta
época.

Todas estas corôas, guarnecidas de torres e ameias parecem alludir á
visão de que falla S. João no capitulo XXI do Apocalypse. _Deus me
mostrará a santa cidade de Jerusalem, que desceu do Ceu, mandada por
Deus..._ representada por uma alta muralha, franqueada por dôze portas;
vendo-se a estas portas dôze anjos, e tendo gravados os nomes das dôze
tribus de Israel. As portas ficavam tres ao Oriente, tres ao Norte, tres
ao Sul e tres ao Occidente. A muralha tinha dôze socalcos, em que se
achavam gravados os nomes dos dôze Apostolos.

Suspendiam-se estas corôas no côro proximo do altar e tambem no ponto de
intersecção da nave com o transepte, quando eram muito grandes.

A corôa para luzes de Aix-la-Chapelle tem oito metros de circumferencia;
é composta de oito arcos de circulo unindo-se de maneira que formam
angulos reintrantes. Estes angulos são guarnecidos de lanternas em fórma
de torrinhas redondas havendo, no ponto medio de cada arco de circulo,
uma torre quadrada maior. Entre cada torrinha podem ser collocadas tres
vellas; como são dezeseis torres, oito quadradas e oito redondas, a
corôa póde receber quarenta e oito luzes em todo o seu circuito. Duas
inscripções latinas se lêem em tôrno do circulo metallico, indicando a
data do XII seculo em que foi dada á egreja de Aix-la-Chapelle pelo
imperador Frederico Barba-rôxa.

_Cruzes d'altar e para as procissões_. Até ao final do XV seculo, não
havia distincção alguma entre as cruzes do altar e as procissionarias ou
estacionarias. A mesma cruz servia para ambos os fins; collocava-se
sobre o altar fixando-a em uma peanha, trazia-se em procissão na
extremidade d'uma vara comprida.

As cruzes d'altar romans, ordinariamente de cobre, de prata, ou mesmo
d'ouro, têem em geral apenas uma só cruzeta; as mais antigas são de
fórma Trina, e cravejadas de perolas ou de variadas pedrarias. Mais
tarde, no XI e no XII seculos, são então compostas com a imagem de
Christo, sendo os ramos da cruz de desiguaes dimensões, isto é, deixam
de ter a fórma Trina.

Grande parte das cruzes d'altar romans são de cobre vermelho adornado
com esmaltes entalhados ao buril, outras compõem-se de simples laminas
de cobre sobre as quaes se reproduzem em esmalte a imagem do Divino
crucificado ou outros symbolos religiosos. Muitas cruzes são formadas de
madeira, tendo as duas faces ou só a principal revestidas com placas
esmaltadas. A imagem de Christo era representada n'estas cruzes e em
alto-relevo. O _perizonium_, que cobre os rins e a corôa que cinge a
cabeça do Salvador, são ordinariamente esmaltados e os olhos
representados por fragmentos de vidro azul.

No fim do periodo roman, as peanhas em que se fixavam as cruzes para as
collocar sobre o altar eram muitas vezes d'uma riqueza notavel; algumas
eram de fórma triangular, a mais geral; e outras tinham quatro faces. Em
cada um dos quatro angulos, d'estas ultimas, apresentam um Evangelista
escrevendo textos relativos á vida ou á morte do Salvador. Queria-se
d'este modo symbolisar a diffusão, pela prédica do Evangelho, da Fé em
Jesus-Christo, Redemptor do genero humano.

_Candelabros_. Os candelabros eram em geral pequenos e terminavam na sua
parte superior por uma dirandella ponteaguda. A fórma d'estes
candelabros do XII seculo, varía pouco; consta em geral de um pé assente
sobre tres patas de leão ou em tres corpos de dragão; um nó de folhagens
ou de dragões enroscados; e uma dirandella bastante concava, sustentada
por tres ou quatro pequenos animaes phantasticos que se assimilham aos
dragões ou aos lagartos com azas.

O contraste que existe entre os pequenos candelabros d'outro tempo e os
que actualmente se empregam de excessiva altura, explica-se da seguinte
maneira: deram aos candelabros e ciriaes uma tão descommunal altura que
obrigaram a substituir as antigas velas de cêra por um cirial simulado e
accrescentado com uma vela. Não devemos esquecer que os ciriaes se
accendem em homenagem ao Crucifixo ou ao Santissimo Sacramento, e que
portanto não devem exceder em altura o tabernaculo. Comprehende-se,
pois, a razão por que um candelabro d'altar é maior e mais monumental
que outro qualquer de sala.

_Candelabros para o Cirio Pascal_. Tinham uma altura bastante
consideravel.

A ornamentação d'estes candelabros, destinados a sustentar o Cirio
Pascal, era analoga á dos candelabros d'altar. N'elles se encontram,
tanto no pé como na dirandella, os dragões e os lagartos com azas
(geralmente no numero de tres), as folhagens e os florões. Em alguns,
tambem se representavam varios personagens e diversos outros assumptos
nas facetas do pé.

_Candelabros de sete braços_. Estes candelabros sempre de bronze,
usavam-se desde o periodo roman, e talvez antes. Destinados, sem duvida,
a fazer recordar o antigo candelabro dos israelitas, são tambem muito
elevados. O pé, o nó e os ramos eram ordinariamente ornados.

Os braços estão collocados, em geral, no mesmo plano, tres de cada lado
da haste central e as dirandellas tambem se encontram ao mesmo nivel.

_Evangeliarios_. Durante o periodo roman, trataram, como até ali, de
reproduzir o mais correctamente possivel o texto Sagrado; e continuaram
do mesmo modo a transcrever os exemplares de luxo com lettras de ouro
sobre velino branco ou côr de purpura.

As Biblias completas e os evangeliarios, isto é, os manuscriptos em que
se encerra o texto dos quatro Evangelhos, são em geral ornados com um
grande numero de miniaturas representando personagens e assumptos do
Novo e Velho Testamentos, e até mesmo alguns factos legendarios.
Todavia, nos mais antigos manuscriptos o numero das illustrações é
geralmente muito menor que nos do XI e XII seculos. Encontra-se com
frequencia, na parte superior de cada Evangelho, a figura do
Evangelista, sentado e escrevendo o seu livro.

Egualmente se encontram na parte superior de quasi todos os
Evangeliarios, miniaturas que occupam muitas paginas, consistindo em
arcadas sobre columnas, agrupadas ás tres e ás quatro, sob um arco
commum que abrange toda a largura da pagina; em cada arcada lêem-se
series de numeros collocados uns debaixo dos outros.

Estas columnatas formam o que se chamam os _canhões d'Euzebio_ ou de
_concordancia Evangelica_. Foram compostas por Euzebio de Cezaréa para
facilitar o estudo comparativo dos Evangelhos, e consistem em quadros
que indicam, por meio de algarismos escriptos na mesma linha horisontal
em duas ou mais arcadas, as citações dos Evangelhos com relação ao mesmo
objecto.

São dez: o primeiro indica todos os logares communs aos quatro
Evangelhos; o segundo, os que se não lêem senão em S. Matheus, S. Marcos
e S. Lucas; o terceiro, o que é referido por S. Matheus, S. Lucas e S.
João; o quarto, as passagens comparativas de S. Matheus, S. Marcos e S.
João; o quinto, o accôrdo de S. Matheus com S. Lucas; o sexto, de S.
Matheus com S. Marcos; o setimo, de S. Matheus com S. João; o oitavo, de
S. Lucas com S. Marcos; o nôno, de S. Lucas com S. João; emfim o decimo,
sob differentes series, o que cada evangelista escreveu de particular.

Cada Evangelho tem á margem, com tinta preta por ordem numerica, a
indicação de todos os versos que o compõem; e inferiormente a cada verso
está notado a encarnado o numero do canhão a que se tem de recorrer para
encontrar a concordancia.

_Capas evangeliarias_. Durante o periodo roman as capas dos livros
lithurgicos tinham ordinariamente um comprimento dobrado ou triplicado
da largura. Comtudo já havia n'essa epoca encadernações que se
approximavam sensivelmente da fórma quadrada, que foi a que mais tarde
prevaleceu.

As capas dos livros romans são de metal e tambem de marfim; acontecendo
muitas vezes reunirem estas duas materias na mesma capa, ou servindo de
caixilho a uma placa de marfim quadrada ou rectangular e com relevos
metallicos.

Os assumptos que mais trivialmente se encontram sobre as capas dos
evangelhos são: 1.^o O Salvador, sentado ou de pé, lançando a benção e
collocado n'uma aureola oval; 2.^o A crucificação de Christo; 3.^o A
Santissima Virgem com o menino Jesus; 4.^o Scenas tiradas da historia do
Novo Testamento.

Os symbolos dos Evangelistas occupam quasi sempre os quatro angulos das
capas.

Para o fim do periodo roman, tambem frequentemente se empregaram, como
capas de livros lithurgicos, placas esmaltadas, oblongas, rectangulares,
fabricadas em Limoges, representando a crucificação do Senhor, com as
figuras accessorias.

_Thuribulos_. É provavel que nos primeiros seculos fossem simples vasos
com grande diametro e um peso consideravel.

Dos thuribulos anteriores ao XI seculo apenas temos conhecimento pelas
pinturas das paredes e pelas miniaturas dos manuscriptos.

São d'uma simplicidade notavel; têem, como todos os que se lhes
seguiram, a fórma espheroidal.

No XI e XII seculos apparecem thuribulos mais ricos.

_Caldeirinhas d'agua benta portateis_. Estas caldeirinhas serviam para
levar agua benta aos imperadores, aos reis e outros grandes personagens
no momento em que entravam na egreja. Têem a fórma d'um cóne troncado e
invertido.

Geralmente são de pequenas dimensões, não excedendo 20 centimetros em
altura.

Tambem as ha de marfim e outras de metal. A maior parte tem
exteriormente duas ordens sobrepostas de figuras em relevo,
representando assumptos religiosos, figuras de Santos ou symbolos.

_Pentes lithurgicos_. Os padres eram obrigados a pentear os cabellos e a
barba antes de celebrar o Officio Divino. O uso dos pentes lithurgicos
existiu até ao XVI seculo, e ainda nos nossos dias se emprega o pente na
Sagração dos Bispos.

_Os pentes lithurgicos_ são geralmente d'osso ou de marfim e tambem
algumas vezes de madeira.

Uns são maiores do que outros; os maiores são guarnecidos com duas
ordens oppostas de dentes, tendo uma com mais finissimos dentes. O
espaço comprehendido entre as duas ordens de dentes é em geral
esculpido. Os pentes de menores dimensões têem apenas uma ordem de
dentes, sendo egualmente mais ou menos ricamente esculpidos.

_Cadeiras_. O uso da cadeira, _cathedra_, foi durante, muito tempo
considerado como uma prerogativa dos Papas, dos Bispos e dos Soberanos
temporaes.

No fim do periodo Latino e no começo do Roman, as cadeiras, eram por
vezes feitas á imitação da cadeira _curúl_ dos Romanos, a qual era
formada de duas dobradiças em fórma de X, entre as quaes assentava um
coxim. Os ramos das dobradiças d'esta especie de cadeiras romans são
ordinariamente terminados, superiormente, por cabeças d'animaes e
inferiormente por patas ou garras; como tambem succede com as cadeiras
curúes mais ricamente esculpidas.

As cadeiras romans têem d'ordinario a fórma d'um cofre rectangular, não
tendo costas nem tão pouco braços. Adornavam-nas com incrustações de
marfim, ouro, prata ou outros metaes; eram estofadas de preciosos
brilhantes e damascos. As cadeiras de costas altas são raras.

_Baculos pastoraes_. Desde os primeiros seculos que os Bispos empunhavam
o bastão pastoral como insignia da sua dignidade. Mais tarde foi este
privilegio extensivo aos abbades dos grandes mosteiros.

Os bastões pastoraes mais antigos eram de duas fórmas diversas: havia o
bastão em fórma de muleta e o bastão em _voluta_. O primeiro, pela sua
similhança com a letra T (a que os gregos chamavam _tau_) é conhecido
pelo nome de _bastão_ ou baculo em fórma de _tau_. O cabo ou travessa
ordinariamente de marfim é todo esculpido.

Os baculos de _voluta_ que ainda hoje existem, datam do XII seculo. A
fórma que tinham antes d'esta epocha sabe-se pelas esculpturas, pinturas
e miniaturas.

Não nos parece que se encontrem Bispos empunhando o baculo em monumentos
cuja data seja anterior ao ultimo quartel de X seculo.

No seculo XII e até mesmo já durante a ultima metade do seculo XI, é que
se começaram a usar os _baculos de voluta_. São tambem d'esta epocha os
_bastões de metal_ ornados de pedrarias d'esmaltes e filigranas.

A voluta de quasi todos os baculos do XII seculo termina por uma cabeça
de serpente ou de dragão encimada por uma cruz, ou lutando com o Divino
Cordeiro armado com o signal da redempção. As volutas terminando em
florão são por emquanto raras n'esta epocha, assim como tambem aquellas
que têem representadas scenas historicas.

Attribue-se geralmente aos baculos pastoraes e a todas as suas
differentes partes, uma significação symbolica. O baculo representa o
bordão do Pastor espiritual; do Bispo na sua diocese e do abbade no seu
mosteiro. A haste é recta para recordar ao Prelado a rectidão da
governação; a ponteira de metal é o emblema da justa severidade com que
deve reprimir os rebeldes, e a voluta recurvada symbolisa a bondade como
as almas são attrahidas para o bem pelas consolações. A voluta do baculo
voltada para o peito, indica a jurisdicção interna dos Abbades; voltada
para fóra, mostra a auctoridade dos Prelados.

_Sapatos lithurgicos_. Estes sapatos, que desde os primeiros seculos são
considerados como uma das principaes insignias dos Bispos e dos Abbades,
tinham o nome de sandalias, _sandalia_, e eram em geral de fórma
identica. Constavam d'uma solla de coiro ordinario, d'uma gaspea e de
dois quartos.

A gaspea era de coiro e recortada muito profundamente a formar uma
especie de lingueta, _lingua_, e quatro appendices, _ligulae_, em fórma
de orelhas atravez das quaes passavam os cordões. As seis chanfraduras,
formadas por estas orelhas, fizeram dar á gaspea o nome de _coiro
fenestrado_, _corium fenestratum_, por affectarem a fórma de aberturas
dos rotulos de janellas.

Tanto a gaspea como os quartos tinham um grande numero de furos, os
quaes bem como as chanfraduras da gaspea tinham uma significação
symbolica.

As sandalias são guarnecidas, inferiormente, por uma solla e
superiormente por um pedaço de cabedal chanfrado ou fenestrado, porque
os pés dos prégadores devem ser resguardados inferiormente para se não
sujarem nas coisas terrestres conforme as palavras do Senhor--_Sacudi o
pó de vossos pés_--; são descobertos pela parte superior para que lhes
seja relevado o conhecimento dos celestiaes mysterios, segundo estas
palavras do propheta: «Desvendae-me os olhos e considerarei as
maravilhas da tua Lei».

A gaspea e os quartos eram ordinariamente bordados a ouro e seda e até
mesmo de pedras preciosas.

_Mitras_. As mitras de dois bicos eram desconhecidas até ao fim do XI
seculo. D'antes os Bispos usavam algumas vezes uma corôa ou grinalda de
laminas de metal, cravejada de pedras, debaixo da qual elles punham um
barrete pouco elevado ou um pedaço rectangular de seda ou de tela, cujas
extremidades, ordinariamente bastante compridas, fluctuavam livremente
sobre as costas.

No fim do XI seculo, a cobertura collocada por debaixo da corôa
tornou-se mais alta de maneira que formava ou uma especie de touca
ponteaguda ou dois lobulos obtusos ou arredondados e pouco tempo depois
duas agudas pontas. N'esta mesma epocha foi substituido o circulo de
metal por fachas de pergaminho primorosamente pintadas e as extremidades
fluctuantes do pedaço de tela por duas fachas compridas e estreitas, que
se chamam _fanons_.

_Alfaias preciosas_. _Tecidos_. Durante os primeiros seculos da éra
christã, os tecidos de seda apenas se fabricavam no Oriente.

Mas no periodo roman continuou a Europa a mandar vir todos os tecidos
preciosos de Constantinopla, da Grecia, da Asia Menor e da Persia.

Comtudo, no seculo IX, os Mouros introduziram a cultura do bicho de seda
no Sul da Hespanha, e a começar do seculo seguinte, a pequena cidade de
Almeria, situada a pequena distancia de Malaga sobre as costas do
Mediterraneo, tornou-se um importante centro de industria de seda, cujos
productos da Europa eram procurados.

Em seguida á expulsão dos musulmanos no anno de 1146 ou 1147, as
fabricas de seda tambem se desinvolveram muito na ilha da Sicilia, e o
commercio de tecidos de seda tornou-se extremamente florescente e
prospero, graças aos intelligentes esforços do rei normando Roger,
secundado na sua empreza por operarios trazidos da Grecia na escolta
d'uma expedição militar. Os tecidos d'ouro e seda, fabricados na celebre
manufactura official de Palermo, e conhecida pelo nome de _Hotel de
Tiraz_, foram os mais estimados durante toda a edade média.

Os tecidos do periodo roman, geralmente encorpados e solidos, são uns
lisos e outros ornados de desenhos representando animaes, plantas,
flôres e fructos, empregados apenas como decoração, sem a menor intenção
de symbolismo. Os estofos produzidos pelas fabricas musulmanas, tinham
tambem ás vezes inscripções arabes; aquelles cujas decorações consistiam
em assumptos biblicos ou symbolos christãos, fabricavam-se em
Constantinopla, na Grecia e mais tarde egualmente na Sicilia.

_Bordados_. Os bordados continuaram a usar-se para reproduzirem
assumptos religiosos quer em medalhões quer sobre umas fitas que
applicavam ás velas d'altar e aos paramentos sacerdotaes. A arte de
bordar fez consideraveis progressos durante o periodo roman.
Encontram-se um grande numero de passamanarias inteiramente executada á
agulha «_acula pictae_» no XI e XII seculos.

Os bordados executados durante o periodo roman eram geralmente feitos em
seda ou lã fina sobre uma talagarça de tela fina.

_Paramentos sacerdotaes_. No principio do periodo roman eram ainda
desconhecidas as côres lithurgicas, e só se começaram a empregar no IX
seculo tomando um certo desinvolvimento nos seculos seguintes, ao mesmo
tempo que se fixou o seu symbolismo. A côr branca e a vermelha foram as
primeiras adoptadas: aquella, como emblema da innocencia e da candura,
servia nas festas do Salvador, da Santa Virgem, dos anjos, dos Santos
que não morreram martyres e durante a Paschoa; o vermelho, symbolo da
caridade e do heroismo, foi destinado aos martyres bem como ao
Pentecostes, festas por excellencia do amor.

No XII seculo duas novas côres vieram augmentar as que já se usavam: o
verde, symbolo da esperança, foi empregado aos domingos e nos dias de
semana em que se não celebrava festa alguma de Santo e durante o tempo
que decorre entre a Epiphania e a septuagesima, entre o Pentecostes e o
Advento, o preto, signal de luto, foi reservado para a sexta feira Santa
e para os officios funebres.

A principio, o uso d'estas differentes côres era facultativo; porém
desde o final do XII seculo e ainda mais durante o seculo XIII,
tornou-se obrigatorio.

Mais tarde, tambem se introduziu o uso da côr violeta, symbolisando
_penitencia_, para o Advento, quaresma, temporas e vigilias.

A _casula_ conservou, durante o periodo roman a mesma fórma que até ali
havia tido, isto é, a d'uma veste dupla, sem mangas, e caindo livremente
á roda do corpo.

As _casulas_ mais ricas eram de seda; cravejadas de pedras, de perolas e
bordadas a ouro, prata, seda ou lã, reproduzindo figuras geometricas,
flôres, animaes, symbolos e assumptos religiosos. Estes ornatos
espalhavam-se muitas vezes por toda a casula; comtudo, d'ordinario,
apenas occupavam as bandas verticaes longas e estreitas, chamadas
_praetestae_, _listae_ ou _augusti clavi_; regularmente são duas, uma na
frente e outra na parte posterior. Além do modo decorativo que ellas
tinham, estas bandas serviam ainda a um fim util, a de tapar as duas
costuras precisas para dar feitio ao paramento. Duas outras fachas,
egualmente estreitas, passavam sobre os hombros e vinham terminar nas
bandas verticaes do peito e ao meio das costas, figurando, adiante e
atraz, uma Cruz em fórma de Y.

Ha _casulas_ antigas que não têem as fachas de juncção que passam sobre
os hombros e cuja decoração se resume nas duas fachas verticaes. Algumas
vezes tambem estas fachas são substituidas por arvores ou plantas com
muitas ramificações.

As casulas de uso diario e as das egrejas mais modestas não eram de
seda, materia de um preço excessivo n'essa época, mas sim de lã, tela ou
outros tecidos mais baratos.

A _estola_ consiste em uma facha comprida e estreita, de seda, de lã ou
de tela, medindo em geral 2^{m},70 de comprimento sobre 6 a 7
centimetros de largura. Foi a partir do IX seculo, que ella tomou esta
fórma e estas dimensões, que se approximam muito das que ainda hoje tem.

As estolas ricas eram ornadas de pedrarias bordadas, e placas de metal
cinzeladas e esmaltadas, e terminavam nas pontas por longas franjas.

O _manipulo_, que d'antes consistia n'uma especie de toalha, com a qual
os padres limpavam as mãos e a cara ou purificavam os vasos sagrados, só
perdeu a fórma e o destino primitivo, durante o IX seculo, quando se
tornou um verdadeiro paramento similhante á estola na fórma, côr e
decoração.

A _capa_ conservou, durante o periodo roman, a mesma fórma que tinha
antes; especialmente reservada aos chantres e clero inferior, era feita
com um tecido ordinario. Os Bispos só raras vezes a vestiam e, por
consequencia, não havia capas ricamente decoradas.

A _alva_ era de linho mais ou menos fino e algumas vezes de seda branca.
Havia duas especies de alva: as alvas sem ornatos, chamadas _albae
purae_ ou _simplices_, e as alvas guarnecidas, _albae paratae_ ou
_frisiatae_. As primeiras serviam nos dias ordinarios e nas egrejas de
segunda ordem; as outras eram usadas pelos Bispos e pelo clero,
especialmente nos grandes dias de festa.

A decoração das alvas dos Bispos consistia apenas em certos ornatos em
volta do pescoço, nas extremidades das mangas e no bordo inferior; além
de duas orlas parallelas verticaes que lembram as _augusti clavi_ dos
Romanos, e que descem do pescoço até aos pés, tanto na frente como nas
costas.

O _cinto_ era geralmente ornamentado com grande luxo.

Muitos tecidos preciosos se fabricaram com fio d'ouro; tendo a fórma
d'uma grande fita de largura entre tres e seis centimetros, podendo-se
mui facilmente assentar, em toda a sua largura, perolas, pedrarias, e
placas de metal cinzeladas e esmaltadas.

O _amicto_ é composto d'um pedaço de panno quadrado ou rectangular, que
o sacerdote põe na cabeça, quando começa a revestir-se, e que depois faz
descer sobre o pescoço.

Os amictos eram em geral de panno de linho. No periodo roman tambem os
havia de seda, e de fio d'ouro.

No IX seculo começaram os amictos a ter um ornamento, que se conservou
em uso durante toda a edade média, e que recebeu o nome de--_parura
plaga_--e tambem, ás vezes o de--_praetextae_. Este adorno consistia, no
seu principio, em uma tira rectangular d'ouro, de renda ou tecido de côr
brilhante, que se pregava no bordo superior do amicto, e que formava em
torno do pescoço uma especie de rico collar, visivel mesmo depois do
sacerdote e os ministros sagrados terem revestido a casula ou a
dalmatica. Algumas vezes tambem tinham como adorno perolas e pedras
preciosas.

A _dalmatica_ é o paramento sacerdotal para vestir por cima, pertencente
ao diacono e sub-diacono. Consistia, durante o periodo roman,
regularmente n'uma especie de toga fechada muito comprida, com mangas e
uma abertura para passar a cabeça. Duas faixas verticaes d'ouro ou de
côr brilhante se applicavam, ás vezes, sobre a toga, prolongando-se até
ao bordo inferior.

Do seculo XI em diante appareceram dalmaticas abertas nos dois lados até
uma certa altura. Eram muitas vezes guarnecidas de faixas douradas em
volta do pescoço, e nos canhões das mangas.

O _pallium_ constituia entre os antigos o principal paramento de vestir
por cima.

Deu-se com o pallio o mesmo que se havia dado com a estola; a parte
principal, e primitivamente essencial, isto é, o manto foi supprimido, e
apenas se conservou o ornato accessorio, as faixas que se lhe
applicaram. Estas uniam sobre o peito e sobre as costas, em fórma de Y,
da mesma maneira que as _listae_ em certas casulas.

Durante o periodo Latino já se decoravam as faixas do _pallium_ com
pequenas cruzes gregas. Estas cruzes, pouco numerosas a principio,
foram-se multiplicando insensivelmente, e desde o XI que já se contavam
muitas sobre toda a extensão das faixas.


*Abbadias, Mosteiros e claustros dos Capitulos*


Desde o VIII seculo que se começaram a levantar estabelecimentos
religiosos, compostos de numerosas construcções edificadas e dispostas
com arte. Havia já egrejas, edificios para alojamento e exercicios dos
frades, enfermarias, escolas, bibliothecas, hospedarias para os
estrangeiros, celleiros, jardins, edificações destinadas aos
aprovisionamentos, emfim, habitações e officinas para as corporações
d'artistas que as abbadias tinham sempre ao seu serviço.

Todos estes antigos mosteiros foram destruidos ou inteiramente
modificados com o correr dos seculos.

Examinaremos as suas disposições interiores, quando tratarmos do plano
das abbadias do periodo ogival.

A principio os conegos das cathedraes e collegiaes viviam em communidade
como os religiosos.

Os claustros dos simples collegiaes eram ordinariamente, como os das
abbadias, contiguos ás paredes meridionaes da egreja, porque a exposição
ao sol do meio dia é a mais agradavel e a mais vantajosa para a saude.
Por estas razões o lado sul nas cathedraes era occupado pelos palacios
episcopaes, e os conegos viam-se obrigados a escolher o lado norte das
egrejas, para edificarem os seus claustros.

Todavia, esta regra não era geral: existem muitos exemplos de claustros
tanto d'abbadias como de capitulos occupando outros logares. Estas
excepções á regra geral são devidas a differentes causas, taes como a
presença de ruas ou de construcções que era impossivel supprimir, e, nos
paizes montanhosos, os accidentes do terreno que torneava a egreja.

Os claustros das egrejas monasticas, cathedraes e collegiaes,
compunham-se ordinariamente de um pateo quadrado ou rectangular, rodeado
de galerias cobertas, que serviam de passeio aos religiosos e aos
conegos.

Estas galerias, abertas para o lado do pateo, eram comtudo d'elle
separadas por meio de um apoio quasi continuo, sobre o qual vinham
assentar as columnas com archivoltas, tornando a arcada toda contínua.
Os mais antigos claustros apenas tinham uma especie de ornamentação com
as galerias cobertas d'um simples alpendre de madeira, cujo madeiramento
só era visivel no interior. Desde o fim do X seculo foram estes
alpendres substituidos por abobadas de berço com aresta, por baixo das
quaes muitas vezes tambem se construia um pavimento.

Na maior parte dos claustros romans do XII seculo, as curvas
descendentes das archivoltas são sustentadas por columnas duplas,
cobertas por uma perna de telhado. Algumas vezes columnas isoladas
alternam com columnas duplas.

Os claustros das cathedraes e das collegiaes eram, como os das abbadias,
rodeados de edificações indispensaveis para a vida commum dos conegos.

Debaixo d'essas galerias se abriam as portas do refeitorio, do
dormitorio, da escola, e da sala capitular e outros locaes affectos ao
serviço da communidade. Mais tarde, quando a vida commum foi abandonada
pelos capitulos, as habitações privadas dos conegos occuparam, em torno
das galerias, o logar d'estes differentes edificios.

A iconographia, isto é, a _sciencia das imagens_, occupa-se das
representações figuradas devidas á esculptura e, em geral, a todas as
outras artes de modelar.

_A gloria, o nimbo e a auréola_. A gloria é um ornamento symbolisando
uma nuvem luminosa, que os artistas da idade média põem em torno da
cabeça ou do corpo d'um personagem, como attributo da santidade ou do
poder. Quando ella não rodeia senão a cabeça, dá-se-lhe o nome de
_nimbo_; quando rodeia o corpo inteiro, chama-se _auréola_.

O nimbo derivado da palavra latina (_nimbus_) é um adorno circular, e
tambem ás vezes quadrado, oblongo ou triangular com que se costumam
adornar as cabeças das figuras que representam as pessoas divinas, os
santos e os homens revestidos d'auctoridade suprema, quer civil, quer
ecclesiastica. É costume collocal-o verticalmente na parte posterior da
cabeça. Assim como a corôa é o signal da realeza, assim o nimbo é o da
santidade ou da auctoridade.

O nimbo circular ou em fórma de disco é o symbolo de Deus, dos anjos e
dos Santos; comtudo, quando circumda a cabeça d'alguma das pessoas
divinas, o disco é regularmente ornado com uma cruz grega, de que apenas
se vêem tres ramos, pelo que se chama nimbo crucifero. A cruz do nimbo
crucifero deve ser vertical, e não inclinada como a cruz de Santo André
X. Muitos artistas, quando se servem do nimbo, commettem um erro, contra
esta regra de iconographia. O nimbo crucifero é o symbolo caracteristico
das pessoas divinas, mesmo quando apenas se representam por figuras
symbolicas. Assim, por exemplo, a mão, symbolo do Pae Eterno, o
cordeiro, symbolo do Filho Jesus Christo, e a pomba, symbolo do Espirito
Santo, representam-se sempre com o nimbo crucifero.

Os ramos do nimbo crucifero são geralmente bastante compridos e mais
largos nas extremidades. O nimbo circular sem a cruz é o symbolo dos
anjos e dos Santos do Novo Testamento. No Oriente tambem os Santos do
Velho Testamento têem o nimbo, mas no Occidente não se segue essa
pratica. As personificações das virtudes, das provincias e das cidades
têem tambem o nimbo. Elle é egualmente concedido aos Papas, aos
imperadores, aos reis, e aos padres quando são representados
administrando o Sacramento do baptismo, por isso que elles se acham
n'estes casos revestidos d'uma auctoridade suprema.

Os personagens vivos depositarios da auctoridade suprema, eram tambem
adornados com o nimbo quadrado ou rectangular. O nimbo é muitas vezes
substituido pela corôa que se dá ás imagens esculpidas do Salvador
crucificado ou da Virgem com seu Filho.

_Origem do nimbo_. Os pagãos já faziam uso do nimbo, para ornamentar os
seus deuses e imperadores.

Assim se vê Trajano n'um baixo relevo do arco de Constantino e Antonio o
Piedoso em uma moeda, confirmando o uso d'este emblema. Mas que época
indicará a introducção do nimbo na iconographia christã? O nimbo parece
só ter sido empregado pelos christãos depois da conversão de
Constantino. Até este tempo não se conhece monumento algum authentico
dos tres primeiros seculos, em que vejamos Christo ou os Santos
adornados com o nimbo. Os mais antigos monumentos, de data determinada,
em que este ornamento se acha empregado como signal iconographico, são
os mosaicos de Roma e de Ravêna.

Ora foi da comparação d'estes differentes monumentos entre si que se
conheceu terem sido as imagens do Salvador as primeiras que tiveram
nimbo, em segundo logar as dos anjos, depois as dos evangelistas e seus
symbolos e emfim as dos Santos e dos soberanos. As imagens de Nosso
Senhor começaram a ter nimbo desde o principio do IV seculo; até ao VI
seculo se vê o nimbo umas vezes simples, outras crucifero. A Santissima
Virgem e os anjos começaram a ter nimbo desde os primeiros annos do
seculo V, os Evangelistas e os Apostolos no meado do mesmo seculo, os
Santos e os personagens revestidos de auctoridade soberana no começo do
seculo seguinte.

Auréola (palavra derivada do latim _aura_, _vento suave_, _sôpro
luminoso_) é uma especie de moldura que envolve todo o corpo como se
fôsse o nimbo do corpo inteiro.

Os artistas da edade média dão auréola ás tres Pessoas Divinas e á
Santissima Virgem e tambem ás almas dos Santos e principalmente á do
pobre Lazaro, figuradas por um pequeno corpo inteiramente nú. A alma é
assim deificada no momento em que volta ao seio do Creador.

Os Santos, por mais venerados que sejam, nunca têem auréola.

Quando Deus Pae ou Deus Filho se representam sentados na auréola, os
seus pés assentam em geral sobre um arco-iris, e sentados sobre um arco
similhante.

Estes arco-iris são muitas vezes substituidos, o primeiro por um
escabello rendilhado, e o segundo por uma especie de poltrona. Sendo a
auréola mais recente do que o nimbo, caíu comtudo em desuso
primeiramente do que este ultimo.

_Representações da Santissima Trindade_. Durante o periodo roman eram as
pessoas da Santissima Trindade representadas de varios modos.

1.^o--Para inculcar aos fieis o dogma da egualdade dos homens,
representavam-se estes com fórmas inteiramente similhantes. Ás vezes
tambem o Deus Filho se representa nos pés ou nas mãos, e o Espirito
Santo é representado com a fórma d'uma pomba. As pessoas Divinas quando
se representam com fórmas humanas, têem sempre nús os pés.

2.^o--Tambem empregavam a representação do baptismo do Senhor nas aguas
do Jordão, para figurar as pessoas da Santissima Trindade.

3.^o--Nos ultimos annos do periodo roman representava-se a Santissima
Trindade da maneira seguinte: Deus Pae, sentado n'um throno ou sobre um
arco-iris, tendo nas mãos uma cruz na qual está crucificado o Salvador;
o Espirito Santo, representado por uma pomba, apparece entre a bôca do
Pae e a do Filho, para mostrar que o procede tanto d'um como do outro.
Este typo foi conservado durante toda a idade e mesmo até aos XVI e XVII
seculos.

Comtudo, a partir do XV seculo, deixou de se symbolisar o dogma da
procissão do Espirito Santo, e collocava-se a pomba ou no braço da cruz
ou no hombro do Pae.

_Representações das tres Pessoas Divinas_. _Deus Pae_. Até ao seculo XI,
nunca se attribuiram a Deus Pae fórmas humanas. A sua presença era
apenas indicada por uma mão saindo das nuvens. Esta mão symbolica,
primeiramente sem nimbo, e mais tarde com o nimbo simples ou crucifero,
encontra-se nos sarcophagos e nos antigos cofres. Foi pois no XI seculo
que Deus Pae começou a ser representado sob fórmas humanas.

_Deus Filho_. Quando tratámos da iconographia das catacumbas, dissémos
que, durante os tres primeiros seculos, só se representava o Salvador,
debaixo das fórmas symbolicas ou das scenas historicas. Já no IV seculo
se encontram imagens isoladas do Salvador. Até ao X seculo, Christo
representa-se muitas vezes com as feições d'um mancebo de quinze a vinte
annos, sem barba, de figura agradavel e resplandecente d'uma mocidade
Divina; só excepcionalmente Christo tem barba e parece não ter mais de
vinte e cinco annos. No XI e XII seculos os artistas dão-lhe uma
expressão mais severa; ordinariamente apresenta barba parecendo ter
trinta a trinta e cinco annos.

_Deus Espirito Santo_. Até meiado do X seculo foi sempre representado
com a fórma d'uma pomba; mas no XI e XII seculos começou tambem a ser
figurado com a fórma humana.


*A cruz e a crucificação*


_Considerações geraes_. A historia da representação da crucificação póde
resumir-se dizendo que este assumpto não se encontra sobre os monumentos
christãos e outros objectos do culto anteriores á conversão de
Constantino; a cruz apresenta uma fórma dissimulada.

No IV seculo, a cruz fez a sua apparição na iconographia christã. Desde
a conversão de Constantino foi então que appareceu sobre um grande
numero de monumentos; mas até ao VI seculo ainda não tinha a imagem de
Christo: era no emtanto adornada com pedrarias e ás vezes circumdada por
uma auréola.

No VI seculo começam então alguns artistas christãos, ainda que
timidamente, a representar o Salvador sobre a cruz. Primeiramente
servem-se do Cordeiro symbolico, que elles representavam de differentes
maneiras com o signal da redempção. Tambem se vêem cruzes tendo ao
centro, e ás vezes nas extremidades dos braços, uns medalhões com o
Divino Cordeiro ou com a imagem do Salvador Triumphante.

Desde o VI até ao XI seculo representa-se o Salvador sobre a cruz com o
fim manifesto de recordar o Seu Triumpho sem nunca indicar a minima idéa
de soffrimento ou d'opprobrio.

Do XI ao XII seculo representa-se Christo crucificado mas Glorioso e
Triumphante, apesar de ser manifesta a idéa de soffrimento.

Do XIII ao XV seculo, os artistas christãos, tendo mais ou menos em
vista o symbolismo das épocas precedentes, esforçam-se por patentear
realmente os soffrimentos do Divino Crucificado.

Durante o periodo do renascimento, o culto da fórma e da realidade
constitue por assim dizer a unica preoccupação do artista, que, dominado
pela idéa de expressar uma dôr vulgar ou de representar um corpo morto
ou moribundo, perde todo o sentimento de nobre symbolismo.

A historia das representações da cruz e do crucifixo comprehende, pois,
duas épocas distinctas: a primeira, que durou desde o IV ao XII seculo
inclusive, tem por caracter distinctivo a representação glorificada do
instrumento da Paixão e da Victima, sem signal de que se tivesse
prestado voluntariamente; a segunda, que começa no XIII seculo e termina
no XIX, é caracterisada pela expressão dos soffrimentos do Divino
Salvador.

A época do soffrimento corresponde ao periodo ogival e ao do
renascimento.

No IV seculo a cruz é frequentemente encimada por um monogramma
inscripto em uma corôa. Quando não tem o referido monogramma, (o que se
dá principalmente desde o V seculo) ou tem os braços eguaes e mais
largos nos extremos, ou é ornada de perolas em renques, ou ornada de
flôres e folhagens, ou rodeiada de auréola. Ha todo o cuidado de
apresentar na cruz qualquer idéa d'opprobrio ou d'ignominia; a cruz não
é o instrumento de supplicio, mas sim, a cruz glorificada, o instrumento
da Redempção do genero humano.

Estas diversas fórmas de cruz continuaram a usar-se até muito antes do
periodo Roman.

Datam do ultimo quartel do VI seculo as primeiras imagens conhecidas do
Salvador crucificado. Porém, entre a cruz simples e o Cruxifixo
encontra-se uma série de monumentos intermediarios, offerecendo a cruz
associada ao Cordeiro symbolico.

Estas cruzes intermediarias, partindo da cruz sem figuras animadas, ao
crucifixo propriamente dito, ainda se encontram em alguns monumentos do
VII seculo.

Os mais antigos monumentos conhecidos que representam Christo pregado á
cruz, pertencem ao ultimo quartel do seculo VI. Taes são a miniatura do
celebre manuscripto syriaco de Florença, do anno 586, e muitos objectos
enviados por S. Gregorio o Grande, a Theodolinda, rainha dos Longobardos
e conservados hoje no thesouro de Monza. Alguns d'estes ultimos
mostram-nos claramente Christo na cruz, ao passo que outros, taes como
os frascos de chumbo, que continham liquidos recolhidos dos tumulos dos
martyres, não fazem mais do que relacionar a imagem de Christo com a
cruz, d'uma maneira muito mais sensivel do que a cruz do imperador
Justino e outros objectos similhantes. Tres d'estes curiosos frascos
têem ao meio da face principal, uma simples cruz folheada, acima da qual
se acha o busto do Salvador entre as personificações do Sol e da Lua;
aos lados da cruz vêem-se dois adoradores, os dois ladrões, a Santissima
Virgem e S. João; inferiormente está figurado o Anjo e as Santas
mulheres ao pé do tumulo de Christo.

No reverso acha-se a Ascensão do Senhor, nos dois lados do gargalo uma
cruz grega de braços eguaes debaixo d'um arco de triumpho e inscripto
n'uma corôa folheada. Sobre o quarto frasco figuram scenas symbolicas
analogas: está Nosso Senhor em pé entre os dois ladrões, tendo os braços
estendidos em cruz. O instrumento do supplicio, que não se vê na face
principal, é comtudo representado no reverso do frasco, debaixo d'um
arco de triumpho, e cercado pelas cabeças dos Apostolos inscriptas em
medalhões circulares e formando uma especie de corôa. Conclue-se, pois,
que o artista christão foi obrigado primeiramente a não representar a
menor idéa de opprobrio e de soffrimento; para isto elle transformou a
cruz tornando-a de braços eguaes, ornando-a de folhagens e
metamorphoseando-a em arvore da vida: quiz affirmar o triumpho alcançado
com a morte, por Aquelle que morreu sobre a cruz, recordando a
Resurreição e Ascensão do Salvador.

Os crucifixos primitivos não têem quasi nunca Christo esculpido em alto
relevo.

Christo está vestido com um _colobium_ ou tunica, ordinariamente sem
mangas, que chega até aos pés. O uso d'esta longa veste serviu
exclusivamente durante o VII seculo e generalisou-se no IX seculo.
N'esta época foi substituida por uma tunica larga cobrindo os rins do
Salvador.

Christo tem sempre a cabeça elevada ou ligeiramente inclinada para a
direita e os braços estendidos e perfeitamente horisontaes. Os pés estão
pregados separadamente á cruz por dois cravos e muitas vezes apoiados
sobre um escabello, ou suppedaneum. Algumas vezes parece serem
supprimidos os cravos com a intenção manifesta de significar que o
Christo se offereceu voluntaria e espontaneamente sobre a cruz para a
redempção dos homens.

Desde o VI seculo até ao VIII, a scena da crucifixão é muitas vezes
acompanhada de personagens e outros accessorios fundados na verdade
historica, mas que se representam, bem como a imagem de Christo, de uma
maneira symbolica. Assim vemos a Santissima Virgem e S. João, o phariseu
que empunha a lança e o que segura a esponja, o Sol e a Lua, a
resurreição do Salvador, o bom e o mau ladrão. Todos estes accessorios,
com excepção do bom e do mau ladrão, se encontram ainda representados
nos crucifixos do seculo VIII.

O sacrificio da crucifixão e os crucifixos do seculo IX até ao XII,
apresentam Christo na mesma attitude que nos seculos precedentes. Os pés
conservam-se ainda com dois cravos, mas afastados um do outro e assentes
geralmente em um--_suppedaneum_.

Foi no XII seculo que appareceram os primeiros crucifixos apresentando
Christo com os pés _sobre-postos_.

Christo poucas vezes se encontra vestido com o _colobium_; apenas em
geral tem á volta dos rins uma toalha de linho larga e comprida, que lhe
cobre o corpo desde os quadris até aos joelhos. Nos seculos XI e XII,
esta toalha tem muitas vezes a configuração d'uma pequena saia que se
chama--_perizonium_.

A Cruz tem geralmente quatro ramos.

Algumas vezes teem um rotulo, mas sem inscripção alguma; outras, nem
mesmo teem rotulo, que em geral consiste n'uma pequena travessa de
madeira rectangular. As inscripções costumam ser variadissimas.

Antes do seculo IX, os personagens e outros accessorios que acompanham a
Cruz, são historicos, isto é, a sua presença é justificada pela narração
dos proprios Evangelistas. No IX seculo começaram então a apparecer os
crucifixos com figuras allegoricas, taes como a Egreja, a Synagoga e as
personificações da Terra e do Oceano. Vamos, pois, tratar
successivamente dos principaes typos do cyclo d'estas representações,
começando pelos accessorios historicos, visto que elles se empregam
desde o VI seculo.


*Personagens e accessorios historicos*


_A Santissima Virgem e S. João_.--Santa Maria está á direita e por
debaixo da Cruz, e o Apostolo em posição analoga, mas á esquerda do
Salvador. Só muito raramente se encontram ambos do lado direito, como
succede na miniatura de Florença.

Ordinariamente estão como que erguendo os braços ao Salvador ou occultam
o rosto em signal de dôr com a mão núa ou escondida na ponta do manto. A
Santissima Virgem tem a cabeça envolvida em um veu e os pés calçados, em
quanto que S. João, de cabeça descoberta e com os pés descalços, tem nas
mãos um livro.

_O phariseu que empunha a lança e segura a esponja_.--Ha uma piedosa
tradição, desde a idade media, em que se diz que o guarda que feriu o
Salvador com uma lançada, era um pagão chamado _Longino_, que mais tarde
se fizera christão, sendo depois venerado como Santo pela Egreja.

Quasi todos os escriptores ecclesiasticos consideram Longino
representado ao lado da Cruz com o typo dos gentios, em quanto que o
phariseu que apresentou a Jesu-Christo a esponja embebida em vinagre
parece ser um judeu.

_O Sol e a Lua_.--No seculo VI, tambem estes astros começaram a ser
representados no sacrificio da crucifixão, vendo-se o Sol á direita e a
Lua á esquerda do Senhor.

A presença do Sol e da Lua n'estes primitivos monumentos, parece ter por
fim recordar o obscurecimento do Sol e as trevas que subitamente se
deram em seguida á morte do Salvador.

No seculo IX, a significação, ainda limitada e puramente historica
d'este assumpto, foi amplificada com outra mais allegorica, desde esta
epocha. O Sol e a Lua não alludem sómente á obscuridade que envolveu a
terra por occasião da morte de Christo, simulam tambem o firmamento
assistindo e tomando parte na morte e no triumpho do seu Creador.

N'este mesmo seculo os dois astros são quasi sempre personificados e
representados por um homem e uma mulher. A personificação do Sol tem
regularmente a cabeça cingida de raios luminosos, a da Lua é em geral
encimada por um crescente. Uma e outra teem ás vezes um facho.

_As santas mulheres chegando ao tumulo do Salvador_.--Desde o VI até ao
XII seculo, apparece muitas vezes, por debaixo do crucifixo, a
approximação, ao tumulo, das tres santas mulheres, Maria Magdalena,
Maria, mãe de S. Thiago, e Salomé. Ellas seguram jarros, thuribulos ou
outros vasos, e estão diante do Anjo, sentadas, não dentro do sepulchro,
como diz o Evangelho, mas diante d'elle. Muitas vezes figuram-se tambem
soldados desfallecidos ou adormecidos.

A reproducção d'esta scena na parte inferior da Cruz era para pôr em
parallelo a humilhação e a glorificação do Salvador, a sua morte sobre a
Cruz e a sua resurreição gloriosa.

_A resurreição dos mortos e a sua sahida do tumulo_.--Durante o seculo
IX figurava-se muitas vezes ao pé da Cruz a Resurreição dos mortos que
se deu por occasião da morte de Jesus Christo, segundo narra o
Evangelho.

Os tumulos d'onde sahiram os resuscitados têem a forma de pequenos
edificios, geralmente armados com uma capella, mais raramente d'um
frontão triangular ou d'um telhado de duas aguas. Nada havia que mais se
prestasse a proclamar a victoria alçada contra a morte de Nosso Senhor
expirando sobre a Cruz, como a Resurreição dos mortos.


*Personagens e accessorios allegoricos*


_A Egreja e a Synagoga_. Desde o seculo IX até ao XII encontram-se,
sobre a maior parte das representações do Sacrificio da Cruz,
personificações da Egreja e da Synagoga. Tinham ellas por fim recordar
aos Christãos a reproducção do povo d'Israel e a vocação dos infieis á
Fé da Egreja Christã. A Egreja, quasi sempre á direita da Cruz, é
representada por uma mulher com uma bandeira e aparando n'um calix o
sangue que corre da chaga de Nosso Senhor feita no lado direito. A
Synagoga é representada por uma mulher com uma bandeira e tambem ás
vezes uma palma. Está collocada á esquerda do Salvador com as costas
voltadas para o Senhor, e algumas vezes parece afastar-se lançando
olhares d'insulto e de cólera.

_O Oceano e a Terra_.--Os artistas romans collocavam frequentemente
sobre o marfim e sobre as miniaturas dos manuscriptos, no pé da Cruz ou
inferiormente a toda a composição, as personificações do Oceano e da
Terra tiradas da mythologia.

O Oceano, geralmente collocado á direita do Salvador, é representado por
um homem barbado, sentado sobre um monstro marinho, ou despejando uma
urna; tem na mão um remo, um peixe, uma cornucopia, ou o tridente de
Neptuno, e na cabeça chavelhos em fórma de serpentes, e tambem, ás
vezes, trazendo azas. Defronte do Oceano acha-se a Terra com a fórma
d'uma mulher, semi-nua, segurando, e até amamentando creanças ou
serpentes, muito proximo d'ella; ás vezes mesmo, n'uma das mãos, vê-se
uma cornucopia.

As personificações do Oceano e da Terra collocavam-se perto da Cruz,
primitivamente, como acima dissemos, para exprimir a dôr que a Natureza
soffreu com a morte do seu Creador; e mais tarde, para mostrar que todo
o Universo partilhou da Redempção operada pela morte do Salvador.

_A mão Divina e a pomba_. Muitas vezes vê-se na extremidade superior da
Cruz uma mão, com ou sem nimbo crucifero, parecendo sair das nuvens e
segurando uma corôa. Esta mão é o symbolo de Deus Pae, do mesmo modo que
a pomba, que se vê sobre algumas Cruzes, symbolisa o Espirito Santo.

_Os Anjos_. Superiormente á travessa horisontal da Cruz e proximo do Sol
e da Lua vêem-se ás vezes dois, tres ou quatro anjos, em attitude de
adoração. Algumas vezes suspendem sobre a cabeça do Salvador uma corôa.
Nos monumentos mais remotos (os do IX seculo), onde mais frequentemente
se vêem os anjos, são estes em numero de dois e designados pelos nomes
de Miguel e Gabriel: representam a Natureza angelica assistindo á morte
do Salvador.

_Os Evangelistas_.--Anteriormente ao IX seculo, nunca se representavam
os Evangelistas do lado principal aos crucifixos, mas sim nas quatro
extremidades do reverso, tendo no centro a imagem da Santissima Virgem.
A razão d'isto é porque n'esta epocha não se admittiam no sacrificio da
Cruz senão accessorios puramente historicos.

No VIII seculo, quando na iconographia da Cruz se introduziram as
allegorias e os symbolos, tambem appareceram os Evangelistas.

Encontram-se ora por cima dos braços horisontaes da Cruz, com os anjos e
os astros, ora nos quatro angulos da cercadura, que forma a moldura da
scena principal. Tambem ás vezes se encontram, tanto no IX como no XII
seculo, no lado principal dos crucifixos, nas extremidades dos ramos.

_O Calix_. Encontram-se crucifixos em que o _suppedaneum_ é substituido
por um calix.

É muito provavel que este calix não seja mais que o _Santo Graal_,[3]
tão celebre na idade mèdia. O _Santo Graal_ diz-se que servira á Ceia;
foi n'elle que Jesus-Christo transformou o vinho pelo seu proprio
sangue.

_Adão sahindo do tumulo_. Esta scena representa-se muitas vezes proximo
da Cruz, para significar que a resurreição da carne é uma consequencia
da morte de Christo.

O sacrificio da Cruz, desde o IX até ao XII seculo, com os seus
accessorios allegoricos e historicos, deve interpretar-se: a Natureza
Angelica, Celeste e Terrestre assistindo ao sublime sacrificio do
Homem-Deus sobre a Cruz, onde affronta os salutares affectos; a Synagoga
reprovada, a Egreja formada, a cabeça da serpente infernal esmagada, o
genero humano rehabilitado e recebendo o testemunho da Resurreição da
Carne.

_Os crucifixos dos seculos XI e XII_. Existem muitos d'estes crucifixos;
apresentam os seguintes caracteres:

A imagem de Christo é, em geral, de cobre vermelho; tem, quasi sempre,
os olhos de vidro azul.

_O perisonium_, ou a toalha que cobre o corpo de Christo desde os
quadris até aos joelhos, toma ordinariamente a forma d'um saiote cujas
orlas são ornadas de perolas. Os Christos dos seculos XI e XII, vestidos
de tunica comprida com mangas ou com o _perisonium_ em forma de saiote,
que lhe chega até aos pés, são extremamente raros.

_Nos crucifixos do XI seculo_, Christo está muitas vezes coroado com uma
especie de gorra ou corôa real. No XII seculo, já a gorra e a corôa se
tornam raras desapparecendo completamente no fim d'elle.

_Os braços das cruzes_ que teem imagens de Christo, são geralmente
ornados com esmaltes e symbolos, tanto no reverso como na frente
principal.

_Cruzes da Paixão e Cruzes da Resurreição_. A Cruz da Paixão é formada
por uma haste e uma ou duas travessas e representa ou imita as
proporções das differentes partes da Cruz, instrumento de supplicio.

_A Cruz da Resurreição_ é apenas um symbolo da Cruz Real ou da Paixão; é
uma pequena cruz na extremidade d'uma haste como a que segura o Divino
Cordeiro.

_A Santissima Virgem_. Durante os doze primeiros seculos da nossa era
representa-se a Virgem umas vezes sósinha e outras acompanhada do Divino
Filho.

_A Virgem sem o Menino Jesus_ tem ordinariamente os braços estendidos e
erguidos parecendo orar e perto da cabeça está inscripta a sigla MPOY,
isto é: Mãe de Deus. Este modo de representação, muito usado desde o IV
até ao VII seculo, deixou comtudo de ser empregado nos seculos
seguintes.

_A Virgem com o Menino Jesus_. Ha duas maneiras de representar a Virgem
com o Menino. Quando a scena é imaginada para prestar homenagem a Nossa
Senhora, diz-se que ella é _poetica_.

Quando os reis magos, por exemplo, vêem trazer os seus presentes a Jesus
no collo da Santissima Mãe, a scena é puramente historica.

Durante o periodo Latino e a primeira parte do periodo Roman, o grupo
historico é o mais frequente. Vemol-o em differentes scenas da vida do
Senhor, principalmente na adoração dos reis Magos.

O grupo poetico póde reduzir-se a dois typos distinctos. O primeiro que
chamaremos _grego_ ou _bysantino_, consiste em representar a imagem da
Virgem com os braços erguidos como que orando, tendo diante de si o
Menino Jesus, lançando a benção, ao modo Grego, com as duas mãos, ou só
com a direita. Este typo já se encontra nas catacumbas.

Os Bysantinos empregaram-se durante toda a idade media, e os Gregos
ainda hoje se empregam.

_O Guia da pintura_ (manual iconographico, adoptado pelos antigos
pintores e ainda hoje seguido pelos Gregos), recommenda que se
represente Nossa Senhora com as mãos erguidas e Christo lançando a
benção para ambos os lados, com o evangelho sobre o peito.

No outro typo do grupo _poetico_, a Santissima Virgem é representada
umas vezes de pé com o Menino Jesus nos braços, outras sentada tendo-o
sobre os joelhos.

Dá-se a este typo o nome de Occidental, não porque elle fôsse
desconhecido pelos Gregos, pois que o usavam conjuntamente com o typo
_bysantino_, mas por que foi este o unico usado no Occidente durante
toda a idade média. Foi introduzido ou pelo menos generalisado
insensivelmente na iconographia christã depois da condemnação de
Nestorio pelo Concilio de Épheso, celebrado em 431. Este heresiarcha
negava que Nossa Senhora fôsse mãe de Deus.

Para affirmar o dogma da maternidade divina de Nossa Senhora,
representavam-n'a com o Menino Jesus nos braços, e muitas vezes
acompanhada da inscripção [Grego: Ê AGIA OEOTOKO],isto é, _Santa
Deipara_, ou a _Santa Mãe de Deus_.

Em geral Nossa Senhora está sentada com o Menino Jesus sobre os joelhos,
lançando a benção, pelo menos, com uma das mãos.

Durante todo o periodo Roman estas representações de Nossa Senhora e do
seu Divino Filho distinguem-se por uma magestade e nobreza de sentimento
como quasi se não encontra nos seculos seguintes.

A Santissima Virgem tem geralmente diante de si o Menino Jesus
completamente vestido, não estando entretido com sua Divina Mãe, mas sim
abençoando aquelles que lhe vêem prestar homenagem. Tem nas mãos uma
esphera ou mais geralmente um livro, ou um rolo, _volumen_, symbolo da
doutrina da nova Lei dada ao mundo.

Na Grecia e no Oriente, os pintores e os esculptores cobrem
ordinariamente a cabeça da Santissima Virgem com um veu; os artistas
occidentaes tambem conservaram esta tradição durante algum tempo, mas, a
começar do seculo IX, dão a Nossa Senhora uma corôa real e algumas vezes
uma especie de gorra.

_Os Anjos_. Os anjos têem figurado nos monumentos christãos desde o IV
seculo. Os primeiros não tinham azas. Só do V seculo em diante é que
começaram a tel-as bem como o nimbo. São representados com uma longa
tunica, orlada por duas faixas em fórma de _clavi_, e têem algumas vezes
na mão um longo sceptro ou _bastão_, terminado por um florão ou por uma
cruz. Os archanjos Miguel, Gabriel e Raphael, tambem muitas vezes são
representados.

Os Anjos têem sempre os pés descalços. Symbolisava-se d'esta maneira a
sua qualidade de mensageiros celestes.

_Os Evangelistas e seus symbolos_. O uso de representar os Evangelistas
sob a fórma humana ou por symbolos, data pelo menos do IV seculo.

Sob a fórma humana encontrâmol-os primeiramente em alguns mosaicos
antiquissimos e um pouco mais tarde tambem nas miniaturas dos
evangeliarios. Estão regularmente sentados debaixo d'um portico, tendo
na sua frente um pulpito chamado _scriptional_, sobre o qual está
desenrolada uma folha de pergaminho, com o titulo ou as primeiras
palavras do seu Evangelho. Apparecem sempre descalços e ás vezes
acompanhados do animal que lhes serve de symbolo.

Os symbolos mais usados dos evangelistas são os seguintes:

_Os quatro rios do Paraizo_. O modo de symbolisar os evangelistas pelos
quatro rios: Phisonte, Géhonte, Tigre e Euphrates, tem origem muito
remota. Os mais antigos mosaicos e as proprias catacumbas nos offerecem
já exemplos d'esta representação. O Salvador com a fórma humana ou com a
do Divino Cordeiro, apparece sobre um outeiro d'onde brotam quatro rios,
emblemas dos Evangelhos, os quaes, produzidos pela fonte da Vida Eterna,
trouxeram ao Universo a fertil doutrina de Christo.

_Os animaes symbolicos_. Os Evangelistas são muitas vezes symbolisados
por quatro figuras com azas: um homem, uma aguia, um leão e um bezerro.
Estes symbolos devem a sua origem ás visões do propheta Ezequiel e do
Apostolo S. João. Eu vi (dizia este ultimo), em torno do throno do
Cordeiro quatro animaes. O primeiro com o aspecto de um leão; o segundo,
de um bezerro; o terceiro com rôsto humano e o ultimo semelhando-se a
uma aguia em pleno vôo.

Os santos Padres consideraram estas visões como os seguintes symbolos: o
homem o de S. Matheus; a aguia o de S. João, o leão o de S. Marcos e o
bezerro o de S. Lucas.

Encontram-se os animaes symbolicos mais a miudo: 1.^o, sobre as capas
dos evangeliarios; 2.^o, nas quatro extremidades das cruzes d'Altar;
3.^o, nos quatro angulos da representação do Christo em sua Gloria, como
elle existe sobre as frentes dos altares, e nos tympanos dos portaes
d'egreja do XI e XII seculos.

Os symbolos dos evangelistas reduzem-se a quatro sobre um unico objecto
ou empregados conjunctamente n'uma pintura, ou esculptura; são
regularmente acompanhados de Christo figurado com a fórma humana ou por
um symbolo.

É, finalmente, da doutrina de Christo que derivam, como d'uma fonte
commum, os quatro Evangelhos.

Quando se dá o caso dos animaes symbolicos ornarem os quatro angulos
d'uma superficie quadrada, quadrangular ou redonda, taes como as capas
dos livros, os tympanos dos portaes, as frentes d'altar ou a _flabella_,
têem certos logares determinados pelo uso: o homem com azas (ao qual
muitos auctores dão abusivamente o nome d'anjo) occupa o angulo superior
direito (á esquerda do espectador); a aguia, o angulo superior esquerdo;
o leão, o angulo inferior direito, e o bezerro, o angulo inferior da
esquerda.

Quando collocados nas extremidades dos quatro braços da Cruz, a aguia
acha-se no vertice, o homem na extremidade inferior, o leão no braço
direito e o bezerro no braço esquerdo da Cruz.

_Os Apostolos_. S. Pedro e S. Paulo eram os unicos Apostolos que durante
o periodo Roman se representavam com um typo uniforme.

Desde os tempos mais remotos, que S. Pedro era representado trazendo uma
Cruz, ou as chaves, e tem cabello na cabeça, emquanto que S. Paulo é
calvo. Até ao XIII seculo não se encontra nos outros Apostolos nenhum
attributo caracteristico. Representam-se todos do mesmo modo, com um
rôlo ou livro na mão.

Os Apostolos e mesmo Judas, têem os pés descalços.

Os artistas da idade media symbolisavam com este signal iconographico a
missão sublime, confiada aos Apostolos, de derramar por toda a terra a
doutrina Evangelica.

_Assumptos religiosos representados sobre os monumentos dos seculos XI e
XII_. Estes assumptos tirados quasi todos da Biblia, não eram muito
variados; tinham em geral um caracter uniforme e reconheciam-se bem ao
primeiro golpe de vista. Eis pois os que mais frequentemente eram
reproduzidos:

1.^o, a tentação dos nossos primeiros paes; 2.^o, o sacrificio
d'Abrahão; 3.^o, a Annunciação; 4.^o, a visitação da Santissima Virgem;
5.^o, o Nascimento de Nosso Senhor, que já se representava sobre os
sarcophagos e nas pinturas a fresco das catacumbas do seculo IV; 6.^o, a
Adoração dos reis magos; 7.^o, a degolação dos innocentes; 8.^o, a
fugida para o Egypto; 9.^o, a exposição do Menino Jesus no Templo;
10.^o, o baptismo de Nosso Senhor; 11.^o, a sua entrada triumphal em
Jerusalem; 12.^o, a transfiguração; 13.^o, a ultima ceia; 14.^o, a
crucifixão; 15.^o, a descida da Cruz; 16.^o, a Resurreicão; 17.^o, as
Santas mulheres no tumulo; 18.^o, a Ascensão de Nosso Senhor.

_Representações symbolicas das virtudes e dos vicios_. Os artistas
christãos da idade media estimavam muito symbolisar tanto as virtudes
como os vicios. Durante o periodo Roman as virtudes representam-se sob a
figura de mulheres tendo corôas, algumas vezes tambem azas, e na cabeça
uma especie de gorra. O seu nome acha-se inscripto do seu lado, ou sobre
qualquer objecto que conservam nas mãos; ás vezes teem mesmo um emblema.
As quatro Virtudes Cardeaes;--prudencia, justiça, força e
temperança--encontram-se frequentemente sobre os monumentos Romans de
toda a especie.

Os vicios são figurados, ou por monstros phantasticos, ou por homens e
mulheres entregues aos excessos de suas paixões; encontram-se muitas
vezes sobre o mesmo monumento em concorrencia com as virtudes que lhes
são oppostas.

_Animaes phantasticos_. Os monumentos do periodo Roman offerecem-nos a
representação de numerosos animaes reaes e phantasticos.

Indicaremos alguns d'estes ultimos.

1.^o O _basilisco_ é um animal com a fórma d'um gallo, mas com a cauda
semelhante á d'uma serpente. Reputa-se provir d'um ovo de gallinha
chocado por um reptil. O basilisco symbolisava o demonio.

2.^o A _aspide_ é uma especie de serpente que a lenda diz estar de
guarda á arvore do balsamo. Se o homem quizer approximar-se d'esta
arvore para lhe colher o fructo, torna-se necessario que elle primeiro
adormeça a mesma serpente pelo encanto; mas esta, para se subtrahir ao
encantamento, tapa uma das orelhas com a cauda e a outra com terra,
espojando-se na lama. A _aspide_ representa os que voluntariamente
deixam de attender aos mandamentos do Senhor.

3.^o O _griffo_ é um quadrupede com azas e cabeça d'aguia. Symbolisa o
demonio. Vê-se muitas vezes sobre os monumentos Romans dos seculos XI e
XII.

4.^o A _sereia_ é um monstro com o corpo metade mulher e metade peixe. A
parte superior do corpo, que comprehende a cabeça, os braços e o corpo
até á cintura, tem a fórma humana; e o resto inferior é a cauda d'um
monstro marinho. Entre os Gregos e os Romanos as sereias terminavam em
passaro e não em peixe; eram tres e habitavam uns rochedos escarpados
entre a ilha de Capri e as costas d'Italia; os seus cantos tinham o
poder de fazer esquecer aos navegadores o paiz d'onde vinham. Durante a
idade media a sereia foi o symbolo da seducção causada pelos attractivos
das pessoas.

Tambem se encontram sobre muitos monumentos os doze signos do zodiaco,
muitas vezes acompanhados com os trabalhos do anno que lhes
correspondem. Eram frequentemente empregados para ornar as archivoltas
dos portaes principaes das egrejas.

_Doadores e doadoras_. Quando os doadores e as doadoras d'um monumento
queriam conservar ás gerações futuras a lembrança do seu beneficio,
faziam-se representar em pequenissimas proporções, humildemente
prostrados aos pés de Jesus Christo, da Santissima Virgem ou d'outros
Santos.

Algumas vezes tambem os doadores se figuravam n'uma parte secundaria do
monumento, apresentando a Deus ou tendo simplesmente nas mãos um modelo
da egreja, do altar ou do objecto que haviam offerecido.



CAPITULO V

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     *Summario.*--Noções preliminares--Diversas fórmas de ogiva--Origem
     da ogiva e do estylo ogival--Periodo de transição do estylo Roman
     ao estylo Ogival--Caracteres d'Architectura Ogival--Observações
     geraes--Plano e disposição das egrejas--Systema de
     construcção--Materiaes e apparelhos de construcção--Esculptura
     monumental--Fachadas--Adros--Portaes--Pinturas--Janellas--Rosaes--Caixilhos
     de janellas e vidros--Vidraças pintadas--Pilares, columnas e
     columnasinhas--Bases de columnas--Capiteis--Caxorros e
     misulas--Arcadas e
     arcaduras--Triforium--Cornijas--Platibandas--Abobadas--Arcos
     butantes--Contrafortes--Gargulhas--Nichos e
     Docel--Madeiramentos--Telhados--Torres e
     campanarios--Pavimentos--Labyrintho--Pinturas das paredes--Cruzes
     de consagração--Altares--Tabernaculos--Cadeiras de côro--Separação
     do Altar-mór--Pulpito e confissonarios--Capellas funereas, tumulos,
     campas, Cruzes de Cemiterio--Pias Baptismaes--Pias de agua
     benta--Engradamentos--Orgãos--Alfaias religiosas--Calices e
     patenas--Custodias--Thuribulos--Relicarios--Corôas para
     luzes--Cruzes de altar e de
     procissão--Castiçaes--Estantes--Instrumentos de paz--Moldes para
     Hostias--Baculos--Mitras--Vestimentas sacerdotaes--Abbadias e
     Mosteiros--Egrejas--Claustros e Refeitorios--Sala de
     Capitulo--Dormitorios--Casa para
     hospedes--Celleiros--Prisão--Cartuxa--Hospitaes--Iconographia--O
     Nimbo--O Crucificado--Os Apostolos e os Evangelistas--O Dia de
     Juizo--Sibyllas.
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*Periodo Ogival*


O estylo ogival, tambem chamado _gothico_, foi usado desde o meiado do
XII seculo até ao principio do XIV. Chama-se ogival, porque differe de
todos os outros estylos que o precederam, pelo emprego da _ogiva_. Os
allemães chamam-lhe ás vezes--_estylo em arco bicudo_. As janellas, as
arcadas, os vãos das portas, n'uma palavra, todas as aberturas são
regularmente terminadas por arcos em fórma de ogiva. Devemos acrescentar
que a denominação de _Gothico_, dada ao estylo da idade media, é uma
especie de ironia da época da renascença, pois que o estylo ogival nada
tem de commum com os _Gôdos_. Foi o italiano Vasari quem primeiro
empregou este epitheto como synonimo de _barbaro_!

_Diversas fórmas de ogiva_. Chama-se _ogiva_ toda a figura formada por
dois ou mais arcos de circulo, cortando-se segundo um certo angulo.

Expliquemos, segundo a ordem chronologica, as principaes fórmas da
ogiva:

_Ogiva obtusa_. Chamada tambem Roman, quando termina superiormente em
bico, muitas vezes quasi se confunde com o arco de volta inteira. Os
dois arcos que a formam, têem os centros muito proximos; algumas vezes
mesmo tão perto um do outro que é necessario um attento exame para
distinguir o bico pouco sensivel que o distingue do arco de volta
inteira.

A ogiva com esta fórma encontra-se muito frequentemente nos edificios do
principio do periodo ogival, reapparecendo mais tarde, já no fim do
mesmo periodo, nos monumentos dos ultimos annos dos seculos XV e XVI.

_Ogiva aguda ou lanceta_. É formada por dois arcos cujos centros estão
situados além da corda que une as suas duas extremidades inferiores da
volta do berço.

Tem o nome de _Lanceta_ pela sua semelhança com o instrumento de
cirurgia d'este nome.

_Ogiva equilatera_. É aquella cujos centros se acham nos dois extremos
da corda, e na qual podemos por consequencia inscrever um triangulo
equilatero. Tambem se dá a esta ogiva o nome de ogiva traçada de
terceiro ponto.

_A ogiva alteada_ é aquella cujos arcos se prolongam inferiormente,
sendo formados por dois ramos verticaes e parallelos abaixo da linha dos
centros. Encontra-se muitas vezes no fundo do côro das grandes egrejas.

As tres fórmas de ogiva acima descriptas empregaram-se durante os
seculos XII e XIII.

_A ogiva de terceiro ponto_ é a que tem os centros dos arcos situados no
terceiro ponto da linha dos centros ou corda, e está dividida em tres
partes eguaes. Chama-se effectivamente ogiva de terceiro ponto, por isso
que se colloca a ponta do compasso no terceiro dos pontos de divisão da
corda.

É para notar que muitos auctores, aliás muito recommendaveis, não
mencionam a ogiva formada por arcos cujo centro se encontra a um terço
da corda; a razão d'isto é porque consideram a ogiva equilateral como de
terceiro ponto.

Esta ogiva começou a apparecer no fim do XIII seculo e generalisou-se
bastante nos seculos XIV e XV.

_A ogiva inflexa_ descreve-se por meio de raios partindo de quatro
pontos e produzindo duas curvas junto á corda e duas outras curvas em
sentido inverso no vertice.

O extradorso d'esta ogiva bem como o da fórma seguinte é convexo na
parte inferior e concavo na superior.

_A ogiva em fórma de chaveta_ apenas differe da precedente por ser mais
achatada.

Estas duas ultimas fórmas usaram-se durante os XV e XVI seculos.

A ogiva inflexa serve muitas vezes de coroamento a um arco de terceiro
ponto, durante a primeira metade do seculo XV, ou em chaveta, durante a
segunda metade do seculo XV e principio do XVI.

A ogiva formada meia convexa e meia concava é traçada como a ogiva em
chaveta, com raios que partem de quatro centros differentes, mas
inversamente; o extradorso do arco é concavo inferiormente e convexo no
vertice. Encontra-se esta ogiva, ainda que raras vezes, em alguns
monumentos dos seculos XV e XVI.

_O arco Tudor_, assim chamado, porque tomou o nome dos reis, que estavam
no throno de Inglaterra na epoca em que o seu uso se generalisou n'este
paiz; é formado por quatro arcos cujos centros se acham todos dentro do
espaço da ogiva. Ha uma fórma mais aguda, que é a que se vê em
monumentos inglezes de uma grande parte do seculo XV; a outra forma mais
abatida só foi empregada no fim do XV seculo, e no principio do XVI. Os
inglezes chamam á primeira, arco de quatro centros, e á segunda arco
abatido. Ha ainda muitas fórmas intermediarias entre estes dois
extremos.

_Origem da ogiva e do estylo ogival_. Os archeologos não concordam uns
com outros sobre a origem da ogiva. A opinião que parece mais provavel,
attendendo a que os monumentos do Oriente exerceram certa influencia
sobre a introducção da ogiva na architectura da Europa no meiado do XII
seculo, considera como um producto do genio Occidental a applicação
logica e systematica da ogiva nas construcções executadas no Occidente
desde essa epoca. A ogiva appareceu na Europa poucos annos depois da
primeira cruzada.

É possivel que esta forma architectonica fosse como outras muitas
cousas, introduzida no Occidente pelos cavalleiros cruzados, quando
regressaram das suas longiquas expedições. Empregada a ogiva no
principio como pura phantasia e como um novo modo de ornamentação, quer
para formar os vãos das portas e janellas, quer para decorar as arcadas,
as paredes lisas e por baixo das cornijas, tornou-se mais tarde o ponto
de partida para o bello estylo da architectura cujo nome se ligou ao
XIII seculo e cujo desenvolvimento methodico pertence exclusivamente á
Europa Occidental.

Este estylo rapidamente attingiu um subido gráo de perfeição, devido ás
numerosas egrejas parochiaes, collegiaes, monasticas e cathedraes, que
foram fundadas, construidas ou reconstruidas e augmentadas nos seculos
XIII e XIV.

A palavra _ogiva_ nem sempre teve a mesma accepção, que nos nossos dias
se lhe attribue. Outr'ora designava as nervuras salientes que se cruzam
em uma abobada, seja qual for a curvatura em arco de circulo, em ogival,
d'estas nervuras. Só depois do principio do seculo XIX é que este termo
foi empregado para designar o arco terminando em ponta, conhecido agora
pelo nome de ogiva.

_Divisões do periodo ogival_. O periodo de treze seculos e tres
quarteis, durante o qual reinou na Europa Occidental o estylo ogival,
póde ser dividido em tres grandes epocas, tendo cada uma caracteres
distinctos.

As denominações francezas de estylo em _lancetas_, _radiante_, são
tiradas da fórma das janellas, assim como o nome de _perpendicular_,
dado em Inglaterra, no terciario do seculo XV.

O estylo ogival não foi introduzido ao mesmo tempo em todos os paizes,
nem mesmo em todas as partes do mesmo paiz. Nasceu e desenvolveu-se
rapidamente, no meado do XII seculo, nos arredores de Paris.

O primeiro monumento que appareceu do estylo ogival, foi a fachada
occidental da abbadia de S. Diniz, perto de Paris, construida entre 1135
e 1140. Foi introduzido em Inglaterra, Allemanha, Hespanha e mesmo
n'algumas partes da Italia, por constructores formados em França.


*Periodo de transição do estylo Roman para o Ogival*


A substituição do estylo ogival pelo roman não se fez em um dia, foram
precisos muitos annos para a operar. Foi esta epoca de transformação que
recebeu o nome de _periodo de transição_ entre os dois estylos. A
duração não foi a mesma em todos os paizes, elle começou mais cedo n'um
paiz do que n'outro.

Os monumentos do periodo de transição distinguem-se quasi todos pelo
emprego simultaneo do arco de volta inteira e da ogiva. Esta combinação
consegue-se por dois modos:

1.^o Por simples _juxtaposição_, quando a ogiva isolada se acha n'um
mesmo monumento ao lado d'um arco de volta inteira. Nos edificios de
transição, vêem-se muitas vezes aberturas de forma circular nos
pavimentos inferiores, que são os mais antigos, emquanto que, nos demais
andares, se vêem aberturas ogivaes; porém mais raramente se vêem voltas
inteiras nas divisões elevadas d'um monumento, tendo vãos ogivaes nas
inferiores.

2.^o Como decoração, quando duas ou muitas ogivas estão comprehendidas
debaixo de uma só volta inteira. Este modo de reunir a ogiva ao arco
circular encontra-se principalmente nas janellas e nas arcadas. Tambem
se vêem ás vezes dois ou muitos vãos de volta inteira emmoldurados n'uma
ogiva.

3.^o Quando arcos de volta inteira produzem ogivas, entrecruzando-se
reciprocamente.

Uma outra particularidade que muitas vezes se observa nos edificios de
transição, é a união da esculptura da ornamentação roman com a ogival.


*Caracteres da architectura ogival*


O estylo ogival seguiu principios até então desconhecidos e um methodo
novo e constante nas suas deducções.

A fórma dada a um objecto era conforme a construcção, resultante não
d'um capricho ou d'uma phantasia, mas d'uma necessidade real.

Segue-se que a ornamentação não se applica indifferentemente e sem razão
sobre as differentes partes d'um monumento. D'ella nos servimos ou para
chamar a attenção sobre uma principal parte da construcção, ou sobre um
ponto importante d'um objecto, ou para dissimular um obstaculo.

Um outro caracter distinctivo do estylo ogival é que os seus monumentos
estão, como se diz em termos de architectura, _na escala do homem_, isto
é: que em toda a construcção, grande ou pequena, ha certas partes em
harmonia com a estatura humana e, por consequencia, tendo pouco mais ou
menos sempre as mesmas dimensões.

Os caracteres notaveis do estylo ogival, que nós acabamos de assignalar
em poucas palavras, encontram-se principalmente nos edificios
construidos na edade media, no Noroeste da Europa.

Durante o periodo Roman os architectos e os operarios habilitavam-se nas
grandes obras das abbadias.

O clero secular, e até mesmo os particulares ficaram sob a direcção de
Bispos protectores das artes, taes como Egberto de Tréves (977-993) e S.
Bernardo de Hildesheim (993-1022) tomaram tambem uma grande parte na
direcção dos movimentos artisticos.

No XIII seculo as corporações seculares apoderaram-se da pratica da
architectura, e desde este momento, todos os grandes monumentos, quer
religiosos, quer profanos, foram construidos por mestres praticos.

_Plano e disposição das egrejas_. Plano no rez-do-chão.--Grande parte
das egrejas ogivaes apresentam, na planta, a fórma d'uma cruz latina,
cujo vertice figurado pelo côro, é voltado para o Oriente. Em algumas,
nota-se sensivelmente um desvio grande no eixo do côro com relação ao da
nave principal. Este desvio, que em geral só tem logar no Norte e
raramente no Sul, symbolisa provavelmente a inclinação da cabeça do
Salvador sobre a Cruz no momento em que deu o ultimo suspiro.

A orientação symbolica das egrejas, introduzida desde os primeiros
seculos do Christianismo, foi observada escrupulosamente durante toda a
edade media, e mesmo na epoca da renascença. Foi só nos primeiros annos
do nosso seculo que a orientação começou a desapparecer.

Um pequeno numero d'egrejas tem o plano quasi rectangular.

No Sul e no Oeste da França muitas grandes egrejas do XIII seculo
apresentam uma vasta nave unica sem naves lateraes, tendo contrafortes
interiores para sustentar o esforço da abobada principal, que é d'aresta
com nervuras.

Encontram-se, principalmente na Allemanha, egrejas com duas naves. Quasi
todas foram construidas por religiosos d'ordens mendicantes, taes como
os Dominicanos e os Franciscanos. No seculo XIII tambem os Jacobinos ou
Dominicanos construiram egrejas de duas naves em Paris e no Sul da
França.

As grandes egrejas do XIII seculo compõem-se de tres, de cinco e até
mesmo de sete naves. Na Europa Central e Meridional, na França e na
Belgica, o côro tem geralmente a fórma polygonal, emquanto que na
Inglaterra elle é muitas vezes rectangular e terminado por uma parede
liza. No continente, apenas excepcionalmente se encontra esta disposição
no côro d'algumas grandes egrejas, a não ser nas extremidades do
transepte.

No final do periodo Roman, tinha-se começado em França a dispôr capellas
absidaes no côro das grandes egrejas. Este uso manteve-se durante todo o
periodo ogival, e as capellas tomaram grandes proporções. As primeiras
que se chamam absidaes, irradiam em torno da capella-mór; as outras ao
longo das paredes lateraes: exemplo a Sé de Lisboa.

Notar-se-ha tambem que na cathedral d'Amiens, conforme o uso muito
geralmente seguido em França e em outros paizes, a capella-mór é muito
mais vasta do que as outras. Encontram-se egualmente, no côro das
cathedraes inglezas do XIII seculo, capellas da Virgem, com a simples
differença que são em geral muito maiores do que as do continente e
construidas sobre plano rectangular.

Na Belgica, os córos das grandes egrejas do XIII seculo estão ás vezes,
como succede em França, rodeados de capellas collateraes, dando a volta
completa ao côro, e limitadas por capellas construidas em parte sobre
plano rectangular e em parte sobre o polygonal; mas em geral são
pequenas e o seu numero mais restricto do que nas cathedraes francezas.

Estas capellas constroem-se entre os contrafortes, que as dissimulam.

O plano das egrejas do XIV e do XV seculos conserva pouco mais ou menos
a mesma disposição que durante o precedente seculo. A unica mudança
importante, que geralmente se nota, consiste na addição de pequenas
capellas ao longo das paredes lateraes das naves.

As capellas são estabelecidas sobre um plano rectangular entre os
contrafortes, parecendo como que formar uma segunda nave collateral ao
lado da primeira. Na mesma época, juntou-se muitas vezes, aos edificios
do XIII seculo, ao longo das naves lateraes, capellas construidas fóra
do primitivo plano.

Estas addições tornavam-se precisas pelo grande numero de capellanias
fundadas nos seculos XIV e no XV. Pelo mesmo motivo se acrescentaram
altares entre as pilastras das egrejas.

_Disposição acima do solo, e aspecto exterior das egrejas_. As egrejas
_d'uma só nave_--apresentam sempre uma secção rectangular. Nos edificios
abobadados os contrafortes têem muitas vezes uma grande importancia
apresentando maior saliencia sobre a parede do edificio tanto no
interior como no exterior. Quando os contrafortes estão construidos no
interior, estabelecem-se regularmente, entre estes contrafortes,
capellas fazendo corpo com a egreja: como na de S. Vicente em Lisboa.

As egrejas que têem tres ou um numero impar de naves, podem dividir-se
em duas classes conforme fôr a nave do meio mais elevada ou da mesma
altura que as paredes lateraes.

A primeira classe comprehende as egrejas cuja nave do meio é
notavelmente mais elevada do que as paredes dos lados. As egrejas com
esta fórma são as unicas conhecidas na Europa Occidental e Meridional,
isto é, na Belgica, na França, na Inglaterra, na Hespanha, na Italia e
em Portugal. A sua nave mais alta é coberta com telhado de duas aguas
inteiramente independentes, emquanto que as paredes dos lados têem
muitas vezes um terraço ou um telhado de fórma de alpendre e a sua
inclinação approximando-se sensivelmente da linha horisontal; ás vezes
tambem são cobertos com repetidos pequenos telhados de duas vertentes,
ficando perpendiculares á nave e terminados por empenas.

Abrem-se regularmente nas paredes lateraes da grande nave, janellas que
deitam para cima dos telhados lateraes.

A segunda classe compõe-se das egrejas cujas naves se elevam á mesma
altura. Estas egrejas são proprias da Europa central; encontra-se um
grande numero d'ellas, conjunctamente com alguns edificios da primeira
classe, na Allemanha, Austria e Hungria.

Os Allemães deram ás egrejas tendo nave de egual altura o nome de
egrejas-mercado, sem duvida porque ellas parecem formar uma vasta salla,
um _hall_ inglez, devido á elevação uniforme das suas naves. O seu
aspecto exterior tambem differe sensivelmente do das egrejas belgas,
francezas e inglezas; as tres naves são cobertas por um telhado unico de
duas aguas, e, por conseguinte, a nave central não recebe luz
directamente, como nas egrejas de primeira classe; a luz só lhe penetra
pelas janellas lateraes; todavia estas, altissimas em consequencia da
grande elevação das paredes, compensam bem a suppressão das janellas
superiores introduzindo a luz na nave central.

No fim do periodo ogival encontram-se, particularmente na Austria e
Hungria, egrejas com esta fórma, cujas paredes lateraes são um pouco
menos elevadas que a nave do meio.

Tambem se construiram, na época do renascimento, egrejas com naves da
mesma altura.

_Egrejas da Flandres maritima_. Encontram-se em muitas cidades e aldeias
da Flandres Occidental, egrejas cujas disposições differem notavelmente
das que se construiram no resto da Europa. Apesar de se assimilharem ás
precedentes, de tres naves da mesma altura, não se devem de modo algum
confundir com as egrejas allemãs, com as quaes se parecem á primeira
vista por terem as naves da mesma altura; não têem nada mais de commum
entre si.

Construidas em geral sobre um plano rectangular, compõem-se d'uma nave
principal fechada por paredes d'egual extensão; não têem transepte ou,
se o têem, não produz saliencia alguma no exterior das paredes.

As abobadas de pedra ou de tijolo são substituidas, mesmo nos grandes
edificios, por tectos curvos formados de madeira com divisões visiveis,
pintados e até com obra de talha, e deixando vêr as peças do
madeiramento.

A cobertura das egrejas é formada por tres telhados de duas aguas da
mesma altura pouco mais ou menos; resultando não ter a nave principal
janellas altas e ser a fachada sempre terminada por tres empenas da
mesma altura.

_O plano das capellas_.--As capellas construidas durante o periodo
ogival não têem ordinariamente transepte e são construidas sobre plano
rectangular.

O côro termina no lado Oriental por um abside polygonal ou uma parede
lisa. As capellas das egrejas conventuaes compõem-se geralmente de tres
naves, emquanto que as pequenas capellas não têem regularmente senão
uma.

As construcções ogivaes não apresentam em geral symetria, e o mesmo se
nota no traçado do plano e nos caracteres architectonicos. Estas
irregularidades provêem de duas causas principaes. Em primeiro logar os
architectos d'esta época, sem desprezarem a symetria, não a consideraram
propria das conveniencias, necessidades e harmonia geral.

Algumas vezes tambem, vindo a faltar-lhes os recursos com que contavam
no principio dos trabalhos, viam-se forçados a alterar o plano primitivo
e supprimirem-lhe certas partes. Emfim, muitos monumentos foram
construidos muito lentamente, o que deu logar a que as suas differentes
partes fossem successivamente construidas, apresentando sempre por esse
motivo cada uma d'ellas os caracteres architectonicos em voga na
occasião da sua construcção.

_Systema de construcção_.--Os grandes monumentos edificados pelos
romanos no tempo da republica e sob os imperadores, formavam, pela
estabilidade dos seus pontos d'apoio, condensação e cohesão perfeita dos
seus materiaes, massas solidas capazes de resistir ao peso, e, em caso
de necessidade, á pressão das abobadas, que eram formadas de peças
homogeneas, concretas e sem elasticidade.

Em substituição da abobada romana os architectos romans empregaram pouco
a pouco a abobada de nervuras, cuja construcção assenta sobre o
principio da elasticidade e do equilibrio das forças. O plano quadrado
era o escolhido para as suas edificações; mas quando se tratava de
neutralisar a pressão lateral exercida por esta abobada sobre os seus
pontos d'apoio, ou quando era preciso construir uma abobada sobre um
plano que não fosse quadrado, entregavam-se então a experiencias cujo
resultado nem sempre correspondia á espectativa.

Os architectos do periodo ogival realisam grandes progressos na
construcção das abobadas. Primeiramente cobrem os edificios servindo-se
das abobadas de nervuras, superficies cujos planos são parallelogrammos,
trapesios, pentagonos e mesmo polygonos irregulares; depois, resolvem
d'um modo completo o problema tão difficil da estabilidade das abobadas,
pelo principio do equilibrio das forças. Empregam a abobada, não como
uma crosta homogenea e inerte, mas como uma serie de paineis de
superficies curvas ou de triangulos de enchimento independentes uns dos
outros e limitados por nervuras apparelhadas e flexiveis. Ás pressões
obliquas d'estas abobadas, oppõem resistencias activas, em vez de
obstaculos passivos, e transportam a resultante de todas as pressões
obliquas e contrarias para os contrafortes exteriores, que fazem rigidos
e firmes, dando-lhes uma base muito ampla e carregando-os com um
consideravel pezo.

As nervuras das abobadas com os seus pontos d'apoio, isto é, as
columnas, os contrafortes e algumas vezes os arco-butantes, compõem a
ossada, o esqueleto de todo o grande edificio ogival. As outras partes
da construcção, que formam o revestimento d'esta ossada, desempenham o
logar de simples tabiques: as janellas occupam, entre os pontos d'apoio
das abobadas, o maior espaço possivel, e as paredes pouco espessas são
ornadas de arcadas que ainda as tornam mais delgadas. As janellas e as
paredes podiam ser supprimidas sem que a construcção principal soffresse
o menor prejuiso.

_Materiaes e apparelhos de construcção_. Tanto durante o periodo roman,
como durante o ogival, se procuravam os materiaes precisos o mais
proximo possivel do logar em que se fazia a construcção. Com effeito o
transporte, ainda n'este tempo, offerecia grandes difficuldades por
causa da ausencia completa de estradas viaveis. Os materiaes empregados
são em geral de pequenas dimensões, porque os instrumentos para os
extraír, transportar e assentar eram insufficientes em comparação com as
poderosas machinas de que dispomos em nossos dias.

Quando não havia pedreiras para explorar, serviam-se de tijolos.

_Esculptura monumental_. Durante o periodo roman, a esculptura d'ornato
consistia em figuras geometricas, animaes monstruosos, e tambem ás vezes
de imitação de vegetaes. Durante a segunda metade do seculo XII, teve
logar uma revolução completa na esculptura ornamental; as palmas, as
folhagens, os galões e as figuras geometricas, os cordões entrelaçados
dão logar aos vegetaes indigenas; n'uma palavra, tudo o que não é
inspirado pela flora do paiz desapparece.

Os primeiros artistas que se entregam ao estudo das plantas indigenas
para as reproduzir na esculptura d'ornato, não procuram imitar fielmente
nas suas obras os vegetaes que têem á sua vista; mas antes os
interpretam a seu modo, isto é, apoderam-se dos caracteres principaes
com que se inspiram e compõem a largos traços a sua esculptura
monumental.

Os artistas entendem que a arte para ser bem apreciada não consiste na
reproducção escrupulosa como se fôsse photographia da natureza real, mas
sim na expressão do real idealisado e transformado pela imaginação do
esculptor.

Esses artistas introduziram no centro e no norte da França este novo
estylo de esculptura monumental durante a segunda metade do seculo XII;
e os seus imitadores nas outras partes da Europa, no principio do seculo
seguinte, limitaram-se em principio a imitar nas suas obras as plantas
mais humildes dos bosques e dos campos na occasião em que dão os seus
primeiros rebentos, quando os botões apparecem apenas meio abertos ou
n'uma palavra quando começam o seu primeiro desenvolvimento. Ha um
exemplo bem conhecido d'esta ornamentação vegetal rudimentar nos mais
antigos _crochetes_ de capiteis e nas rampas dos edificios que se usaram
no final do seculo XII e principio do XIII.

Estes _crochetes_ primitivos terminam enroscados de folhagem,
semelhando-se bastante com os rebentos das plantas que brotam da terra.

Entretanto os esculptores vão progredindo; depois de haverem applicado
as suas inspirações ao estudo do primeiro desenvolvimento dos mais
modestos vegetaes, abandonam estes humildes modelos, para em seu logar
applicarem as folhas completamente formadas, as flores e os fructos das
arvores, dos arbustos e das plantas herbaceas, mais graciosas.

Procuram reproduzir a vinha, a hera, o acre, o azevinho, a roseira
brava, a figueira, o carvalho, a pereira, o nenuphar, as campainhas, o
rainunculo, o morangueiro, o trevo, o platano, a salsa, etc. Todavia
esta transformação não se operou bruscamente, mas a pouco e pouco e por
successivas transições: na flora monumental, bem como na flora natural,
á maneira que os tempos passavam, os renovos abrem, as folhas
desdobram-se, os botões tornam-se em flores e produzem fructos. Foi
n'esta epoca que na França (no final do XII seculo, e até mais tarde) os
roulamentos primitivos das _crochetes_ se abrem dando logar a florões e
ramos de folhagens inteiramente desenvolvidos.

Progredindo sempre, os esculptores do seculo XIV abandonavam pouco a
pouco a nobre e graciosa simplicidade que os do seculo XIII costumavam
imprimir a todas as suas obras; entregam-se apaixonadamente á imitação
da natureza real e escolhem de preferencia as plantas d'um modelo
exagerado; reproduzem-nas com uma rara perfeição, mas exageram-lhes as
ondulações e contornos. Estas ondulações, que constituem um dos
caracteres que distinguem a esculptura do seculo XIV, encontram-se já
algumas vezes, ainda que poucas, durante a segunda metade do seculo
XIII.

As esculpturas do seculo XIV são muitas vezes inferiores ás do XIII,
porque são menos francamente executadas e carecem de simplicidade nos
contornos e no modelado; finalmente já visam muito a produzir effeito. O
seculo XIV no entanto produziu obras esculpturaes de grande merito.

A esculptura monumental no seculo XV caminha cada vez mais para o
affectado. Toma as plantas com folhagens muito recortadas, taes como o
cardo, a folha do repolho, etc. e para as imitar exagera-lhes as
profundas chanfraduras e os lóbulos angulosos das folhas.

Estas esculpturas são finas, delgadas e excessivamente vasadas.

Um ornato muito frequente do XV seculo em diante e que principalmente se
vê nas açafatas dos capiteís, é o que vulgarmente se chama folha de
repolho por causa da sua semelhança mais ou menos com a sua folha
enroscada.

Tambem se vêem representados na esculptura decorativa do periodo ogival,
assumptos historicos, legendarios e symbolicos bem como animaes reaes e
phantasticos. Estes animaes e as figuras grotescas, algum tanto raras no
interior dos edificios, encontram-se comtudo bastante na decoração
exterior dos monumentos, como carrancas, modilhões e até algumas vezes
ornatos em substituição dos _crochetes_ de rampa.

Durante todo o periodo ogival, as esculpturas eram completamente
concluidas antes de se collocarem.

Os esculptores de imagens terminavam as suas obras na casa do trabalho,
e eram collocadas no seu logar pelos alveneos. Um esculptor nunca subia
a um andaime.

_Fachadas_.--As faces exteriores dos monumentos da edade media são a
expressão exacta das disposições interiores.

Em consequencia d'este principio, as fachadas occidentaes das egrejas
reproduzem no conjuncto o córte transversal das naves. Além d'isso, como
a fórma d'este córte é pouco mais ou menos a mesma em quasi todas as
egrejas ogivaes, resulta d'isso, que o aspecto geral de muitas fachadas
é d'uma grande semelhança. Apezar d'esta semelhança no conjuncto geral e
dos contornos exteriores, a disposição e a ornamentação das fachadas são
extremamente variadas. As mais bellas fachadas ogivaes são sem duvida as
das grandes cathedraes francezas. Compõem-se em geral de muitas zonas
horisontaes e parallelas; o pavimento terreo tem tres portaes, que dão
ingresso para as tres naves; o central, que é a porta principal, é mais
largo e ornado mais ricamente que os outros dois.

As fachadas das grandes egrejas inglezas e allemãs (excepto a de
Colonia), não têem ornamentações tão vistosas como as cathedraes
francezas. A disposição é menos regular e a ornamentação destituida ás
vezes de bom gosto. Grande numero das egrejas allemãs têem só na fachada
Occidental duas torres em cada lado.

Na Belgica poucas egrejas têem tres portaes; geralmente na fachada
principal ha apenas um. As rosaceas, que são tão vulgares nas fachadas
francezas, raramente se vêem nas egrejas da Belgica.

As fachadas das egrejas ruraes são sempre de uma grande simplicidade. Em
geral tem um campanario, e apenas uma porta ao centro da fachada e uma
ou tres janellas no frontispicio.

_Alpendres_. Quasi todas as grandes egrejas ogivaes apresentam um ou
muitos alpendres, collocados adiante da fachada Occidental, ou das
entradas lateraes. Em muitas egrejas romans foi addicionado o alpendre
na epocha ogival.

Os alpendres contiguos á fachada principal das egrejas ogivaes ou os
construidos debaixo do campanario, que limita esta fachada, quasi se não
encontram em França desde o seculo XIII. Ainda são mais raros na
Belgica, Allemanha e Inglaterra.

Durante o periodo ogival, muitos alpendres se construiram adiante das
entradas lateraes. Os mais bellos monumentos d'este genero são os
alpendres ao Norte e ao Sul da Cathedral de Chartres, que datam dos
primeiros annos do seculo XIII. Na Belgica tambem ha alguns alpendres
lateraes notaveis, compostos d'um ou dois vãos na frente e vedados por
tres lados, estando ornados no interior com estatuas collocadas sobre
misulas e coroadas de doceis. Tambem se construiam, mas raramente,
alpendres abertos em tres lados ou vedados por frestas nos dois lados.

_Portaes_. Na França e mesmo em Colonia as cathedraes e as grandes
egrejas ogivaes não têem geralmente alpendres adiante da fachada
principal, mas os portaes formam de per si verdadeiros alpendres, que
são cuidadosamente adornados.

Os portaes principaes das grandes egrejas francezas do seculo XIII
distinguem-se pela riqueza extraordinaria das esculpturas de todos os
generos com que são adornados. Apresentam grandes vãos que se abrem do
interior para o exterior e divididos em duas partes eguaes por uma
parede.

Na fachada de _Notre-Dâme_ de Paris vê-se, em frente d'essa parede e sob
um docel, uma grande estatua representando o Salvador deitando a benção,
a Santissima Virgem com o seu amado Filho, e tambem ás vezes o orago da
Egreja. A base d'essa parede e os rodapés dos vãos são ornados com
baixo-relevos.

Os tympanos são regularmente divididos em tres partes horisontaes, onde
se figuram em relevo assumptos religiosos, estatuas de grandes
dimensões, que em numero consideravel guarnecem as paredes verticaes dos
portaes, emquanto que as curvas das abobadas recebem muitas ordens
parallelas de estatuetas collocadas debaixo de doceis.

Todas estas esculpturas representam Santos e factos tirados da historia
do Velho e Novo Testamento, da lenda e de certos dogmas da Fé.

Os arcos dos portaes, das janellas e das empenas são, algumas vezes,
ornados tambem interiormente, d'um appendice chamado _redente_; este
ornato tambem ás vezes se encontra no intradorso das grandes arcadas,
ligando as columnas que separam as naves das paredes lateraes das
egrejas.

Os _redentes_ são recortes em fórma de dente ou de bicos, que guarnecem
o intradorso d'um arco. Tambem se applicou este mesmo nome a uns ornatos
analogos, que se collocam sobre as prumadas das empenas.

Nos edificios do seculo XIV, os portaes são ainda bem delineados,
todavia já não têem a grandeza que caracterisa os do seculo XIII. Os
perfis das molduras são agudos e muito multiplicados; a estatuaria,
abandonando a nobre simplicidade, preoccupou-se em cogitar formas
affectadas, e por isso mesmo a arte declina. Apesar d'estes defeitos, os
grandes portaes das egrejas do seculo XIV têem ainda verdadeiro merito
quanto á composição e outras qualidades que debalde se procuram nos
monumentos dos seculos posteriores.

Os grandes portaes dos seculos XIV e XV têem as mesmas disposições
geraes que os do seculo precedente, com a simples differença de que as
columnas cylindricas que formavam os vãos dos portaes e que sustentam as
archivoltas são substituidas por molduras prismaticas, ordinariamente
sem capitel, e que prolongando-se constituem por si só as archivoltas.
Estes portaes occupam espaço profundo, porque são regularmente
construidos entre dois contrafortes salientes da fachada.

O pilar que separa o portal, e o tympano dos grandes portaes do XIV e XV
seculos, tem sempre estatuas de Santos debaixo dos doceis e apoiando-se
sobre misulas primorosamente esculpidas. Desapparecem as estatuas em
muitos monumentos.

Ordinariamente os vãos ogivaes dos portaes e muitas vezes os da entrada
dos alpendres, são emmoldurados por um contorno em forma de empena.

Nos seculos XIII e XIV, este feitio representa a extremidade d'um
telhado de duas vertentes com a inclinação d'um angulo que varia entre
45 e 90 gráos. No XV seculo, os vãos de todos os portaes grandes e
pequenos, e algumas vezes tambem os das janellas, são formados por
ogivas ou por contracurva.

No seculo XII, as inclinações das empenas são quasi sempre ornadas de
_colchetes_ enroscados; desde o principio do seculo XIII, os
enroscamentos ou extremidades d'estes _colchetes_ desdobram-se e
transformam-se em florões. Os _colchetes_ são substituidos, no seculo
XIV, por folhas de extraordinaria grandeza, que muitas vezes se designam
ainda pelo nome de colchetes, redentes ou animaes phantasticos; nos
seculos XV e XVI apparecem as folhas de repolho.

Estes ornamentos pouco numerosos e muito espaçados no XIII seculo,
multiplicam-se e approximam-se á medida que a arte ogival vae em
decadencia. O vertice das empenas ou das ogivas inflexas que substituem
as empenas do XV seculo, termina ora por um florão, ora por uma estatua
assente sobre uma quartella, em fórma de sóco.

Os portaes de segunda e terceira ordem offerecem mais simplicidade do
que os outros que acabamos de descrever. Não têem pilar de separação e
por causa dos seus vãos geralmente pouco profundos, têem molduras
menores que os portaes de primeira ordem.

No XIII e XIV seculos, as empenas compõem-se de duas, tres ou quatro
columnatas na rectaguarda umas das outras, e ligam-se com os extremos
dos arcos superiores. Desde o final do XIV seculo, foram as columnatas
substituidas por molduras prismaticas, quasi sempre sem divisão de
capitel.

Até meiado do seculo XV, ajuntava-se, muitas vezes, á archivolta dos
portaes e tambem ás curvas das janellas, um rebordo exterior em fórma de
goteira cujas extremidades assentam á altura da nascença da ogiva, sobre
modilhões esculpidos, representando figuras, animaes phantasticos ou
carrancas; este rebordo tambem ás vezes é ornado de _colchetes_ com
folhas de grande lavor ou figuras grotescas.

_Lemes das portas_. Os constructores romans tinham, como já explicámos,
convertido em objecto de ornamentação os lemes e as ferragens que
empregavam para reunir os frisos que compõem os batentes. As archivoltas
do periodo ogival ultrapassaram os seus precedentes n'este genero de
decoração.

No seculo XIII e ainda mesmo no XIV, os lemes representam folhagens
entrelaçadas, armadas de flores e fructos. As suas differentes partes
são reunidas com uma arte e delicadeza notaveis, apesar de n'esta epoca
os meios de fabrico serem muito simples. Um martello movido por uma
corrente de agua constituía, por assim dizer, o unico recurso das
fabricas da edade media. O ferro obtido em fragmentos de um peso
mediocre, era entregue ao ferreiro, que á força de braço convertia estes
fragmentos em barras ou peças mais ou menos delgadas. Não eram
conhecidas, nem a lima, nem as cisalhas. Apezar da pobreza de meios de
fabricação, os ferreiros da edade media produziram obras primas de
serralheria. Podemos affirmar que em muitos paizes a arte de serralheria
attingiu o seu apogeu no seculo XIII. Os lemes do principio do periodo
ogival distinguem-se dos das epocas posteriores em que, ordinariamente,
são _estampados_, isto é, trabalhados em relevo por meio de matriz. Foi
pela estampagem que se obtiveram ramagens cheias de vigor e estes
soberbos cachos que caracterisam os lemes dos portaes de todas as
grandes egrejas do XIII seculo.

Os lemes estampados começaram a desapparecer na França no principio do
seculo XIV, ao passo que na Belgica foram muito empregados ainda n'este
seculo e até mesmo no seculo XV.

Nos fins do seculo XIII começaram a apparecer na França os lemes lisos,
isto é, formados por uma peça de ferro batido, poucas vezes executados
em relevo. Este uso generalisou-se desde os primeiros annos do seculo
XIV; nos outros paizes e especialmente na Belgica eram empregados
simultaneamente com as ferragens estampadas, tanto no seculo XIV, como
no XV.

Os serralheiros da edade média procuraram para objecto de ornamentação,
não só os lemes, mas tambem todos os outros accessorios necessarios para
os portaes, taes como os prégos, os fechos, as argolas das fechaduras.

_Janellas_. Durante o periodo de transição e no principio da epoca
ogival, os vãos das janellas eram estreitos, pouco elevados e fechados,
na sua parte superior, por lancetas ou ogivas agudas. Estes vãos, em
geral reunidos em dois ou tres, são separados por pequenos pilares em
fórma de humbreira, estando muitas vezes como emmoldurados por um grande
arco commum. Chamam-se prumos de cantaria os que dividem uma janella em
humbreiras aos vãos ou compartimentos verticaes. A triplice lanceta da
janella tem o vão do meio geralmente mais elevado que o dos lados.

Em França, no principio do seculo XIII, e n'outros paizes alguns annos
mais tarde, em vez de estreitarem os vãos das janellas, alargavam-nos e
formavam por cima bandeira com construcção de cantaria compostas de
humbreiras simples e ligeiras. Em geral existe uma abertura independente
por cima dos vãos d'estas janellas primitivas. Nas construcções
esmeradas e ricas, as humbreiras estão collocadas tanto no interior como
no exterior, tendo uma columna com base e capitel, e o tympano da
janella é ornado de redentes, com uma ou muitas vidraças compostas de
tres, quatro, seis e algumas vezes oito vidros.

As grandes egrejas do XIII seculo e um grande numero de edificios do XIV
seculo teem as janellas muito grandes, divididas em muitos vãos.

Estas janellas compõem-se de uma rosacea de grande diametro, que occupa
a parte superior do tympano tendo uma columna que divide o vão em duas
partes eguaes; em cada um d'estes vãos secundarios, apresenta uma
abertura composta egualmente de uma columna central, porém, mais delgada
que a primeira e d'um oculo circular do feitio de folha de trêvo, ou uma
de quatro folhas. Se mesmo com estas sub-divisões (como succede nas
janellas de grande largura), estas columnas não ficam sufficientemente
proximas para a segurança das vidraças, estabelecem-se ainda entre si
novas humbreiras divisorias, tendo por cima tambem rosaceas de menor
grandeza.

Na Belgica, Allemanha e Inglaterra, ha janellas do seculo XIII,
divididas por duas humbreiras de menor importancia para formarem tres
vãos. Ás vezes é o vão do meio mais estreito que os dos lados. Este
feitio de janellas era muito raro na França, no principio do periodo
ogival.

Para diminuir o espaço vazio das rosaceas do tympano das grandes
janellas, collocavam-se redentes de cantaria seguros por circulos de
ferro. Ás vezes, no seculo XIV, se substituiam as rosaceas do tympano
por folhas de trêvo, ou compostas de quatro folhas, e tambem com outras
combinações de figuras geometricas.

Durante os seculos XIV e XV, o numero dos vãos das janellas varia muito,
mas em geral é de tres.

No mesmo edificio, se vêem, conforme a largura dos vãos, janellas de
dois, tres, quatro, cinco, seis, sete ou oito compartimentos.

Em alguns monumentos belgas, inglezes e allemães, as grandes janellas
das extremidades do transepte e da capella mór, quando esta termina por
uma parede recta, ficam divididas em duas partes eguaes por uma columna
central de grande grossura formando um verdadeiro pilar.

As humbreiras das janellas dos seculos XIII e XIV são ás vezes formadas
por uma só pedra inteiriça; comtudo geralmente são construidas por
pedras pequenas. Em grande numero dos edificios francezes, ha, interior
e exteriormente, ou n'um dos lados das janellas, uma columna embebida,
com base e capitel.

Na Belgica, Allemanha e Inglaterra as humbreiras das janellas de muitos
monumentos não têem columnas, principalmente as do seculo XIV.

As columnas servindo de humbreiras apparecem sempre collocadas junto dos
pés direitos, no interior e no exterior da janella. Na Belgica vêem-se
com frequencia essas columnas embebidas nos angulos das paredes
pertencentes ás janellas nas quaes lhes faltam as humbreiras.

Os capiteis das columnas que formam as humbreiras das janellas, são
coroados por um ábaco _quadrado_, no principio do periodo ogival, mais
tarde tornou-se _circular_, e no principio do XIV seculo, _hexagonal_.

Os constructores dos seculos XIII e XIV, habituados a discorrer sobre
todas as suas obras, facilmente comprehendiam que collocar um capitel
nas columnas servindo de humbreiras, era ir ao encontro do principio
fundamental da architectura ogival, que prescrevia desprezar todas as
partes inuteis, todos os motivos de ornamentação que não resultassem
d'uma necessidade de construcção. Effectivamente não parece
sufficientemente justificada a necessidade d'este capitel, porque a
parte superior da columna não serve de ponto de apoio a nenhum peso
extraordinario, e tambem não serve de transição ás duas partes realmente
distinctas, pois a moldura superior do capitel é em tudo semelhante á
fórma do fuste da columna, porquanto o capitel apenas servia de ornato,
sem outro fim verdadeiramente util. Tendo em vista o principio
fundamental do estylo ogival e todas as consequencias logicas que elle
encerra, os architectos da segunda metade do seculo XIV e do principio
do XV não se detêem em reconsiderar, supprimem inteiramente o capitel e
muitas vezes a propria columna, e dão a todas as humbreiras a mesma
espessura. No fim do XIV seculo introduziram egualmente modificações
importantes nos desenhos traçados pelas humbreiras dos tympanos das
janellas. Os redentes que até aqui serviam para diminuir o espaço roto
das grandes rosaceas foram primeiramente substituidos por combinações de
figuras geometricas em que predominam as formas ogivaes com curvas
compostas de duas em sentido oppostos e do feitio de chamma. É d'esta
epocha que data o ornato conhecido pelo nome de _chamma_ e deu o nome de
_flammejante_ ao estylo do seculo XV. Este ornato não só se encontra nos
tympanos de janellas, mas tambem nas balaustradas, nos batentes das
portas, fechos, mobilias, n'uma palavra, em tudo onde é possivel
applical-o. Os allemães chamam-lhe Fischblase (bexiga de peixe).

As janellas da _primeira metade_ do seculo XV têem ainda ás vezes alguma
analogia com as dos seculos precedentes. Não é raro encontrar-se nos
tympanos grandes rosaceas com figuras curvas ou chammas em vez de
redentes. Todavia grande numero das rosaceas circulares dos tympanos,
durante a primeira metade do seculo XV, foram substituidas com o feitio
de triangulos e quadrilateros curvilineos ou por outras figuras
geometricas regulares, nas quaes ha chammas representadas. No meado do
seculo XV desapparecem do tympano as figuras regulares, e as humbreiras
tomando direcções cada vez mais arbitrarias, dão logar aos mais variados
desenhos flammejantes.

No fim do XV seculo as archivoltas das janellas tornam-se mais obtusas e
tomam no principio do seculo XVI a forma de arcos de volta abatida ou em
aza de cesto; os desenhos dos tympanos são toscos e angulosos. A volta
inteira ou de semicirculo, que começa a apparecer timidamente nos vãos
entre as humbreiras, annuncia o proximo regresso dos typos de
architectura classica.

Do que acabamos de dizer resulta que os desenhos geometricos
encontram-se principalmente nos tympanos das janellas durante a primeira
metade do seculo XV, emquanto que os desenhos flammejantes propriamente
ditos são da ultima metade do XV e do principio do XVI seculos.

As archivoltas exteriores das janellas dos edificios de primeira ordem
têem ás vezes alguns ornatos.

O cavado mais largo e mais profundo do intradorso d'estas archivoltas é
ornado de colchetes nos grandes monumentos francezes do seculo XIII; no
seculo XIV é ornado de florões e de cachos, e no XV apparece a folha de
repôlho.

As archivoltas exteriores das janellas são do mesmo modo que as dos
portaes e dos alpendres rodeadas por um rebordo saliente ou encimadas
por uma galeria. Os rebordos que rodeiam as archivoltas das janellas
têem o mesmo feitio que os dos portaes.

Nos seculos XIII e XIV, têem a fórma d'uma goteira e são geralmente
formados nos proprios fechos da archivolta; as extremidades vêem acabar
á altura do nascimento da ogiva, ficando assentes sobre modilhões ou
então na direcção horisontal sob a fórma de cordão, que liga entre si
duas janellas proximas uma da outra.

Nos edificios mais importantes, os rebordos são em geral decorados de
distancia a distancia, com colchetes ou folhas ornamentaes. Nos seculos
XV e XVI, os feitios das janellas têem a fórma de uma ogiva com curvas
inversas, terminando por um florão. Os remates que coroam muitas vezes
as janellas dos grandes monumentos, são similhantes aos dos portaes,
tendo do mesmo modo a fórma da empena e os seus lados inclinados têem
colchetes, redentes ou folhas de repolho encrispadas. O vertice, que em
geral termina em florão, penetra muitas vezes na balaustrada prolongando
a altura do tecto e fazendo corpo com elle.

Os architectos do periodo ogival, e até mesmo os do periodo de
transição, de ordinario reservaram nas grandes egrejas, galerias
passando junto das janellas e que eram principalmente destinadas a
facilitar a collocação e conservação das vidraças. Estas galerias são
estabelecidas em toda a extensão do edificio, dando muitas vezes a volta
completa em todo o monumento; são verdadeiros corredores de serviço. No
rez-do-chão, isto é, nas paredes dos lados e no côro, quando este não
tem capellas lateraes, são ellas estabelecidas no interior em quanto que
no pavimento superior ficam sempre exteriores e atravessam os
contrafortes. D'aqui resulta haver galerias em que as vidraças estão
assentes por dentro nas janellas inferiores e por fóra nas altas.

_Rosaceas_. As rosaceas são um dos mais bellos ornamentos dos grandes
monumentos religiosos do periodo ogival.

Apparecem tanto na fachada Occidental como nas empenas dos transeptes.
Na França, as rosaceas são muito communs nos seculos XIII e XIV; pelo
contrario na Belgica e na Inglaterra, são raras, mesmo nas maiores
egrejas.

As rosaceas e as janellas têem caixilhos de pedra destinados a fixar as
vidraças. Estes caixilhos são muitas vezes dispostos em fórma de raios
de roda.

Durante a segunda metade do seculo XIII e todo o XIV, foram construidas
grande numero de rosaceas em contacto umas das outras e dispostas em
muitos renques concentricos á volta d'uma rosacea central, na qual são
inseridos caixilhos do feitio de folhas de trêvo ou em quatro folhas.

Foi a brilhante ornamentação d'estas rosaceas e dos tympanos das
janellas que deu ao estylo ogival do XIV seculo a denominação de
_radiante_.

Os caixilhos das rosaceas do XV seculo descrevem em geral desenhos
flammejantes, semelhantes aos que se vêem nos tympanos das janellas da
mesma epoca. Ás vezes encontram-se: 1.^o nos monumentos do seculo XIII
rosaceas que têem analogia com as dos edificios romans do seculo XII;
2.^o nos edificios dos seculos XIV e XV, rosaceas compostas de folhas de
feitio de trevo, e de quatro folhas, ou com figuras geometricas
curvilineas.

No seculo XV, e na Belgica já no XIV, os caixilhos das rosaceas, não
têem como d'antes, columnas formando as divisões, mas têem os mesmos
compartimentos que os caixilhos de janella d'esta epoca.

_Vedações das janellas e vidraças_. Por causa da aspereza do clima nos
paizes do Norte foram muito cêdo usadas as vidraças nas janellas.

Os vidros, incolores ou pintados d'uma côr unica e de pequenas
dimensões, eram antigamente collocados em caixilhos de madeira ou de
cantaria. Depois do seculo X eram fixos por meio de pestanas de chumbo.
Foi devido ao emprego do chumbo que conseguiram formar bellas vidraças
pintadas, cuja historia vamos expôr succintamente.

As vidraças dividem-se em duas classes: vidraças _incolores_ e
_pintadas_.

_Vidraças incolores_. As vidraças incolores dos seculos XII e XIII são
compostas de pequenos pedaços de vidro, não excedendo doze a quinze
centimetros, na sua maior dimensão, sendo de côr esverdeada escura,
irregulares e um pouco convexas.

O chumbo empregado antigamente era muito espesso, convexo nas suas faces
e algumas vezes polido nas ranhuras; distingue-se facilmente dos
modernos, fabricados depois do fim do seculo XVI, por se servirem de
instrumento proprio para o reduzir a tiras, com uma especie de
laminador.

Em consequencia da maleabilidade e brandura do chumbo, as tiras que
reunem os vidros das vidraças incolores dos periodos roman e ogival
apresentam muitas vezes as mais curiosas figuras. N'este caso e em
muitos outros a urgencia fornece um motivo d'ornamentação; era
necessario vedar uma abertura relativamente alta e larga com pequenos
fragmentos de vidro, porque as grandes chapas de vidro eram ainda então
desconhecidas. Os vidraceiros da idade média resolveram este problema
como verdadeiros artistas: em vez de adoptarem um systema de envidraçar
vulgar, consistindo em quadrados ou rhombos, serviram-se das tiras de
chumbo para produzir, nas janellas, os mais variados e vistosos
desenhos.

Na Belgica as vidraças incolores eram muito communs nos seculos XII e
XIII; ha exemplos de vidraças, ainda existentes, que se podem referir
com certeza a esta epoca. É verdade que se encontra aqui e ali algumas
vidraças representando entrelaçamentos de fitas, anneis, circulos e
figuras geometricas, que parecem muito antigas por causa da pequenez das
aberturas destinadas a receber as chapas de vidro; mas não é possivel
determinar-lhes uma data approximada.

Estes entrelaçamentos de fitas e de figuras geometricas foram usados na
Belgica durante todo o periodo ogival e conservaram-se com modificações
mais ou menos consideraveis até ao presente.

_Vidraças pintadas_. Ha uma grande differença entre colorir um vidro ou
pintal-o, ou por outras palavras, entre os vidros coloridos e os
pintados. Os primeiros, que tambem se chamam vidros de côr, obtêem-se
misturando-lhes na massa vitrea em fusão oxydos metallicos, que dão a
toda a pasta um colorido uniforme. Este colorido não é superficial; as
materias que produzem as diversas côres penetram durante a fusão na
massa vitrea e combinam-se inteiramente com ella. Para fazer vidros
pintados toma-se uma chapa de vidro translucido e sobre uma das faces,
ou em ambas, applica-se com o pincel os traços do desenho a côres
vitrificaveis, que não são mais que pastas vitreas coloridas por meio
d'oxydos metallicos, reduzidos a pó e diluidos n'um liquido como vinho,
agua gommada e essencia de therebentina. A lamina de vidro, esmaltada, é
em seguida submettida ao fogo; o pó corante entrando promptamente em
fusão, fixa-se sobre a placa de vidro que a sustenta e que apenas está
amollecida pela acção do calôr.

No VII seculo, havia vidraças compostas de laminas de vidro diversamente
coloridas; eram especies de mosaicos transparentes. Mas seria n'essa
epoca que começaram a pintar a côres, sobre vidro branco ou colorido,
personagens e assumptos historicos e legendarios? A opinião mais
provavel colloca a invenção da pintura sobre vidro no fim do X seculo.
Comtudo só no seguinte é que esta arte nasceu na Allemanha e se
desenvolveu e espalhou pela Europa occidental. Logo que se inventou a
pintura sobre vidro no meiado do seculo XIV, o pintor de vidros
servia-se de laminas, cada uma de sua côr uniforme.

No seculo XII e XIII, houve excepção a esta regra para o vidro vermelho,
que, em geral era _duplicado_, isto é, composto de uma lamina delgada
vermelha, applicada sobre uma lamina de vidro incolor.

As differenças de espessura que têem os vidros antigos, differenças que
resultam da imperfeição dos processos de fabríco do vidro, contribuem
singularmente para augmentar o brilho das vidraças da idade média. Em
primeiro logar, os pintores vidraceiros empregavam com muita pericia
estes vidros desiguaes ou ondulados, cortando-os de fórma que a parte
mais delgada se achasse do lado da luz; o que fazia augmentar
consideravelmente o effeito da vidraça. Por consequencia, mesmo para os
fundos fechados, estas differenças de espessura dão á coloração um
aspecto scintillante, que a certa distancia augmenta consideravelmente a
intensidade dos tons.

As côres de que o pintor de vidros dispunha na idade média eram
numerosas e variadas, porque a maior parte das operações chimicas
empregadas para obter vidros de côr, eram empiricas e por consequencia,
davam muitas vezes resultados imprevistos.

Esta gamma de côres extensissima póde comtudo ser reduzida a cinco tons
principaes: azul, vermelho, amarello, verde e côr de purpura.

Para exprimir as carnações, isto é as partes apparentes das carnes, taes
como as cabeças, as mãos e os pés, usavam nos seculos XII e XIII, d'um
vidro d'uma leve côr de violeta, e mais tarde d'um vidro esbranquiçado;
os traços sobre estes vidros eram d'uma côr parda, applicada com um
pincel e em seguida fixada com a cozedura.

Os pintores de vidros dos seculos XII e XIII occupavam-se
principalmente, na composição do cartão, da harmonia das côres. Para o
obter elles não hesitavam em sacrificar a verdade, dando aos objectos
côres que a natureza lhes não deu; é assim que se encontram nas vidraças
antigas, cavallos verdes e arvores com folhas de muitas côres
diferentes. Como o vermelho, e sobre tudo o azul se prestam
admiravelmente a uma collocação vigorosa e alliam-se admiravelmente com
todos os outros tons, os fundos vermelhos e azues são sómente empregados
nas vidraças de assumptos historicos ou legendarios.

Os vidros coloridos das vidraças, vistos a distancia, tomam, graças á
translucidez e á luz que os atravessa, um brilho que faz parecer a sua
superficie maior do que na realidade é; este effeito chama-se
_rayonnement_.

As diversas côres translucidas têem _rayonnements_ de valôr muito
differente; assim, para não fallar senão das tres côres fundamentaes do
prisma; o azul é a mais brilhante, seguindo-se o vermelho e depois o
amarello.

O _rayonnement_ de certas côres translucidas, a distancia, é tal que não
só faz parecer a sua superficie maior do que na realidade é, mas até
modifica mesmo a qualidade d'estas côres e das que lhe ficam proximas.

É d'este modo que um azul limpido, collocado ao lado d'um vermelho
augmenta o brilho dos bordos d'este e torna-os côr de violeta. Além
d'isso, este brilho faz ás vezes desapparecer totalmente os filetes de
chumbo, que engastam os vidros, e altera as linhas do desenho fixado
sobre os vidros por meio do esmalte escuro.

Os principios artisticos que regem a pintura sobre vidro ou translucida
differem notavelmente dos principios da pintura opaca. A luz
atravessando côres translucidas actua sobre estas côres, e sobre as
combinações d'estas côres entre si, de maneira differente do que se
fossem opacas; a luz passando atravez d'um desenho modifica os contornos
d'este, facto que se não dá quando actúa sobre uma superficie opaca
desenhada.

A pintura sobre vidro só póde ser uma pintura de convenção muito
differente da pintura em quadro. N'esta procura-se illudir a vista do
espectador servindo-se de todos os recursos das sombras, do claro escuro
e da perspectiva linear e aérea. Na pintura sobre vidro, pelo contrario,
assim como na pintura monumental, o artista deve respeitar e deixar
parecer plana a superficie sobre que pinta; deve contentar-se em traçar
a silhueta dos personagens e dos objectos que entram na composição do
seu assumpto, fazer pouco caso da perspectiva, mesmo linear, traçar as
sombras d'uma maneira convencional, indicando as partes salientes por
claros e as rugas por tons opacos, e desprezar os accessorios ou, quando
muito, represental-os hieroglyphicamente. Na pintura opaca o artista
deve procurar grupar os personagens d'uma scena de modo que se destaquem
uns dos outros afim de obter uma sèrie de planos, em quanto que na
pintura translucida, evita-se, tanto quanto possivel, as agglomerações
d'um grande numero de figuras, e esforçam-se por fazer apparecer o fundo
em torno de cada uma d'ellas.

As vidraças pintadas do XII seculo são sempre formadas de pequenos
medalhões circulares, quadrados ou apresentando outras fórmas simples e
regulares. Estes medalhões, nos quaes apparecem composições adornadas,
ficam dispostos symetricamente sobre fundos formados de mosaicos de
vidro simples ou differentemente coloridos.

A côr _azul_ domina geralmente nos fundos das vidraças pintadas no XII
seculo; pouco empregam a côr encarnada; algumas vezes tem tambem o fundo
azul, ficando mais harmonico, tendo-se espalhado, sobre esse fundo,
pequenos florões encarnados, ou pequenos traços que se encruzam e cobrem
o fundo azul de um tecido encarnado com divisões quadradas ou rhombos.
Em roda da vidraça e de cada medalhão ha cercaduras differentes, quasi
sempre bastante longas e compostas de florões, palmetas, folhagens e
enlaçadas com perolas.

As composições representadas nos medalhões são tiradas da vida de Jesus
Christo e de Nossa Senhora, ou da historia do antigo e novo Testamento;
assim como da legenda dos Santos. A execução é d'uma grande simplicidade
e com muita ingenuidade. O desenho accusa as tradições bysantinas: o
emprego das figuras apparece, não obstante as roupas que o vestem, sendo
as prégas da roupagem estreitas e parallelas.

_As vidraças do XIII seculo_. As vidraças pintadas no XIII seculo têem
grande similhança com as do XII, porque a maneira de sua execução ficou
quasi a mesma. Nas janellas inferiores da capella mór e das naves
lateraes, as vidraças compunham-se, como precedentemente, de medalhões
historiados de differentes fórmas, dispostos uns por cima dos outros
sobre uma ou muitas fileiras. Nas janellas superiores da capella mór e
da nave principal, principiaram a representar, desde o final do XII
seculo, grandes figuras em pé, figurando veneraveis personagens do
antigo e novo Testamento.

As côres de que mais uso se fez para os fundos das vidraças pintadas no
XIII seculo foram o _azul_, o _encarnado_ e o _verde_; empregava-se
tambem, em certos casos, porém com moderação, o _amarello_ e o _roxo_.
Os fundos não são lisos, formam uma especie de pannos-de-raz sobre os
quaes vem assentar a composição dos assumptos. Esta tapeçaria se compõe
não sómente de _escamas_, _canniçal_ e de _xadrez_, mas, muitas vezes
tambem, de enlaçados, festões e folhagens, enrolamento, sobre os quaes
os assumptos se destacam perfeitamente. Do mesmo modo que nas
composições com as grandes figuras, as tiras de chumbo indicam os
contornos principaes d'estas ornamentações.

No correr do XIII seculo, o estylo e o caracter do desenho mudaram
completamente, porém por séries de transformações successivas. Desde a
metade do XII seculo, os artistas de vidraças pintadas, da mesma fórma
que os miniaturistas, os pintores, e os esculptores, tinham principiado
a abandonar pouco a pouco as tradicções da arte Byzantina, e a
manifestar uma direcção notavel para a imitação da natureza. Esta
direcção augmenta e se affirma cada vez mais no XIII seculo. Os pintores
das vidraças d'esta época não continuam a representar o nú das figuras
em desdem da inclinação natural dos vestuarios, estudam a natureza e
esforçam-se de a reproduzir tal qual se apresenta á sua vista:
reconhece-se facilmente este novo methodo pela maneira por que são
indicados os gestos das personagens, a physionomia das cabeças e as
prégas dos vestuarios: os gestos perdem a sua expressão archaïca, as
cabeças não são já desenhadas conforme os typos convencionaes, e os
trajes são os da epoca, fielmente imitados. A composição dos assumptos é
apresentada com animação; sendo evidente que os artistas do XIII seculo
se preoccupavam de proposito em produzir no espectador um effeito
subito.

As vidraças pintadas do XIII seculo offerecem muito interesse para o
estudo do vestuario da idade média. Conforme o uso adoptado n'esta epoca
em todas as representações artisticas, sejam pintadas ou em esculptura,
o artista vidraceiro tomava os seus modelos que lhe eram familiares; não
se preoccupando de nenhuma maneira da fidelidade historica, trajava as
suas figuras á moda do seu tempo.

A arte da pintura das vidraças não se conservou por muito tempo no
apogeu que havia alcançado no decurso de alguns annos. Desde o meiado do
XIII seculo principiou a declinar pouco a pouco. Em consequencia da sua
propensão notavel para os effeitos dramaticos, chega á affectação e ao
exquisito, occupando-se mais dos detalhes, perdendo facilmente a nobre
simplicidade que tanto caracterisava as suas obras no final do XII
seculo e no principio do XIII seculo.

Ao findar o XII seculo, as pinturas das janellas superiores da nave
principal e quasi todas da capella mór foram ornadas com figuras em pé,
representando santos do antigo ou do novo Testamento, não excedendo, em
tamanho, a estatura geral do homem. No XIII seculo, dava-se a estas
figuras proporções mais colossaes, porque ficavam collocadas a uma
grande distancia do espectador. A disposição geral d'estas vidraças nas
cathedraes e nas grandes egrejas do XIII seculo merece o exame
reflectido da parte do archeologo. A pintura da vidraça superior do côro
da capella mór, que attrahe sobretudo a vista e domina, de alguma
maneira, o altar mór, era dedicada ao Salvador soffrendo pela redempção
do genero humano; vê-se ahi quasi sempre Jesus Christo na Cruz entre a
sua Divina Mãe e o discipulo querido, com os symbolos accessorios, que
na idade média acompanham sempre a scena da crucifixação. Nas outras
janellas superiores do côro estão em pé os Apostolos e os Santos
venerados na basilica; as janellas altas da nave principal são pintadas
com grandes imagens de outros Santos, taes como as dos patriarchas, reis
e prophetas do antigo Testamento. As vidraças pintadas á roda da capella
mór e das capellas da charola, formadas por medalhões, representam os
principaes factos da vida de Jesus Christo e de Nossa Senhora, ou as
legendas dos oragos da egreja; algumas vezes tambem, se representavam,
sob fórmas symbolicas, os principaes dogmas da Fé. As vidraças pintadas
das janellas lateraes da nave, e muitas vezes do transepte, eram
dedicadas ás legendas de devoção da localidade, e aos Santos ou Santas
de que a egreja possuia reliquias.

Nas vidraças pintadas do XII e XIII seculo, ás vezes reproduziam os
retratos dos doadores, mas sempre de tamanho menor.

Passemos agora a fallar das vidraças com pinturas de _grisalha_. Dá-se
este nome á composição do caixilho pintado de vidros brancos ou um pouco
esverdinhados, sobre os quaes são traçados, por meio do _esmalte pardo_,
desenhos e ornatos variados.

Nas _grisalhas_ da primeira metade do XIII seculo, o desenho é
desenvolvido com firmeza, vigorosamente modelado, e os vidros seguros
por filetes de chumbo que indicam os traços mais fortes dos ornatos ou
formam as principaes divisões do caixilho da vidraça pintada. Os vidros
são quasi opacos e completamente sem nenhuma parte colorida. Estes
vidros são geralmente grossos, esverdeados e muitas vezes apresentam
bolhas na superficie.

A começar da ultima metade do XIII seculo, as _grisalhas_ vieram a ser
menos opacas, deixando penetrar uma claridade mais abundante no interior
dos edificios; ás vezes não são estes vidros sem ter colorido, porque se
lhe ajuntam vidros coloridos nos filetes que os dividem, ou nas pequenas
rosetas espalhadas na superficie.


*Vidraças pintadas do XIV seculo*


_As vidraças pintadas do XIV seculo_ apresentam aspecto differente das
dos seculos precedentes, posto que, durante toda a metade do seculo, o
artista d'esta especialidade se servia ainda dos mesmos processos
d'execução dos seus antecessores. Esta mudança total d'aspecto proveio
de muitas causas: pelas novas disposições da armação de ferro, assim
como pelo tom claro e brilhante que se deu ás vidraças, finalmente pelas
propensões exageradas para a imitação servil da natureza real.

Nas guarnições de ferro das vidraças do XII e do XIII seculo, desenhando
os contornos tão variados dos medalhões legendarios, foram levados a
seguir a fórma primitiva, consistindo em simples hastes verticaes
divididas de distancia a distancia, por travessas horisontaes, formando
angulo recto com essas hastes.

As côres mais empregadas nas vidraças do XIV seculo, eram o _azul_, o
_encarnado_ e o _amarello_; este ultimo tom, geralmente muito usado,
produzia um brilhante effeito, que fazia desmerecer as grisalhas claras,
frequentemente empregadas n'essa epoca. A côr _verde_ e o _roxo_ vão
sendo menos usadas.

O desenho continúa, durante o XIV seculo, a obter mais correcção; porém
o pintor de vidraças, esquecendo cada vez mais a pintura transluzente
que não é e não podia ser uma simples pintura de conservação, procura já
produzir illusão para a vista do espectador; tenta de copiar a natureza,
e consegue algumas vezes reproduzil-a com certa fidelidade.

As vidraças _legendarias_ desapparecem quasi completamente no XIV
seculo, e nos raros exemplos que se encontram, os medalhões são quasi
sempre supprimidos e as representações das differentes scenas religiosas
sobre-postas uma ás outras, ficam sem molduras e sem separação. As
grandes figuras isoladas preferidas n'esta epoca, apparecem, não sómente
nas vidraças altas, mas tambem nas outras dos lados da nave e á roda da
capella-mór. Representam mais vezes Santos, e poucas vezes pessoas ainda
existentes.

As figuras estão sempre postas debaixo de doceis cheios de ornamentação
tirada da architectura, taes como ridentes, pinaculos, clochetões,
rosaceas e arcos-butantes. Estes doceis parecem ficar sustentados por
pés-direitos com feitio de contrafortes ornados de arcadas e de nichos,
nos quaes se collocam pequenas figuras d'anjos e de santos. As molduras
e os doceis do remate das grandes figuras tomam ás vezes uma tão grande
importancia que occupam tanto e mesmo maior espaço, que as figuras que
elles adornam.

No principio do XIV seculo os fundos das vidraças sobre os quaes
sobresaem as grandes figuras são ás vezes lizos, outra de côr
_encarnada_ ou _azul_; vindo a ser depois quasi sempre de feitio
_adamascado_, isto é, cheias de desenhos differentes, similhantes aos
que se vêem na seda chamada _damasco_.

No XIV seculo, os brazões dos doadores apparecem muitas vezes nas
vidraças pintadas. Vêem-se tambem nos bordados, nas rosaceas do tympano
e nas almofadas inferiores das janellas, e inscripções que apparecem
frequentemente.

No meiado do XIV seculo, uma importante descoberta, do _amarello de
prata_, fez obter aos pintores de vidraças um novo esmalte e
proporcionou-lhes grande facilidade no trabalho da pintura. O _amarello
de prata_, é um esmalte obtido por um composto d'ocre amarello com o
sulphureto de prata. Depois de ter passado pelo lume os vidros cobertos
d'este mixto, separa-se a demão secca d'ocre; ficando depois sobre o
vidro um bellissimo tom amarello mais ou menos carregado e perfeitamente
translucido.

Os fabricantes dos vidros tornando-se mais habeis, conseguiram tambem,
durante o curso do XIV seculo, produzir chapas de vidro muito maiores
que nos seculos precedentes.

A descoberta do amarello de prata e os progressos feitos no fabrico do
vidro contribuiram poderosamente para modificar o aspecto das vidraças
pintadas, porque fizeram diminuir o numero dos filetes de chumbo, e
simplificaram, por conseguinte, a armação da vidraça.

As grisalhas do XIV seculo parecem-se muito com as do final do seculo
precedente. Todavia as grisalhas sem colorido são substituidas pouco a
pouco pelas que apresentam algum colorido. Além d'isso, depois do meiado
do XIV seculo, apparecem as grisalhas brancas, com o realce do amarello
de prata.


*Vidraças pintadas do XV seculo*


_No XV seculo_ uma unica côr tem applicação, posto que, de pouca
importancia, para servir de incarnação, vindo-se ajuntar á palheta do
artista aos dois esmaltes já conhecidos. Esta fraca tinta, que servia
para modelar as cabeças e as partes nuas do corpo humano, era provavel
fôsse um composto d'oxydo de ferro e terra de sombra calcinada. O pintor
de vidraças não tinha ainda á sua disposição senão tres côres para
pintar sobre o vidro: o _pardo_, o _amarello de prata_ e a _côr_ para a
incarnação; porém achou novo expediente para a sua arte no emprego de
_vidros duplicados_. Já explicámos como, desde o XII seculo, o vidro
encarnado era muitas vezes composto de duas laminas, uma sem côr e outra
encarnada, ficando sobrepostas durante a sua fabricação. Depois no final
do XIV seculo, o processo que tinha servido antes para se obter vidros
encarnados, foi applicado ás outras côres. Sobrepondo duas ou mais
demãos de differentes côres, obtinham-se vidros de tintas muito
variadas. Os vidros duplos lhe davam certos tons d'um vigor desconhecido
até então: obtinham-se vidros roxos sobrepondo o vidro encarnado ao azul
claro; verdes, sobrepondo o branco, amarello e o azul.

O colorifico que é resultado de se terem unido dois vidros de côres
differentes não póde ser confundido com o que se obtem pela applicação
d'uma côr d'esmalte sobre o vidro fabricado, e posto depois á recocção
do fogo.

Os pintores de vidraças do XV seculo, não empregavam sempre os recentes
aperfeiçoamentos introduzidos na sua arte com bastante cuidado e
intelligencia. É por isso que o emprego muito frequente e irracional da
pintura em grizalha sobre vidro branco constitue um dos caracteres
particulares das vidraças pintadas da ultima metade do XV seculo e do
principio do XVI seculo. Muitas vezes as roupas superiores das grandes
figuras em pé são brancas e o fôrro sómente de côr. Comprehende-se que
este abuso das grizalhas, nas roupagens e na maior parte dos
accessorios, dá necessariamente ás vidraças uma apparencia clara e
scintillante. Muitas vezes os fundos azues e encarnados, adamascados
superiormente, nos quaes sobresaem as figuras e os assumptos, offerecem
ainda unicamente um tom real com bastante colorido.

O maior numero d'estas vidraças tem emmoldurados de feitio
architectural, consistindo em contrafortes cheios de pinaculos ou
columnasinhas, com os fustes mais ou menos ornados. Estes emmoldurados
parecem suster os docéis, cujos lados inclinados da empena, sempre de
fórma ogival, são ornados de elegantes folhagens. Debaixo dos docéis
estão figuras em pé separadas pelas molduras das hombreiras, seja por
assumptos historicos ou legendarios, occupando toda a largura do vão.
Nas vidraças com assumptos não apparecem os filetes de ferro na
separação dos vidros. Quando se superpõem, como às vezes acontece,
muitas figuras e muitos assumptos em um só vão da janella, ficam
separados uns dos outros por sócos ornatados com decoração
architectonica da época, e apoiando-se sobre os docéis que formam o
remate do renque inferior.

Os grandes progressos que foram realisados, no XV seculo, na pintura
opaca ou de cavallete, e o estado prospero em que ella se achava desde a
primeira metade do XV seculo, exerceram a mais funesta influencia sobre
a pintura translucida. Os pintores de vidraças, que quasi sempre eram
tambem, e mesmo principalmente, pintores de quadros, esqueciam
diariamente, cada vez mais, que a pintura sobre o vidro é essencialmente
uma pintura de convenção. Não se contentavam de introduzir nas vidraças
pintadas um desenho mais correcto, procuravam ainda enganar a vista do
espectador tão completamente quanto fosse possivel; por outras palavras,
executavam sobre o vidro composições que só convinham para superficies
opacas.

No meiado do XV seculo, apparecem nas vidraças pintadas, como nos
quadros de tela, pequenas paisagens em perspectiva longiqua; estas
paisagens representavam vistas pittorescas de castellos cheios de
ameias, edificios de toda qualidade e apresentações dos trabalhos
agricolas.

No XII e no XIII seculo, as vidraças das egrejas compunham-se de
pinturas e esculpturas, eram um livro sempre patente, onde os ignorantes
e bem assim os estudiosos podiam instruir-se nos principaes dogmas da
Fé, na historia da religião e nos deveres do homem para com Deus e o
proximo. Esta missão sublime da arte religiosa começou a ser esquecida
durante o XIV seculo; em muitas vidraças d'esta época, as representações
exemplares e instructivas são substituidas por brazões e retratos em pé
dos doadores. No XV seculo, as propensões, cada vez mais profanas, se
manifestam na escolha dos assumptos reproduzidos nas vidraças pintadas.
Estas não serviam para instrucção do povo; muitas vezes os principaes
dignitarios ecclesiasticos e os poderosos do mundo se faziam ahi
representar sumptuosamente; quando muito, o santo orago apparece atraz
no segundo plano da pintura, emquanto os brazões de armas se repetem,
sob fórmas diversas, em todos os lados da vidraça.


*Vidraças pintadas no XVI seculo*


No XVI seculo, as vidraças pintadas apresentam um aspecto inteiramente
novo. Todavia o primeiro terço do seculo se passou sem que os processos
materiaes da pintura sobre o vidro se tivessem modificado; e se a
_renascença_ não tivesse, desde este momento principiado a influir nas
composições artisticas, seria difficil distinguir as vidraças dos
primeiros annos do XVI seculo das do final do seculo precedente. Em
1540, uma nova côr teve applicação, o _encarnado de ferro_, que se
juntou na paleta do pintor de vidraças aos tres esmaltes conhecidos
então: o pardo, o amarello de prata, e a côr para encarnação. Alguns
annos depois, em 1550, achou-se o segredo de applicar todas as côres,
preparando-as com um liquefactivo (que não era outra coisa que o pó
vitreo), incorporando-os pela cozedura nas placas de vidro. Este genero
de pintura sobre vidro, que teve o nome de _pintura_ ou _apprèt_, deu
grandissimas facilidades para os pintores de vidraças, e fez mudar
completamente os processos da arte. O artista preparava primeiramente a
placa vitrea, pouco mais ou menos como a téla, para a pintura a oleo
pela maneira de tintas geraes e sitios; sobre estes tons modelava depois
as figuras e objectos; finalmente traçava as sombras e alcançava o
effeito com os retoques de côres, emquanto fazia apparecer os pontos
luminosos, desfazendo com promptidão a tinta opaca afim de deixar ao
vidro toda a sua translucidez.

Cerca da mesma época descobria-se a propriedade que tem o diamante de
cortar o vidro, inventando-se o tira-chumbo, que facilitou a producção
dos filetes de chumbo para segurar os vidros, conseguindo-se tambem
executar placas de vidro de grande dimensão. Todos estes progressos nos
processos materiaes produziram uma revolução completa na arte da pintura
das vidraças, e tiveram por principal resultado o abandono quasi total
dos vidros tintos na massa.

O estylo das vidraças transforma-se inteiramente no XVI seculo sob a
influencia artistica do renascimento. Nos edificios religiosos dos
primeiros annos do XVI seculo, a volta inteira substituiu
insensivelmente a ogiva. Depois d'esse momento tambem appareceram, sobre
as vidraças pintadas, ornatos tirados do estylo classico, misturados com
florões e outras decorações que recordavam ainda a época ogival. Pouco a
pouco as idéas classicas fazem progressos e conseguem, depois de algum
tempo, obter a preferencia. Não se vê mais então ovanos, volutas, folhas
de acantho, festões de flores e fructas. O arco de triumpho ou portico,
imitado da architectura pagã, forma de ora ávante o moldurado proprio
das vidraças pintadas em que figuram as personagens e os assumptos. Até
metade do XVI seculo, o artista se satisfaz em desenvolver, na parte
inferior da vidraça o assumpto principal com o moldurado que o limita, e
reserva a parte superior, assim como o tympano para collocar os brazões
e os symbolos. Poucos annos depois da metade do XVI seculo, em 1560, o
assumpto e o emmoldurado passam mesmo atravez dos enlaçamentos do
tympano, se todavia os quizerem respeitar, e não fazel-os desapparecer.

Os assumptos religiosos e symbolicos são raros sobre as vidraças
pintadas do XVI seculo: vêem-se as mais das vezes os retratos dos
doadores nas vidraças, onde apparecem representados geralmente de
joelhos sobre um genuflexorio, quer só, quer rodeados das pessoas de
suas familias. O orago do sanctuario os acompanha sempre, e os seus
brazões repetem-se muitas vezes em differentes partes na pintura da
vidraça.

No XVI seculo, produziu-se uma certa predilecção pelas pequenas
almofadas pintadas com que se ornavam antes, algumas vezes no final do
seculo precedente, as vidraças dos edificios publicos, castellos,
claustros e mesmo as habitações particulares. Essas bonitas pequenas
almofadas, quer em grizalha retocada com amarello de prata, quer de
côres differentes, são feitas com bastante tenuidade e delicadeza
extrema. Ás vezes occupam toda a abertura, ou pelo menos uma das
divisões principaes da vidraça, outras vezes consistem em simples
medalhões circulares ou ovaes, circumdados de vidro colorido ou branco.
As pequenas vidraças pintadas, designadas _vidraças suissas_, porque
tiveram primeiramente uso na republica Helvetica, pertencem á mesma
categoria. Estas vidraças, cujo uso se conservou durante os seculos
seguintes, reproduziram para a nobreza os brazões de familias
differentes moldurados; para os edificios municipaes, as armarias da
cidade ou da provincia com figuras de porta-estandartes vestidos com os
trajos e as armaduras da época; para as abbadias, as armas do mosteiro
ou a figura em pé do fundador. Os burguezes e as pessoas de profissão
eram ahi representados com os symbolos do seu officio sobre um escudo.
Muitas vezes tambem os fidalgos, burguezes e operarios eram
representados todos nos seus trajos com sua familia. A transparencia e o
brilho do colorido são geralmente mais vistosos nas vidraças suissas,
que nas maiores vidraças pintadas.


*Vidraças pintadas do XVII seculo*


No XVII seculo, a pintura com preparo ou com côres pegadas, continuou a
ter voga, devido aos aperfeiçoamentos introduzidos na composição e no
assentar os esmaltes, o que fez abandonar completamente o emprego dos
vidros duplos e dos vidros tintos na massa. Este genero de pintura,
muito apropriada para as vidraças pintadas dos aposentos, não convinha
de maneira nenhuma para decoração das grandes vidraças pintadas, porque
o artista querendo apresentar grandes sombras e tons fugitivos,
servindo-se de meias-tintas e de tintas de bistre, tornava a sua pintura
tão carregada, embaciada e confusa que, por vezes, era difficil
distinguir os objectos.

A representação de Arcos de Triumpho ou porticos constituia, como no
seculo precedente, o moldurado forçoso de todas as composições, com esta
differença, que esses arcos e esses porticos são agora vistos
obliquamente ou de lado, isto é, em perspectiva, emquanto d'antes
apresentavam a frente geometral.

Os filetes de chumbo, que anteriormente seguravam tão vantajosamente os
principaes contornos do desenho, foram considerados como inuteis e mesmo
causando embaraço na execução da pintura. Não serviram mais que para
reunir vidros eguaes e quadrados, formando uma especie de canniçado, por
detraz do qual os artistas pintavam sobre os vidros como se fossem uma
tela, não fazendo nenhum caso das juntas metallicas.


*Vidraças pintadas do XVIII seculo*


_No XVIII seculo_, os vidros tintos na massa foram pouco fabricados; seu
preço era avultado, e sua falta muito grande. Quasi todas as vidraças
d'esta época são com vidros esmaltados. O esmalte branco, já conhecído
no XVI e XVII seculo, veiu a ser então de uso geral e formou as
principaes côres empregadas. A decadencia da pintura das vidraças foi
completa, e a arte perdeu a tal ponto que havia em Paris um _unico
pintor d'esta especialidade_, o qual não podia subsistir por este seu
trabalho.

Finalisando a historia de pintura sobre o vidro, devemos notar uma
tradição popular muito vulgar que considera, sem razão, a arte da
pintura sobre o vidro, conforme era feita na edade média, como sendo um
segredo que se perdeu desde muito tempo. Esta opinião não tem nenhum
fundamento.


*Pilares, columnas e columnasinhas*


Na edade média, as designações de _pilar_ e de _columna_ se confundem
muitas vezes; todavia a palavra _columna_ indica a idéa de um apoio com
fuste cylindrico. Eucontram-se nos edificios do periodo ogival quatro
especies principaes de pilares ou columnas: o pilar _quadrado_, a
columna _monocylindrica_, a columna _cruciforme_ e a columna
_enfeixada_. A columna monocylindrica dá em secção um _circulo_, e o
pilar quadrado, um _quadrado_ ou um _rectangulo_; a columna cruciforme
se compõe de um _pilar central_, tendo sobre _as faces quatro columnas_
mais ou menos envolvidas; finalmente a columna _enfeixada_, como o nome
indica, é o resultado da reunião em _mólho_, em roda de um massiço
formando pilar, _muitas columnasinhas ou nervuras_.

Os pilares quadrados são raros durante o periodo ogival; apparecem no
começo, e ás vezes as suas arestas são chanfradas.

Em quasi todos os monumentos belgas do XIII e XIV seculos, as columnas
são monocylindricas. As columnas cruciformes, communs nas cathedraes
francezas, servem na Belgica principalmente na intersecção da nave e do
transepte nos grandes edificios.

Os edificios do XV seculo teem as columnas monocylindricas ou
enfeixadas. As primeiras apresentam ás vezes capiteis; outras vezes são
inteiramente privadas d'elles. N'este ultimo caso os arcos-duplos e as
nervuras das abobadas nascem directamente do fuste da columna, no logar
onde se colloca o capitel. Este genero de columnas se encontra muitas
vezes em todos os paizes da Europa central e occidental.

No XV seculo, as columnas enfeixadas não são já formadas, como
precedentemente, de columnasinhas com capitel, porém compostas de
nervuras _prismaticas em grupo_, á roda de um pilar central. Estas
nervuras saem da base da columna erguendo-se quasi sempre sem ter por
intermedio o capitel até ás abobadas do edificio, afim de formar os
_arcos-duplos_ e os arcos ogivaes; são sempre com a fórma angulosa e
apresentam secções similhantes ao feitio de um seio. É por excepção que
se encontram ainda, em certas partes dos monumentos do XV seculo,
columnas enfeixadas formadas pela reunião de columnasinhas cylindricas
com capitel.

Os pilares e as columnas são construidas por _fiadas_ na Belgica, na
Allemanha e no Norte da França. No meiodia da França e na Italia, as
columnas cylindricas são quasi sempre monolithos.

Durante o periodo ogival, os fustes das _columnasinhas_ não são, como
muitas vezes no periodo _roman_, cobertas de diversas esculpturas.
Todavia encontram-se, em alguns edificios dos primeiros annos da época
ogival, como na cathedral de Chartres em França, e em muitos monumentos
italianos, columnasinhas _terciaes_ em que o fuste é em espiral.

As columnasinhas tiveram principalmente applicação no XIII e no XIV
seculos. As que compõem os grandes pilares teem geralmente o seu fuste
envolvido n'um quarto de circumferencia, os outros tres quartos ficam
apparentes; algumas, não obstante, estão inteiramente separadas da
parede ou da columna que fórma o pilar que ellas ornam, como existe nas
cathedraes de Amiens, França, e de Salisbury, na Inglaterra. No XIII
seculo, essas columnas são muitas vezes, como as do seculo precedente,
_anneladas_, ou compostas de engrossamentos em fórma de bracelete.

No XV seculo, estas columnasinhas são raras; ou então substituidas por
nervuras prismaticas não sómente nas columnas enfeixadas, mas tambem em
todas as outras partes dos edificios, taes como o molduramento das
portas e das janellas. Estas nervuras teem base, mas sem capitel.

No principio do XVI seculo tornam a apparecer as columnasinhas com o
fuste coberto de esculpturas, representando figuras geometricas, festões
e arabescos. Os fustes das columnasinhas d'esta época são regularmente
cylindricos: algumas vezes polygonaes ou apresentando a forma de
_balaustre_.


*Bases das columnas*


As bases das columnas do XIII seculo compõem-se de dois _tóros_
separados por uma cavidade redonda (_scocia_) bastante profunda de
maneira a formar uma calha na qual a agua da chuva se retem afim de não
prejudicar o cimento da construcção. Algumas vezes o tóro inferior é
achatado e sobresae bastante por cima do _plintho_; o tóro superior é
quasi sempre cylindrico; por vezes todavia apresenta uma pequena
depressão.

Durante a primeira metade do XIII seculo, as bases das columnas estão
ainda muitas vezes ligadas aos angulos dos seus plinthos _por garras_.
As garras apparecem por vezes, porém excepcionalmente no final do
periodo ogival.

Depois do meiado do XIII seculo, a _scocia_ profunda, que indica um dos
signaes caracteristicos das bases da ultima metade do XII seculo e do
principio do XIII seculo, desapparece pouco a pouco, assim como o
achatamento do tóro inferior. As bases passam depois successivamente
pela fórma polygonal ou cylindrica; pertencendo a primeira d'este feitio
ao XIII seculo, e a segunda ás bases do XVI seculo.

Quando o tóro inferior da base desdobra muito sobre o plintho da
columna, põe-se algumas vezes um pequeno apoio por baixo do t­óro. Esta
particularidade, sem belleza, se encontra nos edificios francezes e da
Belgica.

O sóco sobre o qual vem assentar a base da columna do XIII e do XIV
seculos, fórma, quasi sempre, um octogono regular; algumas vezes,
comtudo, é quadrado (nos edificios dos primeiros annos do periodo
ogival) ou cylindrico. Os _sócos cylindricos_ se encontram em muitos
monumentos belgas do XIII e do XIV seculo: tambem são bastante communs
na Inglaterra: em França servem na Normandia, na Bretanha e no Maine.

No XV seculo, a base e plintho das columnas monocylindricas são
extraordinariamente delgadas. A base é formada sempre por uma simples
moldura do feitio de tóro. Muitas vezes esta moldura, que nos seculos
precedentes era traçada sobre um plano circular, toma a fórma polygonal
do sóco.

Nas columnas enfeixadas do seculo XV, as pequenas bases parciaes das
nervuras prismaticas ou cylindricas em grupo á roda do pilar central,
formam, pela sua reunião e penetração, a base e o sóco da columna.
Durante a primeira metade d'este seculo, as pequenas bases teem todas o
mesmo perfil e ficam ao mesmo nivel. Mais tarde, os architectos
costumaram perfilar as bases parciaes em niveis differentes, como para
melhor fixar cada columnasinha e para evitar tantas compridas linhas
horisontaes.

_Capiteis_.--Durante todo tempo do periodo ogival, ornaram regularmente
com bellas esculpturas os açafates dos capiteis. Houve comtudo excepções
a esta regra, e por isso se encontram em alguns edificios religiosos de
segunda e terceira ordem do XII e do XIII seculo, limitados por uma
simples moldura.

Os capiteis do XIII seculo distinguem-se com facilidade pela
ornamentação vegetal de um caracter mui particular. O seu açafate
compõe-se geralmente de um, de dois, e algumas vezes mesmo de tres
renques de crochetes ou enroscamento de folhagens. Os crochetes de
renque superior supportam quasi sempre os angulos do abaco, e
substituem, de alguma maneira, o emprego dos modilhões. No final do XII
seculo e no principio do XIII seculo, teem a sua extremidade enroscada e
parecem rebentos de vegetaes. Em França desde o final do XII seculo, e
na Belgica um pouco depois, as extremidades dos crochetes se desenrolam,
e os rebentos se abrem em folhagens.

Algumas vezes os crochetes, em logar de acabarem por folhagens
enroscadas ou abertas, trazem no seu cume cabeças de homens e de animaes
verdadeiros ou phantasticos.

Os capiteis com crochetes enroscados, cujo emprego então estava
abandonado em toda a parte no final do XIII seculo, continuou na
Flandres maritima até ao fim do periodo ogival. Além d'isso, os
crochetes teem, n'esta região, uma fórma especial; seus enroscados são
muito mais chatos e mais largos.

A ornamentação dos capiteis do XIV seculo consiste em ramos de
folhagens, de flôres e de fructos, de fórma muito variada, nas quaes se
acham todos os caracteres da esculptura ornamental do XIV seculo. Os
crochetes, apropriadamente assim designados, não apparecem mais que
excepcionalmente com os capiteis d'esta época: todavia os ramos de
folhagens e de flores são geralmente collocados, nos angulos do abaco,
de maneira a recordar pelo seu vulto os crochetes do XIII seculo, e
servem para o mesmo fim. Muitas vezes estes ramos são dispostos sobre
dois renques; esta maneira se nota sempre quando, como acontece
repetidas vezes, o açafate é composto de duas peças sobrepostas, e mesmo
algumas vezes, quando o capitel é formado de uma só pedra.

As figuras de animaes reaes ou phantasticos se encontram poucas vezes
sobre os capiteis do XIII e do XIV seculos.

Os capiteis do XV seculo teem, como os dos seculos precedentes, o seu
açafate coberto de folhagens; porém essas folhagens apresentam
geralmente mais ou menos desenvolvimento; são delgadas, angulosas, muito
recortadas, muito profundas e exaggeradas. Com o XV seculo, appareceu
sobre os capiteis o ornato vulgarmente designado _folha de repolho_.

Em muitos ornamentos do XV seculo, os architectos, levados pela
applicação muito rigorosa do preceito que qualquer ornato deve ter ao
mesmo tempo um emprego necessario, supprimiram o capitel. N'estes casos,
os arcos-butantes e as nervuras das abobadas sobem, sem intermediario,
do fuste cylindrico, ou então nascem na base mesmo da columna, seguindo
toda a largura do fuste até ao nascimento das abobadas, e tomam, n'esse
logar, as differentes direcções convenientes para a construcção das
abobadas.

As columnas cylindricas com capitel são usadas nos edificios belgas do
XV seculo, mas são bastante raras em França.


*Modilhões e misulas*


É um apoio que faz saliencia sobre a face de uma parede ou de uma
columna que se chama _modilhão_ quando tiver dois lados lateraes
parallelos e perpendiculares á parede; e _misula_, quando apresentar uma
outra differente posição.

Depois do meiado do XIII seculo, os modilhões do feitio de curvas são
raros.

As misulas apresentam por vezes uma tal ou qual similhança com os
capiteis, e são tambem sempre rematadas por um abaco; differençam-se
comtudo, as mais das vezes, pelo seu genero de ornamentação. Na verdade,
as esculpturas dos capiteis do periodo ogival reproduzem quasi sempre
vegetaes: e sómente por excepção mostram figuras de homens ou de
animaes. Sobre as misulas, pelo contrario, a ornamentação vegetal não
apparece, por assim dizer, senão no XIII seculo, e mesmo é rara; durante
os dois seculos seguintes desapparece, e então as misulas são
constantemente formadas de personagens grotescas, acocoradas, de animaes
reaes ou phantasticos, e algumas vezes tambem de cabeças humanas, ou
figuras de anjo e de homem sustentando escudos, disticos e bandeirolas.

Muitas vezes as misulas, collocadas quer no interior, quer no exterior
dos edificios, são pintadas com côres vivas.


*Arcadas e arcaduras*


As grandes arcadas ou archivoltas ligando os pilares das naves e
sustentando o peso das paredes superiores, compõem-se regularmente de
dois ou tres renques de sobre-arcos nos edificios do periodo ogival. Os
perfis variam nos differentes seculos.

No XIII seculo, e mesmo ainda no XIV seculo, as arestas da archivolta
são formadas por tóros inscriptos na face quadrada da peça do arco; no
XIV seculo e durante uma grande parte do XV seculo, os tóros já não são
completamente cylindricos, mas teem antes do termino a curva d'esta
moldura, um filete destinado a deter a força do reflexo; no final do XV
seculo e no principio do XVI, os tóros cylindricos tornam a apparecer.

As _arcaduras_ são bastante vulgares nos monumentos do periodo ogival;
servem para ornar o liso das paredes internas e exteriores dos
edificios. Na parte interna apparecem principalmente no _triforium_ e
por baixo dos peitorís das janellas das naves lateraes; na parte
exterior, por baixo das cornijas e nos frontespicios, nos vasamentos dos
grandes portaes e nas galerias dos claustros.

As arcaduras que se vêem em baixo das janellas de quasi todos os grandes
monumentos, compõem-se de uma serie de pequenas arcadas fingidas,
collocadas entre os peitorís das janellas e o solo ou no sóco de
cantaria que fórma, muitas vezes, uma especie de base ao longo das
paredes das naves lateraes.

No XIII seculo, as curvas das arcaduras assentam sobre columnellos mais
ou menos embebidos na parede. No XIV e no XV seculos, os _columnellos_
ficam substituidos por simples nervuras, ás vezes cylindricas; porém as
mais das vezes a secção polygonal não differe muito da de uma
semi-hombreira de janella. Estas nervuras teem remate junto do solo,
sobre as bases que lhes pertencem. No final do periodo ogival,
supprimem-se, por vezes, as nervuras, e então as _arcaduras_ assentam
sobre modilhões.

No XIV e no XV seculos, as arcaduras sobre os peitorís das janellas
ligam-se inteiramente com as hombreiras das janellas e parecem, de
alguma maneira, confundir-se com elles: parecendo que atravessam a
cantaria do peitoril e descem até ao solo. As arcaduras não são mais do
que a parte inferior da janella que está tapada, e na verdade, a parede
necessitando de diminuir para dentro, ficando á face da vidraça, afim de
deixar metade do peitoril apparente, conserva apenas uma pequena
grossura, que equivale a uma simples divisão.

Nos edificios mais esmerados, os _seguintes_, isto é, os lados
triangulares comprehendidos entre os extradoz das archivoltas e de duas
_arcaduras_, proximas uma da outra, estão geralmente ornatados com
esculpturas, pinturas ou rendilhados, mostrando a fórma trilobada ou
quadrilobada, e com vidros pintados, emquanto as paredes que separam os
entre-columnios, apresentam pinturas decorativas.

As esculpturas e as pinturas com as quaes se decoravam os _seguintes_
das arcaduras, durante o periodo ogival, são ora legendarios ou
satyricos, ora tirados do reino vegetal. Nos monumentos inglezes do XIII
seculo, os _seguintes_ estão muitas vezes com ornatos similhantes a
estofo cheio de relevo.

Dentro das grandes egrejas do XV seculo existem como decoração as
arcaduras e outras figuras por cima e por baixo do _triforium_, sobre o
dorso das grandes arcadas e ao correr das janellas mais superiores; ás
vezes mesmo sobre o liso das paredes e em outras partes do edificio.


*Triforium*


Os _triforiums_ comprehendem toda a largura das naves lateraes, não se
vêem senão por acaso nos edificios do periodo ogival. Desde o final do
XII seculo, lhes substituiram, nas egrejas da Europa occidental,
galerias estreitas, abertas na grossura da parede, por baixo dos
peitorís das janellas superiores da nave principal. Estas galerias
estreitas offereciam commodidade: em primeiro logar facilitavam a
circulação dentro da egreja quasi á altura das janellas superiores, e
davam logar a collocarem-se as armações e outros adornos com que havia o
costume de decorar as egrejas nos dias de festa; e em segundo logar,
diminuindo a grossura das paredes superiores, alliviavam a pressão
exercida sobre os pilares principaes dos edificios; finalmente,
offereciam uma das mais importantes disposições para a decoração da nave
principal.

O triforium communica com o interior da egreja por series de arcaduras
abertas, tendo o mesmo feitio que as arcaduras que havia sobre o liso
das paredes, debaixo dos peitorís das janellas inferiores. Muitas vezes,
principalmente no XV seculo, tapava-se a parte inferior da arcadura com
um parapeito formando ornato de feitio de trêvo ou de quatro folhas.

Nota-se que nos triforiums, assim como nas arcaduras com ornato, as
archivoltas ficam assentes sobre columnatas com capitel pertencente ao
estylo do XIII seculo, e sobre _nervuras das hombreiras_ dos seculos
seguintes. A disposição das arcaduras do triforium apresenta ainda uma
outra analogia muito parecida com as arcaduras de ornato, formando
regularmente, desde o final do XIII seculo, a continuação das janellas
das naves lateraes. Depois d'esta época tambem as arcaduras do triforium
se assemelham ás janellas superiores da nave principal.

No termo do periodo ogival, supprimem-se muitas vezes as arcaduras, não
conservando mais do que um simples guarda-peito; o ornamento denominado
_chama_ apparece regularmente nos desenhos que formam as hombreiras
d'esses guarda-peitos. As janellas superiores ficam, n'este caso,
collocadas a prumo sobre a parede exterior do triforium.

Na Belgica, o triforium é geralmente tapado do lado exterior da nave por
uma parede; é, por excepção, que esta parede tem abertura, e a um ou
dois metros por cima do pavimento da galeria, pequenas aberturas
circulares, _trilobadas_ ou _quadrilobadas_, cobertas de grisalhas ou
com ornatos elevados. Nos edificios francezes do XIII e XIV seculos,
pelo contrario, a galeria do triforium não fica, as mais das vezes,
separada do exterior senão por uma simples lumieira, apresentando bellos
vidros pintados, semelhantes aos que decoram as janellas.


*Cornijas*


As cornijas do estylo ogival têem geralmente pouca importancia. Nos
edificios que pertencem ao periodo de transição, e mesmo, na Belgica, em
algumas que são dos primeiros annos do periodo ogival, o _larmier_
superior da cornija assenta ainda muitas vezes, de distancia em
distancia, do mesmo modo que na época _roman_, sobre cachorros servindo
de modilhões, com muita sacada, mas de grande simplicidade.

Em França, as cornijas dos monumentos mais principaes compõem-se, quasi
sempre, de duas fiadas de cantaria. A fiada inferior está ornada de
crochetes vegetaes no XIII seculo, de folhagens ondeadas no XIV, e de
folhas de repôlho encrespadas no XV. Algumas vezes vê-se tambem, entre
estas esculpturas, modilhões formados por cabeças humanas ou por
carrancas.

As cornijas dos grandes edificios belgas apresentam as mesmas fórmas
geraes que as cornijas francezas, porém não têem esculpturas, sendo
substituidas por arcaduras simples, ogivaes, ou triboladas. Estas
arcaduras apparecem principalmente nos paizes onde, durante o periodo
Roman, as arcaduras serviam de decoração, imitando-se o estylo Lombardo,
e foram usadas para ornar certas partes dos edificios.

Desde o começo da ultima metade do XIII seculo até o final do XIV, os
edificios de segunda ordem, e mesmo os de primeira ordem na Belgica,
têem as cornijas compostas de simples perfis, formados por um pequeno
numero de molduras pouco importantes.


*Platibandas*


As _platibandas_ que corôam as cornijas no exterior dos edificios
principiaram nos primeiros annos do XIII seculo. Antes, a agua da chuva
caía dos telhados directamente sobre o solo; até o meiado do XIII seculo
sómente os edificios mais importantes tiveram canos de chumbo para dar
vasão á agua da chuva e se assentaram platibandas sobre a beira do
telhado. Estas platibandas encanavam a agua por gargúlas, que a lançavam
para longe da face das paredes, e impediam por esta maneira que as aguas
da chuva podessem prejudicar a base da construcção, introduzindo-se-lhe
a humidade. As platibandas, cujo destino principal era evitar o perigo
que apresentava passar sobre as gargúlas, facilitam além d'isso os
concertos do telhado, e resguardam das telhas da beira quando cáem;
permittindo aos architectos darem melhores decorações ao exterior dos
monumentos.

As mais antigas platibandas têem a fórma de arcaduras rendilhadas,
compostas de columnatas, sobre as quaes vem assentar um remate vasado,
na sua parte inferior, em arco ogival, _trilobado_. No final do XIII
seculo substituiram-se as arcaduras pelas folhas de trêvo e de quatro
folhas vasadas.

A altura e o feitio das platibandas variam conforme os materiaes
empregados. No XIV seculo as platibandas, as mais das vezes, tinham
folhas de trêvo e de quatro folhas, vasadas e divididas de distancia em
distancia, na prumada dos contra-fortes, por pinaculos. No XV seculo, as
prumadas são compostas, umas vezes pela reunião de rhombos, de
triangulos equilateraes curvilineos, ou por figuras geometricas
angulares; outras vezes por desenhos flammejantes, parecidos com os que
caracterisam os tympanos das janellas d'esta época. No final do XIV
seculo apparecem, principalmente nos edificios civis, as platibandas com
ameias, nas quaes se vêem os mesmos feitios que nas platibandas
vulgares. O seu uso persistiu até ao final do periodo ogival.

As platibandas com arcaduras verticaes apparecem ainda aqui ou acolá nos
edificios do XIV, XV e mesmo do XVI seculo.

_Abobadas_. As abobadas ogivaes distinguem-se ao mesmo tempo pela sua
elegancia e leveza. Isto foi resultado da pouca grossura dos triangulos
do enchimento que vedava a parte composta de arcos-duplos e de nervuras.
Comtudo a leveza não excluia a solidez; pelo contrario, as abobadas
ogivaes são mais solidas e mais resistentes que as dos periodos
anteriores, posto que sejam muito menos massiças.

_Estabilidade e plano das abobadas_. Já explicámos que a estabilidade
das abobadas não depende do mesmo principio dos edificios antigos e do
periodo ogival; e fizemos notar, em poucas palavras, os progressos tão
importantes realisados pelos architectos do XII e XIII seculos nas
construcções das abobadas.

Fizemos tambem conhecer que as abobadas com o feitio das nervuras, como
são construidas as abobadas ogivaes, causam um esforço lateral que tende
a desviar para fóra dos seus pontos de apoio as columnas, contra-fortes
ou paredes. Os constructores do periodo ogival evitavam esse esforço
lateral, oppondo-lhe quer um esforço em sentido inverso, quer um
obstaculo rigido que, impedindo de operar, resolveu-o empregando cargas
verticaes. É caso particularmente para notar, porque constitue
egualmente uma differença essencial do systema de construcção dos
antigos, esses obstaculos apresentam as dimensões unicamente necessarias
para preencher o fim ao qual são destinados.

Esta neutralisação dos esforços lateraes não se obtem da mesma maneira
nos edificios religiosos, cuja nave principal é notavelmente mais alta
do que as naves lateraes, e n'aquelles em que todas as naves teem egual
altura.

_Egrejas que teem a sua nave central muito mais elevada do que as outras
lateraes_. Foi o systema adoptado, desde o final do XII seculo, pelos
constructores da Europa occidental, afim de conservar o equilibrio das
differentes partes de que se compunham os seus monumentos; porque o
arco-duplo da abobada principal á parede mestra, o arco butante, o
contraforte e a columna que separavam a nave principal da nave lateral
do seu arco-duplo, formavam um triplo esforço motivado pelo arco-duplo
da abobada principal e os seus dois arcos ogivaes, que faziam pender
para fóra a parede mestra do edificio. A este esforço, o constructor da
edade média oppunha o arco butante, que vinha apoiar-se sobre a parede
mestra, ficando collocado ao mesmo nivel. Por esta maneira o esforço
triplo causado n'esse ponto era transferido sobre o contraforte, onde se
quebrantava por causa da sua rigidez; e devido a essa rigidez, o seu
peso juntando-se ao da parede mestra do edificio, que comprime sobre a
columna que sepára as duas naves; por ambas as forças reunidas,
tornava-se esta bastante fixa para aguentar e neutralisar o triplo
esforço exercido pelo arco-duplo da nave lateral e pelas nervuras
proximas da mesma nave. O esforço do arco-duplo d'esta nave e das duas
nervuras ficam supprimidas pelo encontro do contraforte.

_Egrejas em que as naves ficam na mesma altura_. N'estas egrejas os
esforços lateraes que a abobada da nave principal opéra sobre os seus
pontos de apoio ficam diminuidos pela pressão das abobadas exteriores
d'estas mesmas naves lateraes, ficando supprimidos pelos contrafortes,
geralmente bastante salientes, os quaes lhes oppõem um obstaculo rigido,
que produz o equilibrio das abobadas.

_Abobadas de feitio de tecido_. As abobadas sobre plano _quadrado
longo_, formadas por arcos ogivaes que se entroncam uma só vez, foram
geralmente abandonadas proximo do meiado do XV seculo. Apparecem então
as abobadas em _tecido_, designadas tambem pelos archeologos, abobadas
_com divisões prismaticas_. N'estas abobadas as nervuras bifurcam-se,
ramificam-se e encruzam-se em todos os sentidos, de maneira a figurar um
verdadeiro tecido, como está representado na surprehendente abobada do
cruzeiro da egreja monumental dos Jeronymos em Belem. Todos os pontos de
intersecção das nervuras estão regularmente ornados de esculpturas.

_Perfis das nervuras nas abobadas ogivaes_. As nervuras ou arcos ogivaes
das abobadas construidas no final do periodo Roman consistem muitas
vezes em um grosso tóro, algumas vezes tendo dois ou quatro tóros de
menos vulto. Os arcos-duplos da mesma época, muito mais massiços que as
nervuras, apresentam secções quadradas ou rectangulares, e teem os
angulos das partes concavas da abobada talhadas em tóro. Desde o
principio do XIII seculo, os arcos-duplos tiveram, com raras excepções,
os mesmos perfis que os arcos ogivaes.

Durante os primeiros annos do periodo ogival, vê-se ainda arcos-duplos e
arcos ogivaes muito grossos, semelhantes aos dos edificios romans.
Todavia não tardou a adelgaçarem, a diminuirem de grossura. Pouco
depois, a parte redonda do tóro principal apresenta uma aresta viva.
Esta fórma teve logar em França desde o final do XII seculo, e na
Belgica sómente no meiado do seculo seguinte. Mais tarde, em França ao
principio, e na Belgica proximo do meiado do XIII seculo, a aresta viva
é substituida por um filete, que ficou adoptado até ao final do periodo
ogival. Nos edificios francezes apparece tambem o filete sobre os tóros
secundarios desde o meiado do XIV seculo. No final do XV e no começo do
XVI seculo, as nervuras apresentam muitas vezes o perfil composto de
molduras concavas e redondas.

Comparando-se os perfis mais antigos com os mais recentes, nota-se que
os primeiros apresentam uma superficie mais larga e menos alta que as
dos ultimos. Esta mudança na fórma dos perfis não se fez sem motivo: os
constructores tinham aprendido por experiencia que a resistencia de um
arco ou de uma nervura está em razão directa da altura da peça de voltas
e não em razão da sua largura.

_Fecho da abobada_. No XII seculo, tinham principiado a ornar com
esculpturas os fechos da abobada. Estes primeiros fechos esculpidos
representavam Jesus Christo deitando a benção, o Cordeiro Divino, Nossa
Senhora, os anjos, os animaes symbolicos dos evangelistas, santos, e
muitas vezes tambem carrancas ou animaes phantasticos. Nas abobadas dos
edificios de segunda ordem contentavam-se algumas vezes de indicar um
simples florão ou entrelaços.

No XIII seculo o emprego dos fechos de abobadas com esculpturas veiu a
ser geral, sendo representado nas abobadas do côro, Jesus Christo, o
Cordeiro Divino, os symbolos dos evangelistas e outros objectos
religiosos. Na nave principal e nas lateraes a ornamentação distingue-se
por ser vegetal. Os fechos de abobada no XIV seculo, e tambem na
primeira metade do XV seculo, apresentam bastantes vezes a mesma
decoração que a do XIII seculo; todavia na sua esculptura vegetal ha os
caracteres proprios da ornamentação de cada um d'estes seculos. No XV
seculo, os brazões dos bemfeitores da egreja são esculpidos
frequentemente sobre os fechos da abobada.

No final do XV seculo, apparecem os fechos da abobada ornados de um
appendice que recebeu o nome de _pendente_, que ficou em uso durante uma
parte do XVI seculo, imitando stalactites que estão suspensas ás
superficies superiores das grutas. Algumas vezes tem o feitio de um
florão ou um ornamento extravagante; outras representa uma estatua
pegada á abobada.

Muitas vezes os fechos da abobada são furados por um buraco circular,
para se poder içar os sinos e outros objectos acima das abobadas: como
havia dois oculos na abobada da egreja de Belem, indicando não sómente
essa applicação, mas que o edificio _deveria ter duas torres_: todavia,
construiram modernamente um torreão colossal, que esmaga aquelle
monumento, e não respeitaram o que fôra projectado na sua primitiva
edificação!

_Arcos butantes_. Chama-se _arcos butantes_ aos arcos destinados a
transportar até aos contrafortes exteriores o esforço lateral das
abobadas mais elevadas de um edificio. Nascem dos contrafortes e
apoiam-se sobre as paredes da nave principal nos differentes pontos onde
vão confinar os resultantes dos _encostes_ dos arcos ogivaes e dos
arcos-duplos.

Já explicámos os dois systemas empregados durante o periodo roman para
contramurar o esforço lateral produzido pelas abobadas superiores sobre
as paredes altas das egrejas em que a abobada principal é muito mais
alta que as outras das naves inferiores, e notámos os inconvenientes que
resultavam de uma e de outra applicação. Estes dois systemas foram em
pouco tempo abandonados, primeiramente porque a nave principal ficava
sem claridade, sobretudo nos edificios de maior largura, e em segundo
logar porque, n'um como no outro systema, as abobadas das naves lateraes
precisavam de ser muito altas para attingir o ponto onde se effectuava o
encontro combinado das nervuras das abobadas altas. Raciocinadores
dispostos a sujeitar tudo aos principios dos architectos do XII seculo e
do XIII seculo, conheceram que os semicirculos das abobadas em berço
contiguo, do qual alguns dos seus antecessores se tinham servido com o
fim de neutralisar o esforço lateral das abobadas altas, não era
necessario na sua fórma completa, e que se obtinha o mesmo resultado
applicando sobre a parede exterior do edificio no ponto onde viesse dar
a resultante dos encostes, um arco partindo de um contraforte exterior:
foi esta combinação que deu origem aos arcos-butantes.

Para que satisfaça á sua applicação deve o arco-butante: 1.^o, ter as
juntas das peças de sua construcção _normaes_ ou perpendiculares á curva
por elle descripta; 2.^o, ficar o seu vertice sobre a parede exterior no
ponto onde passe a resultante do esforço da abobada. Esse ponto acha-se
entre o nascimento das nervuras ou arcos ogivaes e perto da metade da
altura da abobada. Em theoria esse ponto é um ponto geometrico; todavia
na prática é preciso que a summidade ou cabeça do arco-butante seja
larga; primeiro porque é impossivel, na execução, determinar de uma
maneira exacta a direcção da resultante dos differentes esforços das
abobadas; depois porque a direcção d'esta linha póde facilmente
desviar-se em resultado de ter dado de si nos pontos de apoio verticaes,
effeito que acontece frequentemente nas grandes construcções medievaes
cujos pontos de apoio são delgados e supportam uma pesada carga.

Os arcos-butantes são geralmente reforçados, no seu _extradoz_, por um
encosto em linha recta, construido em cantaria. O espigão d'este encosto
é muitas vezes ornatado de _crochets_.

Desde o final do XII seculo e no principio do XIII seculo, os
arcos-butantes vieram a ser de uso geral em todos os grandes monumentos
religiosos, cuja nave principal era mais alta que as naves lateraes. Os
mais antigos são geralmente formados por um quarto de circulo. Depois a
curvatura veiu a ser menos curva, approximando-se da linha recta.

Empregaram tambem desde os primeiros annos do XIII seculo,
arcos-butantes _duplos_, isto é, dois arcos-butantes collocados um por
cima do outro.

Os arcos-butantes foram empregados durante todo periodo ogival; todavia
eram menos usados durante a ultima metade do XV seculo. Em muitos
monumentos d'esta época, mesmo os mais principaes, julgavam-se
sufficientes os contrafortes muito massiços e salientes para diminuir o
esforço das abobadas.

Quando no principio do XIII seculo collocaram por baixo do madeiramento
um canal para receber as aguas da chuva, dirigiam as aguas do telhado
principal para os contrafortes exteriores por um canal de cantaria posto
sobre o capello do arco-butante. As aguas passavam atravez no cimo dos
contrafortes, e eram depois lançadas fóra por gargulas, caindo afastadas
da base do monumento. As infiltrações causadas pela passagem das aguas
sobre o capello dos arcos-butantes, e atravez dos contrafortes,
produziram damnos tão consideraveis nas construcções que ficou em pouco
tempo abandonado este systema de dar escoante ás aguas da chuva.

_Contrafortes_. Durante os primeiros annos do periodo ogival, os
contrafortes dos edificios de abobadas foram demasiadamente engrossados
e tiveram bases bastante salientes; á proporção que se elevavam assim,
iam diminuindo consideravelmente por grandes resaltos successivos sobre
cada uma das faces.

No meiado do XIII seculo, os contrafortes ficam mais regulares,
erguem-se quasi verticalmente da base á extremidade superior, e não
apresentam já por cima do envasamento um ou dois resaltos bastante
pequenos e sómente sobre a face principal.

Estes contrafortes terminavam por uma face chanfrada que ia ter até á
cornija, e muitas vezes era de fórma abahulada, quando ficavam isolados
ou excediam a base do madeiramento. Nos monumentos principaes
limitavam-se algumas vezes a pôr pinaculos, e ornavam as suas faces
lisas de arcaduras e estatuas postas sobre misula, tendo docel.

No XIV seculo a fórma dos contrafortes ficou quasi a mesma que durante a
ultima metade do seculo precedente. Tinham a sua extremidade, como
d'antes, quer em pinaculos e fórma abahulada, quer ficando os pinaculos
assentes sobre base quadrada ou octogona, terminando por agulhas
pyramidaes, cujas arestas estão ornadas de cróchets.

Os contrafortes do XV seculo semelham-se ainda muitas vezes aos dos dois
seculos precedentes. Como estes, apresentam, de distancia em distancia,
diminuição de grossura pouco apparente sobre a sua face anterior, e são
ornados de arcaduras, nichos e doceis, ornamentação no gosto da época.
Todavia, desde o fim do XIV seculo, principiaram a modificar algumas
vezes a sua disposição; regularmente deixaram subsistir a base quadrada
ou rectangular, tendo a face anterior parallela e as duas faces lateraes
perpendiculares com o liso da parede; porém, a certa distancia acima do
solo (ao primeiro ou segundo resalto), a face anterior, parallela á
parede, passa a ser angular; mesmo ás vezes se vêem contrafortes cuja
face anterior fica angular á parede desde a base do edificio. Estes
contrafortes, com lados chanfrados, acabam como todos os outros, por um
plano inclinado, platafórma ou espigão de feitio abahulado, ou por um
pinaculo bastante ornado.

No XIII e no XIV seculo, os contrafortes collocados no ponto de
intersecção de paredes que se encontram em angulo recto, são sempre em
numero de dois. No XV seculo, julgavam ás vezes ser sufficiente um unico
contraforte collocado de maneira a fazer face ao angulo; sendo estes
contrafortes angulares muito communs nos edificios d'esta época.

Por causa do excessivo esforço lateral que produzem sobre os seus pontos
de apoio, as abobadas ogivaes necessitavam o emprego de contrafortes com
base de bastante largura. Nos monumentos dos primeiros annos do periodo
ogival, esses contrafortes, que teem tres de suas faces inteiramente
livres, apresentam saliencias grandes sobre as paredes exteriores dos
edificios. Estas sacadas desagradaram em pouco tempo aos constructores,
que cogitaram em as diminuir ou fazel-as desapparecer inteiramente
disfarçando os contrafortes. Para esse fim recuáram até á parede mestra
a divisoria que havia antes na nave lateral, aproveitando na parte
interna do monumento o espaço de um rectangulo que communicava com a
extremidade da nave lateral e servia ás vezes de capella.

Nos edificios do periodo ogival, cobertos por simples fôrro do tecto, de
madeira, os contrafortes tinham pequena sacada sobre o liso das paredes.

_Gargulas_. Dá-se o nome de _gargulas_ aos canaes salientes pelos quaes
as aguas da chuva sáem dos telhados e são lançadas longe da base das
paredes dos edificios. Teem quasi sempre a configuração de animaes
monstruosos e phantasticos, e raramente a figura humana. Admira-se,
n'estas esculpturas, uma variedade prodigiosa, e seria difficil de achar
duas do mesmo feitio, todavia a maior parte dos edificios ogivaes
apresentam um grande numero. N'este genero ha duas no nosso paiz
bastante exquisitas, uma no angulo da cimalha da egreja de Caminha, na
capella mór, voltada para o norte da fronteira do paiz, estando a figura
humana revirada, isto é, em posição dobrada, com a cabeça para o lado do
telhado e a parte trazeira do corpo para fóra do edificio, e é pelo anus
que sáem as aguas da chuva: no castello de Pombal ha outra com a figura
de mulher na mesma attitude, saindo a agua da chuva pelo que distingue o
seu sexo. Eram de proporções curtas e solidas no principio da sua
applicação; vieram a ser mais compridas e com melhores fórmas desde o
final do XIII seculo.

_Nichos e doceis_. Dá-se o nome de _nicho_ a qualquer espaço aberto,
mais ou menos profundo, feito na grossura de uma parede, pilar ou
contraforte, para n'elle se collocar uma estatua, um grupo, um vaso, ou
qualquer objecto de decoração. Os nichos apparecem poucas vezes nos
monumentos do XIII e XIV seculos; n'essa época as estatuas, com as quaes
ornavam ás vezes certas partes dos monumentos, eram postas sobre misulas
salientes, tendo doceis egualmente salientes sobre a face das paredes.

No XV seculo, o uso dos nichos vem a ser mais geral; vêem-se bastantes
vezes no exterior dos monumentos, sobre as fachadas, nos contrafortes e
nos tympanos dos portaes.

Os doceis, isto é, os remates salientes, mais ou menos ornamentados de
esculpturas, ficando collocados por cima da cabeça das estatuas, são
muito geraes desde o final do periodo roman. No XII e no XIII seculos,
esses doceis primitivos representam quasi sempre edificios, fortalezas,
e mesmo algumas vezes cidades inteiras cercadas de muralhas. Não havia
ainda n'esta época, por cima, pinaculos ou pyramides delgadas, posto que
em certas partes do centro da França, as tiveram desde o meiado do XIII
seculo, sendo terminadas por _clochetons_. As fórmas architectonicas dos
edificios representadas pelos doceis são muitas vezes anteriores á época
em que foram esculpidos; é por isso que no XIII seculo apparecem n'elles
zimborios, arcos de volta inteira, etc., que todavia não se vêem já nos
monumentos contemporaneos.

No XIV seculo, os doceis mudam totalmente de aspecto, cobrem-se de
arcaduras com ornamentação e com outros detalhes imitados da
architectura; teem geralmente por cima vistosos pinaculos, muitas vezes
vasados.

No XV seculo, apresentam quasi as mesmas fórmas que no seculo
precedente, porém exaggeradas; sendo os doceis contornados
demasiadamente, e a sua ornamentação feita com muita delicadeza.

_Madeiramentos_. Distinguem-se, nos edificios do periodo ogival, duas
especies principaes de madeiramentos: os que não ficavam apparentes,
porque não revestiam as construcções abobadadas, e os apparentes que se
empregavam nos edificios que não tivessem abobadas, sendo estes que
interessam sobretudo os archeologos.

Quando os madeiramentos ficam apparentes, isto é, visiveis no interior
do edificio, apresentam sempre o aspecto de uma abobada de fórma de
berço. Este berço é algumas vezes semi-cylindrico, semelhante aos que se
encontram em algumas egrejas romans; as mais das vezes, todavia, são
traçados por tres centros. _Ripas_ de carvalho, ou de qualquer outra
especie de madeira, tendo as juntas sobrepostas, são pregadas sobre as
_cambotas_, circulares ou ogivaes, formadas pelas asnas e _varedo_.
Tendo pinturas por decoração, e algumas vezes as extremidades das peças
de madeira ficam visiveis, tendo esculpturas, que representam anjos com
escudos ou phylacterias, cabeças de gente, figuras de cocoras com
carranca, ou animaes phantasticos. Muitas vezes as nervuras ou as
_franquias_ ficam parallelas ás nervuras das _asnas_, porém sendo mais
estreitas, estão pregadas sobre o varedo e sustentam no seu logar as
ripas. Estas nervuras são cobertas com vivas côres ou com elegantes
entrelaçados.

Algumas vezes tambem são assentes sobre as ripas, as nervuras que se
encruzam do mesmo modo que os arcos diagonaes ou as ogivas das abobadas
de cantaria.

As abobadas cobertas de gesso, taes como as constroem os architectos
modernos na maior parte das novas egrejas ruraes, eram inteiramente
desconhecidas durante o periodo ogival. Quando a verba de que dispunham
não lhes permittia o estabelecer abobada de alvenaria, serviam-se do
madeiramento apparente, que se ornava tão artisticamente quanto fosse
possivel. Nunca se empregavam pueris dissimulações, fingimentos
architecturaes, onde as _ripas_ appareciam a imitar a cantaria com a
capa desprezivel de gesso ou de argamassa! Não se esquecia n'esta época,
que a verdade é a condição essencial da existencia da arte; esta deve
engrandecer o espirito, encantar a vista, e não enganal-a.

_Telhados_. No meiado do XII seculo, os telhados teem grandes
inclinações nos edificios da Europa Central e Septentrional; emquanto
nos paizes meridionaes conservam pequena correnteza, como se praticava
nos telhados da antiguidade e no periodo roman.

Cobriam-se os madeiramentos com chumbo, cobre, ardozia e telhas. Ás
grandes cathedraes e aos edificios mais importantes punham chapas de
chumbo ou de cobre, por tal maneira, que podiam, sem alterar a sua
superficie, dilatar-se ou encolher-se, conforme fosse a temperatura.

_Cumieira e cimeira_. Dá-se o nome de _cumieira_ ao remate do espigão de
um edificio. Durante o periodo ogival este remate era de metal (quasi
sempre de chumbo), de barro cozido ou de cantaria. As _cimeiras_ são
telhas que formam uma cumieira; eram de barro de cozedura.

O maior numero dos grandes monumentos da edade média tinham d'antes por
remate cumieiras nos madeiramentos, egualmente recortadas, imitando
quasi sempre folhagens. Infelizmente são poucos os edificios do XIII e
XIV seculos que conservam esse ornato primitivo. De todas as cumieiras
de chumbo anteriores ao XV seculo (e eram as mais em uso n'essa época)
não ha já vestigios: a oxydação do metal e muitas outras causas de
destruição as teem feito desapparecer.

Nos paizes onde a telha foi empregada para cobrir os edificios, como,
por exemplo, na Borgonha, as cumieiras dos madeiramentos compunham-se de
uma continuação de cimeiras de barro de cozedura, mais ou menos ornado.
Uma capa esmaltada e envernizada ao fogo tinham sempre estas cumieiras
para se tornarem menos permeaveis á humidade.

Desde o XI seculo, o emprego das cumieiras de pedra veiu a ser geral no
meio dia de França. Encontra-se ainda hoje n'este paiz um grande numero
de cumieiras dos periodos roman e ogival, as quaes escaparam á sua
destruição. As mais antigas apresentam enlaçamentos e figuras
geometricas; as que pertencem ao XIV e XV seculos são compostas de
ornamentação com remate de folhagens, como ha na egreja de Belem.

_Torres e campanarios_. Do mesmo modo que no periodo roman os
campanarios da época ogival são compostos de dois ou mais andares
sobrepostos. A separação dos differentes andares é indicada, no
exterior, quer por um resalto saliente, quer por uma pequena diminuição
de grossura do andar superior sobre o inferior. Estes andares não teem
já, como precedentemente, a mesma altura: são baixos ou altos, conforme
as disposições internas dos campanarios. O rez-do-chão das torres é
geralmente construido sobre plano quadrado; mas no primeiro ou no
segundo andar, e as mais das vezes sómente no principio da flecha o
plano vem a ser octogono. Os espaços triangulares, que ficam livres nos
angulos do quadrado, pela passagem da fórma de quadrado para octogono,
apresentam quasi sempre quatro pinaculos ou clochetões.

As frentes das torres teem aberturas nos differentes andares, janellas
estreitas ogivaes, muitas vezes geminadas, sendo raro estarem separadas
ou reunidas em tres vãos.

Desde o principio do periodo ogival, os campanarios acabavam por flechas
construidas de madeira ou de cantaria, com muita elevação, tendo a fórma
de uma pyramide com oito lados eguaes. Já no XIII seculo, as arestas das
flechas de pedra e os pinaculos collocados na base do octogono estão por
vezes ornados, de distancia em distancia, por crochets vegetaes; no XIV
seculo, principia-se a vasar os lados das flechas fazendo-se pequenas
aberturas do feitio de flor de trevo, ou quatro folhas e com florão. No
XV seculo, essas ornamentações são substituidas por feitios de chammas e
por outras figuras geometricas vasadas. No final do XV seculo e no
principio do seculo seguinte, construiram-se, em muita parte, os
campanarios com flechas rendilhadas.

Muitos campanarios mais importantes, de grandes proporções, ficaram por
concluir desde a base da flecha projectada, e ás vezes ainda mais
abaixo. Algumas vezes tambem, as flechas da primitiva construcção,
depois de terem sido destruidas por uma tempestade ou incendio causado
pelo raio, foram substituidas por corpos simples ou remates hybridos,
que não teem nada de commum com as lindas pyramides da época ogival.

No XIV e no XV seculos, muitos campanarios teem na base da flecha uma
platibanda vasada, composta de arcaduras ou com feitios chammejantes.

A maior parte das egrejas ogivaes de segunda e terceira ordem tinham
campanarios de uma extraordinaria simplicidade, cujo effeito é agradavel
e mesmo admiravel, se reflectirmos na pouca resistencia dos meios
empregados para a execução. Estes campanarios, sem nenhum ornato,
compunham-se de dois andares quadrados, dos quaes o superior só tinha as
quatro frentes com janellas geminadas ou com tres aberturas, servindo
para sair o som do sino. Uma flecha octogona limita a sua extremidade.

Os constructores da edade média comprehendiam que, sobretudo nos
edificios de menor importancia, as combinações geraes mais simples eram
as unicas mais acertadas para produzirem um aspecto monumental.

Em Flandres maritima tem-se conservado até ao presente um grande numero
de campanarios ogivaes de segunda e terceira ordem, dignos de chamar a
attenção dos archeologos e dos architectos; encontram-se alguns muito
bellos até nas modestas freguezias do campo. Estes campanarios,
construidos com tijolos, como todas as outras partes dos edificios
d'este paiz, são geralmente terminados por uma flecha octogona tambem de
tijolos, muitas vezes tendo quatro pinaculos nos angulos da sua base; as
arestas da flecha e dos pinaculos são quasi sempre decoradas de crochets
egualmente com tijolos. As platibandas que ligam entre si os pinaculos
são cheias, pouco altas e ornadas com arcaduras fingidas. Uma outra
particularidade que apresentam alguns campanarios de Flandres maritima,
é inclinarem-se um pouco para o lado oeste, que se suppõe ser um facto
intencional do architecto para fazer resistir melhor contra os ventos
d'este quadrante que sopram com extrema violencia á beira mar.

Muitas egrejas monasticas, e algumas vezes tambem as parochiaes, teem um
campanario collocado quer na extremidade da capella mór, quer em um dos
dois angulos formados pela intersecção da capella mór e o cruzeiro. Esta
disposição é bastante geral nas egrejas ruraes na Baviera e na Austria.
As abbadias preferiam esta collocação afim de que os frades incumbidos
de darem signal pelos sinos para as ceremonias religiosas não fossem
obrigados a afastar-se da egreja.

Os constructores romans construíam muitas vezes um campanario no logar
da intersecção da nave e do cruzeiro. Na Inglaterra e na Normandia,
estes campanarios centraes conservam-se durante o periodo ogival; por
toda parte, fóra d'isso, são raros desde o XIII seculo, e muitas vezes
foram substituidos por simples campanariosinhos de madeira. Na Belgica,
encontram-se por vezes campanarios centraes de cantaria, porém de
resumida dimensão, nos edificios do periodo de transição.

As _escadas dos campanarios_ e tambem as que servem em outras partes dos
monumentos para subirem aos madeiramentos, são geralmente de caracol com
centro cylindrico ou octogono. Estas caixas das escadas, collocadas no
exterior do edificio nos angulos formados pela saliencia dos
contrafortes, nunca são dissimuladas, mas visiveis, facilitando as
seteiras que estão abertas darem luz á escada.

Durante o periodo ogival, collocavam quasi sempre _cruzes de ferro
batido_ no cimo das flechas dos campanarios, na extremidade do espigão
do côro por cima da abside, e algumas vezes tambem sobre os espigões do
cruzeiro. Estas cruzes distinguem-se geralmente por uma composição de
bastante trabalho. As cruzes dos campanarios são quasi sempre encimadas
por um gallo servindo de catavento. Primitivamente este adorno
encontrava-se sobre as torres das egrejas parochiaes ou dos capitulos
apenas. O gallo collocado no cimo da egreja symbolisa a imagem dos
prégadores; pois o gallo vela durante a noite escura e assignala as
horas pelo seu canto, faz despertar aquelles que dormem, e annuncia a
aurora que se approxima; mas antes d'isso, elle se excita a si mesmo a
cantar, dando ás azas.

_Pavimentos_. Os pavimentos romans eram compostos com mosaicos. Nos
paizes meridionaes esses mosaicos foram formados de marmores
differentes. Tanto em França como na Belgica, Allemanha, Inglaterra e
Portugal, eram compostos de ladrilhos esmaltados ou de lagedo gravado e
com embutido egualmente de côres diversas. Os ladrilhos e os lagedos
gravados continuaram a ser empregados nos pavimentos dos edificios
ogivaes na Europa Occidental e Septentrional.

Esses pavimentos eram ora de uma grande simplicidade, ora esplendidos.
Poucas vezes o chão todo das egrejas estava coberto por bellos mosaicos;
em geral, não se adoptou este genero de decoração senão para a capella
mór e para as capellas do corpo da egreja, porque nas naves, onde todas
as pessoas são admittidas indistinctamente, o roçar do calçado em pouco
tempo teria destruido o verniz do ladrilho ou o lagedo com gravuras.

Como já explicámos, o amarello e o verde-escuro são as côres preferidas
no final do periodo roman, nos pavimentos de ladrilho do Norte e Oeste
da Europa. No XIII seculo, substituiu-se muitas vezes a côr
verde-escura, o encarnado e o avermelhado escuro, empregando-se o
amarello para os embutidos. As côres carregadas e escuras deixaram de
ser usadas nos pavimentos.

Os ladrilhos esmaltados são geralmente de pequenas dimensões, como havia
no cruzeiro da egreja monumental do convento de Alcobaça, cujos
ladrilhos estão agora _escondidos por baixo de simples lagedo_, na
profundidade de _0^{m},34 centimetros_!

Quando os desenhos dos ladrilhos ficam completos sobre um só ladrilho,
ou se completam em quatro e mesmo em maior numero de ladrilhos reunidos,
formam regularmente figuras geometricas, brazões, florões, animaes
existentes ou phantasticos. Circulos, flores de liz, veados, aguias com
duas cabeças, é o que mais frequentemente se vê.

No XIII e no XIV seculos, figuras de homens em pé foram algumas vezes
representadas pela reunião de um certo numero de ladrilhos pintados.
Estas effigies de personagens eram muitas vezes acompanhadas de
letreiros, empregados nas campas de cantaria.

Durante o XIV e o XV seculos, os desenhos dos ladrilhos conservam quasi
o mesmo caracter precedente, mas são menos vistosos e não teem o vigor
das côres e o desenvolvimento que apresentavam os do XIII seculo. No XIV
seculo, as ornamentações são muitas vezes substituidas por firmas,
letras, inscripções, escudos, e mesmo pequenas vistas. Pelo mesmo tempo
apparecem os tons verdes e azues-claros.

Nos edificios de segunda e terceira ordem, e tambem em algumas egrejas
abbaciaes, principalmente da Ordem de Cister, fazia-se uso, durante o
periodo ogival, de pavimentos compostos de ladrilhos de differentes
côres, sem nenhum ornato.

Em alguns sitios fabricavam-se tambem ladrilhos sem ser esmaltados,
apresentando figuras em relevo. Estes ladrilhos são muito raros, porque
não se podiam fazer senão com barro muito rijo, para que os relevos não
ficassem em pouco tempo gastos.

_Lages gravadas e com embutidos_. Desde o XII seculo, empregaram-se
algumas vezes, para cobrir o chão das egrejas, lages de pedra e de
marmore gravadas e com embutidos. Os desenhos dos ornatos eram indicados
em parte pelos espaços conservados da propria lage, ou por um betume
colorido que enchia as cavidades deixadas pela gravura. As lages d'este
genero não foram muito communs, e um limitado numero escapou da sua
destruição! Um dos mais bellos e mais completos é o que ornava a capella
mór da cathedral de _Saint-Omer_ (França), e do qual bastantes
fragmentos se têem conservado até ao presente. Os fundos dos arabescos
são de côr castanho-escuro, assim como a inscripção; os traços do
contorno das personagens e do cavallo são a encarnado, assim como está
representado em gravura o nobre cavalheiro, no meio d'essa composição,
que é do meiado do XIII seculo.

_Labyrinthos_. Na antiguidade pagã designavam-se com o nome de
_labyrinthos_, as galerias subterraneas ou os edificios construidos em
cima do solo, com ramificações em grande numero e complicadas. Todos
sabem da existencia do labyrintho de Creta, onde, conforme a mythologia,
o Minotauro foi morto por Theseo. Durante a edade média o nome de
labyrintho foi dado a uma disposição particular que se vê no pavimento
de algumas egrejas dos periodos Latino, Roman e Ogival. A disposição,
divisão e côr das lages, formam, pelas suas combinações, linhas sinuosas
com bastantes voltas, todas para um ponto central. Os Romanos e os
Gregos representavam já, por vezes, labyrinthos nos pavimentos em
mosaico ou sobre as paredes de seus templos e de suas habitações. Os
labyrinthos que existem desde os primeiros seculos nas egrejas christãs,
por exemplo, na de S. João Vidal de Ravana (Italia), que é do VI seculo,
acharam, sem nenhuma duvida, a sua origem nos labyrinthos dos edificios
pagãos. A presença da figura de Theseo combatendo o Minotauro, que se vê
no centro dos labyrinthos de alguns monumentos christãos, como em Pavia
e em Luca, dão uma prova evidente d'esta affirmação. Os christãos
introduzindo os labyrinthos nas egrejas, deram-lhes uma significação
symbolica. Seria comtudo difficil, por não dizer impossivel, determinar
de uma maneira irrefutavel o symbolismo dos labyrinthos nas antigas
egrejas christãs.

Na edade média, parece ter-se reputado os labyrinthos como emblema da
viagem á terra Santa, ou, segundo outras opiniões, o transito doloroso
de Jesus Christo desde a casa de Pilatos até ao Calvario. Indulgencias
eram concedidas ás pessoas que os percorressem de joelhos, recitando as
orações prescriptas. Os labyrinthos n'esta epoca eram tambem designados
com o nome de _dedalo_, _meandro_, _caminhos de Jerusalem_.

A fórma dos labyrinthos não é sempre a mesma, O de _Chartres_ é
circular; o de _Saint-Quentin_, octogono; taes eram tambem os de
_Arrhas_, _Amiens_ e _Reims_. Na egreja de _Saint-Bertin_ em
_Saint-Omer_, tinha a fórma quadrada. Muitas vezes havia, ao centro e
aos angulos do labyrintho, pedras com inscripção lembrando algum facto
relativo á construcção do edificio. Em _Amiens_, por exemplo, a pedra
central representava os architectos da egreja e o bispo _Évrard_, seu
fundador, com os nomes dos personagens e a época da construcção,
gravados sobre laminas de cobre embebidas na parede.

_Pinturas das paredes_. Já descrevemos os caracteres da pintura mural na
época roman. Esses caracteres e o systema do colorido modificam-se de
uma maneira evidente seguindo o desenvolvimento da architectura ogival.

Se o leitor tiver presente na memoria o que fizemos notar a respeito do
estylo ogival, da sua decoração esculpida e do seu systema de
construcção, comprehenderá facilmente que uma modificação notavel
motivou tambem o colorido da decoração. Com effeito, nas construcções
ogivaes os membros das paredes desapparecem, por assim dizer, e cedem o
espaço para aberturas de janellas; os membros da architectura
multiplicam-se e apresentam-se com grande evidencia; a vista examina sem
custo a sua fórma e os seus fins, desde a base da columna até ao fecho
da abobada que reune as nervuras da abobada. Além d'isso, as superficies
das paredes, que não foi possivel supprimir, ficavam com esses espaços
divididos. Como acontece nas paredes divisorias sobre os peitorís das
janellas inferiores, as paredes são todas cheias de series de arcaduras
estreitas, muitas vezes cheias parcialmente de esculpturas. Finalmente a
multiplicidade dos detalhes e a vista de ornamentações esculpidas,
diminuindo a escala dos elementos embellezadores para augmentar o espaço
de união, modificaram a seu modo as condições da pintura, dando-lhe
caracteres novos.

O augmento extraordinario dos vãos das janellas e o aspecto grandioso
que lhes deram nos edificios motivou que nas vidraças pintadas eram
quasi todas as preoccupações do constructor do periodo ogival. Era ali,
em certo modo, que devia apparecer o effeito da decoração. Os progressos
da arte da pintura sobre o vidro corresponderam então ás exigencias que
esta arte tinha a satisfazer, e a palheta abundante, vigorosa e variada
do pintor vidraceiro impôz á coloração adoptada pelo pintor ornatista
uma harmonia e combinações novas. Por outras palavras, a pintura
historica e legendaria, não tendo mais do que um espaço limitado e
parcimonioso medido sobre a superficie das paredes foi servir-se das
vidraças para os seus trabalhos, e por este motivo as figuras mostram,
onde apparecem, ainda umas proporções acanhadissimas. A intensidade da
coloração das vidraças pede, pela logica dos preceitos da harmonia,
maior energia na pintura ornamental das paredes. Todavia, não foi essa a
unica consequencia do emprego das vidraças excessivamente coloridas: a
luz não entrando já no interior da massa vitrea a qual atravessava como
peneirada atravez d'um tecido multicolor, dava á pintura mural um
aspecto differente d'aquelle que teria a luz natural do dia; havia pois
a attender simultaneamente ao reflexo das côres translucidas com as da
pintura mural que se devia harmonisar com a luz colorida e sombria que
as vidraças pintadas projectam sobre as paredes e partes architecturaes.
D'aqui veiu o emprego, principalmente no XIII seculo, de côres vivas sem
ficarem separadas: encarnado, purpura, verde, azul carregado, realçado,
ás vezes, por tons claros e ouro com bastante profusão quando os meios o
permittiam. D'aqui ainda uma outra grande divisão dos elementos
decorativos e desenho dos detalhes.

Não é pois para estranhar que as _pinturas historicas e legendarias_
tivessem tido muita voga durante o periodo roman, vindo a ser bastante
raras nos edificios do estylo ogival. As arcaduras decorativas debaixo
dos peitorís das janellas inferiores, são muitas vezes as unicas
superficies convenientes para terem pinturas com assumptos, e mesmo esse
espaço é muito limitado e regularmente dividido em pequenos
compartimentos por columnadas ou nervuras, sobre as quaes assentam as
archivoltas das arcaduras. As pinturas das arcaduras decorativas
representam muitas vezes personagens isolados.

A influencia das tradições byzantinas sobre a arte occidental é
manifesta durante todo o tempo do periodo roman. Todavia, se desde o XII
seculo se observa no _desenho_ uma tendencia a abandonar os typos
byzantinos, não foi senão nos seculos seguintes que o caracter das
pinturas mudou completamente no Occidente. Nas figuras das pinturas
muraes, como nas outras que ornam as miniaturas dos manuscriptos, se
observa uma transformação cada vez mais visivel no que respeita ao
estylo do desenho. Este se desprende insensivelmente das formas
tradicionaes afim de adquirir maior liberdade. As attitudes veem a ser
mais variadas, o gesto mais natural, o caracter das cabeças mais
individual, a expressão dos rostos mais viva ou mais serena conforme as
situações. Uma tendencia ao naturalismo principia a apparecer desde o
começo do XIII seculo, e torna-se mais notavel nos seculos seguintes.

Na _colorisação_ succederam, tanto como no desenho, transformações
successivas durante o periodo ogival. Nas pinturas muraes do periodo
roman, os tons claros são frequentes, e seu aspecto é geralmente suave.

No XIII seculo, a colorisação teve, na _pintura decorativa_, as mesmas
transformações que na pintura historica e legendaria. Nos edificios
romans, em que as janellas eram relativamente pequenas e envidraçadas as
mais das vezes com vidros brancos ou muito claros, a luz diffusa e pouco
dilatada dos fundos podia-se usar para a pintura decorativa, de tons
brilhantes e brandos ao mesmo tempo; porém, quando, no XIII seculo, os
vãos das janellas se alargaram e tiveram vidraças extremamente
coloridas, esses tons suaves ficaram inteiramente sumidos pela
intensidade da colorisação das novas vidraças. O azul e o encarnado,
entrando com maior emprego na composição das vidraças pintadas, davam um
aspecto turvo aos tons claros e terreos ás pinturas: os verdes, por
exemplo, ficavam pardos e baços; os brancos, e em geral todos os tons
claros, ficavam estriados. Com os vidros coloridos, foi preciso
necessariamente mudar a gamma de colorisação das pinturas muraes,
fazendo uso de tons brilhantes e fortes. Além d'isso, os tons, para
terem toda a sua apparencia, devem ser acompanhados e contornados com
traços pretos. É assim que se veem n'esta epocha as nervuras, os fechos
das abobadas, e muitas vezes mesmo os tympanos das abobadas pintados com
vivas côres. O uso de destacar o vertice das nervuras das abobadas
servindo-se de côres vivas e com desenho chaveiroado continuou durante
todo o tempo do periodo ogival.

No XIV seculo e durante a primeira metade do XV seculo, as pinturas de
decoração por baixo dos peitorís das janellas inferiores, muitas vezes
representavam pannos de armações. No XV seculo, viam-se bastantes vezes
sobre as paredes das capellas dedicadas a um santo, os attributos
caracteristicos d'esse santo, dispostos symetricamente sobre um fundo
colorido. Descobriram-se, ha pouco tempo, pinturas d'este genero n'uma
egreja de Bruxellas.

Motivos de economia e, nas egrejas dos monges de Cister, prescripções da
regra monastica fizeram que por vezes tambem se empregasse um modo de
pintura de decoração muito simples, consistindo na imitação das pedras
de construcção: traçavam-se sobre fundo mais ou menos claro traços de
côres differentes, pardos, encarnados ou amarellos, sobrepostos,
representando as juntas dos apparelhos, e algumas vezes com
ornamentação.

Da mesma maneira que a pintura historica e legendaria, a pintura de
decoração da idade media não se servia da perspectiva; nem conservava
nos monumentos as paredes lisas e opacas, não procurando affastal-as,
por assim dizer, do espectador pela illusão da perspectiva linear e
aerea. São principalmente as pinturas representando as formas
architectonicas, por exemplo as arcaduras e columnas, que mostram não
ter o artista nenhuma intenção de disfarçar a ornamentação em relevo; o
que elle pretende é sómente um effeito de decoração, não pensa por
nenhum modo em produzir exactamente as dimensões relativas, o modelo,
apparencia real com relevos, molduras, columnas, capiteis; contenta-se
de apresentar essas formas para servirem a dar mais attractivo aos
monumentos.

Muito poucos monumentos do periodo ogival têem conservado as suas
pinturas bastante completas para se poder formar uma idéa cabal do
systema empregado e do resultado obtido. A mais notavel de todas pela
esplendida decoração, e além d'isso pela sua restauração tão habil
quanto perfeita, é a da Capella Santa de Paris.

A estatuaria e a esculptura ornamental seguem o systema geral da
decoração pictorica; tanto assim, que muitas estatuas e baixos relevos
têem conservado até ao presente bastantes vestigios de dourados e
polychromia, concorrendo para se harmonisarem com as vidraças pintadas e
as pinturas a fresco das paredes.

A decadencia da pintura monumental, decoração historica e legendaria,
data da ultima metade do XV seculo; vindo a ser completa desde o
principio do seculo seguinte. As pinturas das abobadas das egrejas não
vão além do XVI seculo.

_Cruz de consagração_. O Pontifical romano prescreve que, para a
dedicação de uma egreja, doze cruzes serão pintadas ou esculpidas sobre
as columnas ou paredes internas do edificio. Estas cruzes, que o Prelado
consagrante unge com os Santos oleos, devem ficar apparentes. Desde o
periodo roman, estabeleceu-se o uso de ornar essas cruzes, que
geralmente eram pintadas. As cruzes de consagração datam do periodo
roman e vieram a ser bastante raras; conservam-se muito singulares no
oratorio carlovingiano de Nimégue. Encontraram-se em grande numero da
epocha ogival debaixo de grossas _camadas de cal_ na parte interna das
egrejas antigas, que ficaram escondidas na occasião do renascimento.
Todas são executadas com grande esmero e esplendidamente coloridas.

Acontece ás vezes que as doze cruzes de consagração do XIII e XIV
seculos são sustentadas pelas figuras dos Apostolos pintados ou em
esculptura.


*Altares, tabernaculos, piscinas, cadeiras do côro, bancos para os
celebrantes, tribunas e separações da capella-mór*


_Altares_. Como já explicámos, o altar verdadeiramente designado é uma
mesa de pedra sobre a qual o padre diz a missa. Sem esta mesa o altar
não existe; ella e só ella, forma, todo o altar. Esta mesa é de pedra,
porque o altar é a imagem e o symbolo de Jesus Christo em pessoa.
Portanto, durante os oito primeiros seculos da nossa era, a egreja quiz,
pela veneração por este famoso symbolismo, que o altar ficasse
inteiramente independente; prohibiu severamente que n'elle se pozesse o
mais simples objecto, salvo o livro dos Evangelhos, a custodia
eucharistica com as divinas hostias. No correr do IX, o Papa Leão IV
permittiu que se collocassem reliquarios contendo reliquias de santos.
Quando o altar é formado de um corpo macisso cubico, o que tinha logar
muitas vezes durante o periodo Latino e Roman, os seus lados eram
cobertos com laminas de ouro, prata e de cobre dourado e esmaltado, ou
ornados de esculpturas e de pinturas, ou ainda revestidos de estofos
preciosos.

Algumas vezes, principalmente nas grandes egrejas, o altar estava
collocado debaixo de um baldaquino sustentado por quatro columnas, entre
as quaes se suspendia, sobre varões, pannos cortinas, que se corriam
durante certas partes da missa afim de occultar os sacerdotes da vista
dos fieis. No final do XI seculo, introduziu-se tambem o uso dos
_retabulos_.

Devemos notar, que todos estes accessorios eram ideiados e dispostos de
maneira a não obstar por nenhum modo ao symbolismo sublime do altar.

Explicaremos successivamente, o _altar_ com _a sua verdadeira fórma_, os
_frontaes_ dos altares, _baldaquino_, os _cortinados_ e os _retabulos_
do periodo ogival.

_O altar assim designado_. Como os do periodo roman, os altares da epoca
ogival compunham-se as mais das vezes de um simples macisso de
alvenaria, apresentando regularmente uma especie de ornamentação pintada
ou esculpida. Estes macissos estavam rodeados de tapeçarias cujas côres
mudavam nos diversos dias de festa. Algumas vezes, porém poucas, se
decoravam os lados nús d'estes altares com arcaduras fingidas, cujos
arcos assentavam sobre columnasinhas ou pilares embebidos na parede; as
arcaduras tinham pinturas historiadas e decorativas, ou estatuas e
baixos relevos.

Nos altares cheios ou macissos, decorados de arcaduras, estas eram
formadas no XIII e no XIV seculos por ogivas equilateraes ou arcos
traçados por tres centros; no XV seculo por ogivas inflexas ou postas a
pár, e no XVI por arcos abatidos ou de volta inteira.

Na idade media os altares eram sempre de pedra, nunca de madeira.
Consagravam-se ao mesmo tempo que a egreja ou a capella: não havia então
as _pedras aras_, bentas, que se podiam assentar depois na meza de um
altar sem estar benzido, e como presentemente se usa muitas vezes.

O altar mór das egrejas cathedraes, conservou durante quasi todo o
periodo ogival, uma fórma simples e positivamente symbolica. Em geral ou
era sem retabulo, ou ficava-lhe por cima um retabulo de pouca altura.
Tinha um crucifixo, o livro dos Evangelhos, dois castiçaes, e ás vezes
um tabernaculo para a conservação da Eucharistia. Outra maneira de
reservar o Santissimo Sacramento usada em certos paizes pelo menos desde
o XIII seculo, foi aquella cuja recordação se conservou n'um curioso
quadro do XIII seculo, representando o altar mór da antiga cathedral
d'Arras com todos os seus accessorios. Uma hastea quadrada, collocada
por detraz do altar, que se eleva em dois andares, a uma grande altura,
tem por remate um pinaculo sobre o qual ha um crucifixo. Em meia altura
da hastea ha um bello baculo ficando a sua voluta suspensa no meio de
uma corrente, e a custodia eucharistica é formada com o feitio de
torrinha.

Nas egrejas, cathedraes e abbadias, havia, como em muitas egrejas
romans, um altar para reliquias, ao fundo da capella mór, por detraz do
altar proximo do abside oriental da egreja.

Os grandes reliquarios costumavam a ficar expostos detraz do altar, de
modo a deixar passar as pessoas por baixo; ás vezes tinham um docel.

_Frontaes_. São cortinados de seda que cobrem tambem os lados verticaes
de um altar, e algumas vezes o retabulo; como se usa ainda hoje em
muitos paizes. Designam-se vulgarmente com o nome de _antependium_. Na
idade media quasi todos os altares tinham frontaes. Esses frontaes eram
cobertos com fazenda de custo; algumas vezes apresentavam laminas de
ouro, prata e cobre dourado e esmaltado, ou almofadas de madeira
cobertas de pinturas.

Os frontaes metallicos, assaz communs durante os periodos Latino e
Roman, vieram a ser mais raros a começar do final do XII seculo, e pouco
a pouco o seu uso foi completamente abandonado. Durante a epocha ogival,
os frontaes com estofo fôram, por assim dizer, os unicos empregados. A
sua côr condizia com as vestimentas lithurgicas e mudava, por
conseguinte, conforme os dias festivos. Havia de linho, seda e mesmo de
veludo; os mais sumptuosos eram todos bordados e ornados de pedras
preciosas. Representavam figuras de Santos e assumptos historicos e
legendarios.

_Baldaquino_. O uso do baldaquino cobrindo o altar em signal de
veneração, foi bastante geral até ao XII seculo; mas ficou quasi
abandonado na Belgica e França durante o periodo ogival; na Europa
Occidental e Septentrional não se serviram mais do baldaquino n'esta
epocha, como summidade dos reliquarios.

Na Italia, em Roma, n'este paiz onde o estylo ogival nunca teve
principio, vê-se ainda um grande numero de baldaquinos da epocha ogival.
Os mais notaveis são os de S. Paulo fóra dos muros, os de S. João, de
Santa Maria no Trastever, Santa Maria em Cosmedin e de Santa Cecilia.

Na França e na Belgica suppriam algumas vezes a falta do baldaquino,
suspendendo por cima do altar um docel esculpido ou forrado com estofo
de custo.

O baldaquino parece-nos apresentar a maneira mais adequada para inspirar
aos fieis o respeito e a veneração devida ao altar, symbolo do Salvador.
Muito melhor que todos os outros accessorios, sem exceptuar o retabulo,
preenchia este fim resguardando o altar, sem todavia se confundir com
elle, e conservando-lhe assim toda a sua significação symbolica. O
retabulo, pelo contrario, liga de certo modo o altar fazendo parte
d'elle, desvia a attenção das pessoas para o accessorio com grande perda
do objecto principal, que é o altar apropriadamente assim chamado.

_Cortinas_. Chamam-se cortinas a armação suspensa nos dois lados do
altar, e por detraz do retabulo quando fôr pouco alto. Essas cortinas,
da mesma maneira que os frontaes, eram geralmente muito simples; algumas
vezes, todavia, representavam figuras, quer no tecido, quer nos
bordados, ornamentação, figuras e objectos religiosos.

Ficavam estas cortinas prezas por varões apoiados muitas vezes em quatro
ou seis columnasinhas de cobre ou de madeira, encimadas de figuras de
anjos, tendo na mão luzes ou differentes instrumentos da paixão. A côr
das cortinas mudava conforme os dias de festa e as differentes occasiões
do anno lithurgico.

Além das cortinas do altar, serviam-se tambem, durante a idade media, de
duas outras especies de armação lithurgica. Eram: 1.^o a grande cortina
que se suspendia durante a quaresma na entrada da capella-mór ou do
presbyterio, e que se designava _o véo do templo_; 2.^o os véos que
serviam na mesma occasião nos crucifixos, retabulos e imagens, eram
designados pelo nome _véos de quaresma_.

_Retabulos_. Como já indicámos, o uso dos retabulos foi introduzido no
final do XI seculo. No começo collocavam-os sobre os altares das
reliquias e os altares de segunda classe; ficavam encostados á tribuna
ou postos no cruzeiro e nas capellas ornando a capella-mór. Nas egrejas
matrizes, collegiaes e monasticas de primeira ordem, o altar-mór ficava
quasi sempre sem ter retabulo, pelo menos durante todo o seculo XIII. Em
França, Belgica, Allemanha, Inglaterra e nos outros paizes
septentrionaes da Europa, adoptou-se no XIV seculo, depois que a cadeira
do bispo ou do abbade e as cadeiras do côro dos conegos ou dos frades,
que até então ficavam por detraz do altar-mór ao correr da parede do
hemicyclo obsial, foram mudados, para diante do sanctuario sobre os dois
lados do côro, isto é, para o logar onde se vê presentemente nas egrejas
do Norte.

Durante o periodo ogival serviram-se de diversa qualidade de materiaes
para os retabulos. O mais antigo era o metal; como n'aquelles do periodo
roman a cantaria (excepcionalmente a madeira), substituiu o metal. Desde
a ultima metade do XIII seculo, os retabulos de cantaria parece terem
sido preferidos. No meiado do seculo seguinte, os retabulos de madeira
com obra de talha foram mais adoptados, e no XV seculo, substituiram
quasi completamenle os retabulos de cantaria. Principiaram, todavia, já
n'essa epocha, a introduzir as almofadas pintadas, em fórma de
_trypticos_, que, no meiado do XVI seculo supplantaram, para assim
dizer, totalmente, os retabulos com obra de talha.

As portas que os retabulos haviam tido muitas vezes desde o XIV seculo,
tiveram no principio ornamentação de esculptura na face interior, e
pinturas na exterior. Porém o peso das portas com ornatos compostos de
estatuas ou baixo-relevos tornavam esse appendice muito difficil, e
mesmo por vezes como perigoso, quando era preciso abrir ou fechar o
retabulo; preferiram pois d'ali a pouco as pinturas para decoração
d'essas duas frentes das portas.

Os retabulos não apresentavam a mesma _fórma_ durante todo o periodo
ogival. Quasi sempre com pouca altura no começo, tendo tambem pouca
grossura. Os mais antigos eram muitas vezes rectangulares: algumas vezes
comtudo a sua parte central tinha mais altura. Esta ultima fórma,
principiaram-n'a a usar no meiado do XIII seculo; conservou-se em alguns
paizes, até o meiado do XV seculo.

O uso dos retabulos de madeira com obra de talha introduziu-se pouco a
pouco no XIV seculo, principalmente na Belgica. Desde o principio,
tiveram muitas vezes portas. Esta circumstancia lhe fez dar, como aos
retabulos pintados tendo portas, o nome de _tryptycos_ ou _polyptycos_,
conforme tinham tres ou maior numero d'esses appendices.

Na Belgica, França, Inglaterra no XV seculo, e na Europa central e
meridional já durante o seculo precedente, os retabulos perderam a bella
e elegante simplicidade que os distinguiam antes. Os seus contornos e
subdivisões se complicam cada vez mais, á proporção que se aproximam do
final do periodo ogival. Tinham por remate, no XIII seculo e no XIV
seculo, linhas horisontaes e sem nenhum adorno no cimo; os caixilhos dos
retabulos do XV seculo passam depois por transições com mistura de
linhas rectas e curvas para chegar por fim ás ogivas de requebro, arcos
unidos de volta abatida e volta de sarapanel com curvas de todo o genero
que ornavam muitas vezes no XVI seculo de crochetes e florões; chegando
mesmo a rematar o retabulo com torrinhas e pinaculos, estatuas e
enlaçamentos do feitio de firmas.

Devemos todavia notar que as formas dos moldurados do XIII e XIV seculo
se encontram ainda no XV e mesmo no XVI seculo, principalmente nos
triptycos pintados. Os moldurados d'este ultimo seculo apresentam sempre
maior simplicidade que os dos retabulos com obra de talha.

_Os assumptos representados sobre os retabulos_, eram tirados da
historia do antigo e novo testamento ou das lendas dos santos. No XII
seculo e no XIII, ornavam-se os retabulos quer de baixos relevos, quer
de estatuasinhas collocadas em arcaduras; um medalhão central de forma
quadrilobada ou de aureola se via as mais das vezes no centro do
retabulo, tendo a imagem de Jesus Christo na cruz ou assentado sobre o
arco-iris. No XV seculo, as arcaduras não apparecem senão poucas vezes;
quasi sempre, n'esta epoca, o retabulo esta dividido em muitas series
verticaes e horizontaes com as divisões cheias de baixos relevos
sobrepostos uns aos outros. A representação da cruxificação com a Virgem
Nossa Senhora e S. José, com os dois ladrões e grupos de personagens,
occupa bastantes vezes o compartimento central, commummente mais alto e
por vezes tambem mais largo que os compartimentos inferiores.

Os retabulos estavam cobertos, em certas occasiões, por frontaes
similhantes aos dos altares. Muitos _retabulos pintados_ do periodo
ogival se têem conservado até ao presente. Arrancados quasi todos ao
logar que occupavam primitivamente detraz dos altares, apparecem agora
como paineis nos museus de pinturas ou estão dependurados nas paredes
internas das egrejas.

As obras primas dos pintores do XIV, do XV e do principio do XVI seculo,
não são como os antigos retabulos em forma de triptyco.

_Os retabulos esculpidos_ foram usados simultaneamente com os retabulos
pintados. Os que se fizeram na Belgica durante o XV seculo e os
primeiros annos do XVI seculo compunham-se quasi sempre de um certo
numero de grupos com mais ou menos alto relevo, em caixilhos ou
collocados debaixo de docel delicadamente recortado; os dos outros
paizes, pelo contrario, e particularmente os da Europa Oriental,
compõem-se de estatuas perfiladas no compartimento central, e muitas
vezes tambem sobre as portas. Ainda que entre os retabulos belgas do
ultimo seculo do periodo ogival apparecem alguns de execução grosseira e
sem nenhum merito, quasi todos, todavia apresentam bastante apreço
artistico e testemunham o estado florescente da esculptura n'esse
periodo.

Os retabulos de madeira com talha eram muitas vezes dourados e pintados
de côres. Convém advertir que as letras que, n'esses retabulos, se veem
frequentemente sobre os bordados das vestimentas dos personagens, não
apresentam commummente nenhuma significação, tendo sido ahi collocadas
unicamente com o fim decorativo.

No final do periodo ogival, o retabulo firma-se quasi sempre sobre um
sóco de 20 a 30 centimetros de altura, e por este modo se liga ao altar.

Esta base se designa _predella_, nome que se dá egualmente aos
degrausinhos para os castiçaes do throno dos altares modernos. O lado
superior, que corresponde á base do retabulo, é muitas vezes mais
comprido que o lado interior; n'este caso a differença de tamanho é
disfarçada por um arco de circulo saliente.

A _predella_ (banqueta) é muitas vezes ornada do busto do Redemptor e
dos doze apostolos.

Das observações precedentes resulta que, não obstante as dimensões por
vezes exageradas, o retabulo parte inteiramente accessoria, conservou
até aos fins do periodo ogival, o seu caracter essencial. A maior parte
dos artistas modernos que se encarregam de compor os altares no estylo
ogival não se preoccupam de forma alguma com o primitivo destino do
retabulo, a que dão impropriamente o nome de altar. Desconhecendo a
verdadeira significação do retabulo, substituem-lhe tablados ridiculos,
muitas vezes de _madeira_, com côr de _pedra!!!_ compostos de socos,
arcaduras e pinaculos, onde os symbolos religiosos, as imagens, e os
baixos relevos são inteiramente supprimidos ou estão mesquinhamente
representados. Muitas vezes estes symbolos, estas imagens, e estes
assumptos são executados apesar das regras da iconographia christã,
regras das quaes os architectos, esculptores e pintores _não teem
geralmente o incommodo de adquirir as noções as mais elementares_! É
tambem para lastimar, que nas restaurações das antigas egrejas, não
encarreguem os retabulos _triptycos_ ao talento dos pintores que se
occupam de trabalhos religiosos.

_Sacrarios_. Durante quasi todo o periodo ogival não se reservava,
depois da celebração da missa, senão a quantidade de hostias consagradas
e necessarias para levar o viatico aos enfermos em perigo de vida, e
para expor o Santissimo Sacramento á veneração dos fieis.

Quando as pessoas que assistiam aos officios divinos queriam commungar,
approximavam-se da mesa da communhão durante a missa, e recebiam _uma
parte das sacramentaes_ que o padre acabava de consagrar. Não se deve,
pois, estranhar que os vasos sagrados destinados á veneração da Santa
Eucharistia e o logar onde os depositavam tivessem pequenas dimensões
durante o XIII e o XIV seculos.

Conservavam a Santa Eucharistia de muitas maneiras:

1.^o Nas egrejas dos paizes meridionaes, onde a pyxide se manteve em uso
durante o periodo ogival, continuaram a ficar suspensos, como se fazia
precedentemente, o calix e a pyxide com as hostias.

2.^o Em França e na Belgica e nos paizes septentrionaes da Europa
serviram-se muitas vezes durante o XIII e o XIV seculos, da maneira
indicada na pag. 272. As hostias encerradas em uma pyxide ou dentro de
uma pomba dourada e esmaltada, ficavam collocadas n'uma pequena torre ou
pequena tenda (_tabernaculum_) em estofos custozos, que se suspendiam,
por cima do altar, n'um baculo de bronze ou de prata.

3.^o Algumas vezes conservam-se as hostias em cofres de forma de arca,
relicario ou torre. Estes cofres eram transportados e depositados no
sacrario, ou sacristia, ora collocados de vez sobre o altar.

4.^o No maior numero de casos, principalmente nas egrejas de segunda e
terceira ordem, a Santa Eucharistia ficava em armarios construidos
detraz ou ao lado do altar. O uso de collocar as hostias nos
tabernaculos em forma de armario, parece ter sido muito geral na
Belgica, pelo menos depois do XIV seculo.

5.^o No XIV e XV seculos, construiram tambem, para a reserva
Eucharistica, tabernaculos de fórma de torre, inteiramente isolados e ao
lado do Evangelho. Os tabernaculos d'este genero vieram a ser communs na
Belgica e na Allemanha desde o XV seculo. Encontram-se muitos n'este
ultimo paiz que são do XIV seculo.

O maior numero dos tabernaculos com a fórma de torre são de pedra;
encontram-se não obstante, mas excepcionalmente, de madeira ou mesmo de
metal.

Do lado da Epistola, defronte do tabernaculo, se faz muitas vezes na
parede um armario imitando a fórma de tabernaculo, porém mais pequeno e
muito menos ornado.

Os armarios feitos na grossura da parede tinham a frente para o altar
sendo destinados a guardar as alfayas e vestuario dos ecclesiasticos que
deviam celebrar a missa; encontram-se algumas vezes, nas capellas que
guarnecem os lados da capella-mór ou da nave.

_Piscinas_. O uso das piscinas ou pias abertas na parede do lado da
Epistola, que havia durante o periodo roman, foi conservado tambem na
epocha ogival.

No XIII seculo, a maior parte das piscinas eram _geminadas_, isto é
compostas de duas pias ou orificios para passarem as aguas por uma bica,
quer por baixo do pavimento da egreja, quer por fóra do pavimento do
edificio. Uma d'essas pias era destinada a receber as aguas de uso, a
outra, as oblações das mãos do sacerdote e mesmo as do calix; porque,
ainda n'esta epocha, as oblações do calix eram lançadas nas piscinas, e
não bebidas pelo padre. Encontram-se todavia ainda agora piscinas
_simples_, isto é tendo um unico orificio para sahir a agua.

As piscinas gemeas fingem geralmente a fórma de um duplo nicho, separado
por uma columnasinha. Muitas vezes, nas egrejas ornadas de arcaduras
fingidas debaixo do peitoril das janellas, a piscina occupa duas
arcaduras proximas, e une-se a ellas; n'este caso, a columnasinha posta
entre as duas arcaduras forma a divisão dos dois nichos da piscina.

As piscinas do XIV seculo não differem muito das outras do seculo
precedente senão pelo genero da ornamentação architectonica e
esculptura, que harmonisa com o estylo da epocha. As mais das vezes são
gemeas, posto que o ecclesiastico beba, desde então, a agua de que se
serve para fazer a oblação do calix.

No XV, e mesmo já no final do XIV seculo, as piscinas tornaram-se raras
e acabaram proximo do fim do periodo ogival, para desapparecerem
completamente.

_Cadeiras de côro_. Estas cadeiras collocadas no côro das egrejas eram
destinadas ás dignidades ecclesiasticas assistentes aos officios
religiosos. Durante o periodo roman estas cadeiras eram geralmente de
pedra; porém desde o fim do XV seculo, sempre se fizeram de madeira.

As cadeiras de madeira compõem-se de differentes partes, tendo cada uma
um nome para a designar.

As separações de duas cadeiras são formadas por curvas elegantes com
ornamentação de obra de talha na sua parte superior, que lhes dão graça
e belleza. Os _arrimos_ são apoios horisontaes que limitam as cadeiras
na parte superior; geralmente esta parte tem bastante largura com fórma
inclinada, podendo as pessoas de pé encostarem-se facilmente.

Alguns auctores dão impropriamente o nome de encosto á _rampa curva_ da
divisão da cadeira, sobre o qual se apoia o cotovello, quando se está
sentado. A taboa movediça servindo de assento gira sobre gonzos ou
eixos, e póde-se abaixar e levantar como se quizer. Tem, por baixo uma
misula que se chama _misericordia_ ou _paciencia_, sobre a qual se póde
sentar, _fingindo estar a pessoa de pé_, quando a taboa que pertence ao
assento está levantada.

No côro das cathedraes, egrejas collegiaes e abbaciaes, estas cadeiras
ficam collocadas á direita ou esquerda do fundo do côro em duplo renque
e altura: cadeiras altas para os conegos e religiosos, cadeiras mais
baixas para os ecclesiasticos de cathegoria inferior ou de congregação.
O piso das cadeiras superiores fica alto com dois ou mais degraus acima
do chão; em quanto as cadeiras inferiores assentam sobre o solo ou sobre
um unico degrau. As pessoas sentadas em cima podem mais facilmente que
as debaixo vêr o altar. As costas das cadeiras do primeiro renque ficam
muito baixas e servem de genuflexorio aos conegos que estiverem nas
cadeiras superiores; as costas d'estas são muitas vezes inteiramente
semilhantes das cadeiras baixas, outras teem por cima obra de madeira
bastante alta e limitada por um remate em sacada com a fórma de um
docel. As pessoas que occupam as cadeiras baixas se ajoelham sobre o
chão com o rosto virado para as costas de suas cadeiras. De distancia em
distancia a fila das cadeiras baixas fica interrompida pela suppressão
de uma cadeira para dar passagem aos que vão assentar-se nas cadeiras
mais altas; estas aberturas chamam-se _entradas_. Encontram-se tambem
cadeiras com genuflexorios.

As cadeiras do côro do XIII seculo são notaveis tanto pela sua singeleza
como pela sua elegancia. Duas columnasinhas, uma na parte inferior e
outra na parte superior, ornam quasi sempre os lados de cada divisão
d'estas cadeiras. As mais sumptuosas têem além d'isso, esculpturas sobre
as _misericordias_ e nos remates, que no quarto de circulo. E reunem ás
columnasinhas servindo de apoio aos braços das cadeiras. Estas
ornamentações constam de folhagens, fructos e algumas vezes de figuras
de animaes reaes ou phantasticos.

As cadeiras do côro do XIV seculo apresentam o mesmo feitio que as do
XIII seculo; só com a differença de maior ostentação na obra de talha.

Muitas vezes no XIII seculo, e mesmo ainda no princípio do XIV seculo,
estas cadeiras não tinham costas. Quando as apresentavam eram com uma
almofada e arcaduras, tendo regularmente um tecto lavrado similhante a
um docel, um pouco saliente na face interna e com poucas esculpturas. No
XIV seculo, esse tecto lavrado apparece mais apparatoso; cada vez mais
saliente, descança sobre reprezas, acabando em forma de curvatura. Nos
dias de grandes festas, suspendiam-se em frente, no cimo do encosto,
sedas de côres, bordados e pannos de raz.

Na mesma epocha, os lados superiores das cadeiras do côro, mesmo quando
não tenham alto encosto, cobrem-se de diversas esculpturas,
representando estatuasinhas, animaes reaes ou phantasticos, e uma
decoração vegetal muito vistosa.

As cadeiras do côro do XV seculo distinguem-se geralmente das
precedentes por uma abundancia extraordinaria no ornato esculptural. São
cheias de bastante decoração e executadas com mais primor e delicadeza
que nos seculos XIII e XIV. Os seus altos encostos compõem-se quasi
sempre de baixo relevos dentro de arcaduras com redentes feitos
delicadamente, e cada cadeira tem um docel em que um pinaculo vasado
muito alto forma a extremidade. Os baixos relevos das costas representam
assumptos tirados da Biblia, da historia ecclesiastica ou da legenda;
successos da vida de Jesus Christo ou de Nossa Senhora são representados
quasi sempre. As esculpturas dos lados internos das cadeiras e das
misericordias apresentam muitas vezes figuras com carantonhas, animaes
reaes ou phantasticos, symbolisando os vicios. Poucas vezes as
esculpturas das cadeiras representam santos ou assumptos religiosos.

Na Belgica ha um limitado numero de cadeiras do côro do XV e XVI
seculos.

Em França, as mais notaveis são as da cathedral d'Amiens (XV seculo), e
d'Auch (principio do XVI seculo), e na Allemanha, as da cathedral d'Ulm,
com esculpturas de Jorge Syrlino de 1474 a 1476; em Portugal as da Sé
Velha de Coimbra.

_Bancos e docéis dos celebrantes_. O banco dos officiantes era destinado
para o celebrante, diacono e subdiacono se assentarem emquanto se canta
o _Gloria_, _Credo_, e _Dies irae_; servia ao mesmo fim as poltronas que
é costume collocar presentemente no côro proximo dos degraus do altar.
Estes bancos, que havia na idade media em todas as egrejas de primeira e
segunda ordem, estavam regularmente no _presbyterium_, do lado da
Epistola defronte do tabernaculo, e apresentavam uma certa analogia com
as cadeiras do côro. Conforme as prescripções lithurgicas, distinguia-se
por uma grande simplicidade; eram lisos e sem subdivisões. Algumas
vezes, todavia, se compunha de tres cadeiras mais ou menos similhantes
ás do côro. Este banco, liso ou subdividido, tinha muitas vezes um docel
cheio de esculpturas, formado por um nicho aberto na grossura da parede
do côro, quando este não tinha naves lateraes ou sustentado por columnas
e de paredes mestras quando o côro estava rodeado de naves lateraes.

_Jubes, Screens[4] e Cruzes triumphales_. Antigamente chamava-se _Jube_
á tribuna (em latim _doxale_) especie de barreira com tres e mais
arcadas esplendidamente ornadas que nas egrejas separava o côro das
naves; tinha por cima uma especie de galeria ou tribuna com
_guarda-peito_, havendo na extremidade uma ou duas escadas em espiral,
em cuja tribuna um abbade vinha lêr o Evangelho, depois de ter
pronunciado a formula: _Jube, Domine, benedicere_.

D'ahi vem o nome _Jube_.

As escadas ficavam algumas vezes escondidas detraz dos pilares dentro de
caixas rendilhadas com linda decoração.

Durante a primeira parte do periodo ogival, a arcada do meio estava
tapada por uma parede, as duas outras arcadas ficavam abertas, tendo
portas ou grades. Mais tarde mudou-se em alguns paizes esta disposição
primitiva; na Belgica, por exemplo, na França e em certas partes da
Allemanha, a arcada central só ficou aberta com uma grade de pau ou de
ferro servindo de porta; taparam com parede as duas outras lateraes
encostando-lhe altares.

Na primeira metade do XIII seculo, os _Jubes_ eram raros. Foi sómente no
final d'este seculo, e principalmente durante os seculos seguintes que
se fizeram geralmente nas cathedraes, collegiadas, e nas abbaciaes. No
XV e no XVI seculo tambem, os collocaram nas egrejas parochiaes, mais
importantes. Alguns se teem conservado na Belgica até ao presente: o
mais antigo é da era 1490.

O mais magestoso é o da cathedral de Milão.

Os _jubes_ teem sempre proxima a _cruz triumphal_. Esta cruz, de grande
dimensão, é geralmente de madeira e ornada de pinturas e dourados. Os
seus quatro ramos com florões teem muitas vezes quadrilobos, nos quaes
estavam do lado da nave os symbolos dos quatro evangelistas, e do lado
do côro, os quatro doutores da egreja latina; S. Gregorio, S. Ambrosio,
S. Agostinho e S. Jeronymo. Ao pé da cruz estão as imagens de Nossa
Senhora, e do apostolo S. João; a primeira á direita, e a segunda á
esquerda.

Antes da introducção dos _jubes_ a cruz triumphal estava igualmente
suspensa por tres correntes no meio do arco chamado _triumphal_, que
occupa a entrada da capella-mór.

Havia tambem antigamente nas egrejas do periodo Latino e Roman uma
_haste_ (Tress). Era costume collocar nas basilicas entre o côro e a
parte reservada para o publico uma viga atravez do côro, sobre o qual se
punham luzes e tambem suspendiam lampadas, e tambem durante a quaresma,
servia para pôr o véu chamado _velum templi_.

_Separações do côro_. A disposição dos antigos bancos da clerezia ao
comprimento da parede absidal do côro, ja descripto, não foi conservada
durante o periodo ogival, sendo em Italia e tambem em Portugal, onde
continua ainda, assim como em algumas egrejas da Allemanha,
principalmente nas cathedraes de Spire e de Mayence.

Desde o XI seculo, a maior parte das abbadias da _Europa central e
occidental_ tinham, como já referimos, transferido para o cruzeiro, os
bancos, alem das cadeiras dos ecclesiasticos, que occupavam antes a
capella da abside. Mais tarde tambem a mesma mudança se introduziu pouco
a pouco nas cathedraes e nas collegiadas d'essas mesmas regiões,
principalmente depois da reunião das naves lateraes e capellas absides á
roda da capella mór. Os bancos de pedra do periodo roman transformados
em cadeiras do côro ou cadeiras de madeira, foram collocados diante do
sanctuario, sobre o lado d'esta parte da egreja. O côro ficou separado
das naves lateraes pelas barreiras, as mais das vezes de cantaria,
bastante alta, vedado por detraz com as cadeiras do côro collocadas
entre as columnas da capella-mór. A roda do sanctuario propriamente
chamado, ás vezes, recortavam aberturas, de maneira que as pessoas que
estivessem nas naves lateraes podessem vêr o altar, e outras vezes
tambem substituiam as barreiras da porta circular da capella-mór por
tumulos ou mausoléos. Nas grandes cathedraes, numerosas esculpturas em
alto relevo ornavam as partes lizas das separações tanto no exterior
como no interior da capella-mór. Alguns monumentos, por exemplo as
cathedraes de Paris e de Amiens, teem conservado, por completo ou em
parte, as suas antigas separações da capella-mór.


*Pulpitos e confessionarios*


_Pulpitos_. Durante os primeiros seculos da era christã, as tribunas do
alto onde se fazia a leitura do Evangelho e da Epistola, serviam ao
mesmo tempo de pulpito.

Ao uso de prégar do alto da tribuna, veiu juntar-se o de um pulpito
saliente que se conservou na Europa central e occidental até ao final do
XV seculo. Por isso, os pulpitos anteriores ao meiado do XV seculo se
encontram mui raras vezes. Foi sómente no começo d'esta epocha que se
principiou a pôl-os isolados na nave principal das egrejas d'esta parte
da Europa.

Os mais antigos pulpitos são quasi todos de pedra; no XV e XVI seculos
fizeram-se egualmente de madeira.

O espaço dentro do pulpito, para o prégador, no periodo ogival é
geralmente hexagono e ornatado no cimo dos lados, ficando o sexto lado
reservado para a entrada n'elle; a decoração compõe-se de estatuas,
baixos relevos, e algumas vezes tambem, de simples desenhos geometricos
ou chammas. Vê-se com frequencia Jesus Christo e Nossa Senhora entre
quatro evangelistas ou os quatro doutores da egreja do Occidente, S.
Gregorio, Santo Ambrosio, Santo Agostinho e S. Jeronymo.

Ha em Portugal um pulpito de pedra de admiravel composição, que pertence
á egreja de Santa Cruz de Coimbra, de que tirámos o modelo e figurou na
exposição universal de Paris em 1867; depois o museu de Londres quiz
compral-o, ao que nos oppozemos.

O pulpito apoia-se por vezes sobre uma curva em sacada, sobre um macisso
de alvenaria ou sobre columnatas enfeixadas; as mais das vezes, todavia,
está assente sobre uma columnata ou sobre um pedunculo. Esta ultima
maneira foi mais commum no XV e no XVI seculo. Estes apoios eram ornados
com esculpturas, muitas vezes muito intrincadas conforme o uso adoptado
no final do periodo ogival. Na Allemanha haviam por vezes representado
as figuras de Adão, Eva ou Moysés em alto relevo nas frentes do pulpito.

O sobreceu dos pulpitos principiou a servir no final do periodo ogival,
e mesmo não era muito imitado n'essa epocha. Veiu a ser de uso geral no
fim do XVI seculo. Os sobreceus do XV seculo têem geralmente a forma
d'uma pyramide, d'um coruchéo ou d'um campanariosinho. Na Inglaterra
vêem-se sobreceus sómente com uma simples guarnição. Esta ultima forma
nos parece a melhor, pois não causa a desagradavel vista do remate de
tanto vulto, que parece abafar a voz. Ha poucos exemplares de pulpitos
do periodo ogival.

_Confessionarios_. Os confessionarios em que o confessor fica separado
do penitente por uma rotula, foram desconhecidos durante o periodo
ogival. N'essa epocha, o confessor collocava-se, para ouvir as
confissões, em uma poltrona ou nas cadeiras do côro, e o penitente
ajoelhava deante d'elle. A recordação d'esta maneira de se confessar foi
conservada nas miniaturas, paineis e gravuras do XV seculo.

Foi proximo do final do XVI seculo que os confessionarios com rotula
foram introduzidos na Belgica.


*Capellas funereas, tumulos, campas, lanternas dos defunctos e cruz de
cemiterio*


_Capellas funereas_. Estas capellas funereas eram construidas isoladas
nos cemiterios durante o periodo ogival. São raras em quasi todos os
paizes. Não ha nenhuma na Belgica nem em Inglaterra. Em França vêem-se
algumas nos cemiterios bretões, e existe uma muito notavel, do XV
seculo, em Avioth nas _Ardennes_ francezas. É na Austria que são mais
communs.

_Tumulos apparentes_. O uso de encerrar os cadaveres nos sarcophagos e
pôl-os sobre o solo ficou completamente abandonado no norte da Europa
desde o XIII seculo.

Na Inglaterra, Belgica, Allemanha, e nas provincias septentrionaes da
França, os tumulos apparentes do periodo ogival são cenotaphios,
consistindo em socos de cantaria com massiços de alvenaria postos sobre
uma sepultura subterranea, tendo a effigie do finado. Compõem-se
geralmente, como no XIII seculo, de um sóco ou macisso coberto de uma
grande lousa, sobre a qual está deitada a estatua do defuncto. Este
estendido sobre uma cama ricamente disposta, apresentando todas as
insignias de sua dígnidade: os bispos e os abbades trazendo mitra e
baculo; os reis e principes, a corôa e o sceptro; os cavalleiros, o seu
escudo e a sua armadura. Os pés dos bispos e dos ecclesiasticos, e em
certos paizes tambem dos seculares, apoiam-se contra um dragão ou um
monstro phantastico; os dos clericaes, principes e nobres, contra um
leão, symbolo de coragem, e mesmo, ás vezes, como para as damas tendo os
pés sobre um rafeiro, emblema da fidelidade conjugal. Pequenas figuras
de anjos agitam thuribulos, sustentando tochas ou almofadas em que
descança a cabeça do personagem. Depois do XIII seculo, os anjos com
thuribulos tornaram-se raros. Durante muito tempo, a effigie do finado
não apresenta nenhum dos caracteres da morte.

No XIII seculo e ainda no principio do XIV seculo, as estatuas deitadas
têem os olhos abertos e reproduzem os gestos e as attitudes dos
personagens vivos. Sómente depois do XIV seculo o defuncto principia a
ser representado morto ou adormecido, com os olhos fechados.

Muitas vezes, columnatas reunidas por arcaduras são dispostas em roda do
sóco, no qual estão assentes; algumas vezes, mas, raramente, as
arcaduras são vasadas, e a estatua _deitada_ do finado occupa o _logar_
do sóco supprimido.

Os cenotaphios do periodo ogival são geralmente de pedra, poucas vezes
de cobre ou de outro metal. Os tumulos de pedra têem quasi um metro de
altura, em quanto que os sepulchros de metal, que se conservam até ao
presente têem apenas 50 centimetros acima do solo; todavia o unico de
metal que possue a Sé de Braga tem maior altura.

Para evitar o estorvo nas egrejas, não se permittia, salvo raras vezes,
erguer-se um cenotaphio. Na capella-mór admittia-se o tumulo do fundador
ou de um bemfeitor distincto, collocando os dos outros personagens de
distincção nas capellas que cercam os lados do côro e da nave principal.
Estes monumentos apresentavam muitas vezes uma decoração de pinturas e
dourados. Alguns ficavam encostados á parede e dentro de um grande nicho
sob fórma de arcadura ogival; outros, e era o maior numero, ficavam
separados em todos os seus lados.

_As campas com gravuras a traço_ tornaram-se vulgares desde o XIV
seculo. Muitas têem sido conservadas até ao presente, não obstante o
grande numero de causas de destruição, ás quaes têem ficado expostas
desde seis seculos. A maior parte estão ornadas de imagens do finado,
debaixo de arcaduras trilobadas do feitio de docel, muito simples e
sustentado por columnatas. Quasi sempre vê-se uma mão deitando a benção,
symbolo de Deus, sahida do cimo da ogiva; e anjos agitando thuribulos
occupam os _seguintes_ da arcadura. Sobre as campas dos bispos, dos
abbades e dos padres, vê-se tambem, algumas vezes, aos dois lados do
personagem, clerigos, ou anjos de pequeno tamanho, segurando em velas
accesas.

Muito antes do XIII seculo, as campas têem, bastantes vezes ainda, como
durante o periodo roman, a forma de um trapezio, isto é, são mais
estreitas do lado dos pés. A inscripção que quasi sempre têem, forma
geralmente o contorno exterior da pedra, menos geral do que o
emmoldurado de ogiva; principia por uma cruz a inscripção e quasi no fim
do XIII seculo, ajuntam já por vezes, aos quatro angulos, os emblemas
dos evangelistas collocados nos quadrilobos.

As campas dos tumulos do XIII seculo que não têem um emblema, um symbolo
ou um escudo com armarias, são bastante raras na Belgica.

Sobre as campas do XIV seculo, a effigie do finado continua a ser
collocada debaixo de uma arcadura, poucas vezes trilobada, porém não
durante os primeiros annos. Sómente esta arcadura é muito mais carregada
de detalhes architectonicos do que precedentemente, taes como ridentes,
crochetes, florões, pinaculos e rosaes; além d'isso, as arcaduras
principiam a não ser sustentadas por columnatas com base e capitel, mas
sim por pés-direitos do feitio de contra-fortes ornados de pinaculos e
nichos, nos quaes se vêem pequenas figuras de homens.

Quando uma unica campa cobre uma sepultura dupla ou tripla, as arcaduras
estão reunidas no numero de duas ou tres, e contéem, cada uma, sua
effigie. O leão, o cão e os outros symbolos, que acompanham quasi sempre
as estatuas deitadas dos cenotaphos, se vêem tambem sobre as campas do
XIV seculo. Estas são geralmente de fórma rectangular, e não têem o
feitio de um trapezio. Os anjos incensadores e ceroferários não se vêem
excepcionalmente a começar do XVI seculo.

As arcaduras e o contorno com curvas em rampa que formam o remate
caracteristico dos moldurados do XIV e XV seculos, são regularmente
substituidos no XV seculo por docéis, representados em perspectiva e
muitas vezes compostos de ogivas inflexas com desenhos complicados; os
pinaculos, os nichos, as rosaceas flammejantes se multiplicam sobre todo
o moldurado; além d'isso, os arcos-butantes apparecem para ligar os
docéis aos contrafortes.

Será bom notar que os moldurados das campas do XIV e do XV seculos
apresentam a maior similhança com as decorações do mesmo genero que se
vêem nas vidraças pintadas contemporaneas.

Como no XIII seculo, a inscripção apparece no XIV e no XV seculos sobre
a borda da campa e está inscripta entre duas linhas parallelas. Nos
angulos formados pela intersecção d'essas quatro linhas se vêem
quadrilobos com os emblemas dos evangelistas, ou tambem algumas vezes,
desde o começo do meiado do XIV seculo, as armarias; acontece mesmo que
a inscripção está, além d'isso, interrompida pelo escudo da armaria
sobre os seus lados mais compridos.

Já explicámos que, quando são applicados para ornar os quatro angulos de
um quadrado ou de um rectangulo, os symbolos dos evangelistas põem-se,
pelo menos, até ao XIII seculo, da maneira seguinte: o homem alado no
angulo superior á _esquerda_ do espectador; a aguia á _direita_, o leão
no angulo inferior á _esquerda_ e o novilho á _direita_. No XIV seculo,
houve uma mudança; desde esta epocha, vê-se quasi geralmente a aguia no
_angulo superior esquerdo_, e o homem alado no _angulo superior
direito_. É ali tambem o logar que estes symbolos occupam sobre as
campas.

Os caracteres das campas que acabamos de indicar por cada seculo do
periodo ogival, não são de tal maneira proprios como os que são mais
proximos da epocha indicada. Pelo contrario, acontece muitas vezes,
principalmente na Belgica, que as campas do XV seculo apresentam ainda,
por assim dizer, os caracteres que não se está acostumado a encontrar
n'outra parte nas campas do seculo precedente. Não é raro tambem achar
campas do XIII, XIV e XV seculos, nas quaes o ornamento architectural
seja moderado de detalhes, ou inteiramente os supprimiram.

Em França quasi sempre e algumas vezes na Belgica, as carnes, em vez de
serem imitadas a traço, são represeutadas por embutidos de marmore ou de
metal.

_Tumulos chatos de cobre_. Durante o periodo ogival, introduziu-se o uso
do cobre ou de laminas de latão sobre as quaes as linhas do desenho são
feitas a traços gravados bastante fundos, estando cheios com uma
substancia rezinosa de côr preta e de tom mate. Essas largas linhas
pretas se destacam perfeitamente sobre a superficie brilhante do metal
brunido ou adamascado, até mesmo dourado, cujo reflexo luzidio é muitas
vezes realçado pela armaria colorida em esmalte da composição da campa,
a qual fica solidamente fixa na grossura do cobre. Devido a estas
qualidades, os tumulos lizos em cobre contribuiam admiravelmente, assim
como o pavimento e as vidraças pintadas, para a decoração das egrejas. É
na Inglaterra e Flandres que têem sido mais communs durante toda a idade
media.

Os tumulos chatos de cobre podem dividir-se em duas classes. A primeira,
de maior numero, comprehende as laminas de cantaria, quer de marmore ou
de gres, nas quaes a figura do finado fica recortada em _silhoeta_ na
lamina de metal, assim como differentes ornatos; as armarias, emblemas,
inscripções em feitio de fita, gravadas sobre tantas peças distinctas,
ficam embutidas e arrebitadas separadamente nos entalhes correspondentes
da pedra, designados _casements_ pelos auctores inglezes. A segunda
classe parece ter sido menos numerosa, porém contém especimens mais
bellos e preciosos. Acham-se comprehendidos n'ella os monumentos que
apparecem debaixo do aspecto de grandes placas de cobre, d'uma só peça,
mas que, na realidade, são muitas vezes compostas de muitas laminas
ajustadas, das quaes com grande habilidade ficam disfarçadas as juntas
na profundura dos traços. A figura do finado, geralmente de grandeza do
natural, representa-se de pé ou deitada.

Os tumulos de latão consistem em grandes laminas soltas, não destinadas
a ser embutidas nas laminas de pedra, e que formam por si um todo
completo; foram communs na Belgica durante todo o periodo ogival; o seu
uso continuou, em certos sitios, até o XVII seculo. Na Allemanha e
igualmente no Norte da França tiveram acceitação. Sobre as laminas, não
sómente a figura do finado, como tambem os accessorios symbolicos e de
decoração que lhe servem, foram executadas da mesma maneira que sobre as
pedras das campas gravadas. Todavia, a composição do assumpto é
regularmente mais superior, e a execução mais esmerada que das outras;
os mais insignificantes detalhes do vestuario, os docéis do remate, as
pequenas figuras dos anjos e dos santos que os ornam muitas vezes assim
como os pés-direitos, todas as partes, em uma palavra, são feitas com
fidelidade, com arte e com delicadeza. Além d'isso, o fundo sobre o qual
se destaca a effigie do finado, em logar de ser lizo e sem ornato, como
sobre as pedras das campas gravadas, é regularmente adamascado, isto é,
coberto de ornatos differentes imitando os desenhos que apresentam
certos estofos orientaes; esses desenhos assemelham-se aos que se vêem á
roda dos personagens nas vidraças pintadas do XIV seculo. São compostos
de folhas do trevo, de quatro folhas, folhagens, côres matizadas,
figuras de animaes, gritos de guerra, ou com divisas muitas vezes
repetidas. Parece mesmo por vezes no XV e no XVI seculo, que os detalhes
architectonicos desapparecem completamente para dar logar aos fundos
adamascados. Finalmente, uma particularidade que apresentam ainda as
laminas de cobre funereas do XV e do XVI seculo, vem a ser que as
_phylactéres_ se veem muito mais frequentemente que sobre as pedras das
campas. Chama-se _phylactéres_ a bandeirolas compridas e estreitas,
saindo da boca das personagens ou estão seguras nas suas mãos, e sobre
as quaes está inscripta uma oração, uma divisa ou uma sentença.

_Pequenos monumentos funereos do XV e do XVI seculo_. Além dos
cénotaphos, das campas e dos tumulos chatos de latão, erigiam-se tambem,
nos XV e XVI seculos, pequenos monumentos funereos de pedra ou latão,
encaixados na face da parede proxima do logar da sepultara. Estes
monumentos curiosos encontram-se, não só no interior das egrejas, mas
tambem nos claustros das cathedraes, collegiaes e mosteiros. Compõe-se
regularmente d'um epitaphio, por cima do qual se vê um assumpto
religioso, por exemplo, a SS. Trindade, a flagellação, a crucificação ou
qualquer scena da Paixão. Muitas vezes tambem se vê Nossa Senhora com o
Menino Jesus. O finado está regularmente representado ao lado da scena
principal, de joelhos em oração e por vezes acompanhado do santo da sua
devoção, o qual fica em pé por detraz d'elle e parece recommendal-o á
clemencia Divina; sobre a bandeirola saindo da boca na direcção da scena
principal, lêem-se frequentemente as palavras que é natural dirigir a
Deus ou aos santos, por exemplo: _Qui potes, oro, rei, Christe, mementa
mei_, e _O mater Dei, memento mei_.

A scena religiosa está esculpida em relevo ou gravada a traço. Quando
feita em alto relevo, vê-se quasi sempre em um nicho ogival, aberto na
grossura da parede, e o epitaphio inscripto na parte inferior do nicho,
sobre uma pequena chapa de latão, de marmore ou de pedra.

Nos baixos relevos e nas pedras gravadas a traço, o assumpto e o
epitaphio são geralmente collocados sobre uma unica pedra; ora n'uma,
ora n'outra occupa a maior parte. A scena é coberta por um docél
servindo de remate; algumas vezes, comtudo este docel não apparece.

Não obstante as mutilações lamentaveis que lhe causaram os iconoclastas,
estes monumentos merecem chamar a attenção, não sómente dos archeologos,
mas tambem dos artistas e sobretudo dos esculptores.

Serviram-se tambem de monumentos similhantes para perpetuar a fundação
praticada por generosos bemfeitores. Na parte superior d'uma pedra ou de
uma placa de latão, vê-se uma scena religiosa, diante da qual está de
joelhos o fundador muitas vezes acompanhado do santo da sua devoção. Uma
inscripção commemorativa da fundação substitue o epitaphio, o qual nos
monumentos funereos se vê por baixo da scena. Algumas vezes sómente
apparece uma simples inscripção gravada sobre uma pedra ou lamina de
cobre.

_Lanternas dos defunctos_. Dá-se o nome de _lanternas dos defunctos_ e
_pharol de cemiterio_, a columnas ou pyramides ôcas que se collocavam
n'outro tempo nos cemiterios. Este pequeno monumento tinha no cimo um
pavilhão vasado, no qual se suspendia de noite uma lampada accesa com o
fim de lembrar aos caminhantes que orassem pelos defunctos e para lhes
indicar a presença da casa de Deus.

_Cruz de cemiterio_. Erguiam tambem, nos cemiterios, grandes cruzes de
pedra durante o periodo Roman, ajuntavam-lhe, poucas vezes, a imagem de
Christo; porém do começo do XIII seculo, essa imagem vê-se quasi sempre
acompanhada de Nossa Senhora e do Menino Jesus, postos no revesso da
cruz, ou encostados á columna que serve para a sustentar. Outras vezes,
e isso é mais seguido, a cruz fica entre a imagem de Nossa Senhora sem o
Menino e a de S. João. As hastes que forma a columna ou o pilar sobre os
quaes está assente a cruz, são geralmente postas sobre um sóco mais ou
menos alto, tendo na sua base um pequeno altar.

As cruzes de pedra que se erigiam muitas vezes, na idade media, nas
encruzilhadas das vias e no meio das praças publicas, apresentavam as
mesmas fórmas que as cruzes de cemiterios; sómente não tinham altar na
base do seu sustentaculo. Em Lisboa havia um excellente especimen no
cruzeiro de Arroyos, estando presentemente guardadas as esculpturas na
egreja d'esse bairro.

As cruzes de cemiterio e dos cruzeiros não eram todas de cantaria;
havia-as tambem de bronze, de ferro e madeira. Inutil é declarar que as
cruzes de madeira ficaram destruidas já ha muito tempo. As de bronze
têem desapparecido egualmente, para fundirem o metal! Mas ha ainda, em
alguns paizes, as que foram feitas com ferro forjado.

As cruzes de cemiterio continuaram a estar em uso durante a epocha do
renascimento, e estão quasi sempre acompanhadas das imagens de Nossa
Senhora e S. João, e algumas vezes d'uma pintura representando o
purgatorio. Quando o cemiterio fica adjacente á egreja, a cruz
colloca-se sobre um alpendre junto do coro, na parte interna. As cruzes
triumphaes, que se viam durante o periodo ogival por cima do Jubé foram
aproveitadas, em muitos logares, para servirem de cruzes de cemiterios.


*Pias baptismaes*


A pia de baptismo no periodo ogival é geralmente menos larga e profunda
do que a em uso no periodo Roman. Esta differença foi motivada pelo
abandono do baptismo por _immersão_ no XIII seculo. Como
precedentemente, algumas das pias têem o feitio d'uma tina sem pé,
redonda, quadrada ou com seis ou oito lados; outras assentam sobre um
grosso pilar central acompanhado nos angulos da pia por quatro
columnasinhas, mas o maior numero são monopediculados.

As pias de feitio de tina sem pé encontravam-se ainda algumas vezes no
periodo ogival, porém muito poucas durante o periodo Roman.

_As pias monopediculadas_, isto é, firmadas sobre um só pilar, foram as
mais communs na Belgica durante todo o tempo do periodo ogival. Estas
pias baptismaes, em vez de serem como as Romans, circulares ou quadradas
na parte externa, eram geralmente de seis ou oito lados. A pia continua
a apresentar, como durante o periodo Roman, a fórma hemispherica ou
oval; havendo muitas vezes, na parte mais baixa, um orificio servindo
para vasar a pia.

Na Allemanha e na Belgica desde o final do seculo XIV, e principalmente
no XV seculo, havia pias monopediculadas em latão.

O maior numero de pias Romans estavam cobertas de esculpturas
decorativas, symbolicas ou historicas. Sobre as pias do periodo ogival,
pelo contrario, os assumptos historicos e legendarios, assim como as
figuras symbolicas e phantasticas são raras; por excepção se vê ainda
n'ellas o baptismo de Jesus Christo e outras scenas biblicas ou tambem
personagens isolados collocados debaixo de arcaduras.

Os ornatos simplesmente decorativos, taes como folhagens e carrancas,
são tambem bastante raros sobre as pias do XIV e XV seculo. Toda a
decoração das pias ogivaes, principalmente no XV seculo, consiste as
mais das vezes n'um certo numero de molduras que se vêem sobre a pia e
sobre o pilar em que se fórmam.


*Pias para agua benta*


Ha duas qualidades de pias para agua benta: as _fixas_ e as _portateis_.

As pias fixas são cylindricas ou polygonaes, com reservatorio
hemispherico, collocadas junto da entrada da egreja, no interior ou
exterior do edificio: umas isoladas e postas sobre um pé, outras sem
terem apoio. Estas ultimas, que estão sempre unidas com as construcções,
vê-se quer em nichos, quer em sacada sobre o liso da parede ou d'um
pilar, no qual estão encaixadas.

Posto que as pias para agua benta pediculadas estivessem já em uso no
XIII seculo, e talvez ainda antes, foi todavia no XIV e XV seculos que
vieram a ser mais communs. Em muitos paizes, apresentam bastante
analogia com as pias baptismaes contemporaneas, de maneira que é muitas
vezes difficil distinguir de repente, se o objecto que está presente
serviria na primitiva de pia para agua benta ou de pia baptismal, pela
sua grandeza. A capacidade limitada do reservatorio e a falta do
orificio destinado para dar sahida ás aguas baptismaes, dão algumas
vezes um indicio para designar que o objecto seja uma pia para agua
benta e não uma pia baptismal.

O maior numero das pias para agua benta fixas do periodo ogival que
existem, ainda são de pedra. Havia tambem em outro tempo um certo numero
d'ellas de bronze e de latão. A memoria de algumas d'estas pias de metal
nos foi conservada, quer por desenhos e gravuras, quer por testemunhos
de escriptores antigos. Encontram-se mesmo raros especimens que
escaparam á destruição vandalica.

As pias para agua benta _portateis_ são vasos com azas, destinados a
conter a agua benta. Como já referimos, serviam durante o periodo Roman,
para apresentar a agua benta aos imperadores, reis e outros distinctos
personagens, na occasião da sua entrada na egreja. Serviam tambem n'esta
epocha, para a agua com que se faziam as aspersões prescriptas pela
liturgia. O costume de principiar a missa solemne do domingo por uma
procissão dentro da egreja, durante a qual se aspergia o povo com agua
benta, remonta aos primeiros seculos do christianismo. As capitulares de
Carlos Magno confirmam já este costume, e no Concilio reunido em Nantes
em 911 determina aos curas que benzam a agua ao domingo, em um vaso
limpo e apropriado, para que o povo seja aspergido, e o sacerdote possa
leval-a aos enfermos, aspergil-os e á sua habitação.

As mais antigas pias para agua benta portateis são de marfim. As pias
para agua benta em metal, já conhecidas durante o periodo Roman, vieram
a ser muito communs no XIII e XIV seculos. Todas as pias para a agua
benta portateis são, comparativamente ás em uso desde o XV seculo, de
muito pequena dimensão: medem apenas 20 centimetros pouco mais ou menos
de altura, com um diametro entre 10 e 13 centimetros.

Quando, no XV seculo, as pias para a agua benta portateis de metal
vieram a tornar-se de uso geral, deram-lhes dimensões maiores. Todavia
encontram-se ainda muitas d'esta epocha, que são muito pequenas.

Quasi todas as pias para agua benta antigas têem a fórma d'um balde;
algumas apresentam um engrossamento consideravel sobre a borda superior,
diminuindo sensivelmente para a base. Vêem-se com uma inscripção
mostrando como as das pias fixas, assim como a allusão ao symbolismo de
agua benta pelo baptismo de Jesus Christo.


*Grades e barreiras*


_Grades de ferro_. As grades do XIV seculo apresentam mais ou menos o
aspecto geral que as do periodo Roman. Como antecedentemente, têem os
prumos verticaes com um caixilho de ferro a que ficam reunidos por
ornatos em fórma de _X_ composto por barrinhas de ferro com secção
differente; e todavia, quando as grades são destinadas para as
cathedraes ou para os edificios importantes, as barrinhas das
extremidades simplesmente enroscadas não têem por ornato senão algumas
hastes verticaes. A suppressão das couceiras póde ter logar sem
inconveniente nos vãos de pequena largura, de pouco peso e fórmas
delicadas, mas para grades maiores e expostas aos encontrões da
multidão, o systema de almofadas com ornato entre as couceiras e as
travessas é o unico modo que dará a solidez precisa sem obstar ao
aspecto de leveza.

Os cenotaphos erguidos nos logares frequentados da egreja, os
reliquarios expostos publicamente á veneração dos fieis e os armarios
dos thesouros eram muitas vezes resguardados por grades com importante
trabalho de mão d'obra. Estas grades ornadas geralmente por barrinhas
estampadas do lado externo sómente estão por vezes armadas com grandes
pontas e ganchos de ferro que impossibilitam o assalto.

Nas grades do XIV e XV seculo, os prumos servindo de couceiras e as
travessas continúam a ser empregadas; porém as barrinhas torcidas e
estampadas das grades do XIII seculo ficaram substituidas por ornatos
obtidos, servindo-se de chapas de ferro batido, recortadas em florões ou
folhagens. Depois, em logar de ficarem seguros como precedentemente os
prumos por bracedeiras, não soldados, esses ornatos estão fixos por
cavilhas arrebitadas. Os caixilhos de ferro são muitas vezes
supprimidos, e a esses prumos depois de lhe assentar na extremidade
remates mais ou menos vistosos, compostos de flôres de liz ou florões de
folha de ferro soldadas.

As grades que se não abrem, que assentam na frente das janellas, nos
thesouros das egrejas, casas de capitulo, depositos do archivo, casas
nobres e mesmo nas casas particulares, estão muitas vezes guarnecidas de
pontas de ferro dispostas em espigas nas duas extremidades das
couceiras. Algumas vezes as grades com espigas têem, álem d'isso, as
suas couceiras e travessas reunidas de maneira impossivel para fazer
mover as couceiras nos olhaes das travessas ou nos olhaes das couceiras;
estes olhaes estão alternativamente feitos nas travessas e nas
couceiras.

_Barreiras de madeira_. Em logar de grades de ferro, tambem se serviam
de barreiras de madeira, a fim de separar as capellas. Estas barreiras
são geralmente tapadas até á altura quasi d'um metro, não ficando
interrompida a vista na parte superior. Quasi todas são feitas com
madeira de carvalho, devendo a sua duração não sómente ao bem feito da
obra, como á excellente qualidade do material empregado. A começar do
XIV seculo, a parte inferior tapada é formada de duas ou muitas ordens
sobrepostas de almofadas encaixadas entre as couceiras e as travessas.
Estas almofadas teem muitas vezes obra de talha figurando pinasios dos
caixilhos, ou folhas de pergaminho dobradas. A parte superior d'estas
barreiras compõe-se quasi sempre de arcaduras rotas, deixando passar a
vista entre os prumos em que se dividem.


*Orgãos e caixas para elles*


Os primeiros orgãos de que os chronistas occidentaes fazem menção, são
os que o rei Pepin recebeu de presente da côrte imperial de
Constantinopla no meiado do VIII seculo, e que fez collocar no seu
palacio de _Compiègne_. Carlos Magno tambem no principio do seculo
seguinte mandou fabricar orgãos, conforme o modelo byzantino para ornar
a sua egreja de _Aix-la-Chapelle_. Depois de Carlos Magno, o uso dos
orgãos para o acompanhamento de certas partes cantadas do officio
divino, introduziu-se pouco a pouco na egreja Latina. Desde o final do X
seculo, a maior parte das egrejas cathedraes e abbaciaes de primeira
ordem tinham-os adquirido, e durante os dois seculos seguintes
continuaram a generalisar-se.

Os orgãos primitivos eram muito defeituosos e d'uma grande singeleza,
como vemos nas miniaturas dos manuscriptos contemporaneos.

Durante o periodo ogival a predilecção pelos orgãos tomou novos
desenvolvimentos, e, no final do XV seculo, todas as egrejas de alguma
importancia e mesmo as capellas tinham o seu orgão. No XIII seculo,
começaram já, em alguns logares, a multiplicar o numero dos orgãos em
uma só e mesma egreja. Ao principio contentavam-se com dois d'estes
instrumentos; porém no XIV e XV seculos tinham tres, quatro e até cinco.
Na egreja do convento de Mafra, el-rei D. João V mandou collocar quatro
grandiosos orgãos nos angulos do cruzeiro, no XVII seculo.

_Até ao XV seculo_, diz o insigne architecto Violet-le-Duc, _não parece
que os grandes orgãos estivessem em uso. Serviam-se apenas de
instrumentos de mediocres dimensões e que podiam ficar dentro d'um movel
assentes na capella-mór, nos jubés ou sobre tribunas mais ou menos
espaçosas, destinadas não sómente aos orgãos, mas ainda aos cantores e
musicos. Foi no final do XV e principio do XVI seculo que houve a ideia
de dar aos orgãos, dimensões extraordinarias_ desconhecidas até então,
tendo uma _grande força de som e exigindo, caixas collossaes_. Todavia
esses orgãos não são nada em comparação com os instrumentos que se
fizeram depois no XVII seculo.

No fim do periodo ogival, a fórma das caixas dos orgãos era determinada
pela disposição que tinha esse instrumento. A obra de entalhador para as
caixas dos orgãos do XV e XVI seculos, e mesmo de alguns orgãos do XVII
seculo era independente do instrumento e servia para o resguardar,
cobrindo-o. O mechanismo e os folles ficam inteiramente mettidos entre
as almofadas macissas dos sócos; as almofadas recortadas enchem os
espaços rotos existentes entre a extremidade superior dos canudos e os
tectos, afim de facilitar a emissão do som. A marceneria ornada de
esculpturas e de polychromia e os canudos eram muitas vezes estampados e
dourados. Tudo ficava encerrado por portas que o organista abria quando
tocava; estas portas eram, as mais das vezes, ornadas, pelo menos na
parte interna, com pinturas historicas que se viam quando servia o
instrumento. Os orgãos e as caixas, anteriores ao XVI seculo, são
muitissimo raros.


*Alfaias religiosas*


_Ourivesaria e esmaltadores_. No XIII seculo, a arte de ourives
transformou-se completamente sob a influencia do novo estylo
architectural. Durante o primeiro quartel e mesmo durante a primeira
metade d'esse seculo, os vasos sagrados e os objectos do culto
apresentavam ainda, é verdade, as mesmas fórmas geraes que durante o
periodo Roman; porém o systema da decoração teve modificações
importantes. O artista, fosse quem fosse, esculptor, pintor ou ourives,
ia procurar as suas inspirações, jamais como precedentemente aos
objectos byzantinos ou aos estofos orientaes, mas sim na flora do seu
paiz; serviam-lhe de modelos os vegetaes indigenas e applicava-se
interpretal-os artisticamente.

As chapas esmaltadas e os engastes das joias, com algumas folhagens de
filigrana, ficam geralmente em uso até ao meiado do XIII seculo;
continuando a dar o principal modelo de decoração para os objectos de
grandes dimensões, taes como os reliquarios e os frontaes dos altares.

Todavia n'uma parte da Belgica, o uso dos esmaltes de côres desappareceu
mais cedo que nas outras partes. Desde o primeiro quartel do seculo
XIII, encontra-se, sobre as margens do _Lambre_, uma escola de ourives
tendo em pratica principios inteiramente novos. Á frente d'esta escola e
ao impulso artistico que produz, apparece o irmão Hugo, frade Agostinho
do priorado de _Oignies_. Este humilde religioso executou durante o
primeiro quartel do XIII seculo, (um dos seus trabalhos tem a data de
1220), em alguns annos, uma serie de obras-primas que ainda não foram
imitadas, algumas das quaes teem resistido aos estragos dos tempos, e
guardam-se devotamente no thesouro das freiras de Nossa Senhora em
_Nemours_, produzindo a admiração de todos os entendedores. Desprezando
o emprego dos esmaltes com muitas côres, elle procurou o principal
effeito de decoração n'um trabalho original, que consiste em cobrir os
objectos, no todo ou em parte, com delicadas folhagens formadas de
cachos, de flôrsinhas e pequenas folhas estampadas, reunidas pela
soldadura a delicados pés. A estas folhagens ajuntava figuras de veados,
cães e caçadores, tudo produzido da mesma maneira. O tecido muito unido
que resultava d'estes trabalhos era depois arribitado ou soldado sobre
as differentes partes do objecto do qual elle abrangia todos os
contornos.

Hugo empregou ainda as joias; mas ás vezes, em logar de dispôl-as sobre
chapas rectangulares e ligal-as pela filigrana, as dispunha
artisticamente entre as suas delicadas folhagens. Além d'isto, seguindo
o exemplo dos seus antecessores, não empregava camafeus e com gravuras
concavas á maneira antiga, todas as vezes que não tinha joias novas para
o seu trabalho.

Quanto ás massas coloridas embutidas no metal, Hugo não conserva quasi o
negro do buril que serve para traçar as inscripções, ornamentos e tambem
as figuras.

Depois do meiado do XIII seculo, os objectos de ourivesaria principiaram
pouco a pouco por imitar na sua fórma e aspecto geral os monumentos de
architectura: os relicarios, que antes eram cofres, sarcophagos,
remedando o feitio dos edificios religiosos, vieram a ser pequeninas
egrejas em ouro e prata: os relicarios tinham enfeites, por vezes
remates, torrinhas ladeadas de contra-fortes e bastantes arcos; em uma
palavra, as fórmas elegantes e graciosas da architectura ogival foram
copiadas nos objectos do culto. A cinzelura tambem faz cada vez mais
progresso; e vê-se mesmo a maior parte das vezes pequenos objectos
apresentarem as esculpturas e altos relevos, o que não se fazia antes,
excepto nos grandes objectos de ourivesaria.

Os objectos de ourivesaria propriamente chamados conservam, no XIV
seculo, as fórmas que tinham precedentemente, isto é, imitam o aspecto
dos monumentos de architectura, ou, pelo menos, são decorados com certos
detalhes architectonicos. Todavia na França, e sem excesso na Belgica,
os ourives executaram, para relicarios, estatuas pequenas de alto
relevo, grupos e imitações de membros de corpo humano, ou outros
objectos que se desejava encerrar dentro d'elles. Desde o XIV seculo, os
vasos sagrados e os outros objectos do culto perdem a nobre simplicidade
do estylo grave da época precedente.

No XV seculo os trabalhos de ourivesaria correctos differençavam pouco,
quanto ao aspecto geral, dos do seculo anterior. As suas fórmas
patenteavam todavia as modificações successivas que teve a architectura
n'esta época. Os ourives empregavam menos simplicidade nas suas
composições, menos elegancia nas fórmas, porém o seu trabalho é
geralmente mais apurado e mais delicado; levado por vezes até á
exaggeração pelo acabamento e perfeição dos pequenos detalhes.

Quando empregavam ainda algumas esmaltes para realçar o oiro e a prata,
os ourives do XIII seculo, como os seus predecessores do XII seculo,
indicavam sobre o liso do metal o contorno das figuras, e dispunham
depois todas as partes internas do desenho, quer por um cinzelado
produzindo um relevo pouco saliente, quer, mais simplesmente ainda, por
uma delicada gravura, cujos traços refaziam o desenho dos contornos das
figuras; emfim, abaixavam o fundo á roda das figuras e enchiam-no de um
esmalte, geralmente escuro, adequado para fazer sobresair a composição.
Até ao final do XIII seculo, os traços da gravura delicada ficavam
geralmente vasios; era só excepcionalmente que os enchiam de preto. Mas,
no começo d'esta época, enchiam-n'os quasi sempre de encarnado ou
pardo-escuro.

_Dinanderie_. Dá-se o nome de _dinanderie_ a um objecto de cobre ou
latão coado e martellado, conforme o modo de fabricar esses objectos.
Esta palavra tira a sua origem da cidade de _Dinant_ sobre o _Meuse_, a
qual tinha adquirido, na edade média, uma grande fama pela execução de
objectos de latão. Portanto, em virtude d'esta etymologia, alguns
archeologos continuaram com o uso recebido, escrevendo--Dinan_te_rie, em
logar de Dinan_de_rie.

A arte de _dinanderie_ estava prospera desde o fim do XI seculo nos
Paizes-Baixos, e durante os seculos seguintes, os bate-folhas de cobre
obtiveram de differentes soberanos muitos privilegios, que facilitaram a
exportação dos productos de sua industria para Allemanha, França,
Inglaterra e todo o norte da Europa.

As pias baptismaes executadas com este material, as primeiras de 1112, e
as outras de 1149, ainda se conservam na Belgica.

_Calices e Patenas_. A communhão sob a especie de vinho tendo sido
abolida na Egreja Latina, proximo do XII seculo, os calices _ministraes_
com aza cessaram de ser empregados no Occidente, e a sua fabricação
ficou completamente abandonada. Assim, todos os calices ministraes de
origem occidental são anteriores ao periodo ogival. Na Grecia e no
Oriente, pelo contrario, onde a communhão se dava ainda aos seculares
sob as especies de pão e vinho, o uso dos calices ministraes
conservou-se até ao presente.

_Os calices vulgares_, isto é, os de uso do sacerdote que celebra a
missa, teem geralmente no XIII seculo, como nos dois seculos
precedentes, a taça muito larga e pouco funda, o pé redondo e de grande
diametro; a tige está ornada de um nó grosso, composto muitas vezes de
arestas salientes, mas raramente de medalhões circulares.

No XIV seculo, e mesmo no fim do XIII uma mudança notavel se deu na
fórma dos calices. A taça estreitou-se, e de hemispherica, como era
antes, veiu a ser conica ou enfundibuliforme, isto é, similhando-se a um
funil. A fórma desegual, quasi desconhecida nos calices do XIII seculo,
veiu a ser commum, sem todavia tomar uma grande importancia. A hastea,
que durante a primeira metade do XIII seculo, era regularmente
cylindrica, tornou-se angulosa e prismatica, tendo geralmente seis
faces. Os lados do nó foram mudados para botões redondos, quadrados ou
rhombos, egualmente em numero de seis, e quasi sempre embutidos de
esmalte, gravuras ou joias. Sobre os seis botões estão algumas vezes
inscriptas as seis letras do nome de Jesus, como ortographavam então:
IHESUS. O pé está dividido em seis lobulos ornados de esmaltes e de
gravuras a traço representando imagens, e mesmo composição completa;
estes lobulos correspondem ás faces da hastea e aos botões do nó. O sóco
do pé está recortado em folhas de trevo, quatro folhas ou arcaduras; seu
diametro, sempre menor que o dos calices romans, conserva não obstante
uma base bastante larga para evitar a quéda. Em resumo, os calices do
XIV seculo, comparados com os dos seculos precedentes, tem mais altura,
mas o diametro da taça e do pé é muito menor.

A fórma geral dos calices do XV seculo é pouco mais ou menos a mesma dos
calices do XIV seculo. Todavia, em certos paizes, por exemplo na
Belgica, observa-se que os lobulos do pé, as faces das hasteas e os
botões do nó teem muitas vezes o numero oito em logar de seis. Esta
mudança foi introduzida proximo do meiado do XV seculo.

A _patena_ do periodo ogival tem como a do periodo roman, a fórma de uma
pequena salva, apresentando no meio uma cavidade circular. O fundo da
salva traz muitas vezes, gravado a traço, um circulo ou um quadrilobo,
circumdando quer o Cordeiro Divino, quer a Mão com aureola que symbolisa
a Divindade, quer qualquer outro assumpto. Colloca-se algumas vezes uma
pequena cruz sobre a borda da salva.

_Galhetas_. Existem raros especimens de galhetas da época ogival.
Havia-as de cobre esmaltado e em crystal de rocha com guarnição de prata
cinzelada e algumas de prata dourada com guarnições gravadas.

Durante a edade média serviram-se tambem mais frequentemente de galhetas
de vidro, mas por causa da fragilidade da materia, muito poucos objectos
d'esta especie escaparam da destruição.

_Custodias Eucharisticas_. Em alguns paizes, particularmente em França,
a Eucharistia continuou, durante o periodo ogival, a estar conservada,
como anteriormente, nas pombas douradas e esmaltadas, collocada, a maior
parte das vezes, em uma torresinha ou pequena tenda forradas de telas
custosas, ficando suspensa por cima do altar, quer sob a pyxide, quer no
baculo de metal.

No XIII, no XIV, e mesmo ainda durante uma parte do XV seculo, as
pyxides eram geralmente como as do periodo Roman, de muito pequeno
tamanho, porque, até proximo do meiado do XV seculo, serviam sómente
para conservar o numero necessario de hostias de que havia precisão para
a communhão dos doentes em perigo de vida. Os fieis que podiam assistir
aos officios religiosos, recebiam a Santa Eucharistia depois da
communhão do sacerdote, com as especies consagradas durante a missa,
sendo distribuidas servindo-se da patena.

Quasi todas as pyxides do periodo ogival eram de metal; as de marfim e
cobre não apparecem senão excepcionalmente.

_As pyxides sem pé_, de cobre dourado e esmaltado, compostas de pequenas
caixas cylindricas, tendo uma tampa de fórma de cone, ficaram em uso
pelo menos até o XVI seculo; empregando-se principalmente para levar o
Viatico aos enfermos.

Encontram-se ainda presentemente muitas d'estas pyxides, mais ou menos
valiosas e ornadas. Não poucas devem a sua conservação a esta
circumstancia, que depois da introducção das grandes pyxides
aproveitaram-nas para guardar as reliquias destinadas a ficar
chancelladas no altar no momento da consagração: portanto, não é raro
encontrarem-se nos desmanchos dos altares do XVI e XVII seculos.

As pyxides _pediculares_, isto é, tendo um pé, que eram raras antes,
vieram a ser as mais communs desde o XVIII seculo. Algumas destinadas a
ficarem suspensas por cima do altar, sob o sacrario, ou na voluta do
baculo, teem o pé muito pequeno, e a taça assim como a tampa bastante
grandes e quasi hemisphericas, de maneira a formar reunidas uma bola
ôca, geralmente um pouco achatada.

No seculo XII, as pyxides, em logar de ficarem suspensas por cima do
altar, foram postas nos sacrarios, deram-lhes regularmente um pé mais
alto, similhante aos dos calices e dos relicarios. No principio, bastava
collocar sobre um pé as pequenas pyxides de cobre dourado e esmaltado;
depois fizeram tambem as pyxides em metal com cinzelados e rebatidos,
vindo a ser unicamente usadas. As mais antigas da ultima especie teem a
taça e o pé circular.

No XIV seculo, a taça e a tampa tiveram a fórma hexagonal, isto é, seis
faces, e o pé divide-se em seis lobulos.

Durante a ultima metade do XIV seculo e todo o XV seculo, as pyxides
pediculadas têem muitas vezes as arestas da tampa decorada de crochetes;
os angulos formados pela intersecção dos seis lados da taça, sendo
flanqueados de contra-fortes, e os lados tambem ornados de arcaduras com
ou sem estatuasinhas.

Quando no XV seculo, ficou introduzido o costume de conservar o maior
numero de hostias consagradas, afim de poder dar a communhão aos fieis,
mesmo sem ser na occasião da missa, as pyxides tiveram dimensões muito
maiores. Continuou-se geralmente a dar-lhe fórmas architecturaes, porém
essas fórmas vieram a ser, sobretudo na Allemanha, mais altas e mais
complicadas ajuntando-se arcos-butantes aos contra-fortes e ás arcaduras
com as quaes já as ornavam precedentemente. Em França e na Belgica,
appareceram proximo do final do XV seculo as pyxides esphericas, cuja
fórma faz lembrar a dos antigos ciborios suspensos. Não é raro, além
d'isso, achar pyxides transformadas em relicarios.

Não será inutil aqui repetir, que, salvo raras excepções, todas as
pyxides anteriores ao XVI seculo teem a tampa presa á taça por um gonzo.

_Custodias_. A solemnidade do _Corpus Domini_, ou festa do Corpo de
Deus, instituida em Liège em 1246, e extensiva á Egreja Universal,
dezoito annos mais tarde pelo pontifice Urbano IV, trouxe o uso de expôr
publicamente o Santissimo Sacramento á veneração dos fieis. Foi este uso
que deu origem ao vaso chamado _custodia_, ou _apresentação_ nome
derivado dos verbos latinos _ostendere_ e _monstrare_, significam, um e
outro, _mostrar_.

No principio, parece que o _Santissimo Sacramento_, estava exposto
publicamente nas pyxides _transparentes_ com cruzes e torrinhas cheias
de aberturas; mas, dentro em pouco adoptaram-se, geralmente as
custodias.

Algumas d'estas custodias primitivas apresentam a maior analogia com os
relicarios expostos contemporaneos. São pequenos edificios de metal, com
recortes, tendo um pé e furados sobre dois ou muitos dos seus lados, com
aberturas, as mais das vezes sob a fórma de janella ogival.

As custodias mais communs durante todo o periodo ogival, foram as de
_cylindro_, assim designadas porque são formadas d'um cylindro de
crystal ou de vidro posto sobre um pé de metal. No XIV, XV e XVI
seculos, o cylindro tem geralmente por cima um campanariosinho e nos
flancos contra-fortes e arcos-butantes, igualmente de metal. Depois do
XIII seculo, o campanariosinho e o pinaculo não são usados. A hostia
colloca-se no interior do cylindro n'uma luneta sustentada por um ou
mais anjos. O pé e o nó d'estas custodias apresentam a maior similhança
com os calices e as pyxides contemporaneas; todavia, o diametro do pé é
geralmente maior nas custodias que nas pyxides e calices.

As custodias em que o cylindro de crystal é substituido por um _sol
radiante_ vieram a ser geraes desde o XVI seculo. Antes d'esta epocha,
eram extremamente raras, e sómente se conhecem pela noticia que se
encontra nos inventarios dos thesouros das egrejas pertencentes ao XV
seculo.

_Relicarios_. Os relicarios do periodo ogival apresentam fórmas tão
variadas como os da epocha Roman. Seria difficil descrevel-os todos;
occupar-nos-hemos dos principaes.

_Relicario da vera Cruz_. Como precedentemente dava-se muitas vezes a
estes relicarios a fórma d'uma cruz com travessa dupla; porém
empregavam-se os ornatos proprios da ourivesaria da epocha ogival. A
maior parte d'estas _cruzes-relicarios_, sobretudo as mais bellas, são
do XIII seculo.

Depois d'essa epocha abandonou-se o costume de encaixilhar os relicarios
da vera cruz, nas cruzes relicarias com travessa dupla, e serviram-se
geralmente da cruz com uma unica travessa.

Deu-se tambem algumas vezes a fórma de uma cruz aos relicarios contendo
reliquias de santo; mas n'este caso a cruz tem sempre uma só travessa.

No XIII seculo, os relicarios da vera cruz, collocados n'uma pequena
cruz ou bocota, eram ainda ás vezes, como durante o periodo Roman,
encaixilhados dentro de placas metallicas fixas sobre o meio da madeira
e ornados de esmaltes, gravuras e cinzelados de maneira a formar uma
especie de quadro com portas de metal ou madeira pintada.

_Relicario da corôa com espinhos_. Os espinhos da corôa trazida pelo
Redemptor durante a sua paixão, eram collocados regularmente em corôas
de ouro ou de prata enriquecidas de joias. Algumas d'estas corôas,
feitas no Oriente, foram enviadas para a Europa Occidental pelos
imperadores que as conquistas dos cruzados tinham collocado sobre o
throno de Constantinopla.

A Santa Corôa de espinhos que tinha vindo em poder dos cavalleiros
cruzados em seguida ás suas conquistas no Oriente, ficou conservada
religiosamente no throno sagrado do novo imperio byzantino até 1237,
epocha em que o imperador Bauduino II foi obrigado a dal-a em penhor aos
commerciantes venezianos, os quaes lhe haviam feito um emprestimo da
quantia de quatro mil marcos de prata para occorrer ás necessidades mais
urgentes das finanças imperiaes.

Pouco tempo depois, S. Luiz IX, rei de França, tendo tido a felicidade
de occupar o logar dos emprestadores, ficando responsavel pela quantia
entregue, pôde obter a preciosa reliquia, e a fez transportar para
França por dois frades dominicanos.

O santo rei mandou pôr muitos espinhos nas corôas do mesmo feitio que
tinha a corôa real, e presenteou com ellas um certo numero de
estabelecimentos religiosos.

Os Santos Espinhos foram tambem por vezes encaixilhados em relicarios
mais simples e d'um feitio differente.

Os relicarios do periodo ogival apresentam o mesmo aspecto que os do XII
seculo, isto é, teem a fórma d'um cofre oblongo, fechado por uma tampa
imitando um telhado com duas aguas.

Os grandes relicarios do XIII seculo são cofres de madeira coberta com
chapas de metal esmaltado, cinzelado e por vezes simplesmente gravado.
Quasi todos são rectangulares; ha todavia, por exemplo, a grande caixa
das reliquias de Nossa Senhora de _Aix-la-Chapelle_, que se vê sobre os
seus dois compridos lados, saliencias que a faz parecer com uma egreja
tendo um cruzeiro. As suas faces verticaes são ornadas de estatuasinhas
de ouro, prata ou de cobre dourado, ficando collocados debaixo de docéis
ou arcaduras. Jesus Christo abençoando, sentado ou de pé, só ou entre
dois santos, se vê, como nos relicarios Romans, sobre um dos dois
pequenos lados formando empena, emquanto o outro lado fica occupado por
Nossa Senhora, ou pelo Santo cujas reliquias se conservam no relicario,
igualmente collocado entre dois santos.

Os dois lados compridos estão divididos n'um certo numero de
compartimentos tendo como remates frontões dentro dos quaes estão
inscriptas ogivas quasi sempre trilobaes. Estes compartimentos formam
docéis ou arcaduras, mostrando estatuasinhas dos apostolos ou de outros
santos assentados.

Sobre as abas da tampa ha figuras em pé ou baixos relevos representando
os mysterios da vida de Jesus Christo e os principaes factos do corpo
que encerra o relicario.

Finalmente, algumas vezes a aresta superior do cofre, e mesmo os lados
inclinados dos frontões, teem na summidade folhagens de esmerado lavor,
interrompidas de distancia a distancia, por castões.

As linhas inclinadas dos frontões, os docéis, os molduramentos e os
fustes das columnasinhas que sustentam os docéis estão bastantes vezes
cheios de esmaltes e filigranas como se fazia precedentemente.

Desde o final do XIV seculo, os relicarios em metal perdem o aspecto de
feretro ou cofre, como haviam tido até então; transformam-se pouco a
pouco e tomam a apparencia de capellas e mesmo de pequenas egrejas.

Alguns relicarios do XIV seculo fingem, d'uma maneira extremamente
caracterisada as fórmas architectonicas: representando rosaceas,
galerias, campanariosinhos e contrafortes; os seus docéis e frontões
teem as inclinações dos contornos decorados de crochetes acabando no
feitio d'um florão.

O maior numero dos relicarios metallicos dos XV e XVI seculos imitam
servilmente a maneira de se construirem os monumentos de cantaria; vindo
a ser reproducções em pequeno das grandes egrejas ogivaes. Tendo
egualmenle arcos-butantes, na summidade recortes, parapeitos vasados em
trefles ou de quatro folhas, uma nave principal e as lateraes, etc., e
ás vezes tambem uma torre se ergue no centro do espigão.

Usaram tambem, durante o periodo ogival, de _relicarios de madeira_
cobertos de pinturas representando assumptos religiosos que recordam
geralmente os principaes factos da vida do santo que contém o relicario.

O relicario de madeira mais notavel como objecto d'arte por causa de
suas pinturas, é o de Santa Ursula, que está no hospital de S. João em
Burges. Tem a data do XV seculo e constitue uma das obras primas do
pintor Hans Memlinc.

Ha tambem poucos exemplares de relicarios de pedraria do periodo ogival.

Os relicarios não contém sempre os corpos inteiros dos santos, e são
tambem destinados a conservar reliquias diversas.

_Bustos, braços, pés, estatuasinhas_, etc. O uso de conservar as
reliquias dos santos dentro de bustos ou nos relicarios preciosamente
ornados imitando a fórma dos ornatos a que os relicarios pertenciam já
no periodo roman, manteve-se durante toda a epocha ogival, e
encontram-se ainda muitos exemplares do periodo do renascimento.

O maior _busto-relicario_ conhecido, pois mede 1^{m},62 centimetros de
altura e um dos mais magnificamente ornados, é o de S. Lamberto da
cathedral de Liège, obra de 1506 a 1512. É de prata dourada e está posto
sobre um plintho decagono decorado de seis baixos relevos representando
differentes scenas da vida do santo bispo de Maestricht. O bispo está
paramentado com as vestes pontificaes e todo coberto de joias e perolas.

Os ossos dos braços e dos pés estão muitas vezes introduzidos nos
relicarios apresentando a fórma d'esses membros do corpo humano. Nos
relicarios de fórma de braço, a mão fica sempre representada _benzendo_
á maneira Latina.

No thesouro da egreja de Nossa Senhora de Tongres ha sete relicarios com
a fórma de braços. Dois são do final do XIII ou principio do XIV seculo,
estando compostos de chapas de prata com faxas de cobre dourado
guarnecido de joias e filigranas; os outros cinco são de madeira
pintados e dourados. Os tres mais admiraveis e preciosos, têem dois a
fórma d'um pé, e no terceiro, com a fórma de meia lua, guarda-se uma
costella do apostolo S. Pedro.

Ha tambem relicarios apresentando o feitio de estatuasinhas. Geralmente
as reliquias estão contidas em um pequeno cylindro de crystal,
guarnecido de prata ou cobre dourado, fechado nas duas extremidades e
posto ao lado da estatuasinha ou trazendo-o na mão. Algumas vezes, posto
que raramente, estão fixos n'um medalhão ou pequena cruz, sobre o peito
ou sobre outra qualquer parte da estatuasinha.

_Mostrador-relicario_. Estes relicarios compõem-se de vasos de crystal
ou de qualquer outra materia transparente, engastados em obra de
ourivesaria, onde se mettem as reliquias, depois de as ter embrulhado em
pellica, seda ou estofo, tecidos de ouro ou prata. Estes vasos,
geralmente de fórma de cylindro ôco, põem-se muitas vezes n'uma posição
vertical, e ficam limitados por um remate tambem conico. O maior numero
dos mostradores-relicarios são postos sobre pés similhantes aos dos
calices e das custodias; alguns são sustentados por anjos ou levitas;
finalmente ha os que ficam postos sobre um sóco; por vezes acontece não
terem essa base.

No XIII seculo, e mesmo ainda ás vezes no seculo seguinte, os ourives, á
imitação das obras dos esculptores contemporaneos, iam buscar os feitios
de decoração para os mostradores-relicarios ás reliquias nos engastes
das joias, ás filigranas e as folhagens imitando a flora indigena.

Ao começar do XIV seculo, muitos relicarios fingem fórmas architecturaes
e imitam mais ou menos certas partes dos edificios do estylo ogival. Os
feitios da decoração tirados até ali ao reino vegetal, dão logar para
formar pinaculos, contra-fortes, arcosbutantes e docéis, estando
delicadamente lavrados e executados, não pela imitação servil dos
edificios de cantaria, mas com uma intelligencia apurada que distingue
todas as producções artisticas da idade media e que attendiam á natureza
da materia que se punha em obra. O ourives, posto que conservasse as
fórmas geraes da architectura, dava-lhes uma leveza que seria
impossivel, se fosse executada na pedra.

Quando o cylindro ficava na posição vertical, a fórma do
mostrador-relicario confundia-se geralmente com a das custodias, como já
referimos.

Vêem-se tambem algumas vezes relicarios com cylindro vertical e feitio
da decoração imitando a architectura, não tendo peanha.

Quando, pelo contrario, o cylindro tem a posição horisontal, é
geralmente executado em obra de ourivesaria de fórma de egreja com uma
ou mais naves, encimado d'uma torresinha elevada e ligada por
arcos-butantes sahindo do engaste que encerra o cylindro.

_Phylacteras_. Não podemos deixar de mencionar uma outra fórma de
relicarios que foi commum no XII e no XIII seculos. Estes objectos
compõem-se de pequenos moldes de madeira cobertos de prata e cobre
dourado e esmaltado, sobre os quaes estão traçadas, em esmalte ou
relevo, imagens, scenas historicas e legendarias, emmolduradas n'uma
cercadura de filigrana recamada de joias sem serem lapidadas. Muitas
vezes mesmo as representações dos assumptos, das figuras e symbolos
faltam inteiramente. As costas, formadas igualmente d'uma chapa de
metal, são ornadas de lavores, gravuras ou pinturas. Têem sempre
pequenas dimensões (o seu diametro não é de mais que dois a tres
decimetros), e fórma redonda, ellyptica ou, as mais das vezes, com
quatro folhas. Alguns archeologos lhes dão o nome especial de
_phylacteras_, posto que, conforme a etymologia, este nome, derivado do
grego, _guardar_, designa qualquer especie de custodia ou recipiente, e
deveria por conseguinte applicar-se indistinctamente a todos os
relicarios.

Algumas vezes as phylacteras são, como os relicarios de cylindro de
crystal, postas sobre um pé de metal com figuras de anjos ou de santos.

_Cofres-relicarios_. Continuou-se, durante o periodo ogival, a encerrar
as reliquias dos santos nos cofres de metal, madeira, marfim e couro com
figuras em relevo. É bastante raro achar, sobre estes cofres, scenas
historicas ou symbolos religiosos.

No XV seculo principiou-se a fazer cofres de ferro, e o seu uso não se
demorou a generalisar. Não devemos pois admirar-nos, se um grande numero
d'estes objectos curiosos têem sido conservados até ao presente. A maior
parte eram destinados a uso profano: guardavam joias e outros objectos
preciosos. Ha todavia alguns que serviram de relicarios, principalmente
os que têem inscripções religiosas, como--AVE MARIA GRATIA PLENA e O
MATER DEI MEMENTO MEI.

Ás vezes estes cofres eram inteiramente de ferro; sendo todavia formados
d'uma caixa de carvalho ou de faia forrada de couro encarnado, sobre o
qual assentava uma chapa de ferro recortada e segura por enfeites de
ferro. O ferrolho tinha ás vezes a fórma d'um lagarto ou de salamandra.
A maior parte d'estes cofres eram cobertos de florões scintillantes, o
que faz vêr que no XV seculo os serralheiros como os ourives iam buscar
á architectura as suas principaes fórmas de decoração.

Os cofres de marfim, dos quaes se haviam servido muitas vezes para os
relicarios durante o periodo Roman, ficaram em uso até á epocha ogival
juntamente com os de madeira, de metal e de couro.

_Trombetas-relicarios_. Não é raro achar, nos thesouros de egrejas,
antigas trombetas de guerra e de caça transformadas em relicarios.
Durante a idade media, os christãos não receiavam empregar no culto
certos objectos profanos emquanto á sua origem e á sua ornamentação,
mais preciosos como materia ou como obra d'arte. Já assignalamos esta
pratica para os camafêos e pedras antigas gravadas concavamente, das
quaes os ourives da idade media frequentemente faziam uso para dar mais
brilho ao metal nos differentes objectos para o culto; encontrando-se
tambem nas trombetas dos caçadores de que tratamos agora e dos esmoleres
de que fallaremos depois.

Quasi todas as trombetas-relicarios são de marfim e apresentam a mesma
fórma, imitando a defeza do elephante de cuja materia eram fabricadas. É
do nome d'este animal, que as trombetas de marfim têem tirado o de
_olifante_, pelos quaes são geralmente conhecidos. Na idade media o
_olifante_ era tanto se não fosse mais, um instrumento de guerra como
para a caça; servia principalmente para dar signal de commando, reunir
as tropas e annunciar a presença do inimigo.

Os elephantes e as trombetas estão guarnecidos de aros de metal,
floreado com florões ou redentados que facilitam suspendel-os em
bandoleira. Estas virolas, algumas mostrando a cabeça de bezerro, estão
fixas nas duas extremidades, e de distancia em distancia sobre o
comprimento do objecto. Algumas vezes tambem ornam-se os elephantes de
esculpturas em baixo-relevo, e então as virolas não têem ornatos.

As principaes officinas para a esculptura dos oliphantes e guarnecel-as
de metal existiam durante a idade media no Norte de França,
principalmente em Abbeville e Paris.

Encontram-se tambem trombetas relicarios em chifre de boi e de bufalo;
posto que guarnecidas pela mesma maneira que os _oliphantes_, são
todavia faceis de reconhecer, não sómente pela sua côr, mas ainda pela
sua curva muito mais fechada, approximando-se geralmente d'um
semi-circulo.

_Esmoleres-relicarios_. Chama-se _esmoler_ a uma pequena bolsa com
cordões ou fechos, que se traz suspenso á cintura para guardar o
dinheiro e os objectos de serviço habitual. Estas bolsas, que formavam
na idade media o complemento indispensavel do vestuario dos dois sexos,
eram de couro ou estofos de preço. Dava-se-lhes tambem o nome de
algibeira.

A fórma mais antiga é d'uma pequena bolsinha com dois cordões de correr
para fechar, e d'um outro cordão para suspender á cintura. Mais tarde
supprimiram-se os cordões e dobraram na frente do bolsinho uma parte do
estofo, que se levantava quando se queria introduzir a mão no esmoler.

Não se tem conservado até ao presente esmoleres de estofo, e mesmo os de
couro não se encontram senão casualmente. Entre estes estofos uns são de
seda lavrada, outros têem bordados sobre linho ou seda com fios de ouro
ou seda de differentes côres traçando simples ornamentos, symbolos e
mesmo algumas vezes assumptos.

Na idade media serviam-se, muitas vezes dos esmoleres para embrulhar as
reliquias dos santos e deposital-as nos relicarios. É mesmo a esta
circumstancia que deve ter-se conservado um grande numero d'esses
curiosos objectos, o que serve tambem para se explicar acharem-se nos
thesouros das egrejas. Poucas vezes esses esmoleres mostram symbolos ou
assumptos religiosos; no maior numero vêem-se simples ornamentos;
algumas vezes mesmo estão decorados com assumptos profanos.

_Relicarios diversos_. Além dos relicarios que acabamos de descrever por
classes, ha tambem outros de que seria impossivel formar grupo, havendo
infinita variedade, e ao mesmo tempo um gosto singular, que os artistas
de todo o periodo ogival empregaram no feitio d'esses objectos.

_Custodias_ d'Agnus Dei. Chama-se _Agnus Dei_ a pequenos medalhões de
cera branca, de fórma circular ou oval, ornados sobre as duas faces com
a impressão d'um cordeiro deitado, uma cruz de resurreição, estandarte e
tendo dois ou tres guiões fluctuantes. Por baixo do cordeiro ha n'um
segmento de circulo, o nome do Pontifice que benzeu o objecto. N'uma
epocha bastante recente, tem-se muitas vezes completado esta indicação,
ajuntando-se-lhe o anno do pontificado; havendo-se substituido ao
cordeiro collocado no reverso do medalhão, o brazão d'armas do papa ou
uma imagem. Em exergo lê-se quasi sempre: AGNE DEI MISERERE MEI QUI
CRIMINA TOLLIS.

Desde o IV seculo é provavel se estabelecesse o uso de aproveitar, no
domingo depois da Paschoa, os restos do cirio paschal do anno precedente
para o dividir em pequenos fragmentos e distribuil-os depois aos fieis,
os quaes os levavam comsigo para suas casas e serviam como objecto bento
de devoção. É n'esta pratica ao presente conservado em algumas dioceses
com as modificações accessorias, que se acha a origem da devoção dos
_Agnus Dei_. Em Roma, principiaram cedo a ajuntar cera pura e oleo aos
fragmentos do cirio paschal e com esta mistura, se moldavam medalhões em
forma de distico, tendo a effigie do cordeiro Divino. Estes medalhões
eram já conhecidos em Roma perto do fim do VI seculo. Mais tarde, e
ainda presentemente, os restos do cirio paschal foram completamente
excluidos da materia dos _Agnus Dei_, e serviram-se unicamente da cêra
sem nenhuma addição de substancias estranhas, que o soberano Pontifice
mergulha durante algum tempo em agua benta misturada dos Santos Oleos e
de balsamo puro.

Em todos os tempos os _Agnus Dei_ têem sido recebidos pelos fieis com
grande veneração, e muitas vezes encerrados em pequenas bocetas de metal
mais ou menos precioso, cuja forma e ornamentação apresentam a maior
analogia com os dos relicarios. Estas bocetas têem geralmente uma argola
para se suspender; são circulares como os antigos _Agnus Dei_, trazendo
em exergo a legenda como está: AGNE, (ou mais vezes ainda AGNUS) DEI
MISERERE MEI QUI CRIMINA TOLLIS, ou uma outra oração. São muitas vezes
recortadas de maneira a mostrarem uma maior ou menor parte da cêra. Os
espaços que occupam o metal são ora dispostos em simples cruz grega
tendo na intersecção dos ramos, um medalhão cinzelado, gravado ou
esmaltado, ora em relevo sob a fórma de cordeiro, imagens, ou simples
florão.

Os mais antigos _Agnus Dei_ conservados até ao presente não vão além do
principio do XIV seculo; porém os d'uma epocha posterior encontram-se
com bastante frequencia.

_Armarios para reliquias_. Os relicarios, os vasos sagrados, os livros
do Evangelho e outros objectos preciosos conservam-se regularmente em
armarios ou tendo simples nichos feitos na grossura da parede; outras
vezes formavam construcções de pedra encostadas a uma parede; todavia as
mais das vezes eram moveis de madeira com mais ou menos obra de apurado
trabalho.

No XIII seculo, e mesmo ainda muitas vezes no XIV seculo, estes moveis,
d'uma fórma sempre simples e adequada ao seu destino eram principalmente
ornados com ferragens de feitio esmerado e com pinturas sobre as suas
portas. As portas sem molduras compunham-se d'uma serie de taboas
simplesmente juntas, duplas, consolidadas na parte interna, por
travessas e no lado exterior ornadas com bellas pinturas.

Desde o fim do XIII seculo e durante a primeira parte do XIV seculo, a
pintura e a esculptura foram, em certas occasiões, empregadas
simultaneamente na decoração dos armarios das reliquias; algumas vezes
mesmo, as portas com esculpturas tinham dourados, e o lavor de estojo
com ornamentos coloridos. Depois, a esculptura augmenta e pouco a pouco
acaba, no fim do XIV seculo, para substituir completamente a
polychromia. As portas dos armarios não apresentam já, a contar d'esta
epocha, as superficies inteiramente lisas e cheias de pinturas.
Compõe-se então de almofadas encaixilhadas e preparadas do mesmo modo
que as partes lisas das portas. Entre estas almofadas, algumas têem em
relevo molduras com desenhos imitando as travessas das almofadas das
janellas, as outras estão cheias de folhagens ou ornatos de talha
imitando folhas de pergaminho, como já explicámos. Uma cimeira recortada
e vasada e na qual os prumos dos aros veem terminar em florão rematam
muitas vezes o movel em todo o seu comprimento.

_Vasos para os santos oleos_. Na quinta feira de cada anno, o bispo
benze solemnemente, durante a missa que elle celebra na sua cathedral,
tres especies de oleos, os quaes são depois distribuidos pelas egrejas
da diocese. São: 1.^o oleos para os cathecumenos; 2.^o, oleo para os
enfermos; e 3.^o, oleo para a chrisma.

Acham-se ainda hoje em algumas cathedraes, grandes vasos do periodo
ogival que serviram antigamente para benzer os santos oleos na ceremonia
de Quinta Feira Santa.

Além d'estes vasos de grandes dimensões, nos quaes o bispo benzia os
oleos para toda uma diocese, ás vezes mesmo para muitas, havia
recipientes mais pequenos, que continham sómente os santos oleos para o
deão de uma grande cidade. Alguns eram cofresinhos rectangulares ou
ovaes, de madeira forrada de couro, dividido interiormente em tres
separações, podendo em cada uma caber um frasco. Outros em metal mais ou
menos precioso, compõe-se de tres vasos, geralmente cylindricos reunidos
estando soldados ou simplesmente unidos.

Os vasos contendo os santos oleos para a occasião mesmo em que dar os
sacramentos e nas differentes uncções de bençãos, são regularmente muito
mais pequenos do que aquelles que fallamos, e podem ser divididos em
duas classes. Os da primeira classe, destinados a conter ao mesmo tempo
as tres especies de oleos, são triplicados como os dos deões, os quaes
se differençam unicamente pela sua menor dimensão. Compõem-se quasi
sempre de tres cylindros ôcos, com uma tampa conica, collocados em roda
d'um nucleo, porém raras vezes postos em linha. Alguns não têem pés,
outros mostram esse appendice.

Para distinguir os differentes oleos, marcam-se os vasos com lettras
differentes: I, designa o oleo para os enfermos, _oleum Infirmorum_; C,
o santo oleo, _chrisma_. Para o oleo dos cathecumenos servem-se ora da
lettra S, _oleum Sacrum_, ora da lettra O, _oleum_, ou mesmo da lettra
E, do grego [Grego: Elaion], oleo. Como cada um d'estes oleos não serve
sempre nas mesmas ceremonias, e se precisa levar longe o oleo para os
doentes, cada um dos pequenos vasos pode-se separar do nó central que os
reune.

A segunda classe dos vasos para uso immediato de ungir comprehende
aquelles que encerram uma unica especie, geralmente o oleo para os
enfermos. Teem quasi sempre a forma cylindrica e estão tapados com uma
tampa de fórma conica. Alguns teem pés, outros não.

_Corôas suspensas sobre o altar_. Estas corôas chamadas _votivas_,
estiveram em uso pelo menos durante uma parte do periodo ogival, e
conservavam a fórma que tinham antes: a de um circulo de metal, cujo
brilho era muitas vezes augmentado com joias e esmaltes. Algumas eram
feitas de proposito para o serviço do altar; outras pertencentes aos
soberanos como insignia de realeza, foram dadas ás egrejas pela
generosidade dos principes.

_Corôas com luzes_. As coroas de luzes do periodo ogival são ou
_suspensas_ ou sustidas em um _pedicello_.

As corôas _suspensas_, que estiveram em uso desde os primeiros seculos
do christianismo, chegaram ao seu maior desenvolvimento no XI e XII
seculos. Durante o periodo ogival, perderam muito da sua importancia, e
as maiores d'esta epoca, encontram-se muito raro presentemente.

No XV seculo apparecem os lustres, que quaes vieram a ser communs em
pouco tempo, e ficaram a substituir as corôas desde o principio do
periodo do renascimento.

As corôas de luzes _pediculadas_ são geralmente de ferro forjado e
compõe-se quasi sempre de uma tampa da qual se ergue uma hastea vertical
ornada de um ou muitos nós. No alto d'esta haste estão postos em
diversas alturas, dois ou mais numeros de circulos em fórma de polygonos
de diametros differentes, compostas de espigas e dirandellas para terem
vellas. Os circulos são movediços e podem girar em roda da hastea que os
sustenta; esta disposição permitte aos devotos puxar para si as
dirandellas sem vellas pôr-lhes outras vellas offerecidas por promessa.
Estas corôas estavam em uso nas egrejas onde numerosos peregrinos vinham
venerar as reliquias ou a imagem de algum santo. As mais remotas corôas
tendo pé não vão além do XV seculo.

_Cruz de altar e de procissão_. Já dissemos, que até o fim do XV seculo
não houve distincção entre as cruzes do altar e as cruzes processionaes
ou estacionarias. A mesma cruz servia para o mesmo uso: punham-a sobre o
altar ficando firmada sobre uma base ou levavam-a em procissão no cimo
de uma comprida hastea.

No XIII seculo, as cruzes processionaes eram de uma grande simplicidade.
Tinham geralmente a imagem de Jesus Christo, e nas extremidades dos
braços havia os symbolos dos evangelistas collocados em um quadrilobo.

No XIV e no XV seculo, ornam muitas vezes com as fórmas architecturaes,
e mesmo tendo estatuasinhas debaixo de docel, o cabo era ôco servindo
para fixar a cruz sobre a hastea ou sobre um pé.

Quando no XIV, e principalmente no XV seculo, multiplicaram-se as
capellas e os altares em uma mesma egreja por causa do augmento
extraordinario da fundação de missas, introduziu-se o uso das cruzes do
altar, isto é, assentes permanentemente sobre elle. A cruz do altar
principal era a unica que ficava portatil, podendo servir no altar e nas
procissões.

_Castiçaes_. Havia, durante o periodo ogival, quatro especies principaes
de castiçaes: os castiçaes do _altar_, os castiçaes de _elevação_, e os
castiçaes _paschoaes_ aos quaes se podem ajuntar os _tocheiros_
collocados aos lados dos catafalcos.

_Castiçaes de altar_. O uso de collocar _dois castiçaes sobre o altar_
foi introduzido, em certas partes, no fim do periodo roman, e veiu a ser
geral no XIII seculo.

Os castiçaes de altar do XIII seculo apresentam uma grande similhança
com os do periodo roman. Do mesmo modo eram de metal e compunham-se
regularmente de um pé descançando sobre tres garras, d'um nó e d'um
prato com uma espiga; sendo todavia menos ornados. É por isso, que
apparecem excepcionalmente animaes phantasticos de forma de lagarto ou
dragão de azas que sustentam o prato de quasi todos os castiçaes romans.

No XIII seculo, como precedentemente, os castiçaes teem pouca altura,
sendo as mais das vezes de 15 a 25 centimetros. Algumas vezes todavia,
porém muito raro, proximo do fim do XIII seculo, tinham a hastea com
dois ou tres nós quasi 50 centimetros de alto.

O uso de não pôr sobre o altar mais de dois castiçaes pequenos durou até
ao XVII seculo.

Nos XIV e XV seculos, os nós da hastea foram substituidos por virólas,
sendo o numero de duas ou tres; ha todavia exemplos, principalmente no
XIV seculo, onde a hastea tem uma unica viróla.

No fim do XV seculo e no principio do XVI seculo, os castiçaes têem
muitas vezes os nós, o pé e o prato com relevos do feitio de meias
perolas e a hastea torcida em espiral.

_Castiçaes de elevação_. Este nome foi dado aos castiçaes destinados
para terem as vellas accesas antes da elevação da Hostia, e que se
apagam depois da communhão do padre. Estes castiçaes, regularmente em
numero de dois e collocados aos lados do altar, eram muito mais altos
que os castiçaes do altar, tendo de altura muitas vezes um a dois metros
de alto.

_Castiçaes paschoaes_. Assenta-se geralmente a hastea do _castiçal
paschoal_ n'uma estante vasada, onde se põe o livro para o canto do
_Exultet_. Muitas vezes se collocam dois ou mais braços destinados a ter
pequenas vellas; ha-os de latão e de ferro forjado.

No XIII seculo, os castiçaes paschoaes são ornados muito simplesmente
imitando na ornamentação o reino vegetal.

No XIV seculo, os candelabros para a tocha paschoal estão ornados muito
modestamente.

Os castiçaes paschoaes do XV seculo são ainda muito mais simples.

_Os castiçaes postos aos lados do catafalco_. Estes castiçaes geralmente
muito simples são as mais das vezes de ferro forjado e ornados com
polychromia. A sua altura varia entre um a dois metros. Um grande numero
se têem conservado. Algumas vezes estes castiçaes eram tambem de
madeira.

Aos lados dos catafalcos, os tocheiros isolados eram muitas vezes
substituidos por um _candieiro-triangular_ de pau ou metal composto de
um certo numero de bicos ou de pratos e assente sobre um ou dois pés.
Esta alfaia é tambem designada, principalmente nos antigos inventarios,
_cabide_, _rastrum_ e _rastrellum_.

Vestigios de apparato com luzes para os defuntos, se vêem ainda hoje em
muitos monumentos funerarios do XIII seculo, nas egrejas de S. Diniz,
proximo de Paris, mandados erigir por S. Luiz Rei de França, em memoria
dos reis seus predecessores.

_Braços com vellas e dirandellas_. Os candieiros com braços e as
dirandellas vieram a ser de um uso geral no principio do XV seculo. Têem
geralmente o mesmo feitio que os braços do candieiro paschoal com o
prato adentado. São postos sobre as paredes, e mais vezes ficam defronte
de uma imagem. O maior numero são de latão; os de ferro forjado
encontram-se raras vezes.

_Estantes para o côro_. Chama-se _estante do côro_ a uma estante de
madeira ou de metal sobre a qual se põe os livros para facilitar as
leituras lithurgicas.

As estantes do côro fazem parte das alfaias religiosas; são de duas
especies: estantes _fixas_, collocadas geralmente no meio da capella-mór
e chumbadas no pavimento, ou com um pé tão pesado que se não poderia
facilmente mudar para outra parte, e estantes _portateis_. As primeiras
serviam para os chantres recitarem os officios; as outras para o diacono
e subdiaconos cantarem o Evangelho, a Epistola ou as lições sagradas.

_Observações preliminares_. Desde o VII e VIII seculos, e durante todo o
periodo roman, fizeram algumas vezes as _estantes fixas_ independentes
da tribuna. Estas estantes isoladas, estando destruidas presentemente,
eram quasi sempre de metal, e compunham-se, como tambem as do principio
do periodo ogival, d'uma aguia com as azas abertas, pousada sobre um
sóco. Muitas vezes a aguia, attributo do evangelista S. João, era
acompanhada de symbolos dos tres outros evangelistas.

_Estantes fixas collocadas no meio do côro_. As estantes do côro
destinadas aos chantres, são ordinariamente de latão e compõem-se d'uma
aguia assente sobre um pé em fórma de pilar ou de columna. Este pé
algumas vezes é consolidado por arcos-butantes, os quaes estão ornados
de arcaduras vasadas com rosaceas e ornatos variados, similhantes aos
que ornam as grinaldas dos tympanos das janellas ogivaes.

Nos antigos documentos a estante do côro é designada _aguia_, em latim
_aquila_, porque a maior parte das estantes, tanto do periodo ogival
como da renascença, têem a forma d'uma aguia. Muitas _estantes-aguias_
do XV seculo escaparam de serem destruidas, talvez pelo seu peso.
Algumas vezes a aguia é substituida por outros animaes, ou por homens e
anjos. As estantes de pelicanos, cujo uso foi introduzido no tempo do
periodo ogival, veiu a ser bastante commum na epocha do renascimento.

_As estantes moveis_. Estas estantes facilmente transportaveis, foram
empregadas durante o periodo ogival, quer para a leitura do Evangelho e
da Epistola, quer para as outras ceremonias do culto; eram geralmente de
ferro e poucas vezes de madeira. Estas estantes eram regularmente
formadas d'uma dupla dobradiça com o feitio d'um _X_, cujas extremidades
superiores ficam ligadas entre si por uma cobertura de couro sobre a
qual se põem os livros lithurgicos. Acontece todavia, principalmente nas
estantes moveis de madeira, que elle não é formado d'uma cobertura de
couro, mas sim de taboinhas postas no prolongamento de duas das quatro
extremidades superiores da dobradiça da estante.

_Livros do Evangelho e manuscriptos lithurgicos_. Continuou-se, durante
o periodo ogival, a _illuminar_ os textos dos livros santos.

No fim do XII seculo, isto é, no momento em que a ogiva tomou o logar da
_volta inteira_, fez-se uma revolução completa na arte de pintura. Os
miniaturistas da Europa Occidental do mesmo modo que os pintores das
vidraças e esculptores libertaram-se das tradicções byzantinas e romans,
para se applicarem principalmente á imitação da natureza. Este novo
genero nascido em França, como o estylo ogival, generalisou-se por todos
os paizes proximos.

A escola dos _miniaturistas_ do XIII seculo dilatou a carreira de suas
obras. Até esta epocha, as Biblias, os livros dos Evangelhos e os dos
psalterios tinham sido as unicas obras ornadas de estampas illuminadas;
depois as obras profanas da antiguidade classica, as dos padres, os
romances dos cavalleiros e as chronicas tiveram tambem illustrações
calligraphicas.

Proximo do meiado do XIV seculo, uma nova mudança teve a pintura em
geral, estendendo a sua influencia sobre todos os ramos d'esta arte. Ao
primor do desenho que traça os principaes contornos, esforçou-se o
pintor por ajuntar o modelado dos objectos no afrouxamento gradual dos
tons e na opposição das sombras e da luz. A começar d'esta epocha, o
colorido deu á figura, não sómente a côr, mas ainda a fórma e o relevo.

No XV seculo, a arte da pintura e do miniaturista, subiu em Flandres ao
mais alto grau de prosperidade, sob a influencia dos irmãos Hubert e
João Van Dyck, Thierry, Streerbout, Roger von der Weyden e Haus Memling;
em Portugal, Antonio e Francisco de Hollanda. Todos estes eximios
mestres não desprezavam empregar o seu tempo na illuminura dos
manuscriptos. O rei Filippe--o Bom--1419-1467--, tinha uma predilecção
notavel pela ornamentação dos manuscriptos, como tambem em Portugal
el-rei D. João II e D. Manuel[5], contribuiram singularmente para o
desenvolvimento d'este genero de trabalho.

Os pintores d'esta epocha applicam-se a reproduzir a belleza real que se
colhe da natureza, mais agradavel que uma belleza ideal; substituem de
alguma maneira, o realismo ao symbolismo dos seculos findos passados;
diligenciando representar com toda a verdade os minimos detalhes da
natureza, cogitam o modo de apresentar a mais exacta reproducção do
feitio e côr dos objectos.

_Capas dos livros dos Evangelhos_. Até ao IX seculo serviram-se
bastantes vezes de capas de marfim; do IX seculo ao XII, o marfim estava
misturado ao metal e ás pedras preciosas. Durante o periodo ogival,
abandonaram geralmente o uso do marfim, e o metal só ornado com riqueza,
sobretudo no XIII seculo, de esmaltes e joias, foi empregado nas capas
das Biblias, nos livros dos Evangelhos e nos lithurgicos. Salvo raras
excepções, eram cobertos de estofos, de couro, e algumas vezes de
madeira com esculpturas ou de chapas de prata em relevo[6].

_Thuribulos e naveta para incenso_. Os thuribulos do XIII seculo
compõem-se geralmente, como os dos seculos antecedentes, de duas
semi-espheras ôcas, as quaes juntas formam uma bola. A semi-esphera
inferior tem um pé que lhe serve de apoio, no qual se põe as brazas e o
incenso; vem a ser o verdadeiro perfumador. A semi-esphera superior, que
serve de tampa, está crivada de muitos orificíos para sahir o fumo do
incenso. Esta tampa que tem como remate muitas vezes uma torrinha com a
figura de homem ou de animal, é movediça: sóbe e desce ao correr de tres
ou quatro correntes prezas por uma extremidade do thuribulo e por outra
parte da mesma tampa atravez da qual passa uma cadeia que fixa o remate,
e facilita levantal-a ou abaixal-a como se quizer.

A fórma geral dos thuribulos do XIII seculo é conhecida, não sómente
pelos raros especimens em metal conservados até ao presente, mas tambem
pelas esculpturas e miniaturas contemporaneas, nas quaes se vêem anjos
ou clerigos thuriferarios.

Nos seculos XIV e XV, os thuribulos mudam de aspecto, apresentam poucas
vezes a fórma espherica e têem geralmente o feitio de diversas curvas;
tomando a fórma de torrinhas com telhado, janellas recortadas, etc. O
metal de que geralmente se serviam, era o latão; para os de melhor
qualidade empregavam a prata.

_Gomís_ ou _aquamaniles_. Os gomís designados tambem _aquamaniles_ (de
_aqua_, agua, e _manile_, vaso para deitar agua nas mãos) faziam parte
das alfaias ecclesiasticas e continham agua para as abluções das mãos,
durante as ceremonias religiosas. Empregavam-se tambem no uso civil para
a lavagem das mãos antes e depois das refeições. No fim do periodo roman
e durante todo o período ogival tinham as mais caprichosas e mais varias
fórmas. A maior parte apresentam a d'um animal real ou phantastico; a
agua é geralmente introduzida no gomíl pelo cimo, na cabeça do animal,
servindo de gargalo; a bocca ou o bico finalmente a aza é formada, quer
pela cauda do animal revirada sobre o lombo, quer por um lagarto ou um
dragão alado; algumas vezes mesmo a torneira está posta diante da
figura. Os animaes representados mais vezes são o leão, o cavallo, o
veado, o gallo, o dragão, a sereia e differentes passaros. Quasi todos
os _aquamaniles_ são de latão ou de cobre.

Alguns gomís de metal têem a fórma do busto de homem, de mulher e de
creança. Devemos tambem mencionar os gomis do XIII seculo apresentando a
fórma d'um prato côvo, não sendo diverso da bacia que servia senão para
pela existencia, sobre a borda d'um bico para sahir a agua sobre as
mãos.

No XI seculo principiou o uso de lavatorios collocados no meio das
sacristias. Havia-os de fórmas architectonicas, imitando mais ou menos
uma fortaleza ou uma torre; outros (e eram os mais communs),
compunham-se de vasos de bronze ou latão, de pequenas dimensões, tendo
uma grande aza e dois gargalos oppostos; para se lavar as mãos,
abaixava-se, empurrando de cima para baixo, um dos gargalos. O seu uso
durou até ao XV seculo.

_Pratos para offerendas_. Encontram-se em muitas egrejas grandes pratos
ou bacias de latão estampado, cinzelado e gravado, ornados de assumptos,
symbolos, brasões, folhagens e figuras geometricas. Estes pratos
designados _bacias de offerenda_, porque serviam e servem ainda para
receber as offertas dos fieis, principalmente as que se fazem durante as
missas para os defuntos, eram feitos no XV e XVI seculo nas officinas
dos fundidores de cobre em Augsbourg, Nuremberg e Brunswick. É preciso
advertir, que as bacias do XV seculo e do principio do XVI seculo,
apresentam os caracteres da decoração ogival, e que as do XVI e XVII
seculos apresentam ornatos do estylo da renascença.

Os assumptos e os symbolos, representados geralmente no centro do prato,
mais raramente sobre a borda do prato, são quasi sempre religiosos:
todavia vê-se tambem algumas vezes com o busto de _Cicero_, de sereias,
veados, cães, escudos com brazões, etc.

Inscripções ou legendas estão gravadas dentro d'um ou dois circulos
concentricos proximo da borda do prato, e repetem-se geralmente cinco
vezes. Entre essas legendas ha um grande numero que apresentam um
sentido facil de interpretar, por exemplo: _Got sei met vus, hiff Got
aves not, hiff Th_ (esu) _vnd Maria, van allen schriftvren het slodt myt
sonder Gost, eh wart_ (ou _gich wart_) _der in fridt, ch_ (ou _ich_)
_bart et zeit gelvek, gi seal recorden, gustate et benedicite Deus_;
outros pelo contrario (e estes são os que se encontram mais vezes)
compõem-se de lettras, as quaes reunidas não apresentam nenhum sentido;
taes são as seguintes: _rahe wishnbi et vrmtlife, vrmtielf_ ou
_lifevrmto_.

Parece bastante provavel que estas legendas, até ao presente
indecifraveis, foram os signaes ou as primeiras lettras de muitas
palavras formando uma divisa conhecida geralmente na epocha em que se
executavam estas bacias para offerendas.

_Representação da patena_. Em vez de se beijar a patena, recommendava o
apostolo S. Paulo aos primeiros christãos, um abraço fraternal. No XIII
seculo, por motivo de decencia e de respeito foi substituido em muitas
partes, pelo uso d'um _osculatorium_ o abraço porque julgaram então não
se poder praticar sem detrimento para a moral e distincção das
dignidades.

As regras lithurgicas fallam da patena, mas não determinam nem a fórma
nem a representação. Serviram-se pois para este fim indifferentemente da
cruz, relicarios, capas dos evangelhos, etc. Todavia a fórma que
prevaleceu, foi a d'um pequeno painel, feito com materias de estimação,
taes como ouro, prata, madeira rija ou marfim cinzelado, gravado,
esmaltado ou pintado, representando um assumpto religioso ou santo. Este
pequeno painel tem geralmente um cabo no lado posterior.

_Moldes ou ferros para hostias_. Serviam-se desde muito tempo, e
servem-se ainda hoje de ferros para coser o pão que symbolisa a
Eucharistia, imprimindo-se-lhe figuras e lettras. Estas hostias teem
regularmente a fórma circular. Muitas vezes os moldes representam
crucificação, o Cordeiro Divino, a simples cruz, o signal I H S, imagens
de santos e symbolos.

_Insignias e medalhas dos peregrinos_. As insignias de _romaria_
compõem-se, durante toda a idade média, de pequenas chapas
rectangulares, quadradas ou circulares, muitas vezes de chumbo fundido e
de obra vasada, outras de cobre ou prata impressa e aperfeiçoada ao
buril. Apresentam geralmente em relevo a imagem do santo para quem ella
foi feita. Distinguem-se de duas sortes: umas (e eram em maior numero),
cosiam-se sobre o ornato pertencente á cabeça e sobre o vestuario; as
outras, bastante raras, fixavam-se na extremidade do bordão ou arrimo do
peregrino.

Havia-as egualmente apresentando a fórma de medalhas ornadas, nas duas
faces, com imagem de santos e inscripções; muitas vezes são acompanhadas
de um carneiro ou argola servindo para se trazer ao collo, ou pegadas
quer no vestuario, quer nos objectos de devoção, como são os rosarios,
etc.

_Pequenos altares domesticos_. Encontram-se muitas vezes, nos museus
publicos e nas collecções particulares, pequenos _triptycos_ e
_polyptycos_ de marfim, metal ou madeira, esculpidos, pintados ou
esmaltados. Estes objectos, os fieis se serviam antigamente nas suas
habitações para satisfazer a sua devoção, teem muitas vezes a fórma de
um retabulo com portas, porém, de grandes proporções; sendo como os
outros retabulos, ornados de baixo-relevos, estatuas e pinturas.

_Baculos_. Como já explicamos, a voluta do maior numero dos baculos
romans era terminado por uma cabeça de serpente ou de dragão;
completava-os uma cruz com o Cordeiro Divino. Esta scena, symbolo do
triumpho de Redemptor alcançado sobre o demonio pelo sacrificio do
Calvario, veiu a ser raro desde o XIII seculo. Algumas volutas, sem
duvida, trazem ainda n'esse tempo na extremidade, uma cabeça de dragão
ou serpente, mas essa cabeça fica inteiramente separada ou invez já não
ao Cordeiro nem sobre uma personagem ou sobre uma scena religiosa. Em um
grande numero de baculos a cabeça da serpente é substituida por um ramo
de folhagens ou por uma flôr aberta.

Quando, proximo ao fim do XIII seculo, os detalhes de architectura
substituiram-se as peças de ourivesaria, e a decoração foi buscar aos
reinos animal e vegetal, real ou phantastico, os baculos mudaram
egualmente de aspecto. Ornaram-se então de nichos, estatuasinhas,
flechas e pinaculos. O nó principalmente, e tambem a hostia, ficaram
sobrecarregados com estes ornatos.

_Estofos preciosos_. Durante o periodo ogival, serviram-se muitas vezes,
para os vestuarios sagrados, de estofos preciosos, nos quaes os desenhos
da decoração eram feitos, _juntamente_ com o tecido mesmo, por meio de
uma trama de differentes côres, sendo depois urdido pela applicação de
bordados feitos com agulha. O uso dos pannos de raz para a decoração das
egrejas generalisou-se cada vez mais durante o periodo.

_Tecidos_. A arte de fabricar os tecidos de seda foi trazida da Italia
no XIII seculo. Os desenhos embellezadores que ornam bastantes vezes os
tecidos no XIII seculo e durante uma parte do XIV são geralmente
copiados sobre os estofos orientaes. As figuras symbolicas e os
assumptos pertencentes á historia do antigo e novo Testamento, que se
acham excepcionalmente nos tecidos sicilianos ou italianos antes do
meado do XIV seculo, apparecem frequentemente depois d'esta epocha, com
cercadura, ou não tendo este enfeite.

No XV seculo, a industria do tecido da seda desenvolveu-se cada vez mais
a Oeste e Norte da Europa. A Suissa, França e a Belgica, que possuíam,
depois do XIII seculo, alguns teares isolados para a fabricação da seda,
do veludo, e do setim, viram então os seus teares a multiplicar-se e
tomar consideravel incremento.

Em Flandres tambem se tinha alcançado, desde o XIII seculo, bastante
fama pelos tecidos preciosos, para os quaes os primeiros aprestos foram
fornecidos pela Inglaterra. De todos os estofos o mais estimado e de
preço fabricado em Flandres era o setim de _Bruges_.

_Bordados_. Nas bordaduras do XIII seculo, como nas pinturas e
esculpturas contemporaneas, o desenhador abandonou pouco a pouco as
tradicções byzantinas. Os gestos dos personagens perdem a sua expressão
archaica, as cabeças não são delineadas conforme typos convencionaes, as
pregas dos vestidos, em logar de serem comprimidas e paralellas, são
executadas com fidelidade; finalmente, as figuras teem muitas vezes a
presença curvada.

Desde o fim do XIII seculo, a arte de bordar, designada muito
distinctamente na idade média _pintura com a agulha, acupictura_,
attingiu a um subido gráo de prosperidade; desenvolvendo-se cada vez
mais durante o XIV seculo, e chegou ao seu apogeu no principio do XV
seculo. N'esta ultima epocha, tres paizes se distinguiram sobretudo pelo
talento e habilidade no acabamento dos bordados: foram a _Belgica_, a
_Prussia rhenal_ e a _Bourgogne_. Os dois principaes centros de
manufactura para os estofos bordados encontravam-se em Arrhas, em
_Flandres_ e em _Cologne_; a estas duas cidades se póde ajuntar em
segundo logar _Malines_, _Liége_, _Tournai_ e _Reims_.

_Pannos de Raz_. Chama-se panno de raz a _um tecido no qual os fios de
côr, enrolados sobre uma urdidura fixa vertical ou horisontalmente, faz
corpo juntamente, e produz combinações de linhas e tons similhantes aos
de pintura que se obtem com o pincel, e o mosaista com os cubos de
marmore ou de esmalte_. O panno de raz distingue-se do bordado em que as
figuras fazem parte integrante do tecido, em quanto os bordados são
simplesmente sobrepostos sobre um tecido já feito. Distingue-se por
outro modo, dos estofos tecidos de ouro e seda, porque constitue sempre
um trabalho manual, e não é obtido por um mechanismo representando sem
fim o mesmo padrão. Cada uma das producções do _panno de raz_ é uma obra
original.

Os fios com que o tecelão delinea as sua composições, seus symbolos e
ornatos, são o ouro, prata, seda e lã.

A arte dos pannos de raz era já conhecida no XI seculo. Antes do anno
1025, havia, em _Potiers_, uma fabrica de pannos de raz, cujos trabalhos
tinham sido muito apreciados, mesmo fóra de França. Os productos d'estas
officinas eram ornados de retratos dos reis, de imperadores, de figuras
de animaes, assim como de assumptos da biblia.

No XII seculo a Allemanha toma egualmente uma parte activa no
desenvolvimento do fabrico dos pannos de raz.

No XIV seculo, a arte do tapisseiro, posto que continuando a empregar o
mesmo fabrico technico do seculo precedente, progride como todas as
outras artes.

Desde o principio do XIV seculo a manufactura dos pannos de raz de
alto-liço prosperou em Paris, Bruxellas e Arrhas; depois foi introduzida
em muitas outras cidades de Flandres e do Brabante. No fim do XIV seculo
os pannos de raz de Arrhas principiaram a ter a primazia; devendo a sua
reputação á perfeição dos seus tecidos e á sua tintura. Desde esta
epocha, os pannos de raz de alto-liço foram designados, principalmente
pelos Italianos e Inglezes, sendo da fabrica de Arrhas, pelo nome de
_finos pontos de Arrhaz, e arazzi_.

O XV seculo foi a idade de ouro para os pannos de raz. Realisaram-se
então notaveis progressos na execução material. Os fios vieram a ser
cada vez mais finos, a proporção da seda e do ouro augmentaram
consideravelmente, os tintureiros inventaram graduação de côres novas,
emfim os tecelões aprenderam a combinar as côres com tal habilidade que
não podia ser nunca excedida. N'esta epocha os pannos de Arrhas eram os
mais estimados e por isso muito procurados.

_Vestimentas sagradas_. Durante toda a idade média, as vestimentas
sagradas, das quaes se serviam nos dias ordinarios, eram feitas de
tecido de lã, ou algumas vezes tambem de linho. Os estofos de seda
empregavam-se nas vestimentas ricas e preciosas.

A _casula_ conserva, até ao meado do XV seculo, a fórma que tinha
durante o periodo Roman, isto é, de um vestuario largo, comprimido á
roda do collo, cobrindo inteiramente os braços e caindo negligentemente
de todos os lados á roda do corpo. Da mesma maneira que precedentemente,
quasi sempre as estolas com bordaduras são comprimidas e estreitas,
representando assumptos religiosos. Na Italia, nos paizes meridionaes e
no meio dia de França, estas estolas são geralmente em numero de duas
postas verticalmente, uma por diante e a outra por detraz do peito; a de
diante fica com o feitio de um _tau_ T. Na Belgica, na Hollanda, na
Allemanha, e em Inglaterra, duas outras pequenas faxas saindo do peito
passam sobre os hombros e vão ter ao meio das costas, formando assim,
pela sua combinação com as estolas verticaes, duas cruzes cujos braços
ficam levantados com o feitio de Y.

As casulas com dupla cruz entraram em uso no norte da Europa até ao XV
seculo, epocha na qual uma mudança notavel se operou na fórma e
disposição das estolas. Primeiramente, estas ficavam com muito mais
largura; depois em toda a parte onde a dupla cruz com braços levantados
havia tido uso precedentemente, pozeram sobre o lado opposto da casula,
uma cruz latina [Símbolo], e sobre a frente uma columna.

No XIII e XIV seculos, sendo sempre estreitas, eram regularmente ornadas
com figuras geometricas ou pequenas folhagens simplesmente de decoração.
Quando no XV seculo se fizeram mais largas, representavam muitas vezes
imagens ou assumptos religiosos.

_A estola e o manipulo_ consistiam, durante o periodo ogival, em faxas
compridas e estreitas, quasi sempre ficando as extremidades um pouco
mais largas.

As estolas e os manipulos, geralmente de uma grande simplicidade, eram
feitos de linho, de lã ou de seda, acabando n'um bordado e franjas. Os
de ornamentos ricos eram por vezes bordados e apresentavam uma certa
analogia com as faxas de recamo d'ouro das casulas, que lhes pertenciam.
As suas extremidades não tinham ornatos com bordados symbolicos, que só
se usaram depois da primeira metade do XV seculo.

No principio o _pluvial_, em latim _coppa_, isto é, capote para
resguardo da chuva (_pluvia_) era usado sómente pelo clero inferior,
principalmente pelos chantres e mesmo por vezes pelos seculares, tomando
uma parte na celebração do culto. Foi sómente no XIII seculo que veiu a
ser commum para todas as ordens da hierarchia ecclesiastica, incluindo
mesmo o pontifice.

Serviam-se do pluvial, como se pratíca ainda hoje, nas procissões e em
todos os outros officios da missa; por exemplo, no canto solemne de
vesperas. O seu feitio é o mesmo da casula; sómente, em logar de ser,
como esta, inteiramente fechada de maneira a esconder todo o corpo, é
aberto na frente desde os pés até ao collo.

O pluvial da idade media tinha, sobre as costas, um capuz de ponta muito
comprida, com a qual se podia cobrir a cabeça. Nos pluviaes ricos as
orlas da abertura de diante, e tambem a orla inferior, estão cobertas de
faxas de estofo colorido, bastante estreitas e ornadas, principalmente
no principio do XIV seculo, sendo os assumptos religiosos feitos com
bordados. No XIV seculo as faxas veem a ser mais largas, e proximo da
mesma época, o capuz augmenta, ficando a sua extremidade redonda, e como
as faxas, ornada.

_Colchete do pluvial_. Prendia-se o pluvial sobre o peito com um grande
colchete coberto de medalhões em metal precioso, ornado de esmaltes ou
delicadamente cinzelado. Estes _medalhões colchetes_, em latim
_fibulae_, _morsus_, _monilia_ ou _pectoralia_, teem muitas vezes a
fórma de quatro folhas; ha tambem circulares, ovaes, e mesmo quadrados.
São geralmente ornados com assumptos religiosos ou com estatuasinhas de
santos. Acompanham-os, principalmente no XV seculo, a figura ajoelhada e
os brazões do doador.

A _alva_ e o _amicto_ conservaram as fórmas primitivas durante o periodo
ogival. Eram geralmente de linho, algumas vezes tambem de seda ou
brocado. Continuou-se a guarnecel-os de faxas rectangulares com recamo
de oiro, bordados ou tecidos vistosos. Estas vestimentas prendiam-se no
meio da orla superior do amicto; e sobre a alva nas extremidades das
mangas á roda do punho, por diante e detraz sobre a orla inferior
proximo dos pés, e algumas vezes tambem sobre o peito.

A _cintura_, da qual o sacerdote se serve para arregaçar a alva,
prende-se á estola em cruz sobre o peito; não teve nunca na idade média
a fórma de cordão que apresenta actualmente. N'essa época geralmente
consistia em um comprido cinto, especie de fita comprida de dois metros
e meio, com a largura de cinco a seis centimetros. Dá-se-lhe algumas
vezes o comprimento symbolico, por exemplo, do tumulo de Jesus Christo.

A _dalmatica_ é a vestimenta decima do diacono, a _tunicella_, a do
sub-diacono. Não existe, ha muito differença entre estas duas
vestimentas, posto que n'outro tempo a tunicella teve mangas mais curtas
e era mais comprida, porém menos ornada que a dalmatica.

Durante o periodo Roman e no principio do ogival, a dalmatica consistia
em um comprido vestido inteiramente fechado, com mangas e uma abertura
para passar a cabeça. Era enfeitada diante e detraz por duas faxas
verticaes com recamo de ouro ou de côr, descendo até a orla inferior.
Estas faxas, muito estreitas no XIII seculo, vieram a ser cada vez mais
largas desde o XIV seculo.

No XIII seculo, a dalmatica não era ainda aberta nos dois lados da orla
inferior até quasi á quarta parte do seu comprimento. No XIV e XV
seculos, estas aberturas augmentaram até meia altura do vestuario; tendo
então, do mesmo modo, toda a parte inferior da dalmatica, bordados de
faxas de côr ou as superiores de recamo de ouro.

_Mitras_. As mitras com dois bicos, o uso das quaes se tinha
generalisado no XII seculo, foram definitivamente adoptadas no XIII
seculo, como um ornamento episcopal e abbacial. Comparadas com as mitras
modernas, as primitivas eram muito baixas, a sua altura variava entre
0,20 a 0,25 centimetros.

As differentes partes de que se compõem as mitras são: 1.^o as peças
triangulares formando pela sua reunião o barrete; 2.^o as duas fitas
pendentes da mitra mais largas nas extremidades inferiores, ficando
prezas por detraz da mitra.

Havia na idade média duas qualidades de mitras: simples ou lisas, e com
bordaduras recamadas de oiro, designadas na latinidade da idade media
pelo nome _mitrae auriphry giatae_. Sobre estas ultimas as bordaduras
recamadas de oiro dispunham-se por tres maneiras: 1.^o verticalmente ou,
como dizem os livros lithurgicos, _en titre in titulo_; 2.^o
horisontalmente ou _in circulo_; 3.^o em titulo e em circulo juntamente.

No meiado do XIV seculo, os bicos da mitra são maiores. A maior parte
das mitras da ultima metade d'este seculo medem de 32 a 35 centimetros
de altura. Esta altura chega regularmente a 40 centimetros no seguinte.
N'esta ultima época tambem as orlas dos bicos são algumas vezes
guarnecidas com bordaduras recamadas de oiro, ou tendo uma especie de
renda de prata dourada similhando-se a folhas de repolho ou de crochetes
vegetaes.


*Abbadias e Mosteiros*


_Observações preliminares_. As partes principaes de que se compõem as
abbadias e os mosteiros da idade media são a egreja, o claustro, o
refeitorio, a sala do capitulo, o dormitorio, o aposento para o abbade e
para os hospedes, o celleiro, o palheiro, a prisão e as casas de
arrecadações. Estas differentes partes ficavam geralmente da mesma
maneira, principalmente nos conventos que observavam a mesma regra.

A egreja era sempre _orientada_, isto é, ficando a capella mór voltada
para o Oriente. No lado meridional da nave fica encostado o claustro, do
qual se entra para a egreja por duas portas collocadas nas extremidades
da galeria encostada á parede lateral da egreja: uma junto do alpendre,
outra na proximidade do cruzeiro. A galeria opposta, que fórma o lado
meridional do claustro, dá entrada para o refeitorio. A sala do capitulo
e o parlatorio occupam o rez-do-chão ao longo da galeria oriental, que
se liga por uma extremidade com o cruzeiro; no andar por cima está o
dormitorio, o qual communica com a egreja por uma escada conduzindo do
dormitorio ao transepte. As construcções do occidente do claustro
serviram primitivamente aos irmãos conversos, os quaes eram em grande
numero nas grandes abbadias do XII e XIII seculos. Porém, quando mais
tarde se supprimiu esta instituição, e se limitaram os irmãos conversos
ao numero estrictamente necessario para o serviço dos religiosos, ellas
foram destinadas para outros usos. Muitas vezes serviram para aposentos
dos hospedes, e uma parte foi transformada em celleiros e armazens.

As differentes Ordens religiosas distinguem-se na escolha do local;
quando pretendiam fundar uma nova abbadia, cada uma dava preferencia aos
sitios de mais predilecção. Os Benedictinos escolhiam geralmente os
sitios altos e as montanhas; os Bernardos, pelo contrario, gostavam de
se estabelecer nos valles sobre as margens dos ribeiros, como exprimem
estes dois versos:

    _Bernardus valles, montes Benedictus amabat,
    Oppida Franciscus, magnas Ignatius urbes_.

A similhança que apresentam a maior parte das abbadias cistercienses na
disposição das suas differentes fórmas é bastante notavel; quasi todas,
quando o accidentado do terreno o permittia, reproduziam, por assim
dizer, servilmente o plano das abbadias primitivas da Ordem de Cister;
plano typo adoptado para a construcção d'estas abbadias na Europa
occidental do XII e XIII seculos.

A egreja era muito vasta; a sua nave meridional ficava encostada ao
claustro, com as suas galerias para passeiar; a Leste do claustro está a
casa do capitulo; o parlatorio era o grande recinto onde se reuniam os
monges; no andar sobre este lado ficava o dormitorio e o refeitorio, e a
cozinha do lado da galeria meridional do claustro. O rez-do-chão era
destinado para reuniões durante o dia, e o andar superior para as de
noite; como se dizia na idade média, _domus conversorum_. O rio ou
ribeiro passava por baixo do refeitorio ou cozinha para levar o lixo de
toda a qualidade. Defronte dos aposentos dos irmãos conversos, havia um
grande pateo murado, no qual estava, na direcção de sudoeste, a porta da
entrada principal da abbadia. Temos em Portugal um famoso modelo na
antiga abbadia de Alcobaça.

As outras grandes ordens religiosas adoptaram muitas vezes, para os seus
mosteiros, disposições analogas.

As ordens de S. Domingos e S. Francisco, fundadas ambas no principio do
XIII seculo, estabeleciam-se regularmente nos grandes centros da
povoação, onde não achavam sempre espaço bastante vasto para se poderem
desenvolver á vontade e dispôr as differentes partes dos seus mosteiros
seguindo dados uniformes. É por esta razão que, em muitos casos, o plano
dos seus conventos differe sensivelmente da disposição tradicional
observada escrupulosamente pelos monges de Cister, mesmo, porém, com
mais liberdade pelos Benedictinos.

_Egrejas_. A planta das egrejas monasticas apresenta geralmente, como a
das cathedraes e das collegiadas, a fórma de uma cruz Latina. Muitas
vezes a capella-mór não é muito comprida. Foi então no XIII seculo que
na Europa occidental e central se pozeram as cadeiras no côro para os
frades, não sómente na capella-mór, mas tambem no cruzeiro, e mesmo em
uma parte da nave principal, como existia na egreja de Alcobaça.

As egrejas dos frades Dominicanos e dos Franciscanos não tinham
ordinariamente nem cruzeiro nem torre. No XIII seculo, os Dominicanos,
construiram em Paris, Augsbourg, Dresde e outras muitas cidades, egrejas
com esta disposição excepcional, ficando divididas por duas naves com um
unico renque de columnas. Encontra-se tambem esta disposição, porém,
raramente, nas egrejas das outras Ordens religiosas.

_Claustros_. Durante o periodo ogival, os claustros eram geralmente
construidos de abobada de barrete com nervuras, e communicando com o
pateo do convento por arcadas ogivaes, vasadas e separadas umas das
outras por contrafortes. Nas arcadas collocavam nos XIII, XIV e XV
seculos, trabalhos rendilhados em cantaria, similhantes aos feitios que
se viam nas janellas contemporaneas; e de que temos exemplos nos
edificios religiosos da Batalha e de Belem. Muitas vezes esses caixilhos
de pedra não tinham vidros; todavia, principalmente no Norte e Oeste da
Europa, vedavam os tympanos com vidros brancos ou de côres, a fim de dar
abrigo contra os rigores da temperatura a quem passeasse pelas galerias
do claustro.

Desde o XIV seculo algumas vezes, e bastantes no XV seculo, substituiram
nos claustros, as arcadas ogivaes pelo feitio de janellas com pinasios
de pedra similhantes aos das arcaduras ornadas, que se veem nos peitoris
das janellas inferiores nas egrejas do ultimo periodo ogival.

Fizemos notar, que as egrejas cathedraes e collegiaes tinham antigamente
um claustro, porque, do mesmo modo que os frades, os conegos viviam a
principio em communidade. Este uso, que principiou a não se seguir desde
o XIII seculo, persistiu não obstante em muitas partes até ao fim do
periodo ogival.

Quasi todos os claustros, grandes e pequenos, construidos na idade
média, possuiam um _lavabo_, _lavadouro_, tendo uma pia com uma fonte. A
fonte occupava, no principio, o centro do pateo do convento. Mais tarde
approximaram-a da galeria do refeitorio; ficando então collocada em
frente da entrada do refeitorio, ou em um dos angulos da galeria ao
longo d'elle. Os frades voltando do trabalho da lavoura, lavavam ahi as
mãos antes de se pôrem á mesa ou ir ás rezas.

_Refeitorio_. O refeitorio estava geralmente situado ao correr da
galeria meridional do claustro. Como já referimos, compunha-se d'uma
vasta sala traçada sobre um plano rectangular, abobadada em geral ou por
vãos descançando sobre um fuste de columnas. Por cima do claustro, havia
muitas vezes um andar pouco alto, servindo de celleiro para
abastecimento no inverno, com alimentos e fructas passadas.

Nos conventos dos Cistercienses, o refeitorio era sempre dividido em
duas naves por um renque de columnas, collocadas ao meio longitudinal;
além d'isto, ficava este renque perpendicular á galeria proxima do
claustro. No refeitorio dos frades de S. Bento, e em geral, em todas as
outras abbadias, o grande eixo corria parallelo á galeria do claustro, e
o renque das columnas muitas vezes não é representado.

Ao lado do grande refeitorio, quasi sempre a oeste d'elle, ficava a
cosinha, geralmente com uma grande chaminé quadrada.

_Casa do Capitulo_. No rez-do-chão ao correr da galeria oriental do
claustro era a casa do Capitulo, a casa para as visitas e a sala dos
frades. O dormitorio occupava o andar d'este lado uma escada conduzindo
directamente do andar superior ao cruzeiro do lado do sul, facilitava
aos frades descerem á egreja para os officios nocturnos sem se expôrem
ao ar exterior.

A casa do Capitulo, isto é, o logar onde os frades se reuniam sob a
presidencia do abbade, afim de tratarem dos negocios espirituaes e
temporaes do mosteiro, era edificado sobre um plano quadrado ou
rectangular com um ou muitos renques de pilares sustentando as abobadas
e as suas nervuras, dividindo-se em duas ou mais naves. Bancos de pedra
guarneciam as paredes em roda. Na Inglaterra dá-se frequentemente ao
plano das casas de capitulo a fórma circular ou polygona; e n'este caso,
uma unica columna central sustenta a abobada e as suas nervuras, como ha
em Westminster e em Lincoln.

_Parlatorio_. O parlatorio, _collocutorium_, era uma pequena casa entre
a do capitulo e a escada conduzindo ao dormitorio. Ali os frades tinham
licença de conversarem em voz baixa, quando relações indispensaveis da
vida commum o exigissem. Em todas as outras partes do mosteiro se devia
guardar o maior silencio.

Ao lado da escada proxima do parlatorio, havia um corredor pelo qual se
podia passar para o grande claustro e annexos da abbadia perto do côro
da egreja.

_Casa e dormitório dos frades_. A casa onde os frades passavam o dia,
que os _antigos_ designavam _domus fratrum_ e que os inglezes designam
ainda sob o nome de _fratres_, isto é, logar onde vivem os frades,
consistia n'um vasto espaço abobadado e occupava sempre o rez-do-chão,
na extremidade Sul do lado Oriental do mosteiro.

No andar da casa de que acabamos de fallar, encontrava-se o dormitorio
commum dos frades, pois a regra de S. Bento determinava que os frades
dormissem n'uma só casa, mas em camas separadas: _Monachi singuli, per
singula lecta dormiant; si potest fieri, omnes in uno loco dormiant_.

O uso das cellas, que havia em alguns raros mosteiros desde o XII
seculo, não veiu a ser commum senão na epocha do renascimento.

_Aposento dos irmãos leigos_. Todas as grandes abbadias benedictinas e
cistercienses tinham, no XII e no XIII seculos, um numero consideravel,
chegando a ter 300 a 400 leigos, designados nos necrologios com o nome
de _conversi_ ou _fratres ad succurrendum_. Estes irmãos, que não
entravam nas ordens sagradas, mas faziam profissão de religiosos,
destinavam-se, sob a direcção dos frades, aos trabalhos da agricultura e
ao exercicio de diversos officios. Habitavam o lado occidental dos
edificios monasticos, designados por esta razão casa dos leigos, _domus
conversorum_, e prolongava-se muitas vezes desde o portico da egreja até
muito álem do grande refeitorio.

Nos edificios cistercienses, a habitação dos leigos compunha-se
regularmente, no rez-do-chão, d'uma só e vasta casa abobadada, dividida
em duas naves por um renque de columnas; e no andar por cima, de uma
casa do mesmo tamanho da inferior, coberta as mais das vezes por um
telhado tendo o madeiramento visivel na parte interna.

_Casa abbacial_. Originariamente o aposento do padre abbade consistia
n'uma simples cella. D'ahi a pouco, todavia, o aposento do chefe do
mosteiro veiu a ser uma construcção importante; e viam-se muito
raramente, na idade média, os abbades contentarem-se com o dormitorio
commum ou uma simples cella. A começar do XIV seculo, e principalmente
na epocha do renascimento, as casas abbaciaes vieram a ser muitas vezes
verdadeiros palacios, constando d'uma capella particular, grandes salas,
pateos, cavallariças, jardins com terraços, etc.

_Aposentos para hospedes_. Todas as abbadias tinham uma habitação
reservada ou uma parte do proprio edificio para hospedar as pessoas que
visitavam os frades. No principio, esta habitação estava sempre a pouca
distancia da porta principal afim de evitar distracção para os frades do
convento: como ha um bello exemplo no extincto mosteiro de Alcobaça.

As abbadias, que foram em todos os tempos casas de caridade, possuiam
tambem suas esmolerias destinadas a dar habitação e sustento aos pobres
e peregrinos. Eram situadas na visinhança da entrada do convento.

_Celleiros_. Nos seculos XI e XII, as abbadias applicaram-se activamente
ao surribamento dos terrenos incultos; os trabalhos campestres eram de
certo modo, a sua occupação principal. Foram as Ordens de Cister e de S.
Bernardo que prestaram assignalados serviços á agricultura.

As abbadias não faziam colheita sómente do producto das suas proprias
explorações agricolas; cobravam tambem o dizimo em muitos sitios e
recebiam em genero o pagamento dos rendeiros. Precisavam portanto vastos
celleiros e armazens muito grandes para recolher, no tempo da ceifa, os
cereaes que recebiam por esses differentes titulos.

Nos conventos cistercienses o celleiro formava, no principio do periodo
ogival, um edificio muito vasto, edificado sob um plano rectangular. Era
algumas vezes abobadado e dividia-se em duas naves por um renque de
columnas para maior solidez, servindo o andar para os cereaes. Outras
vezes compunha-se de tres naves separadas por dois renques de pilares ou
prumos de madeira para sustentar o madeiramento sem precisão de
abobadas.

_Officinas_. Nos XII e XIII seculos havia em cada abbadia, alguns leigos
ajudados muitas vezes por seculares exercendo os officios necessarios
para a conservação do edificio e para o fabríco dos pannos, couros e
instrumentos aratorios. Empregavam um certo numero de alveneos,
ferreiros, carpinteiros, fabricantes de pannos, tanoeiros, etc.; as
officinas estavam geralmente collocadas aos dois lados do pateo situado
entre a porta da entrada principal do convento e a habitação dos leigos.

A maior parte das abbadias possuiam tambem seu moinho e fabrica de
cerveja.

O desenvolvimento extraordinario dos estabelecimentos religiosos durante
as suas culturas e explorações ruraes motivou a construcção de curraes
espaçosos. Encontravam-se tambem em todas as abbadias pateos para aves.

Em propriedades importantes situadas a alguma distancia da abbadia,
estabeleciam-se muitas vezes grandes herdades, sendo a sua exploração
confiada a alguns leigos sob a direcção d'um frade. Compunham-se d'um
corpo de casas situadas em roda d'um pateo quadrado, as quaes tinham
communicação só do lado d'elle. Além d'esta habitação, curraes, celleiro
e outros edificios necessarios para o serviço da exploração, havia
n'estas herdades, uma capella onde os leigos assistiam aos officios
religiosos.

_Celleiros_. Dá-se o nome de celleiro aos armazens onde se conservam os
mantimentos de todo o genero. O frade encarregado de vigiar o
abastecimento tinha o nome de _celleiro_, _cellerarius_ e _collarius_,
mudado mais tarde, por algumas ordens religiosas, no de _procurador_,
_procurator_. Este logar passava por um dos mais importantes nas
abbadias.

_Prisões_. Na idade média, as abbadias, universidades e algumas vezes os
cabidos possuiam prisões para encarcerar os membros da communidade que
se tivessem tornado criminosos de delictos ou insubordinação para com os
superiores.

Na qualidade de soberania, as abbadias, universidades e cabidos gosavam,
nos territorios que lhe pertenciam, o poder superior de justiça, e
tinham prisões para encarcerar os seus subditos seculares criminosos. As
prisões das abbadias ficavam a uma certa distancia dos edificios da
habitação dos religiosos.

_Cartuchas_. As cartuchas, cuja origem vem dos ultimos annos do XI
seculo, apresentam disposições notavelmente differentes das cellas das
abbadias. As principaes differenças que se observam, são: grandissimo
comprimento dos claustros; numerosas habitações inteiramente separadas,
para uso dos religiosos, as quaes se compunham sempre de dois ou tres
quartos e d'um pequeno jardim, com uma porta dando entrada para a
galeria do claustro.

Quasí todas as cartuchas tinham dois claustros unidos.

_Mosteiros para mulheres_. As disposições das differentes partes dos
mosteiros para mulheres apresentam a maior analogia com os das abbadias
para homens. Á roda do claustro ergue-se a egreja, a casa do capitulo
com dormitorio no andar superior, o refeitorio e os outros aposentos. As
escolas exteriores, que havia ás vezes nos conventos de homens, como por
exemplo dos frades Agostinhos, as casas para hospedes, peregrinos e
viajantes, faltavam nos conventos das mulheres, porque toda a relação
com o exterior lhe era prohibida.

_Os conventos de recolhidas_ consistiam em casas particulares e communs,
situadas em um recinto inteiramente fechado, á roda de uma egreja
isolada de todos os lados. Sectarias de _Bégard_, partidistas de uma
perfeição extrema que permittia todos os excessos de devoção e que fôra
adoptada no III seculo. As recolhidas tinham o nome de Beatas.

_Hospitaes_. Os hospitaes da idade média differem absolutamente dos
hospitaes modernos. Os do XII e do XIII seculos compunham-se sempre, de
uma extensa casa onde estavam as camas para os doentes, de uma egreja ou
capella contigua a esta casa e communicando com ella, de um aposento
para os enfermeiros, e de algumas casas para serviço. Por causa da
hygiene ficavam geralmente situados nas proximidades da porta da cidade
ou sobre a margem de um rio.


*Iconographia do periodo ogival*


_Observações preliminares_. As representações iconographicas tão
variadas e tão abundantes de symbolismo, que se encontram em grande
numero sobre os monumentos e alfaias religiosas das epochas Roman e
Ogival, eram geralmente projectadas e imaginadas, não pelo obreiro ou
artista que executava o objecto, porém, por um padre, frade ou secular
litterato.

_A aureola_. A aureola ficou em uso como signal iconographico durante
todo o periodo ogival. _Crucifera_ pertence exclusivamente ás pessoas da
Santissima Trindade; simplesmente _circular_ é attributo caracteristico
dos Santos. A sua fórma manteve-se geralmente a mesma que era antes,
salvas algumas modificações em certos paizes, mas apenas no termo do
periodo ogival.

No fim do XIV seculo, não sómente os Santos, os Apostolos e Nossa
Senhora, mas tambem os anjos, assim como o Padre Eterno e Jesus Christo
ficaram privados d'este attributo caracteristico. Se a aureola por acaso
apparece ainda resplandecendo alguma imagem, foi porque o artista,
luctando contra a moda, commetteu archaismo. Um sem numero de monumentos
que datam d'esta epocha e chegaram até á nossa, apresentam _sem aureola_
as imagens divinas, angelicas ou sanctificadas.


*Representação da Santissima Trindade*


Na epocha ogival, serviam-se ainda algumas vezes do baptismo de Jesus
Christo para representar a Santissima Trindade. Como no periodo Roman,
dava-se ainda, durante o periodo ogival, a fórma humana ás tres pessoas
Divinas, ou pelo menos ás duas primeiras, pois o Espirito Santo
continuou a ser frequentemente symbolisado por uma pomba. As tres
pessoas Divinas continúam a ser representadas da mesma fórma até ao fim
do XIV seculo. Mais tarde o Padre Eterno teve a figura de um ancião, o
Filho de Deus a de um homem de trinta a trinta e cinco annos, e o
Espirito Santo a de um adolescente de doze a dezoito annos. Ao Padre
Eterno dá-se então o distinctivo de um globo, uma Cruz de resurreição ao
Filho, e um livro ao Espirito Santo. Finalmente, ainda perto da mesma
epocha, representa-se o Padre Eterno, e mesmo algumas vezes o seu Filho,
de papa ou de imperador, com a pretensão de expressar, por assim dizer
materialmente, o seu supremo poder, achando-os revestidos das insignias
das duas maiores auctoridades conhecidas sobre a terra.

Encontram-se tambem, no fim do periodo ogival, dois symbolos da
Santissima Trindade, consistindo em figuras geometricas, o triangulo e
tres circulos entrelaçados. Na epocha do renascimento, costumavam muito
a inscrever n'um triangulo algumas vezes um olho, outras o nome de
Jehovah.


*O crucifixo e a crucificação*


No XIII seculo, epocha designada _do soffrimento_, ou da _realidade_,
principia-se a representar Jesus Christo na Cruz. O corpo do Redemptor
curva-se ou mais depressa retorce-se de uma maneira bastante
desagradavel; os braços não ficam na sua posição horisontal, pois as
espaduas descem sensivelmente abaixo do ponto de união das mãos, de modo
a figurar os esforços naturaes produzidos por um corpo humano suspenso
por meio de cravos; os pés sobrepostos afastam-se de pessima posição,
muitas vezes mesmo fazem encruzar as pernas; finalmente a cabeça de
Christo, moribundo ou sem vida, está quasi sempre inclinada sobre o
hombro direito, isto é, para o logar onde se vê a Mãe de Jesus e tambem
algumas vezes a personificação da Egreja.

Nas crucificações pintadas e esculpidas do XV e XVI seculo, a cruz do
Redemptor e as dos ladrões, muitas vezes bastante altas e de diminuta
grossura; assim como a travessa horisontal da cruz do Christo tem um
grande comprimento, em quanto que a extremidade que tem o titulo, sobe
apenas ao ponto de intersecção das duas travessas.

Desde os primeiros annos do XIII seculo, principiou-se com timidez
primeiramente a supprimir o _suppedaneum_ e a pregar á cruz, por meio de
um unico cravo, os dois pés sobrepostos do Redemptor; porém, depois de
algum tempo, o emprego de tres cravos veiu a ser quasi tão commum como o
de quatro; e nos seculos XIV XV foi o unico empregado.

O Christo crucificado traz ainda a aureola no XIII seculo. A corôa de
espinhos, quasí desconhecida antes, apparece de tempos a tempos no XIV
seculo. No seculo seguinte encontra-se frequentemente.

No XIII seculo, a representação da crucificação foi ainda algumas vezes
reproduzida com todas as personagens e accessorios historicos e
allegoricos que acompanhavam precedentemente e que já temos descripto; o
mais das vezes, todavia, não se conservam senão alguns. Os que se vêem
geralmente são Nossa Senhora e S. João, o sol e a lua. Os dois ladrões,
a egreja e a synagoga raro apparecem.

_Nossa Senhora e S. João_. Durante o periodo roman, Nossa Senhora e o
discipulo mais amado são representados com uma attitude de paz, erguendo
geralmente os braços para o Redemptor ou occultam o rosto em signal de
pezar. No XIII seculo, e mesmo durante uma parte do XIV seculo,
conservam esta attitude estavel e digna. Mais tarde, o gesto que se lhe
attribue exprime já uma dôr vulgar e natural.

No XV seculo, e algumas vezes já no XIV seculo, os artistas christãos
procuram produzir, na alma do espectador, sentimentos de ternura e de
compaixão.

Para este effeito representam Nossa Senhora desmaiada nos braços das
duas santas mulheres que a amparam. Os exemplos d'este _deliquio_,
encontram-se na Italia desde o XIII seculo.

_O Sol e a Lua_. Durante o periodo ogival, o Sol é figurado geralmente
por um disco radiante, e a Lua por um simples quarto crescente.

_A Egreja e a Synagoga_. Como já explicámos, a Egreja e a Synagoga eram
personificadas, durante o periodo roman, por simples mulheres trazendo
os respectivos attributos. Depois do meiado do XII seculo, essas
mulheres representavam rainhas. A que symbolisava a Egreja, sempre
collocada á direita de Jesus Christo, traz uma corôa, e levanta a cabeça
com uma expressão de orgulho; as mais das vezes, tem n'uma das mãos o
calix, e na outra uma cruz de haste comprida ou um pequeno modelo de uma
egreja.

A Synagoga, pelo contrario, tem uma corôa que lhe pende da cabeça e um
estandarte cuja haste se quebrou entre as suas mãos; deixando escapar as
taboas da Lei, e tendo os olhos vendados por uma faxa ou por um dragão
que se lhe enrosca á roda da testa.

_Os dois ladrões_. Os ladrões nas mais antigas crucificações, apparecem
de tempos a tempos durante o periodo ogival; teem os musculos encolhidos
até a contorsão, e as mãos, não pregadas sobre a cruz, mas ligadas ás
costas de maneira a deixar passar, pelo centro, a travessa horisontal do
instrumento do seu supplicio. No fim do periodo ogival, encontram-se de
novo representados os ladrões, principalmente nos retabulos de madeira
de obra de talha da escola hollandeza.

_Imagem de Nossa Senhora_. _Nossa Senhora com o Menino Jesus_. Durante o
periodo ogival, o _grupo historico_ de adoração dos reis magos, que se
vê sobre alguns pequenos _diptycos_ ou _triptycos_, de marfim, onde se
vê, ao mesmo tempo, a crucificação e outras scenas tiradas da vida de
Jesus Christo. N'esta representação os reis magos trazem sempre na
cabeça a coroa real.

No XIII seculo, encontra-se ainda frequentemente Nossa Senhora
_assentada_ em uma cadeira ou throno, tendo sobre os joelhos o Menino
Jesus, o qual deita a benção com a mão direita e na esquerda tem um
livro ou o globo terraqueo.

Já muitas vezes no XIII seculo, e mais tarde quasi sempre, Nossa Senhora
está de pé e com o Menino Jesus no braço esquerdo. Durante a primeira
parte do periodo ogival, a sua posição é mais ou menos curvada.

Em quanto aos caracteres que apresentam as imagens de Nossa Senhora
assentada ou de pé nos differentes monumentos do periodo ogival,
pódem-se resumir nos termos seguintes. Nunca o grupo de Nossa Senhora
com o Menino Jesus foi mais ideal que no XIII seculo; mal se approxima o
XIV seculo, descuida a sua bella composição poetica para adoptar a
realidade primeiramente e depois descahir na vulgaridade até á rudeza.

No fim do XII e no principio do XIII seculo, póde-se dizer que Nossa
Senhora não apparece já com o Menino Jesus: esta representação seria
muito vulgar e Nossa Senhora assemelhar-se-hia a qualquer mãe que
tivesse o seu filho ao collo; mas então a Santa imagem o tem _junto de
si_. O Menino Jesus traz o globo do mundo na mão esquerda e deita a
benção com a mão direita; além d'isso está completamente vestido, é já
crescido, posto que ainda menino; é o Deus-Homem, mais depressa que
Homem-Deus. No fim do XIII seculo, Nossa Senhora principia a ser mais do
que a guarda de seu Filho como fazem todas as mães mortaes! Jesus está
ainda vestido, abençôa trazendo um livro ou um globo; porém o vestuario
é menos largo e mais curto, o livro menos volumoso, o globo mais
pequeno.

_Scenas tiradas da vida de Nossa Senhora_. Mencionaremos as tres
principaes:

A _Annunciação_ é quasi sempre representada da mesma maneira. Nossa
Senhora está de joelhos sobre um genuflexorio no momento em que apparece
o Anjo. Entre a imagem e o Anjo está um vaso com a flôr de liz aberta.
Muitas vezes S. Gabriel tem n'uma haste esta flôr ou um sceptro; por
vezes traz na mão uma bandeirola com a inscripção: _Ave Maria_. Um raio
luminoso cae sobre a cabeça de Nossa Senhora, ou então, o Espirito
Santo, sob a fórma d'uma pomba, descança sobre a imagem da Virgem Maria.

_A morte de Nossa Senhora_ é quasi sempre representada da maneira
seguinte: Nossa Senhora está deitada sobre um leito rodeada pelo seu
Divino Filho e pelos apostolos. Jesus traz no braço a alma de Nossa
Senhora, representada por uma creancinha. Os apostolos trazem muitas
vezes um livro com figura iconographica.

_A coroação de Nossa Senhora_ faz-se umas vezes por Jesus só, outras por
tres pessoas da Santissima Trindade; outras ainda vê-se Nossa Senhora
com a corôa na cabeça, sentada sobre o mesmo throno em que está o seu
Divino Filho, o qual se lhe abraça ao peito.

Deixariamos incompleta a historia iconographica de Nossa Senhora, não
mencionando aqui a _Arvore de Jessé_, que se vê tantas vezes desde o XII
seculo. Jessé adormecido serve de alguma maneira de raiz ao tronco
mysterioso, o qual sáe quer do seu peito, quer de sua bocca, quer do seu
cerebro. Os ramos d'este tronco separando-se, trazem na extremidade um
dos antepassados do Redemptor; no cimo, uma flôr desabrocha e serve de
apoio a Nossa Senhora, algumas vezes só, outras tendo nos braços o seu
Divino Filho. As mais das vezes a arvore de Jessé complica-se, entre
cada ramo está collocado um propheta com um phylateria mostrando a
prophecia de que é auctor, e que se refere á vínda de Jesus Christo.
Olhando para a extremidade d'esta arvore, mostra com o dedo onde deve
repousar o Espirito Santo. No Oriente, não se limitam unicamente a
intercalar os prophetas no meio dos ramos, ajuntam-lhe o divino
_Balaam_, e os sabios da Grecia com as suas maximas. O XV e XVI seculos
produziram um grande numero de arvores de Jessé.

_Os Apostolos e os Evangelistas_.--_Apostolos_. Jesus Christo escolheu
doze apostolos á frente dos quaes collocou S. Pedro. Depois da morte do
Redemptor, o traidor Judas ficou substituido por S. Mathias. Além
d'estes doze apostolos, que constituem a congregação apostolica assim
chamada, deu-se tambem o nome de apostolos a alguns outros santos que
haviam tomado uma parte activa e vasta na fundação da Egreja christã.
Tal foi S. Paulo, convertido milagrosamente no caminho de Damasco, elle
o grande promotor da conversão dos pagãos e appellidado, por esta razão,
o apostolo dos gentios; taes foram ainda S. Barnabé, S. Lucas e S.
Marcos, unicos discipulos, os quaes pelas suas prédicas, e, os dois
ultimos tambem, pelos Evangelhos que compozeram, poderosamente
contribuiram para a propagação da doutrina de Christo.

Como S. Paulo figura quasi sempre entre os apostolos quando se
representam reunidos em numero de onze, resulta que se supprime
geralmente um; as mais das vezes é S. Mathias, o successor do traidor
Judas, algumas vezes tambem S. Judas ou qualquer outro apostolo.

Até ao XIII seculo, os apostolos, á excepção de S. Pedro e S. Paulo, não
tinham nenhum attributo caracteristico pelo qual se podessem distinguir
uns dos outros. Representavam-se todos de uma maneira uniforme, com um
livro ou um rolo de papel na mão. Depois do XIII seculo, ficam
geralmente caracterisados pelos instrumentos presumidos do seu martyrio;
porém, como o genero do supplicio que soffreram não é muito bem
determinado para todos, torna-se por vezes difficil designar com certeza
o nome de alguns d'elles: todavia o que os caracterisa ordinariamente é
o seguinte:

S. Pedro traz as chaves ou por vezes a Cruz abatida, instrumento do seu
supplicio; S. Paulo, a espada com que lhe cortaram a cabeça; S. João, o
calix envenenado do qual saiu a morte sob a fórma de um dragão; Santo
André, com a Cruz em fórma de X, e que tem o seu nome; S. Jeronymo, a
espada, ou as mais vezes, o bordão e o vestido de peregrino guarnecido
de conchas; S. Filippe, a cruz com haste comprida; S. Bartholomeu, um
grande cutello do qual se serviram para o esfollar, e algumas vezes
tambem uma cruz; S. Matheus, um machado, uma espada ou uma lança; S.
Simão, uma serra; S. Judas, uma cruz ou um livro; S. Thiago, um bordão;
S. Thomaz, uma grande pedra e por vezes ao mesmo tempo uma lança;
finalmente S. Marçal, uma picareta ou um alfange.

_Evangelistas_. Os Evangelistas continuaram a ser representados da mesma
maneira que precedentemente, quer seja com a fórma humana, quer seja
pelos symbolos dos quatro rios do Paraizo, quer seja por quatro figuras
aladas.

Já indicámos o logar respectivo que devem sempre occupar os animaes
symbolicos nos quatro angulos de um quadrado ou nas extremidades dos
quatro braços da Cruz. Esta regra ficou em vigor durante o periodo
ogival.

_Scenas diversas_. Seria impossivel indicar, mesmo resumidamente, todas
as scenas representadas pelos pintores e esculptores christãos da idade
média. Mencionaremos sómente as quatro principaes, e que se veem mais
vezes.

_O Dia de Juizo_. Esta scena encontra-se principalmente: 1.^o _no
principio do periodo ogival_, esculpida nos tympanos dos portaes
principaes das abbadias, cathedraes, egrejas das parochias e mesmo nas
capellas; 2.^o _no fim do mesmo periodo_, pintada na nave principal das
egrejas por cima do arco triumphal.

Para dar uma ideia exacta da maneira como esta scena é representada nas
principaes cathedraes francezas, faremos a descripção do Dia de Juizo,
que se vê no portal central da Sé de Paris. Este assumpto é um dos mais
bem compostos. A verga da porta está inteiramente occupada por figuras
representando diversos misteres saindo dos seus tumulos, despertadas por
dois anjos, os quaes, de cada lado, tangem trombeta. Todas estas
personagens estão vestidas; ahi está um papa, um rei, guerreiros,
mulheres e um preto. Na zona superior, está ao centro um anjo que peza
as almas; dois demonios tentam fazer pender um dos pratos para o seu
lado. Á direita de Jesus Christo estão os escolhidos, todos vestidos de
compridas vestimentas e coroados. Estes escolhidos são representados sem
barba, jovens e risonhos, olhando para Jesus. Á esquerda o demonio
empurra uma multidão d'almas agrilhoadas vestidas com os fatos do seu
mister. As expressões d'estas figuras são indicadas com superior
talento: o terror, o desespero assignalam-se nas suas feições. Na parte
superior está, ao centro Jesus Christo, representado semi nu, que mostra
as suas chagas; dois anjos em pé, á direita e á esquerda, têem os
instrumentos da Paixão; depois, estão de joelhos, implorando o
Redemptor, Nossa Senhora e S. João. As curvaturas do portal do lado dos
condemnados estão occupadas, na parte inferior, por vistas do inferno, e
do lado dos escolhidos, por anjos e patriarchas, entre os quaes se vê
Abrahão colhendo as almas no seu regaço; depois os escolhidos em grupos.
Esta esculptura tão notavel é da era de 1210 a 1215, e estava
inteiramente pintada e dourada. Ha a mesma representação nas cathedraes
de Chartres, Amiens, Reims e Bordeus.

O inferno é quasi sempre figurado por uma bocca enorme de monstro
lançando chammas, no meio das quaes os démos, armados de grandissimos
harpeos, abysmam os condemnados. Por vezes tambem é representado o
inferno por uma grande caldeira na qual os démos precipitam as almas dos
perversos; e, n'este caso, um demonio armado de um folle activa o fogo
da caldeira.

A scena _de se pezar as almas_ faz geralmente parte do Juizo final, e é
quasi sempre representada da mesma maneira. O archanjo S. Miguel segura
a balança: em um dos pratos está uma alma humana figurada por uma
creança nua; emquanto ao outro, com o pezo que deve ter a alma do
innocente, afim de ser admittido no paraizo, Satanaz procura que elle se
incline para o seu lado. Esta scena, cujo fim era evidentemente inculcar
aos ignorantes a ideia de dar conta a Deus depois da nossa morte, está
representada nas miniaturas dos manuscriptos, e mesmo nas gravuras em
madeira que ornam alguns livros impressos no fim do XV e no principio do
XVI seculo.

_Missa designada de S. Gregorio_. Este assumpto encontra-se muitas vezes
nos paineis e nas miniaturas do XV seculo. O Santo papa diz a missa, e
Jesus Christo apparece-lhe em vida, em pé sobre o altar, e á roda estão
os instrumentos da Paixão. Traz os estigmates nos pés e nas mãos, e
deixa saír do lado o sangue da chaga.

_Alma humana_. Quando os artistas da idade média representam uma pessoa
moribunda, indicam sempre a alma do justo que acaba de saír do corpo,
por uma creancinha nua trazida nos braços de Nosso Senhor.

_Sibyllas_. A representação dos prophetas tem-se ás vezes ajuntado ás
sibyllas, que se reputa haverem predito o nascimento, a vida, a morte, e
a resurreição de Jesus Christo. No XIII seculo, começou-se a fazer
figurar em alguns monumentos, principalmente a sibylla do _Dies irae_.

As doze sibyllas são: 1.^a A Sibylla da Persia, _percicae_, que tem na
mão uma lanterna, porque ella annunciou a vinda do Messias; bastantes
vezes o sol brilha por cima da sua cabeça. 2.^a A de Libya, _libicae_,
que tem um brandão acceso e prediz o Redemptor como a luz do mundo. 3.^a
A de Delphos, _delphicae_, que tem na mão uma corôa de espinhos, porque
prophetisou as mortificações de Jesus Christo. 4.^a A do Mar Vermelho ou
de Erythrea, _erythracae_, uma das mais celebres, que havia predito a
ruina de Troyes; era a prophetisa das vinganças divinas; traz uma espada
nua. 5.^a A de Cumas, _cumana_, egualmente muito citada, tem um
presepio, porque annunciou o nascimento de Christo em uma manjadoura.
6.^a A de Samos, _samia_, traz uma corôa de espinhos como a de Delphos,
e um caniço, porque prophetisou a Paixão. 7.^a A Cimmerianna,
_cimmeria_, prophetisou a crucificação, e por esta razão traz uma cruz
da paixão. 8.^a A de Tivoli, _tiburtina_, tem na mão uma vara, por haver
annunciado a flagellação do Redemptor. 9.^a A de Phrygia, _phrygia_,
traz uma cruz de resurreição, no cimo da qual fluctuam tres bandeirolas
encarnadas. 10.^a A de Hellesponto, _hellespontica_, tem por attributo
uma rozeira florida, ou então uma cruz, porque annunciou algumas
circumstancias da Paixão. 11.^a A Europa, _europaea_, tem um alfange,
porque predisse a degolação dos innocentes. 12.^a Finalmente, a Sibylla
Agrippa tem a vara como a de Tivoli.



CAPITULO VI

Periodo da Renascença


_NOÇÕES PRELIMINARES_


Não nos demoramos muito sobre as differentes phases da arte na epoca da
renascença, mais apropriadamente moderna do que antiga; e que, por
conseguinte, não pertence ao dominio da archeologia.

Chama-se _renascença das artes e das lettras_ ao retrocesso para a arte
classica antiga e para as litteraturas grega e latina. A renascença das
artes estendeu-se não sómente á architectura, mas a todas as artes de
desenho. A reacção favoravel para a architectura grega, romana ou
classica, produziu-se primeiramente na Italia, onde nunca o estylo
ogival tinha vigorado summamente, nem dominado só com poder absoluto.

Proximo ao principio do XVI seculo, a architectura néo-classica transpoz
os Alpes, e passou successivamente á França, Hespanha, Portugal,
Belgica, Allemanha e Inglaterra. Os paizes mais afastados do
renascimento, foram tambem os ultimos a adoptarem os seus principios
architectonicos.

Na França como na Belgica o progresso do novo estylo foi rapido, tendo
apparecido quasi ao mesmo tempo.

O retrocesso tão rapido e tão universal para as fórmas da arte classica,
foi motivado em grande parte por um desejo de novidade, e por uma
reacção contra a architectura ogival. Nota-se, realmente, que em
architectura, mais que em qualquer outra arte, o gosto é sempre movido
para a variedade; e é isto que explica como se póde dizer com verdade,
que a historia da architectura offerece uma continuação de transições
sem repouso. A esta causa principal vieram ajuntar-se muitissimas causas
secundarias, taes como a reacção que se operou nos XV e XVI seculos, a
protecção aos estudos gregos e latinos, e a invenção da imprensa, que
concorreu tão admiravelmente para a diffusão das obras primas da
litteratura e da arte antiga, pelas quaes se tinham apaixonado.

Até ao meiado do XVIII seculo, a renovação das fórmas antigas fez-se
exclusivamente conforme os modelos antigos de Roma e de Italia, modelos
quasi todos não satisfazendo a respeito da conformidade artistica. Foi
sómente n'esta epocha que se principiou a estudar os monumentos da
melhor epocha ainda conservados em Athenas e na Grecia.

Houve, entre o estylo ogival e o do renascimento, um periodo de
transição, durante o qual se notou muitas vezes, no mesmo monumento, uma
mistura, uma fusão de fórmas particulares a cada estylo. Portanto
encontram-se edificios, os quaes, entre os detalhes melhor
caracterisados do estylo ogival do XVI seculo, apresentam ornatos, taes
como medalhões, folhagens e arabescos, copiados dos monumentos da Roma
antiga. Outras vezes, janellas em ogiva são compostas de pinasios com os
perfis no gosto da renascença. Finalmente, ás vezes as abobadas
pendentes, os pinaculos e os campanariosinhos estão cheios de ornatos
imitados dos edificios da antiguidade.


*Caracteres da architectura da Renascença*


_Comêço_. A architectura da renascença seguiu os mesmos principios
fundamentaes que a architectura classica, isto é, as cinco ordens
greco-romanas.

Os primeiros architectos da renascença inspiram-se unicamente dos
monumentos de Roma e da Italia. Ora, n'um grande numero d'estes
monumentos, o _entablamento_, isto é, a parte superior da Ordem,
composto do _friso_, da _architrava_ e da _cornija_, membros que, nas
Ordens Gregas, servem sempre para ligar duas columnas proximas, tinha
sido supprimido e substituido por arcos, os quaes vinham firmar-se nos
capiteis d'essas columnas. Quando procuram empregar materiaes de pequena
dimensão, a substituição do arco pelo entablamento é perfeitamente
logica; porém esta não é a pratica seguida na epocha da _decadencia_
romana, de interpôr ao fecho inferior do arco e ao açafate do capitel,
um simulacro de entablamento da Ordem, entablamento que ficava
completamente inutil, visto que o seu emprego está preenchido pelo
_arco_. Na época da renascença, esta prática pouco racional e pouco
reflectida foi geralmente adoptada, principalmente d'áquem dos Alpes.
Além de que, foram buscar aos mesmos edificios da decadencia romana
outros defeitos tambem notaveis no que diz respeito ás cornijas: em
primeiro logar, quando muitas Ordens estão sobrepostas na altura de um
monumento, como acontece frequentemente nas fachadas, põem-se _tantas
cornijas_ quantas são as _Ordens_; depois, coisa mais singular ainda, a
Ordem collocada _no interior_ de um monumento _conserva_ a sua cornija,
isto é, o _remate do edificio_ destinado a ter _um telhado_ e um algeroz
para dar saída ás aguas da chuva!

A architectura do renascimento, todavia, não é uma simples mescla, uma
copia servil da architectura greco-romana. Serve-se ella, na verdade,
das cinco Ordens, mas ajustou-as para outros usos e para outros climas,
aproveitando os progressos obtidos pela arte de edificar durante o
estylo ogival. Os edificios que executou conforme os principios de
construcção d'este ultimo estylo, foram enfeitados á maneira antiga,
ornamentado superficialmente, ou desfigurados, como em S. Paulo de
Londres, por paredes isoladas que encobrem a configuração architectonica
do monumento; emquanto na Belgica, nas egrejas do renascimento, o
systema do apparelho das abobadas ogivaes foi em toda a parte
conservado, porém dissimulado com arte. As paredes exteriores das naves
lateraes, muito grossas, preenchem o fim dos contrafortes, e muitas
vezes esses arcos-butantes ficam revirados (isto é, collocados de
maneira que a sua curva convexa fica posta na direcção do telhado
d'essas naves), e apoiados nos arcos duplos d'elles.

_Decoração_. Sob o ponto de vista da decoração pintada e esculpida,
muito mais que sob o ponto de vista architectonico, o periodo da
renascença, no sentido mais lato, póde-se dividir em muitos estylos,
apresentando cada um caracteres distinctos. Estas sub-divisões se
applicam particularmente ás producções da arte Franceza. 1.^o o estylo
da renascença propriamente chamado, o qual comprehende o XVI seculo e a
primeira metade proximo do XVII seculo; todavia sepára-se algumas vezes
d'esta época nos annos 1610 a 1642, para lhe constituir o estylo Luiz
XIII; 2.^o o estylo Luiz XIV (1643 a 1715); 3.^o o estylo Luiz XV (1715
a 1774); 4.^o o estylo Luiz XVI (1774 a 1796); 5.^o finalmente o estylo,
designado do imperio (primeiros annos do XIX seculo).

Na origem da _renascença_, os ornamentos foram, como na architectura
imitados quasi servilmente dos monumentos da antiguidade. As almofadas,
frizos, pilastras e um grande numero de outros trabalhos architectonicos
se revestiram, nos edificios os mais sumptuosos, de assumptos de
decoração proveniente da arte greco-romana. As palmetas, folhas de
acantho e triglyphos tornaram a apparecer em todo o logar. Viam-se
tambem, genios alados, figuras naturaes e phantasticas de toda a especie
enlaçadas nas grinaldas e em espiraes formando desenhos os mais
caprichosos. Estes ultimos ornamentos, compostos principalmente conforme
os modelos antigos achados em Roma nas _grutas_ ou ruinas do palacio de
Titus, tiveram no principio o nome de _grotescos_, denominação mais
propria do que a de _arabescos_, a qual lhe foi dada depois, porque os
Arabes proscreviam severamente da sua decoração qualquer representação
da natureza animada.

O estylo da renascença não se conservou intacto senão até o principio do
XVI seculo.

Os ornamentos do estylo Luiz XIV consistem principalmente em grandes
espiraes, palmas muito desenvolvidas, separadas ou envolvidas com os
elementos de ordem architectural, medalhões, trophéus, etc.

O estylo Luiz XV, que prima antes de tudo pela elegancia exaggerada nos
pequenos detalhes, desce á affectação na lindeza. A esculptura
decorativa abunda nas espiraes com folhagens myrrhadas e subtilmente
contornadas; faz com frequencia uso de conchas ou embrechado,
misturando-as em todas as suas composições. A linha recta cede o logar á
linha curva, e sobretudo a symetria não é observada. No principio do
XVIII seculo, o gosto se corrompeu de novo; volta-se no traçado do plano
e nas fachadas dos edificios ás fórmas torcidas e ás linhas quebradas.
Nos ornamentos dos maiores e soberbos contornos, as plantas vistosas do
estylo Luiz XIV transformam-se em definhados filetes, torcendo-se e
entrelaçando-se uns nos outros da maneira a mais singular, e
acompanhados de abundantes obras de conchas e de grande numero de
cupidos; o que fez dar a este _estylo exquisito e todo affectado_ o
appellido de estylo _embrechado_ e estylo _Pompadour_.

A affectação e o grande exaggero que caracterisam o estylo de Luiz XV
motivaram cedo uma reacção. No reinado de Luiz XVI voltaram a empregar
menos entrelaçados e menos entalhaduras. A descoberta de Herculanum e a
publicação das _Antiguidades de Athenas_ contribuiram a levar o
entendimento para o gosto mais serio, uma decoração menos contrafeita;
fizeram vigorar as fórmas classicas da arte grega e romana, cujas
investigações recentes vieram a descobrir os especimens importantes e
notaveis.

A época da revolução franceza e do directorio causou um extraordinario
prejuizo á industria artistica. Quando, no principio do actual seculo,
um novo estado politico ficou definitivamente constituido, o seu novo
soberano, vencedor na Italia e no Egypto, cuidou em conservar junto de
si as coisas que lhe recordassem as suas victorias gloriosas.

No _estylo do imperio_ viu-se apparecer os gryphos, as sphinges, os
feixes consulares, victorias com palmas e corôas de carvalho. Pouco
tempo depois, esses assumptos foram quasi os unicos empregados na
decoração tanto de architectura, como na mobilia.

_Plano das egrejas_. A maior parte das egrejas da renascença têem a
fórma da cruz Latina. As capellas que havia ao correr das naves lateraes
e na nave principal das egrejas ogivaes, ficaram supprimidas em França,
na Belgica e na Allemanha, porém conservaram-se na Italia. A capella mór
e o cruzeiro terminavam geralmente por uma abside semicircular ou
polygonal, apresentando no interior uma disposição de pilastras
corinthias ou compositas, entre as quaes ha janellas e nichos. Arcadas
de volta inteira, descançando sobre columnas ou pilares põem a nave
principal em communicação com as naves lateraes. As portas, as janellas
e todas as aberturas estão tapadas na sua parte superior por um arco de
volta inteira.

Os _triforiuns_ das egrejas ogivaes não se construiram na renascença.
Primeiramente substituiu-os, durante algum tempo, uma galeria em sacada,
tendo parapeito de cantaria vasado ou de obra de ferro; todavia pouco
depois esse logar foi occupado por uma simples cornija com sacada
bastante solida para servir como galeria, podendo-se andar á roda da
nave principal, ficando na altura das janellas superiores.

O monumento mais gigantesco e grandioso que tem produzido a architectura
do renascimento é, sem duvida, a basilica de S. Pedro do Vaticano em
Roma, cuja construcção foi dirigida pelos mais celebres architectos,
Bramante, Raphael, os dois S. Gallo, Peruzzi, Miguel Anjo, Vignola,
Maderno e finalmente Bernini, este artista de quem infelizmente o seu
mau gosto em bellas-artes veiu a ser proverbial, sendo originado pela
inveja dos seus emulos, que pretendiam tirar a fama ao seu superior
talento: imaginando dar formas novas e as mais extravagantes ás suas
composições architectonicas afim de supplantar os seus rivaes, morreu
_desesperado_ por nada ter conseguido; posto que fosse dotado de
talento, o seu desmarcado amor proprio veiu a causar-lhe o descredito do
seu nome. N'esta colossal construcção da Basilica de S. Pedro
consumiu-se mais de seculo e meio.

_Fachadas das egrejas_. As fachadas compõem-se regularmente de duas, e
algumas vezes de _tres Ordens de columnas sobrepostas_. A ordem inferior
abrangendo ao mesmo tempo a nave principal e as lateraes, é mais larga
que a ordem superior; essa corresponde á unica nave central, pois que o
madeiramento das naves lateraes não sóbe nunca até o entablamento da
primeira ordem. A ordem mais superior sempre terminada por uma attica ou
um frontão triangular, tendo no vertice uma cruz ornatada nos angulos,
acrotéros com vasos, fogaréos e tocheiros. Duas misulas deitadas de cada
lado da ordem superior, preenchem os espaços dos angulos rectos
produzidos pela superposição das duas ordens tendo desigual largura. As
columnas da fachada estão geralmente embebidas um terço ou metade do seu
diametro. Um ou tres portaes, conforme a importancia do edificio, dão
ingresso nas naves.

Os jesuitas, cuja Ordem se fundou no XVI seculo, vindo a ser muito rica
e poderosa no XVII seculo, adoptaram em toda a parte esta composição
para as fachadas de suas egrejas; por isso dá-se o nome do _estylo dos
Jesuitas_ á architectura religiosa d'esta época. A maior parte das
egrejas que estes religiosos construiram distinguem-se pela abundancia
dos seus ornamentos, principalmente as edificadas na Belgica.

_Abobadas_. As abobadas têem, como as da época antecedente, nervuras
encruzadas, as quaes, em logar da fórma da ogiva, descrevem uma curva de
volta inteira ou um arco de volta abatida. Os arcos duplos são largos e
muitas vezes formados por almofadas pouco fundas. No XVI seculo, as
abobadas tinham ás vezes decorações pintadas, e os seus fechos sustentam
abobadas pendentes com muitas sacadas de bastante peso. Depois
abandonou-se, além dos Alpes, a decoração pintada, substituindo-lhe os
ornatos em relevo.

_Torres_. As torres, geralmente construidas sobre plano quadrado, e
compostas de dois, tres ou quatro andares sobrepostos e ornados de
pilastras ou de columnas embebidas, têem muitas d'ellas uma balaustrada
á bôca da flecha, com as fórmas mais variadas; campanulada, piriforme,
pyramidal ou uma fórma mais complicada ainda.


*Mobilia religiosa*


_Altares_. Durante algum tempo continuou o uso dos retabulos com
divisões multiplices, no genero d'aquelles dos ultimos annos do periodo
ogival, porém tendo as molduras das almofadas em detalhes no gosto do
renascimento.

Foi proximo do XVI seculo que uma mudança radical appareceu na fórma e
disposição dos altares. Os retabulos foram então substituidos pelos
porticos copiados dos arcos de triumpho da antiguidade, encimados com
frontões de fórmas muito variadas. Serviram-se quasi sempre de marmores
raros e preciosos, sobretudo para as columnas, adquirindo-os com grande
despeza, dos paizes os mais distantes. A arcada imitando o _arco de
triumpho_ foi ornada, no principio, de estatuas e de altos e
baixo-relevos, depois por retabulos de grandes dimensões; e estes mesmos
acabaram em pouco tempo para serem substituidos geralmente por
esculpturas.

Quando no XVII e no XVIII seculos, as fórmas extravagantes (_rocôcó_)
prevaleceram no systema da decoração, os altares tambem ficaram
sobrecarregados de ornamentos de pessimo gosto, e appareceram as
columnas _torcidas_, em _espiral_ e em _saca-rolhas_!

_Tabernaculos_. O uso de collocar tabernaculos para conservar a
eucharistia sobre os altares principaes e secundarios, generalisou-se no
fim do XVI seculo. Até essa época as particulas se conservaram, como
durante o periodo ogival, nos tabernaculos isolados em fórma de torre ou
em armarios abertos na parede, por detraz ou á ilharga do altar. Houve
mesmo paizes onde o antigo costume não ficou abandonado inteiramente só
muito depois do XVII seculo.

Os tabernaculos de marmore e de madeira que se collocavam sobre o altar
desde a época do renascimento, compõem-se geralmente de um cylindro ôco
ornado com riqueza e reunido a _predella_ ou throno, no qual se põem
castiçaes sobre misulas reviradas. O cylindro fechado no seu cume por
uma tampa de fórma hemispherica tem por remate um crucifixo, dividido
por um, dois ou tres compartimentos com separação, e girando sobre um
eixo vertical.

_Cadeiras do côro, obra de talha e confissionarios_. As obras de
entalhador que ornam muitas egrejas do XVII seculo, são as principaes
obras deixadas pela época da renascença.

As costas das cadeiras do côro compõem-se sempre de almofadas de
marcenaria ornadas de baixos-relevos ou de pinturas, separadas umas das
outras por columnasinhas da Ordem Corinthia ou Composita, sustentadas em
sacadas por misulas com bella obra de talha. Os fustes d'essas
columnasinhas, rectos ou torcidos, estão cheios de lindos arabescos e
delicadas folhagens. A obra de talha e dos confissionarios apresentam na
sua decoração de esculptura bastante similhança com as das cadeiras do
côro.

_Jubéos e balaustradas_. Os _jubéos_ da renascença compõem-se geralmente
de tres arcadas de volta inteira, que descançam sobre columnas ou
pilastras imitadas das Ordens classicas.

Collocam-se os jubéos á entrada da capella mór nas grandes egrejas até
proximo do meiado do XVII seculo.

No meiado do XV seculo, uma grande reacção se fez contra os jubéos,
porque, dizia-se então, destruiam o aspecto architectonico e impediam os
fieis de vêr o sacerdote no altar. Muitos foram desmanchados n'esta
época, outros transportados proximo da fachada Occidental da egreja, a
fim de servirem de tribunas para collocar os orgãos.

As _balaustradas_ destinadas a vedar a capella mór e a separar das naves
lateraes as capellas, ou resguardar certas partes da mobilia religiosa,
foram poucas vezes feitas de ferro ou de madeira, faziam-se de
preferencia de marmore ou latão. A sua composição era de repetidas
columnasinhas de fórma classica, quer com balaustres em pé ou
_revirados_, o que lhe fez dar o nome de _balaustrada_.

Muitas vezes assentavam extraordinarios monumentos funerarios entre
essas separações da capella mór e as naves nas cathedraes e nas egrejas
importantes.

_Caixas de orgão_. Na época do renascimento, deu-se ás caixas dos orgãos
as maiores dimensões. Collocaram-se, primeiramente, nas egrejas ogivaes,
do lado do Evangelho, na parte inferior do _triforium_, no primeiro ou
segundo vão da nave principal. Depois, isto é, perto do meiado do XVI
seculo, foram assentes proximo do cruzeiro, á entrada dos lados lateraes
da capella mór. Finalmente, quando as dimensões dos orgãos se foram
desenvolvendo desmedidamente, estabeleceram-se tribunas especiaes na
nave central, proximo da frente Occidental da egreja. As mais antigas
caixas dos orgãos estão cobertas de obra de talha.

_Pulpitos_. Durante o periodo da renascença, o pulpito teve dimensões
muito maiores que precedentemente. No XVI e XVII seculos foram
construidos geralmente de madeira; porém desde o meiado do seculo
seguinte, ajunta-se algumas vezes o marmore á madeira. Os pulpitos das
egrejas de primeira ordem compõem-se muitas vezes de grupos de estatuas
acompanhadas de arvores, rochedos e outros detalhes pittorescos
representando factos da historia sagrada ou ecclesiastica.

_Tumulos e campas_. No XVI seculo os cenotaphios eram compostos ainda
como durante o periodo ogival, d'um sóco ou macisso de alvenaria,
coberto por uma grande lousa, sobre a qual se vê a estatua do finado. Á
roda do sóco acham-se por vezes estatuasinhas debaixo de arcaduras de
volta inteira descançando sobre columnelos jonicos, corinthios e
compositos, outras vezes, as arcaduras e as estatuasinhas estão
substituidas por uma ordem de brazões. A figura do finado vê-se umas
vezes deitada, outras de joelhos sobre uma almofada ou genuflexorio.
Esta ultima attitude foi a mais commum no fim do periodo: todavia no
XVII seculo, os monumentos sepulchraes veem a ter uma composição muito
mais complicada; os sarcophagos tiveram as mais variadas fórmas, e as
estatuas dos finados foram acompanhadas de outras estatuas allegoricas,
como a morte tendo uma foice, figuras de anjos, a Fé, Esperança,
Caridade, etc.

No XVII seculo, os mausoleus encontram-se muitas vezes collocados por
baixo de uma arcada muito ornada no estylo do renascimento. Esta
decoração architectonica applicada sobre as paredes de uma capella ou
das naves lateraes, da nave principal e capella mór conservou-se nos
XVII e XVIII seculos, mas disposta com acerto, com as modificações
introduzidas successivamente na architectura. Na segunda metade do XVII
seculo, e muito mais frequentemente no seculo seguinte, rematavam os
tumulos com pyramides e obeliscos em meio relevo, ornados de bustos, em
medalhão, do finado. Os cyprestes, as columnas quebradas, as urnas
funereas, genios com fachos derribados, todas as reminiscencias pagãs
vieram a ser tambem uma decoração mais seguida n'esta ultima época.

O uso das _campas_ continuou durante o periodo do renascimento, e o seu
numero augmentou muito relativamente á época precedente. No XVI e no
XVII seculos eram postas no pavimento das egrejas e dos claustros;
tambem ás vezes se assentavam na grossura da parede, junto do logar em
que fôra sepultado o finado. As mais antigas, especialmente as da
segunda classe, estão cobertas em parte por figuras em alto e baixo
relevo, em parte com inscripções. Mais tarde limitaram-se a uma simples
inscripção acompanhada de um symbolo ou de um brazão.

A maior parte das campas são de calcareo azul ou de marmore preto, e
muitas vezes têem as inscripções embutidas com marmore branco. Acham-se
tambem algumas lousas funerarias de latão, cujos traços gravados estão
cheios de um esmalte encarnado ou preto, posto a frio.

Desde o começo do XVII seculo, as inscripções funereas principiam
frequentemente pela fórma pagã D (_eo_) O (_ptimo_) M (_aximo_), ou com
as letras P. M. interpretadas PIAE MEMORIAE, mas isso tem o
inconveniente de fazer directamente allusão ao P (_iis_) M (_anibus_)
dos antigos romanos.

_Pias baptismaes_. As pias baptismaes apresentam pouca importancia; a
iconographia tão esplendida e tão abundante de symbolismo que se notava
sobre as pias romãs, e algumas vezes ainda sobre as do periodo ogival,
desapparece de todo. Ellas foram então formadas de simples pias de
marmore, circulares ou polygonaes, tendo a fórma de uma semi-esphera ôca
e achatada, ás vezes ornadas com molduras de fórma de perolas e assentes
sobre um pedunculo com molduras. As tampas são de latão ou de madeira.

_Obras de ourivesaria e de esmaltador_. Durante o periodo da renascença,
os ourives serviram-se princípalmente do trabalho de estampar em relevo,
da cinzelura e da gravura para ornar os objectos de ourivesaria. Os
esmaltes de côres, cujo uso havia sido introduzido no fim do XV seculo,
concorreram egualmente ás officinas de Limoges, Augsbourg e de
Nuremberg. Os _Limousinos_ cobriam quasi sempre com pintura esmaltada as
peças metallicas, grandes e pequenas, transformando-as assim em paineis
ou medalhões: os _Allemães_ empregaram os esmaltes, não sómente como
faziam os Limousinos, para pintar pequenos modilhões, muitas vezes
camafeus côr de rosa, e os applicavam sobre os pés dos calices, das
custodias e sobre outros logares das suas obras, mas serviam-se tambem
para fazer realçar, pelo emprego do colorido superficial, certos
detalhes das suas peças de ourivesaria, por exemplo, as figuras,
folhagens, flôres e grinaldas.

O gosto pelos assumptos mythologicos, que dominava nas artes como na
litteratura, exerceu a sua influencia na ourivesaria religiosa. Os
deuses, os semi-deuses e os monstros da antiguidade pagã foram
resuscitados. Ainda mais, apparecendo nos assumptos da historia da
Biblia ou das legendas dos Santos, os artistas curavam muitas vezes na
reproducção dos heroes do paganismo: representavam o Padre Eterno com as
feições de Jupiter antigo; suppunham exaltar Nossa Senhora
assemelhando-a ás deusas mythologicas; os anjos vieram a ser genios nús,
e as tres Graças serviram para personificarem as virtudes theologaes.
Entre os arabescos via-se reproduzir os Centauros, Pans, Sylvanos,
Tritões, Nereidas; representações onde a natureza humana e a natureza
animal se reunem da maneira a mais singular. Os objectos do culto
revestem-se com todas as excentricidades, e teem muitas vezes dimensões
fóra de toda a proporção.

_Calices_. Os ourives do XVI seculo abandonam pouco a pouco as tradições
da edade média, e, posto que a fórma antiga da taça se conserve ainda
algum tempo mais ou menos primitiva, o calix vem a ser cada vez maior. A
principiar do meiado do XVII seculo, os artistas deixam-se levar pela
sua imaginação, esquecendo completamente as boas tradições dos tempos
anteriores. O calix chega, e mesmo vae além muitas vezes, á altura
desmedida de 35 centimetros; a taça estreita-se muitas vezes de maneira
que na communhão o padre é obrigado a curvar a cabeça para traz; o nó
não se distingue já da hastea, e o diametro do pé do calix diminue a tal
ponto que ao menor choque o calix está arriscado a cair.

A patena é uma simples chapa redonda, não tendo nenhuma cavidade.

_Pyxide_. As pyxides distinguem-se das que havia nas épocas precedentes
pelas suas muito grandes taças; sendo raramente ornadas de lavor
representando assumptos religiosos. A começar do XVII seculo, a sua
tampa não fica ligada á taça por um gonzo.

_Custodia_. As custodias de fórma radiante, foram, póde-se dizer, as
unicas conhecidas da época do renascimento; teem geralmente as dimensões
muito exaggeradas. As custodias com cylindro de crystal apparecem apenas
no XVI seculo. Muitas vezes mesmo mudaram mais tarde estes ultimos,
substituindo o cylindro de crystal por um sol radiante. Nas custodias
ricas, o oculo com sol radiante é algumas vezes ornado de grupos, scenas
em alto relevo e estatuasinhas, que não convém, por fórma alguma, junto
ao Santissimo Sacramento. Essas extravagancias notam-se mais vezes ainda
nas custodias modernas.

_Relicarios_. Os grandes relicarios do renascimento eram as mais das
vezes de madeira pintada e dourada. Faziam-se ainda algumas vezes os
relicarios de madeira, apresentando a imitação de egrejas
contemporaneas, com columnas, entablamento, frontão, etc. Muitas vezes
tambem serviam-se de bustos de Santos de madeira pintada e dourada, que
se collocavam sobre uma base ornada com molduras com ovanos.
Encaixilhavam-se as reliquias no meio da face anterior d'essa base,
mettendo-as debaixo de vidro, ou em um pequeno. relicario de metal.

_Estofos preciosos_. _Tecidos_. No XVI seculo, os estofos de que se
serviam para as vestimentas, os mais ricos eram tecidos com oiro ou
prata, brocado e velludos de Genova e de Utrecht.

_O estofo com oiro ou prata_ é um tecido feito com fios cobertos de
qualquer d'estes metaes. Quando os desenhos são tecidos servindo-se dos
mesmos fios ou fios de seda, designam-se _brocado_. Finalmente, se em
logar de fios de seda se servem de velludo, chama-se _velludo de
Genova_.

Antes do XVII seculo não se conhecia o _velludo lavrado_: da sua
superficie tiravam-se servindo-se da thesoura, certas partes do pello
para formar desenhos de flôres e grinaldas. Mais tarde conseguiram obter
um resultado analogo comprimindo os velludos com uma poderosa machina
movida a braços ou pela agua; foi este o processo que forneceu, durante
muitos seculos, o _velludo batido_. O _velludo_ dito de _Utrecht_ tem
geralmente o pello mais comprido que as outras qualidades de velludos, e
distingue-se por uma consistencia mais forte.

_Bordados_. Os _bordados_ da época do renascimento podem-se dividir em
duas grandes classes. A primeira comprehende os estofos bordados, tendo
conservado a sua flexibilidade, e consistindo o seu apreço na disposição
artistica dos fios de oiro, prata, seda ou lã de differentes côres,
empregadas pelo bordador. Os bordados de segunda classe apresentam em
estofo um aspecto esculptural, devidos aos effeitos das grinaldas,
flôres, fructos e figuras com as quaes estão ornados; podia-se suppôr
que o bordador, esquecendo o seu proprio officio, foi pedir auxilio a
uma arte estranha, que não é nem póde ser a que lhe pertence! Inutil
seria accrescentar, suppomos, que a logica pedia que o bordador
empregasse os processos de execução dos quaes legitimamente elle dispõe
pela natureza mesmo do seu officio, áquelle que empregou da arte da
esculptura, arte da qual os effeitos nos parecem incompativeis com os do
bordado inconvenientemente produzido.

_Pannos de raz_. Os pannos de raz continuaram em uso, e obtiveram mesmo
maior acceitação durante o periodo do renascimento. Nunca os teáres de
alta e baixa trama foram nem mais numerosos, nem tiveram maior uso que
no XVI seculo. O centro de fabrico de mais importancia n'esta época foi
Bruxellas, cujos productos alcançaram primazia não sómente pela
habilidade dos operarios, mas tambem pelos cuidados constantes que se
empregavam na preparação e applicação do tabalho das materias de que se
serviam na sua execução. O magistrado communal da cidade não desprezava
nenhum meio para conservar a merecida reputação das officinas de
Bruxellas, que contribuiam com uma tão grande parte para a prosperidade
nacional. Finalmente, para conseguir pannos de raz perfeitos, elle
prohibiu, por um edital, de 24 de abril de 1425, que se pintassem ou
retocassem com pincel as encarnações dos tecidos de uma certa dimensão;
pelo mesmo edital promettia, além d'isso, aos fabricantes a propriedade
artistica de seus grandes modelos de desenhos, estabelecendo punições
muito severas contra os falsificadores. Tres annos depois, isto é, em
maio de 1528, promulgou um outro edital mais notavel ainda, ordenando
que toda a peça fabricada na cidade e medindo mais de seis varas devia
trazer d'alli em diante na ourela inferior: de um lado uma das tres
marcas dos fabricantes, Bruxellas, Antuerpia e Tournay, e do outro um
pequeno escudo entre dois BB, iniciaes da palavra Bruxellas.

Em 1544, a obrigação de ter a marca foi extensiva pelo governo a todas
as cidades dos Paizes-Baixos.

Na marca de Bruxellas algumas vezes o B está voltado, ficando os dois
anneis do B virados para o escudo. A marca de Antuerpia é formada por
uma mão acompanhada de uma flor de liz; a de Tournay mostra uma torre.

Durante o periodo ogival os pannos de raz reproduziram assumptos
religiosos e, algumas vezes tambem, figuras allegoricas ou contos de
cavallaria. Á proporção do adiantamento no XVI seculo, os assumptos
religiosos tornam-se mais raros; ficando preferidas as representações
que se referissem á mythologia pagã ou á historia antiga da Grecia e dos
Romanos.

A fabricação dos pannos de raz de Bruxellas declinou sensivelmente
durante a ultima metade do seculo XVI, por causa das perturbações
religiosas que assolaram a Belgica.

A Antuerpia era mais um deposito commercial que um centro de producção.
Desde o XV seculo, os commerciantes expediam os pannos de raz para toda
parte; tomando no XVI seculo este commercio uma extensão maior.

No principio do XVII seculo, a concorrencia de muitos paizes
estrangeiros estabeleceu manufacturas officiaes, fazendo declinar a
industria da Belgica. Todavia os novos estabelecimentos foram fundados
com o concurso dos mestres e operarios vindos de Bruxellas.

Durante a segunda metade do XVII seculo o fabrico dos pannos de raz
bruxellezes principiaram a affrouxar, tanto pela sua qualidade, pois não
empregavam as boas tradições artisticas, como principalmente pela
fundação, em França, da manufactura real dos Gobelins, estabelecida em
1662 por Luiz XIV. A direcção d'este estabelecimento foi entregue ao
pintor O'Brun, que tinha um pessoal numeroso, á frente do qual estava,
entre outros, officiaes, João Jans, habil tapeceiro, oriundo de
Oudenarde, que foi residir para Paris, depois de 1650, com grande numero
de operarios flamengos. A concorrencia da fabrica dos Gobelins causou a
ruina das officinas de Bruxellas.

A cidade de Oudenarde, que já tinha officinas de tapeçaria no seculo XV,
produziu nos seculos XVII e XVIII tapeçarias de um genero especial,
designado sob o nome de _Verduras_. Representavam, não assumptos
historicos, mas paisagens animadas por algumas pequenas figuras de
homens e animaes, assim como vistas de castellos ao longe. O seu nome
deriva da circumstancia dos tons de verde-carregado que predominam
geralmente n'estas composições. A industria da tapeçaria acabou em
Oudenarde em 1772.

No XVIII seculo, a illusão da manufactura dos Gobelins foi tão grande na
Allemanha, que a palavra Gobelin veiu a ser synonimo de tapeçaria de
alta e baixa lissa, e tem conservado até hoje esta significação.


*Iconographia*


Uma revolução se effectuou na época do renascimento, na representação da
natureza humana. Até ao XV seculo, a nudez das figuras não era
admittida, não sómente na architectura religiosa, como na architectura
civil. Dissimulavam-se mesmo de proposito as fórmas dos corpos debaixo
da roupagem do vestuario, com receio de despertar as paixões sensuaes;
os esculptores do renascimento _fizeram tudo ao contrario_: tomaram a
taxa de executar sem disfarce a natureza, e dar ao seio, aos hombros, ao
corpo um desenvolvimento de fórmas que na edade média se tinha
dissimulado debaixo da roupagem. O retrocesso do genio para os estudos
classicos levou, por um mesmo estimulo, os artistas ao estudo da
anatomia do corpo humano: vieram a ser pagãos sem comtudo deixarem de
ser christãos, e principiaram a representar, até no sanctuario das
egrejas, a imagem núa da mulher, faunos, etc., nas attitudes as mais
lascivas: foi esta a propensão da arte desde o XVI seculo. A começar
d'esse momento, foi a sensualidade e a nudez que dominaram na maior
parte das pinturas e esculpturas mesmo as religiosas. Muitas vezes nas
egrejas, os assumptos legendarios ficam substituidos por scenas tiradas
da mythologia. Estas mesmas com figuras núas se vêem sobre os vasos
sagrados. Os anjos, que abundam nos edificios religiosos, são genios,
cupidos com azas, dispostos para entrarem no banho.

Entre as representações proprias do periodo do renascimento,
mencionaremos uma unica: _A deposição de Jesus Christo no tumulo_, que
se representa em grande numero de egrejas com figuras de grandeza
natural. Além do corpo inanimado de Christo, vêem-se mais sete
personagens. Nicodémos e José de Arimathéa pegando nas extremidades da
mortalha sobre a qual descança o corpo do Redemptor; Nossa Senhora, o
apostolo S. João e as tres Marias, Maria Magdalena, Maria Cleóphas e
Maria Salomé, estão em fileira, entre as duas primeiras por detraz de
Christo.

Concluiremos estas considerações pelas palavras de um douto archeologo
que estygmatisa o sensualismo:

Podemos todavia ponderar que o estylo da architectura da Renascença,
querendo adoptar as formas da architectura classica, não produziu
progresso nenhum na arte architectural, pelo contrario a fez
_retrogradar_; se os artistas antigos tivessem conhecido essas ousadias
engenhosas dos periodos em que a architectura apresentou as suas novas
idéas artisticas, não teriam espontaneamente renunciado ao grande numero
de fórmas que a Renascença se lembrou de avivar; em uma palavra, não se
teriam adoptado modos differentes antigos, que não significavam ser o
resultado de symptoma de progresso, sendo pelo contrario uma retroacção
da arte, pois não tinham progredido nas bellezas essenciaes no estylo
antigo, tendo apenas alterado ao mesmo tempo a perfeição mechanica e a
belleza racional da arte classica.


FIM



Nomes dos Rev.^{os} Parochos

_QUE FORAM ASSIGNANTES D'ESTA PUBLICAÇAO_


Alexandre de Faria e Silva--Beneficiado da Sé d'Evora--Correio do
Collegio.

Alexandre Ramos Cid--Santa Maria da Feira--Beja.

Alfredo Elviro dos Santos--Secretario do Patriarchado--Lisboa.

Antonio d'Almeida Estrella--Rua do Bomjardim, 187--Porto.

Antonio Ferreira da Gama--Alfarellos--Alfarellos.

Antonio Luiz Pinto de Carvalho--Cartaxo--Cartaxo.

Antonio Luiz Thiago Mesquita--S. Miguel--Villa Franca do Campo.

Antonio Narcizo Pereira--Rua da Borragem--Almada.

Antonio Roza de Carvalho--Nossa Senhora da Conceição--Torres Novas
(Alqueidão do Sena).

Antonio dos Santos Figueiredo--Seminario de Portalegre.

Antonio dos Santos Silva--Santa Catharina da Fonte do Bispo--Tavira.

Caetano Xavier d'Almeida da Camara Manuel--Evora.

Caetano Honorio da Graça e Sousa--Seminario de Portalegre.

Domingos José Alves Almeida--S. João Baptista--Vieira (Mosteiros).

Eugenio de Freitas Cavalleiro de Sousa--Rua da Bella Vista, á Lapa, 7,
2.^o--Lisboa.

Faustino Antonio de Moraes--S. Saturnino--Fanhões.

Francisco da Conceição Costa--S. Pedro--Elvas.

Francisco Ferreira Flôres--Nossa Senhora da Visitação--Ourem.

Francisco José Monteiro--Nossa Senhora da Encarnação--Mirandella.

Francisco Lourenço Cardoso--Nossa Senhora da Assumpção--Caminha.

Francisco Maria de Vasconcellos--Nossa Senhora do Milagre--Leiria
(Vieira).

João Baptista de Mendoça--Nossa Senhora da Graça--Olhão (Moncarapacho).

João David d'Azevedo Barros--Rua do Bonjardim, 158--Porto.

João José de Mattos Ferreira--Santa Maria e S. Miguel--Cintra.

João Maria de Mendoça Vasques--Nossa Senhora da Conceição--Silves
(Alcantarilha).

João Nepomuceno da Costa--S. Pedro de Penaferrim--Cintra.

Joaquim Antonio dos Reis--S. Domingos de Bemfica.

Joaquim Antonio Teixeira--Algarve--Loulé.

Joaquim Bernardo das Dôres--Cacella--Villa Real de Santo Antonio.

Joaquim José d'Ánova--Povoa de Varzim--Povoa de Varzim.

Joaquim Maria Duarte Dias.

Joaquim Martins de Carvalho--Coimbra.

Joaquim Pereira de Moraes (Abb.)--Santa Maria--Taboaço (Sendim).

Joaquim Rodrigues Barroso--Nossa Senhora dos Prazeres--Vizeu
(Abravezes).

Joaquim dos Santos Sequeira--Seminario de Portalegre.

José Alves de Mattos (Dr.)--Reitor do Seminario de Santarem.

José Baptista Pereira--Senhor Jesus--Obidos Sanguinhal.

José Bernardo dos Santos--Borba.

José David d'Azevedo Barros.

José Diogo Ribeiro--Vimieiro--Correio de Alcobaça.

José Farinha Martins--Seminario de Portalegre.

José da Luz Capella--S. Miguel do Pinheiro--Mertola.

José Maria Tavares Portugal--Nossa Senhora d'Assumpção--Vianna do
Castello (Gaveão).

José Ribeiro da Silva--Seminario de Portalegre.

José Victorino de Carvalho--Reitor de Marcello--Santa Cruz de Villa
Aleã.

Luiz José Nunes (Abb.)--S. Miguel--Bouças (Leça da Palmeira).

Manuel Branco de Lemos--Salvador--Ilhalvo.

Manuel Francisco dos Santos Peixoto--Val de S. Sebastião--Ilha Terceira.

Manuel Ferreira Peixoto de Sousa--Vera Cruz--Aveiro.

Manuel Henrique de Sousa Machado--S. Martinho de Bornes.

Manuel José Bernardo Coelho--S. Thiago--Tavira.

Manuel Maria da Costa--S. Matheus da Calheta--Ilha Terceira.

Manuel Marques Monteiro--Nossa Senhora da Conceição--Nellas.

Manuel Ribeiro de Mello--Valladares--Correio de Gaia.

Manuel dos Santos Lourenço--S. João Baptista--Feira (S. João de Vêz).

Mathias M. Grave--Seminario de Portalegre.

Miguel Antonio da Fonseca e Sousa--S. Faustino--Pezo da Regoa.

Paulo da Costa--Rua do Infante D. Augusto--Coimbra.

Prior da Freguezia de Cezimbra.

Prior da Freguezia de S. Miguel--Vagos (Sôza).

Thomaz Joaquim d'Almeida (Dr.)--Santo André--Mafra.

Vice-Reitor do Seminario de Faro.

Victorino da Silva Araujo--Leiria.

Zephyrino José Pinto.



INDICE



Ao leitor.      5

Introducção.      7

*Capitulo I*--Principios da arte christã no Occidente.

_Primeiro periodo_.      13

*Capitulo II*--Descripção das catacumbas de Roma; 1.^o periodo.      14

Symbolos ou allegorias dos primitivos christãos.      16

Monogramma de Christo.      18

Sarcophagos.      21

Edificios religiosos construidos nos tres primeiros seculos.      23

Cemiterios.      24

Paramentos e objectos do culto.      25

*Capitulo III*--Estylo latino.      25

Caracteres d'este estylo.      31

Decoração dos monumentos do periodo latino.      32

Narthex, fachadas e portaes das basilicas.      33

Janellas e vidraças.      33

Altar nas egrejas do Occidente.      36

O _ciborium_ durante o periodo latino.      39

Cemiterios--sarcophagos--campas e tumulos.      42

Os calices e patena.      45

Os crucifixos e os castiçaes.      48

Diptycos.      49

Estofos preciosos.      50

Paramentos sacerdotaes.      53

Mosteiros latinos.      55

Iconographia do periodo latino.      55

Caracteres do estylo bysantino.      57

Systema de construcção.      58

Duração exterior e interna das egrejas.      58

*Capitulo IV*--Periodo Roman.      60

Caracteres do estylo lombardo.      62

Duração monumental.      66

Estylo roman durante os seculos XI e XII.      67

Caracteres da architectura roman.      69

Esculptura monumental no seculo XI.      71

Atrios e portaes romans.      73

Caixilhos rendilhados e vidraças pintadas.      75

Columnas anneladas--ornato designado--garra.      77

Capiteis da architectura roman.      78

Arcadas e arcaduras nos seculos XI e XII.      79

_Triforiums_ e cornijas.      81

Contrafortes e telhados.      83

Torres e campanarios.      84

Pintura das paredes e pintura historica.      86

Altares fixos, retabulos e relicarios.      89

Piscinas.      93

Doceis--Cadeiras episcopaes.      95

Capellas funerarias--tumulos--pedras tumulares.      96

Pias baptismaes.      98

Esmaltes.      99

Ourives de Limoges.      101

Calices e patênas.      102

Grades.      103

Alfaias religiosas.      104

Restauração artistica.      105

Custodias--pyxides e ciborios.      106

Relicarios e urnas.      108

Corôas suspensas nos altares.      112

Cruzes d'altar e para procissões e candelabros.      113

Evangeliarios e suas capas.      116

Baculos pastoraes e sapatos lithurgicos.      120

Mitras.      122

Alfaias preciosas e paramentos sacerdotaes e suas côres.      123

Abbadias--Mosteiros--Claustros dos capitulos.      129

Iconographia, _a sciencia das imagens_.      132

A cruz e a crucificação.      137

Personagens e accessorios historicos e allegoricos.      143

Evangelistas e seus symbolos.      152

Assumptos religiosos representados sobre os monumentos dos seculos XI e
XII.      155

*Capitulo V*--Periodo ogival.      159

Diversas fórmas de ogiva.      160

Origem da ogiva e do estylo ogival.      162

Periodo de transição do estylo roman para o ogival.      164

Caracteres da architectura ogival.      165

Plano das egrejas do XIV e do XV seculos e aspecto exterior das egrejas.
     169

Systema de construcção.      172

Esculptura monumental.      175

Fachadas--Alpendres--Postaes.      179

Janellas no periodo de transição.      185

Rosaceas--Vidraças incolores.      192

Vidraças pintadas.      195

Idem do XIII seculo.      200

Idem pintadas do XIV seculo.      204

Amarello de prata.      206

Vidraças pintadas do XV seculo.      207

Idem pintadas do XVI seculo.      211

Idem do XVII seculo.      214

Idem do XVIII seculo.      216

Pilares--Columnas.      216

Bases e columnas.      219

Capiteis.      221

Modilhões--misulas.      223

Arcadas--arcaduras.      224

Cornijas--platibandas.      228

Estabilidade e plano das abobadas.      231

Egrejas que teem a sua nave central muito mais elevada que as outras
naves lateraes e aquellas tendo igual altura.      232

Perfis das nervuras--fecho da abobada.      234

Arcos butantes--contrafortes.      236

Gargulas.      242

Nichos e doceis.      243

Torres--campanarios.      247

Pavimentos.      251

Lages gravadas com embutidos.      253

Labyrinthos.      254

Pinturas das paredes.      256

Cruz da consagração.      262

Altares--tabernaculos--piscinas.      263

Frontaes--baldaquinos.      265

Retabulos--banqueta.      268

Sacrarios.      274

Cadeiras de côro.      277

Jubes--cruzes triumphaes.      281

Pulpitos--confessionarios.      284

Capellas funereas--tumulos--campas.      286

Pequenos monumentos funereos do XV e do XVI seculo.      294

Pias baptismaes--pias para agua benta.      298

Grades--barreiras de metal e de madeira.      301

Orgãos e caixas para elles.      304

Alfaias religiosas--esmaltes.      306

Calices--patenas.      310

Custodias--pyxides sem pé.      313

Relicarios--braços--pés.      317

Esmoleres--relicarios--diversos.      327

Vasos para os Santos Oleos.      331

Corôas com luzes--castiçaes.      333

Estantes para o côro.      338

Livros do Evangelho--manuscriptos lithurgicos--miniaturistas.      339

Thuribulos--gomis--pratas para offerendas.      342

Insignias--medalhas dos peregrinos.      346

Estofos preciosos.      348

Pannos de raz.      350

Vestimentas sagradas.      351

Mitras.      356

Abbadias--mosteiros.      357

Egrejas--claustros--casa do capitulo.      359

Aposento dos irmãos leigos--aposentos para hospedes.      363

Celleiros--officinas--prisões.      365

Cartuchas.      367

Mosteiros para mulheres--conventos do recolhidas.      368

Hospitaes.      368

Iconographia do periodo ogival.      369

Representação da Santissima Trindade.      370

O crucifixo--a crucificação.      371

O sol--a lua.      373

Imagem de Nossa Senhora--o Menino Jesus.      374

A Annunciação--a morte de Nossa Senhora.      376

Os apostolos--os evangelistas.      377

Scenas diversas.      379

Sibyllas.      382

*Capitulo VI*--Periodo da renascença.      383

Caracteres da architectura da renascença.      385

Começo.      385

Decoração.      387

Plano das egrejas.      389

Fachadas das egrejas.      391

Abobadas.      392

Torres.      392

Altares.      392

Tabernaculos.      393

Cadeiras do côro, obra de talha e confessionario.      394

Jubéos e balaustradas.      394

Caixas de orgão.      395

Pulpitos.      396

Tumulos e campas.      396

Pias baptismaes.      398

Obras de ourivesaria e de esmalte.      398

Calices.      399

Custodias.      400

Relicarios.      400

Estofos preciosos. Tecidos.      401

Bordados.      402

Pannos de Raz.      402

Iconographia.      403

Lista dos assignantes.      409



Notas:


[1] Extraido do _Boletim de Architectura e Archeologia_, n.^o 2, Tomo V,
pag. 20 a 22, anno 1886.

[2] Tinha a mesma designação que coemeteria e criptae.

[3] Era um calix mystico que continha o vinho que bebeu Jesus Christo na
sua ultima ceia. Este calix tinha sido conservado por José de Arimathêa
e transportado por elle para a Bretanha. (Inglaterra).

[4] Termo em inglez admittido pelos archeologos.

[5] Havia no paiz dois magnificos livros do côro, um do convento de
Christo, em Thomar, e outro do convento de Belem. Este foi retalhado
pelos orphãos da casa pia de Lisboa, que fizeram d'elle _barretinas_ e
_talabartes_. Ao outro livro foram cortadas as folhas de pergaminho,
tendo vistosos arabescos e lettras floreteadas, coloridas e douradas,
cujos preciosos fragmentos comprámos avulso aos poucos no anno de 1835.

[6] Ha um muito curioso no cabido da Sé de Vizeu, do qual tirámos o
molde em 1869. Está exposto no museu do Carmo em Lisboa.



Lista de erros corrigidos


Aqui encontram-se listados todos os erros encontrados e corrigidos:

  +----------+---------------------+----------------------+
  |          |      Original       |      Correcção       |
  +----------+---------------------+----------------------+
  |#pág.   25| das das             | das                  |
  |#pág.   88| indefinidamenie     | indefinidamente      |
  |#pág.  102| quaiidade           | qualidade            |
  |#pág.  142| seseculo            | seculo               |
  |#pág.  209| da da época         | da época             |
  |#pág.  301| asperpergil-os      | aspergil-os          |
  |#pág.  350| representanto       | representando        |
  |#pág.  352| nma cruz            | uma cruz             |
  |#pág.  397| XVII e XXIII seculos| XVII e XVIII seculos |
  |#pág.  410| Varzlm              | Varzim               |
  |#pág.  411| Conceiceição        | Conceição            |
  |#pág.  415| dos imagens         | das imagens          |
  +----------+---------------------+----------------------+

* correcções feitas com base na errata do próprio livro.

Foi adicionada a indicação do capítulo II (pág. 14) e corrigida a
entrada do capítulo III (pág. 25).





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