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Title: Scenas da Roça - Poema de costumes nacionaes
Author: Corrêa, António
Language: Portuguese
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                              A. CORRÊA

                            SCENAS DA ROÇA

                     POEMA  DE  COSTUMES  NACIONAES


                             RIO DE JANEIRO
                       TYP. DA GAZETA DE NOTICIAS
                       72 RUA SETE DE SETEMBRO 72
                                  1879



                            SCENAS DA ROÇA



                              A. CORRÊA

                            SCENAS DA ROÇA

                     POEMA  DE  COSTUMES  NACIONAES


                             RIO DE JANEIRO
                       TYP. DA GAZETA DE NOTICIAS
                       72 RUA SETE DE SETEMBRO 72
                                  1879



AO MEU LIVRO


    Vae, filho, já tens idade,
    já ficaste emancipado;
    precisas correr o mundo,
    saber de tudo um bocado.
    Vae, filho, mas sê prudente,
    ouve os conselhos de gente
    que puder te aconselhar;
    sê modesto e delicado...
    em fallar pouco e acertado
    ha sempre muito a ganhar.

    Se alguma gloria colheres,
    não te ufanes sem razão:
    ás vezes ouve-se um tolo
    por méra contemplação.
    Escuta os indifferentes.
    Os amigos e os parentes
    não dizem toda a verdade.
    Agora, no teu caminho,
    não te basta o meu carinho
    nem toda a minha amizade.

    Se ouvires phrases sensatas,
    presta-lhes toda a attenção;
    a tolos não dês ouvidos
    nem provoques discussão.
    Respeita as crenças alheias;
    mas guarda as tuas idéas
    e corrige os teus defeitos.
    Na escola da sociedade,
    estuda, aprende a verdade
    nas phrases de seus eleitos.

    Vae, filho, Deus te acompanhe.
    Das letras no vasto mundo
    bem poucos bóiam á tôna,
    grande parte vai ao fundo.
    Ai! neste momento extremo
    é por ti, filho, que eu tremo!
    attende aos conselhos meus...
    Já são horas da partida;
    comtigo vae minha vida,
    mas parte... vae... filho, adeus.



CANTO PRIMEIRO


I

    Ha quem diga que a franceza
    é a mulher por excellencia;
    mil outros dão preferencia
    aos requebros da hespanhola:
    dizem que ella prende e mata
    quando a melena desata
    e no fandango arrebata
    ao trinar da castanhola.

    As bellas filhas da Italia
    tem milhões de adoradores,
    lá na patria dos amores
    quem dá leis é o coração.
    É tudo vida, alegria,
    feixes de luz, de harmonia,
    ondula em torno a poesia
    nesse mar da inspiração.

    Eu acho a todas bonitas
    quando de veras o são,
    quer sejam do Indostão,
    d'Allemanha, Italia ou França;
    mas p'ra mim a brazileira
    d'entre todas é a primeira:
    é gentil, é feiticeira
    como um sorrir de creança.

    As outras guardam comsigo
    da velha Europa a imponencia;
    estas não, tem a innocencia,
    tem o perfume das flôres;
    captivam pelos encantos
    ingenuos puros e santos,
    e são, meu Deus, taes e tantos,
    que fazem morrer de amores!

    Quem póde escutar-lhe as fallas
    quando a tremer de receio,
    baixando os olhos no enleio
    em que a prende o coração,
    ella diz corando e rindo:
    «Do meu ceu de amor inflado,
    tu és o astro mais lindo
    da maior constellação!»?

    Quem póde conter no peito
    o travesso coração?
    quem não sujeita a razão
    ao dominio dessas fallas?
    quem não se abraza nos lumes
    da mulher que tem perfumes,
    de que as rosas tem ciumes
    se vão se encontrar nas salas?
    ..............................


II

    Meu leitor, deixa a cidade e vem comigo
    que eu quero te mostrar um quadro bello;
    vem á roça onde o amor é mais sublime,
    e tudo quanto é grande mais singelo.

    Eu prefiro ás harmonias de uma orchestra,
    aos encantos que doudejam nos salões,
    a cantiga do tropeiro descuidoso,
    ou as trovas amorosas dos sertões.

    Ha naquelles improvisos mal rimados,
    e naquella inspiração de cada instante,
    a belleza original que parte d'alma
    sem arte, mas com fogo delirante.
    .................................


III

    Elle era um moço bonito
    como na côrte não ha,
    tinha os olhos e os cabellos
    da côr do jacarandá.
    Um porte airoso, engraçado,
    rapagão desempenado
    de metter inveja a cem!
    se na estrada elle passava,
    a moça que o espiava
    lhe ficava querendo bem.

    Mas elle guardava firme
    no fundo do coração
    pela bella Margarida
    a mais ardente paixão.
    E as moças da visinhança
    ao verem sua esquivança
    ás festas, se ella não ia,
    diziam de enciumadas:
    «--Pedro está de azas quebradas;
    pobre moço! quem diria?!

    «--E tem só vinte e tres annos
    e alguma cousa de seu!
    vejam só o que é fortuna;
    tão feliz nunca fui eu!
    --E dizem que casa breve?
    --Eu não sei, mas elle deve
    casar-se p'ra o fim do anno.
    --Que lhe faça bom proveito...
    --E o velho está satisfeito?
    --Pudera não! bem ufano!»

    Tal eram os commentarios
    que em toda a parte faziam
    as moças da visinhança,
    que em festas se reuniam;
    mas elle, surdo aos rumores
    que faziam seus amores
    nas discussões femenis,
    nada via além do encanto
    d'aquelle amor puro e santo,
    d'aquelles olhos gentis.

    Mas quem era a linda moça
    a quem Pedro tanto amava?
    quem era a virgem formosa
    que elle assim idolatrava?
    era rica ou pobresinha?
    tinha-lhe amor ou não tinha?
    Não é o que queres saber?
    lá vamos, leitor querido,
    satisfazer teu pedido,
    já tudo vamos dizer.


IV

    Ella tinha quinze annos; era um anjo
    de graça, candidez e de bondade,
    e aquelle coração de meiga pomba
    amava como se ama nessa idade.

    A todos occultava aquelle affecto
    que su'alma marchetava de illusões;
    dos sonhos côr de rosa que ella tinha
    quem pode descrever as emoções?

    De manhã apoz a prece fervorosa,
    fictados nos do Christo os olhos bellos,
    regava o seu canteiro, e de violetas
    um raminho prendia entre os cabellos.

    «Tomava o seu balaio de costura,
    tirava linha, agulhas e dedal,
    e sentava-se a coser o dia inteiro
    á sombra da mangueira do quintal.

    Ás vezes descuidando seu trabalho,
    parada co'o olhar ficto na estrada,
    no mar da phantasia, como um cysne,
    boiava da corrente á flôr levada.


V

    Tal era a mimosa filha
    do velho Simão da Cruz;
    de sua velhice o arrimo,
    alegria, vida e luz.
    Revia no rosto della
    a companheira extremosa,
    que lhe deixara, murchando,
    o rebentão de outra rosa.

    Vio-a crescer sob os olhos;
    estudou-lhe o coração,
    e lia nelle os mysterios
    d'aquella ardente paixão.
    Um dia toma-lhe o braço,
    fal-a sentar a seu lado,
    e diz-lhe rindo o bom velho:
    «Já tens algum namorado?»

    Enrubece, treme, ensaia
    dizer uma phrase, em vão!
    repete o velho a pergunta,
    e ella responde «--Não...
    --Não mintas, filha! não sabes
    que é um peccado mentir?
    --Perdão meu pai!--Não perdôo
    a quem me busca illudir.»

    Dos bellos olhos da moça
    o pranto desce a torrentes,
    cujas bagas vão no seio
    embeber-se encandescentes.
    O velho, ameigando a falla,
    apoz miral-a um instante,
    lhe torna: «--Vamos! não chores!
    não é Pedro o teu amante?

    «Bom rapaz! é de meu gosto...
    já fallou-te em casamento?
    e tu disseste que sim,
    sem o meu consentimento?!
    Como os filhos são ingratos!
    este mundo como vae!
    quem de uma filha os segredos
    guardará melhor que um pai?

    «Mas vamos lá! estou por tudo;
    disseste que sim? está dito!...
    fizeste mal em negal-o;
    isto assim não é bonito.
    Não chores, dá-me um abraço!
    será Pedro o teu marido;
    é justo, se o amas tanto...
    se foi o teu preferido...


VI

    Estamos em junho, no mez das fogueiras,
    do riso, das festas, das sortes, do amor,
    das cannas assadas, carás e batatas,
    dos jogos de prendas, do fogo em redor.

    Quem póde na roça ficar, preguiçoso,
    dormindo na rêde, sem ir ao pagode?
    se as moças bonitas lá estão feiticeiras
    cantando e sorrindo, fugir-lhes quem póde?


VII

    Na fazenda do Tymbira
    era velha a devoção
    de fazer-se grande festa
    em dias de S. João.
    O velho Joaquim Medeiros,
    que era a flôr dos fazendeiros
    d'aquella localidade,
    esfregava as mãos contente
    quando via em casa gente
    a que o prendia a amizade.

    D. Olympia, sua esposa;
    mãi dos pobres do logar,
    tres dias antes da festa
    não parava a trabalhar.
    Mandava as suas mucamas
    dos quartos fazer as camas,
    espanar tudo e varrer,
    e, doceira de bom gosto,
    lá estava firme no posto,
    fazendo o tacho ferver.

    Fazia doce de côco,
    laranja, cidra, limão,
    bom-bocado, arroz de leite,
    bolinhos de S. João,
    pamonha, cus-cus de milho,
    manouê, biju, sequilho,
    biscoutinhos de araruta,
    tarécos, baba-de-moça,
    e, mil doces que na roça
    se fazem de toda a fructa.

    No terreiro da fazenda
    preparava-se a fogueira,
    e o mastro todo enfeitado
    de folhagens de mangueira;
    e dentre as folhas escuras
    sahiam fructas maduras,
    como é o costume geral,
    e uma boneca vistosa
    de vestido côr de rosa,
    fazia o tópe final.

    No campo desde a porteira
    de verde murta vestida,
    duas linhas de coqueiros
    vem a porta da saida.
    De um lado a outro correndo,
    dirigindo ou desfazendo
    o que não estava direito,
    andava o rei dos festeiros
    o nosso velho Medeiros
    sempre alegre e satisfeito.

    «--Vamos com isso, rapazes,
    que temos mais que fazer
    e d'aqui por uma hora
    ninguem se póde mecher.
    Joaquina e Manuela,
    vocês vão lá p'ra capella
    capinar ali na frente.
    Olá, moleque, ó vadio!
    chega ali embaixo no rio,
    vê se vem alguma gente.

    «Vicente, traze as bandeiras,
    vai tu com elle, Francisco;
    Manuel, varre p'ra um canto
    e apanha depois o cisco.
    Não quero ver uma palha!...
    veja depois como espalha
    essas folhas de mangueira!...
    Ó Job, pergunta á sinhá
    se já tem café por lá,
    que mande aqui na porteira.»


VIII

    Se eu soubesse descriptiva
    dava aqui em perspectiva
    a fazenda toda inteira!
    tomava tinta e pincel
    e sobre plano-painel
    transportava... mas é asneira...

    Eu não pesco nem pitada
    dessa insulsa trapalhada,
    de linhas, pontos e traços;
    mas tambem não me entristeço,
    é sciencia que aborreço,
    cansa a cabeça e os braços.

    E na falta de sciencia,
    eu peço condescendencia
    p'ra o traçado que vou dar;
    é obra de um curioso...
    meu leitor, sei que és bondoso,
    não o queiras censurar.


IX

    O todo se emmuldura em matto virgem;
    arbustos mil em flôr dão-lhe a fragancia,
    e o fundo do painel é verde-escuro
    da côr de um cafesal visto á distancia.

    Por entre as pedras soltas de seu leito,
    o rio serpenteia murmurando.
    De um lado a horta, o engenho, alguns pomares,
    do outro, os animaes que estão pastando.

    Aqui o mandiocal n'um morro enorme,
    naquelles á direita, é o cafesal;
    ha uma socca de arroz junto do brejo
    e da cerca p'ra lá, o cannavial.

    No centro, n'uma dobra do terreno,
    a casa que é voltada p'ra o nascente;
    precede-lhe o jardim, primor de gosto
    que a abraça pela esquerda e pela frente.

    Ao fundo em duas ruas parallelas
    a casa da farinha, a do feitor,
    paióes, estrebarias e senzallas,
    o tanque, o gallinheiro, e corador.

    Olhando p'ra direita vê-se a escada
    que tem de cada lado uma mangueira,
    o campo e o caminho em linha recta,
    que da casa vae parar junto á porteira.

    Concebe o quadro lá como puderes!
    eu dou-te aqui apenas um bosquejo,
    querel-o completar fôra loucura,
    se bem que fosse grande o meu desejo.

    Lá chega o rancho enorme e folgasão
    que vem p'ra festejar o S. João.

    De quatro leguas em roda,
    toda aquella visinhança
    veio assistir á festança
    da noite de S. João.
    O povo da freguezia
    quazi todo nesse dia,
    ia como em romaria
    pandegar por devoção.

    Como é uso admittido,
    a pessôa convidada
    leva roupa preparada
    para quatro ou cinco dias!...
    lá na roça a moda é esta;
    qualquer pagode, não presta
    sem a semana de festa,
    de intermináveis folias!

    Subindo e descendo morros,
    n'um carro por bois puchado,
    n'um tunel improvisado
    de arcos e de uma esteira,
    de uma fazenda visinha
    a passo lento caminha
    a familia que se aninha
    n'essa amavel capoeira.

    Atraz os negros da casa
    Tão carregando os bahus,
    sem camisa, quazi nús,
    e alagados de suor;
    ao lado caminha a passo,
    n'um lindo macho picaço,
    o fazendeiro ricaço
    que vae morto de calor.

    Os filhos vão a cavallo.
    Na frente caminha o pagem,
    que sem esse personagem
    na roça não se é ninguem!
    É um negro de confiança
    em quem o Senhor descança,
    que exerce desde criança
    o cargo honroso que tem.

    Usa jaqueta de vivos,
    chapeo baixo de oleado,
    topete bem penteado,
    canos de bota e chilenas;
    é o mensageiro de amores
    dos filhos de seus senhores;
    leva cartinhas e flôres
    para entregar ás pequenas.

    O pagem da roça é um typo
    de serio e acurado estudo,
    sabe um bocado de tudo
    quanto se deve saber.
    É ferrador, é selleiro,
    carapina e corrieiro,
    é peão e no terreiro
    requebra um fado a valer.

    Aqui um rancho de moças
    vae a pé, moram tão perto!...
    são duas leguas, é certo,
    mas diz-se na roça:--é ali.
    E por toda aquella estrada
    vê-se gente a pé, montada,
    e outra que já cançada
    bebe á sombra paraty.
    ...................................
    ...................................
    ...................................


X

    Terminou-se o jantar, é noite escura;
    com fachos de sapé ligeiros correm
           os moços dando vivas.
    Accende-se a fogueira e em torno a ella
    vão sentar-se alegres, descuidosos,
           os grupos de convivas.

    Aqui tomam garapa em lisas cuias,
    os velhos, que disputam seriamente
           ácerca de eleições,
    ou fallam do café que está sem preço,
    nos gastos da lavoura e poucos lucros
           de suas transacções.

    Ali as moças todas reunidas
    dissertam sobre amor e namorados
           com tal proficiencia,
    como um lente, jubilado na materia,
    derramando em qualquer academia
           a luz da experiencia.

    Não longe os rapazes formam grupos:
    uns são republicanos exaltados
           e outros monarchistas;
    e outros sem partido, olhando as moças,
    a morrer de amor por ellas, contam rindo
           amores e conquistas.

    É tudo animação, prazer e vida...
    aqui um bello dito, ali vozes confusas,
           gostosas gargalhadas;
    estouram buscapées, rebentam bombas,
    foguetes e balões erguem-se aos ares
           no meio de apupadas.


XI

    «--Qual, compadre, desta feita
    parece que os liberaes
    não sobem, não, mas é o mesmo...
    que me diz, Sr. Moraes?

    «--Eu não sei, mas desconfio
    que os homens não fazem nada;
    pelo menos lá na villa
    é tudo chapa cerrada.

    «--Aposto cem contra dez,
    com quem quizer apostar,
    em como os conservadores
    hão de ceder o logar.

    «E o Brazil vae á garra
    se os liberaes não subirem;
    que projectos, quanta cousa
    se perde, se elles cahirem!

    «Estradas e mais estradas,
    navegação pelos rios;
    hão de fazer o diabo
    porque empenharam seos brios.

    «--Ora adeus, em quanto a brios
    os outros tambem os tem;
    e ninguem lhes passa a perna,
    porque fallam muito bem.


XII

    «Ó Gringo, salta a fogueira!
    ó Guillon, pula tambem!
    assim, Norberto! um, dois, trez...
    sim, senhor, foi muito bem!

    «_Seu_ Zé Carlos, largue a moça!
    não seja namorador!
    já temos nova conquista?
    vem p'ra aqui, ó seductor.

    «O Octávio lá está n'um canto
    a scismar _encalistrado_!
    que tem elle?--Ora o que tem!
    anda muito apaixonado:

    «Dizem que elle foi a um samba
    e de lá veio cahido...
    mas espera, olha o Zamith
    como está todo lambido!

    «E o Licurgo? oh que maroto!
    desde que elle se casou
    está com ar de homem serio,
    ficou bonito, engordou!...

    «Tira os carás do rescaldo,
    moleque, traz o melado!
    oh ladrão, anda ligeiro...
    este sim, está bem assado

    «É só da tropa fandanga!
    ninguem mais aqui se metta!
    Ezequiel, tu não comes?
    estás forjando alguma pêta?


XIII

    «--Pois creia, sinhá Chica, foi olhado
    botado na pequena com certeza;
    Candóca esteve assim, mas foi resal-a
    a sogra do Manduca, a nhã Thereza.

    «Foi lá trez sextas-feiras, em seguida
    benzeu e deu-lhe uns _póses_ p'ra tomar;
    e hoje, benza-a Deus, está que é um gosto!
    só vendo é que se pode acreditar!

    «--Pois olhe, p'ra fallar minha verdade,
    já tinha me _alembrado_ ser feitiço...
    não podia senão ser cousa feita..
    pelos modos que é, só se foi isso.

    «A menina tem uns flatos pelas costas,
    e anda jururú que mette pena!
    coitada! tem tomado mil mesinhas
    e nada de arribar; pobre pequena!

    «--Quem sabe, diz a tia Marcolina,
    que entende destas cousas como gente,
    quem sabe se a espinhela tem caida?!
    se for isso, ponho-a boa de repente.

    «A lua agora é nova... pouco importa,
    na sexta-feira cedo mande-a lá,
    que com favor de Deus tenho esperança
    que volta sã e salva para cá.»


XIV

    Eu não sei porque é que em toda a festa
    se encontra sempre um bôbo, um toleirão,
    dizendo muita asneira e se inculcando
    rapaz de muita graça e sabichão!

    Á festa de Medeiros foi um typo,
    a quem debalde eu busco descrever;
    deixára a côrte onde era um _petit-maitre_
    e á roça foi levar todo o saber.

    Fallava sempre em termos empollados,
    mirava-se ao espelho a cada instante;
    usava citações em qualquer lingua,
    e tinha o ar altivo do pedante.

    Frisada a cabelleira e com pastinhas...
    gravata verde-mar, o fraque azul,
    as luvas côr de cinza, a calça branca,
    sapatos de verniz; eis meu taful.

    Desceu para o terreiro, olhou em torno
    buscando achar um pobre a quem massar,
    e eil-o dentro em breve n'uma roda,
    com todo o seu furor a disputar.

    «--Perdão, dizia o typo enthusiasmado:
    eu sou republicano, e como tal
    exijo a liberdade a mais completa,
    quer na ordem civil, quer na moral.

    «A lei é um empecilho á liberdade,
    o que a dicta ou a impõe é um vil tyranno
    os povos não precisam de governo,
    o exemplo está no povo americano!

    «_To be or not to be_, eis como eu penso;
    abaixo a realeza e o seu prestigio;
    o rei a quem o mundo hoje se curva
    escreve--Liberdade--em gorro phrigio!»

    Fallou e disse asneiras muito tempo
    até que ficou só, sem mais ninguem!
    «--Camellos! disse elle em tom baixinho,
    nem sabem de que ponto a luz lhes vem!»

    Mas vendo ao longe a bella Margarida,
    exclama o nosso heróe: «--Oh! _c'est charmant!_
    _Mignone_, vaes ser minha, assim t'o juro...
    e agora ella está só! _c'est bien l'instant_.

    E assim dizendo applica o _pince-nez_
    e vae sentar-se ao lado da menina.


XV

    «Desculpe vossa excellencia,
    mas eu creio que já a vi!
    --Póde ser, responde a moça,
    quasi sempre eu venho aqui...»
    «--Não foi aqui, foi ha um anno...
    na côrte, se não me engano,
    n'um baile que eu a encontrei...
    --Oh! gentes! está enganado,
    se perguntar p'ra que lado
    a côrte fica, não sei!»

    «--Era então o seu retrato
    divinamente imitado...
    os mesmos olhos divinos!
    o mesmo rosto adorado!...
    «--Oh! senhor, parece incrivel!
    deveras será possivel
    tão pasmosa semelhança?!
    --Oh! natura eterna e infinda!
    nunca vi mulher tão linda!...
    --Eu sou linda? que esperança!

    «--Então não vio Guanabara
    da metrop'le no regaço,
    sonhando loucos edyllios
    co'os olhos fitos no espaço?!
    «--Não senhor! se eu não conheço!»
    «--Escuta, diva, eu te peço:
    sou talvez um sonhador...
    --Oh! moço, mal comparando,
    quando o senhor está fallando
    parece-me um pregador!»

    «--Serei tudo, ó casta diva,
    innocente Julieta!
    tu'alma exhala o perfume
    da modesta violeta!...
    --_Ué_! que moço engraçado!
    já deu-me o nome trocado...
    eu me chamo Margarida.
    --Margarida? Oh! doce encanto!
    teu nome tão puro e santo
    guardarei além da vida!

    «Escuta, sylpho do empirio,
    dos céus aerea visão,
    não sentes do amor as lavas
    que arroja o meu coração?
    partamos, além na selva
    sobre um tapete de relva,
    pousemos o floreo ninho!
    partamos, a noite é densa...
    --Ó moço, eu peço licença,
    eu vou fallar com dindinho!

    «--_Comment celà!_ não me deixes
    com tua ausencia obumbrado!
    queres tu que um cenotaphio
    erga a um amor desgraçado?
    --Oh! _seu_ aquelle, me deixa!
    senão eu vou fazer queixa
    a meu pai, largue meu braço!..
    --Não partas, anjo bemdito...
    --Eu sou grossa p'ra palito...
    --Ao menos dá-me um abraço!...»


XVI

    Tal como ao terminar-se da espoleta
    o mixto que de um jacto a carga inflamma,
    e no rouco troar detona a bomba
    cuspindo os estilhaços, fumo e chamma,

    assim do meu leão, na face núa,
    por mão callosa e firme manejada,
    a bomba do ciume arrebentara
    e com ella uma tremenda bofetada!

    Zumbiram-lhe aos ouvidos mil besouros,
    myriades de estrellas viu então;
    sahiram-lhe faiscas pelos olhos,
    perdera o equilibrio, e... foi ao chão!

    De pé, em frente a elle estava um homem,
    raivoso como tigre olhando a preza;
    nos olhos faiscava-lhe o ciume,
    nos labios um sorrir de atroz dureza!

    É Pedro, que no seu amor selvagem
    não póde reflectir, sabe vingar;
    feriam-lhe de morte as crenças d'alma,
    e o tigre que é ferido quer matar.


XVII

    «--Pedro! Pedro! então que é isto?!
    valha-me Nossa Senhora!
    --Margarida, vae-te embora,
    tu não me queiras perder!
    --Pelo que tens mais sagrado,
    deixa esse moço, coitado!
    que mais lhe queres fazer?!...

    «--Quero mostrar a um patife
    como se falla a uma moça;
    elles pensam que na roça
    é como lá na cidade?!
    «Estão enganados comigo!...»
    E com o joelho no umbigo
    dava-lhe sôcco á vontade!

    «--Soccorro! gritava a moça
    quazi louca de terror;
    meu pai, accuda o senhor,
    porque elles se vão matar!...
    meu Pedro, não sejas louco,
    olha, escuta, espera um pouco;
    meu Deus! quem ha-de apartar?

    «--Sahe-te d'aqui co'os diabos!
    não me atormente a cabeça,
    puche já, não me aborreça...
    você pensa que me embaça?
    É tambem teu namorado?
    ha de amargar um bocado,
    hei de tirar-lhe a fumaça...

    «--Repare que é minha filha;
    escutou, _seu_ malcriado?
    sou velho, estou alquebrado,
    mas ninguem me offende em vão!
    sei tolerar n'essa idade
    loucuras da mocidade;
    mas insultal-a, isso não!

    «Margarida é muito honesta!
    não é lá quem você pensa!...
    acho bom que se convença
    que ella tem alguem por si!
    Vem-te embora, minha filha,
    o homem, que assim te humilha,
    é mais que indigno de ti.»


XVIII

    Chegara emfim Medeiros e á contenda,
    poz termo com palavras convincentes;
    do chão suspende o pobre Lovelace,
    separa os dois mancebos imprudentes.

    --Levando pelo braço o seu Juquinha,
    com elle vae p'r'a sala de jantar
    e póde ver á luz, banhado em sangue,
    o triste _petit-maitre_ a soluçar!

    O rosto lhe lavaram com cachaça,
    ficando para todos bem patente,
    que os beiços, o nariz e o olho esquerdo,
    mais gordos lhe ficaram de repente.

    Depois tinha cansaço, foi p'ra um quarto
    que dava uma janella p'ra o jardim,
    despio-se, tomou banho, foi deitar-se...
    dormio? não sei dizer, creio que sim.

    A festa terminou neste incidente
    e cada um tratou de se ir deitar:
    a lua ia bem alta além no ceu,
    e o gallo amiudava o seu cantar.


XIX

    Dona Olympia ouve um gemido
    partir de seus aposentos;
    chegou-se á porta de manso
    prestando ouvidos attentos...

    Era a pobre Margarida
    que entre soluços sem fim,
    co'o rosto nas mãos occulto,
    chorava dizendo assim:


XX

    «Pelas chagas de teu filho,
    pelas dôres que soffreu,
    pelo pranto que verteste
    quando na cruz te morreu,
    valei-me, Nossa Senhora,
    nesta dôr que sinto agora!

    «Inda a pouco era ditosa,
    tinha amor, tinha esperança,
    de um momento de tristeza
    não tenho a menor lembrança!
    eu sorria ao ver-me assim;
    meu sorrir já teve fim...

    «De tudo quanto já tive
    que mais me resta? mais nada!
    quiz provar-lhe o meu affecto
    e fui vilmente insultada!
    Ai, Pedro! que me mataste
    quando assim me injuriaste!

    «Agora que mais espero?
    que esp'rança mais posso ter?
    venha a morte e venha breve,
    que sou feliz se morrer!
    Que Deus lhe pague em prazer
    o quanto me fez soffrer.»


XXI

    Dona Olympia entreabrio de manso a porta,
    e sem bulha chegou-se junto a ella,
    tomou-lhe as mãos nas suas, vio-lhe o pranto,
    beijou a meiga face da donzella...


XXII

    «--Que é isto, minha louquinha?
    quem é que falla em morrer?!
    viste um espinho na vida
    e já te cança o viver!
    Nas tuas suppostas dôres
    só recordas-te os amores,
    mas esqueceste teu pai!...
    Margarida, és muito ingrata!...
    queres matal-o?... pois mata!
    vae pedir a morte, vae!

    «Ao pobre e cançado velho
    que vive do teu carinho,
    em vez de beijos e abraços,
    crava-lhe n'alma um espinho!
    Arrufos de um namorado
    valem mais que um velho honrado?!
    Pensas bem, minha afilhada!..
    vaes morrer? não te demores!
    mas o que é isto? não chores!
    que vale um pai?... quasi nada!

    «--Misericordia, madrinha!
    não falle assim que enlouqueço!
    meu Deus! qual foi o meu crime
    que tal castigo mereço?!
    --Teu crime é não ter juizo....
    e sabes o que é preciso?
    é: pedir a Deus perdão.
    Limpa esses olhos, menina!
    a gente assim se amofina;
    tu choras sem ter rasão!

    «--Mas elle está mal commigo
    e meu pai nem o quer ver!
    --Cala a boca, te prometto
    que tudo se ha-de fazer.
    Socega, filha: descança,
    se ainda tens confiança
    na tua velha madrinha!
    Amanhã em santa paz
    tudo se arranja e se faz;
    vae dormir, minha louquinha?»


XXIII

    Margarida radiante da alegria
    que sentia renascer no coração,
    abraçava com transporte aquella amiga
    e cobria de mil beijos sua mão.



CANTO SEGUNDO


I

    Oh tu quem quer que sejas, meu leitor,
    attende ao que te digo: a ti o auctor
    começa por te dar os parabens
    da somma de pachorra que tu tens,
    se leste esse arremedo de poesia
    sem arte, sal, perfumes e harmonia,
    que p'ra ahi rabisquei sem tom nem som.
    Já vejo que és rapaz prudente e bom...
    desculpa o tratamento... as etiquetas
    exigem luva branca e roupas pretas;
    mas isto é muito bom p'ra deputados,
    que vivem simplesmente de apoiados
    e gastam excellencia a tres por dois...
    coitados! são mal pagos... e depois
    sujeitos a caprichos de ministros....
    ás vezes trazem rostos tão sinistros,
    que chego a ter de véras compaixão...
    Mas dizem que são filhos da eleição?!
    a culpa é então da mãi que os deu á luz,
    que tinha atraz da porta aquella cruz,
    envolta n'um programma e mil projectos
    p'ra os hombros dos filhotes mais dilectos!...
    Sê franco, meu leitor, se estou massando,
    arrólho a discussão e vou tratando
    do resto d'esta historia que encetei...
    Palavra, que não sei onde fiquei...
    Mas... eu te escrevo em mangas de camisa;
    não olhes p'ra o meu trage... quem precisa
    pendura com cuidado o paletot,
    depois de sacudir-lhe bem o pó,
    e fica assim á fresca muito bem.
    Quem poupa, meu amigo, sempre tem!
    não achas que é verdade, ó maganão?
    pois folgo com a tua opinião.
    As cousas andam más, tudo está caro!
    o cobre, santo Deus! anda tão raro!...
    ao menos lá por casa é uma desgraça!
    por mais que se trabalhe ou que se faça,
    por mais que se amofine uma pessoa,
    vem sempre a dar na mesma, é sempre á tôa,
    Fallemos n'outra cousa, as digressões
    arredam sempre o fio ás discussões.
    Entremos na materia francamente,
    vejamos o que é feito desta gente.


II

    O dia amanheceu bastante frio.
    No chão, sobre os sofás e nas cadeiras
    dormiam somno solto os convidados,
    em duzias de colchões e mil esteiras.

    O nosso fazendeiro acordou cêdo,
    e poz as cosinheiras logo em pé;
    sentou-se na varanda lendo as folhas
    á espera que trouxessem-lhe o café.


III

    «--Ora bom dia, _seu_ Pedro!
    --Bom dia, Sr. Medeiros!
    --Ainda o fazia dormindo
    e vejo que é dos primeiros!...

    «Então estranhou a cama?
    passou mal, não é verdade?
    --Não, senhor! pelo contrario,
    perfeitamente á vontade.

    «--Li agora na _Gazeta_
    um facto bem curioso!
    um sujeito, um estrangeiro...
    mas que homem ardiloso!

    «Engole uma espada inteira!
    que barriga! Ave Maria!
    --Mas é serio?--Oh! se o não fosse
    a folha não o diria...

    «O que é isto?! onde se atira
    já de esporas? onde vai?!
    --Vou... eu ia até lá embaixo.
    --Não, senhor, hoje, não sahe.

    «--Mas escute, _seu_ Medeiros...
    --Não escuto, não senhor;
    já queria pôr-se ao fresco?
    enganou-se, meu amor!

    «Ó homem, 'stou te estranhando!
    você que é tão pagodeiro!
    --Eu ia vêr se lá embaixo
    recebia hoje dinheiro...

    «--Qual dinheiro, qual historia!
    eu bem sei o que isto é!...
    Sabes que mais, pucha um banco
    e vamos tomar café.

    «--Já que de todo é preciso
    vou lhe fallar francamente...
    --Pois desembucha, rapaz,
    fallando se entende a gente.


IV

    «--O senhor bem me conhece...
    não sou homem de questões,
    nem ando brigando á tôa
    por qualquer duas razões;
    mas hontem foi desaforo!
    o sujeito de namoro
    co'a minha noiva, e eu ali!
    isto não é fazer pouco?...
    parti cégo como um louco...
    nem sei bem o que senti...

    «Eu vinha de orelha em pé
    ouvindo o palavreado!
    não sei o que... de epitaphios...
    e d'ahi por um bocado,
    agarrou-lhe por um braço
    e quiz lhe dar um abraço,
    no momento em que cheguei!
    fiquei damnado da vida!
    e co'a cabeça perdida,
    por milagre o não matei!...

    «Depois... não ouvi mais nada...
    todo este povo a gritar...
    ouvi o senhor fallando,
    quando nos veio apartar...
    mas estou incommodado
    do negocio se ter dado
    n'uma casa que eu respeito...
    em outro qualquer logar,
    não me importava brigar
    até um ficar desfeito!...

    «--Tudo isso nada vale!
    não penses nisto, rapaz....
    são cousas que a gente moça
    mais ou menos sempre faz.
    --Não, senhor, eu bem conheço
    que isto é máu; mas o que peço
    é que queira perdoar...
    ás vezes lá vem um dia...
    e a gente está de _arrelia_,
    não se póde dominar...

    «--Vamos fallar de outra cousa,
    isto é pura criançada...
    que fizeste á Margarida?!
    --Quando?--Hontem!--Não fiz nada!
    --Pois olha, metteu-me pena
    vêr a pobre da pequena
    chorando, não sei porque...
    --Ella chorou? mas que tinha?
    --Não sei, fallou co'a madrinha
    e a respeito de você.

    «--A meu respeito?! e que disse?!
    --Como já estavas zangado,
    disseste-lhe alguma cousa...
    e te excedeste um bocado...
    --Eu, meu Deus?! ainda mais esta!
    vejam só que bôa festa!
    que S. João tenho eu!...
    e tudo, veja o senhor,
    por causa desse impostor,
    desse barbas de judeu!

    «É uma nuvem passageira...
    não te dê isso cuidado;
    vocês fazem logo as pazes
    e está o negocio acabado.
    Falla tambem co'o Simão...
    o velhote tem razão
    de estar massado comtigo...
    foste offender ao coitado,
    que ficou bem magoado;
    mas o velho é teu amigo.»


V

    Vinha chegando alguem e esta conversa
    ficou neste logar interrompida;
    vão pouco a pouco erguendo-se as visitas,
    renova-se o prazer, renasce a vida.

    Estava tudo em pé; porém o Juca?
    estava ainda no quarto, ainda dormia?
    «--Ó senhor! vão acordal-o, já é tarde
    e basta de dormir: é meio dia.»

    A mesa estava posta, e o fazendeiro,
    que o não vira des que o dia amanheceu,
    abre a porta e só encontra sobre a mesa
    uma carta p'ra si, que abriu e leu:


VI

    «_Meu caro Sr. Medeiros:
    vou p'ra côrte no trem mixto
    que sahe d'aqui a uma hora.
    Desculpe, se faço isto
    sem lhe ter agradecido
    o seu bom acolhimento;
    mas pode estar convencido
    de que no meu coração,
    p'ra com vossa senhoria
    fica eterna gratidão.
    Se fôr á côrte algum dia
    contar-lhe-hei como foi
    a questão. Não tive a culpa;
    o que lhe peço é desculpa
    pelo modo desairoso,
    porque saio da fazenda.
    Vou bem triste e pesaroso
    por causa d'essa contenda,
    que não julguei provocar.
    São horas de me ir embora...
    recommende-me á senhora
    de quem parto penhorado.
    Adeus, aceite um abraço
    do seu amigo e criado...
    JOSÉ DE SOUZA CABAÇO._»


VII

    Medeiros releu a carta,
    dobrou-a, poz na algibeira
    e disse com seus botões:
    «--Ora ahi tem a brincadeira!

    «Um ficou todo mordido!
    o outro--todo esfolado!...
    qualquer dos dois, de juizo
    não tem sequer um bocado!

    «Que dois malucos de força!
    valha-me a Virgem e o Christo!
    qual dos dois terá razão?...»
    e sahio pensando nisto.

    ..............................
    ..............................
    ..............................
    ..............................


VIII

    E os donos da casa empenhados
    em fazer a reconciliação
    conversavam co'os noivos e o velho,
    num cantinho do grande salão.

    Houve protestos, desculpas,
    suspiros, explicações;
    e afinal lá se entenderam
    com muito boas razões...

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    ..............................
    ..............................
    ..............................


IX

    «--Vamos p'ra mesa, senhores,
    que o almoço está esfriando!
    deixemos as ceremonias!
    cada um vá se sentando.

    «Falta aqui um guardanapo...
    Olympia, manda buscar...
    quem quer leitão recheiado
    levante um dedo p'ra o ar.


X

    «Senhores, disse o bom Joaquim Medeiros,
    (e tudo se callou para escutar)
    eu tenho uma noticia de importancia,
    que quero a todos vós communicar.

    «Ali minha afilhada Margarida,
    se bem que me escondesse agora o rosto,
    vae com Pedro, o patusco, felizardo!
    casar-se p'ra meado ou fins de agosto.

    «E como eu sou padrinho do casorio,
    que ha de effectuar-se na fazenda,
    convido a todos vós para assistirdes
    ao nó que não tem pontas, nem se emenda.

    «E aqui o _seu_ vigario, que é de casa,
    aprompta a papellada n'um momento,
    e ha de me amarrar estes pombinhos
    benzendo-lhes os anneis do casamento.

    «Bebamos, pois, dos noivos á saude!
    Senhores, a saude é feita em pé!
    Hurrah! ip! ip! hurrah! vivam os noivos!
    a coisa é de virar, ip! bangué!»


XI

    Simão ergueu-se a custo, e commovido
    fallou desta maneira aos assistentes:

    «--Senhores, quando a alegria
    nos afoga o coração,
    não ha palavras que a digam,
    falta-nos toda a expressão!

    Choramos quando soffremos,
    quando gosamos, sorrimos,
    mas o riso não exprime
    o que n'alma nós sentimos.

    «Assim 'stou eu; bem quizera
    dizer-vos neste momento
    tudo, tudo quanto sinto,
    qual é o meu contentamento,

    «mas não posso, porque é tanta
    a minha felicidade,
    que mais me parece um sonho,
    que pura realidade!

    «E sabeis a quem a devo?
    a quem posso agradecer?
    quem é que em duas palavras
    me embriaga de prazer?!

    «É aqui a mãi dos pobres
    e o meu compadre Medeiros!
    este grande coração!
    a nata dos fazendeiros!

    «Á saude, pois, d'aquelles
    que não tem ostentação,
    quando afogam na alegria
    um mirrado corração!»

    E todos gritavam co'os copos erguidos
    dos donos da casa, bebendo á saude:
    «Que Deus lhes dê vida, que Deus os conserve
    p'ra auxilio dos pobres, p'ra amparo á virtude.»

    ..............................
    ..............................
    ..............................
    ..............................

    Passados oito dias de prazer,
    oito dias de festa e de alegria,
    vão indo pouco a pouco os convidados
    saudosos, p'ra o lidar de cada dia.



CANTO TERCEIRO


I

    Os peralvilhos da côrte,
    ou cidades principaes,
    todos querem ser poetas,
    todos fazem madrigaes
    quando estão apaixonados.
    Em versos estropiados,
    alguns que tem legoa e tanto,
    a pobre da musa súa,
    suspirando á luz da lua
    em cada suspiro um canto!

    Aquelles que nem a tiro
    se lhes abre a cachimonia,
    assignam versos roubados
    com toda a sem ceremonia!
    Não fazem questão de auctor...
    querem provar seu amor
    á deidade que os inspira?
    lá vão direitos á estante,
    e d'ali por um instante
    geme e canta a alheia lyra.

    São estes os commodistas
    e os que tem mais razão...
    p'ra que quebrar-se a cabeça
    se ha versos em profusão?!
    é obra feita, é verdade:
    mas escolhe-se á vontade
    onde ha tanto p'ra escolher...
    lá vai a amostra do panno
    que um typo fez por engano,
    por não ter tempo a perder:


II

    Oh! virgem pura de meus sonhos lindos,
    lyrio mimoso dos jardins dos céus!
    escuta o bardo descantando amores
    louco, inspirado nesses olhos teus!

    Escuta as notas que desprende a lyra
    embevecida neste amor sublime;
    nestes accordes, muito embora rudes,
    só a verdade o meu cantar exprime.

    Tu és a fonte inexhaurivel, pura,
    onde a minh'alma vae a fé beber,
    symbolo da crença, de esperanças fóco,
    livro sagrado que me ensina a crêr.

    Tu és a gota matinal do orvalho
    na rubra pet'la de uma flôr louçã,
    limpido espelho de virtude e graça,
    estrella d'alva em festival manhã.

    Tenra avesinha que em gorgeios ternos
    a Deus envia o suspiroso canto,
    visão etherea do sonhar do bardo,
    miragem bella de sublime encanto.

    Tu és a lympha, que em ramaes de prata,
    borda a campina marchetada em flôres,
    iris formoso da bonança emblema,
    casto sacrario de gentis amores.

    És tudo, tudo quanto é grande e santo,
    astro fulgente de brilhante luz!
    Anjo da Guarda que atravez d'espinhos
    meus tibios passos ao porvir conduz.


III

    Na roça não se usa disto,
    quem faz cerco a um coração
    improvisa as suas quadras
    com a viola na mão.

    E na prima e na segunda
    faz um tal repenicado,
    que a pequena fica tonta
    quebrando o sapateado.

    ..............................
    ..............................
    ..............................
    ..............................

    Quem procura a paz do espirito,
    quem busca a felicidade,
    ha de encontral-a na roça,
    raras vezes na cidade.

    Ali a vida é mais calma;
    a mudez da solidão,
    é como um balsamo santo
    ás dores do coração.

    A doce tranquillidade,
    que se desfructa no lar,
    illumina aquellas almas
    de uma luz crepuscular.

    Na festa ha mais alegria...
    ha no trato amenidade;
    o homem da roça é o typo
    da honra e da honestidade.

    Se acaso lhes bate á porta
    um estranho, um forasteiro,
    tem agasalho e amizade
    desse povo hospitaleiro.

    Sob uma crosta grosseira
    se encontra a sinceridade,
    e mais que ninguem conhece
    as leis da hospitalidade.

    Mas se lhes offendem os brios
    sabem affrontas vingar,
    que o homem rude do campo
    não póde insultos tragar.


IV

    Chegara em fim o dia suspirado
    daquellas duas almas, que se amavam:
    em breve vão-se unir p'ra todo o sempre
    no laço por que a tanto suspiravam!

    Nos meigos olhos della ha mil affectos...
    as faces se lhe tingem de rubor,
    e os labios entreabertos côr de rosa
    parecem repetir:--ventura, amor!

    No rosto do mancebo ha um que de vago
    e certa commoção mal disfarçada!
    é que é tal a ventura que o espera
    que duvida vel-a emfim realisada!


V

    «--Escuta, minha afilhada,
    tu hoje vaes te casar...
    é o passo mais delicado
    que uma mulher póde dar.
    A partir desse momento,
    do nosso procedimento
    depende todo o futuro.
    Escuta toda a verdade,
    se queres a f'licidade,
    este caminho é seguro.

    «No dia do casamento
    tudo é cheio de illusões!...
    julgamos tocar ao termo
    das nossas aspirações.
    Mezes depois, vamos vendo
    que já vão arrefecendo
    nossos sonhos virginaes;
    passada a illusão primeira,
    a mulher é a companheira,
    uma amiga, e nada mais.

    «Então é preciso emprego
    de toda a nossa prudencia,
    e ter p'ra com o marido
    a maior condescendencia.
    Se chega em casa cansado,
    dar-lhe carinhos e agrado,
    não perguntar de onde vem;
    elle mesmo irá dizendo
    o que andou por lá fazendo,
    ou se esteve com alguem.

    «Nunca sejas ciumenta,
    nem lh'o dês a conhecer!
    o ciume, além de inutil,
    nos envenena o viver.
    Sê sempre condescendente...
    não te mostres exigente
    nem lhe peças sacrificios:
    um pedido caprichoso,
    para um marido extremoso,
    é um dos grandes supplicios.

    «Sempre affavel, carinhosa,
    sempre modesta e asseiada...
    eis aqui como procede
    a mulher bem educada.
    Algumas, infelizmente,
    ignoram completamente
    estas verdades, e então
    dizem que são desgraçadas;
    mas são ellas as culpadas,
    é falta de educação.

    «Quando em casa não encontram
    meiguices, consolações,
    os maridos se aborrecem,
    vão procurar distracções...
    e uma vez encetado
    esse trilho tão errado,
    é um martyrio esse viver!
    Deus te livre, Margarida!
    a ter semelhante vida,
    melhor te fôra morrer!

    «Eis aqui os meus conselhos
    que sempre tenho seguido;
    e de cumpril-os á risca
    não me tenho arrependido.
    Desde criança a meu lado,
    has de ter observado
    como trato teu padrinho;
    e tenho sido estimada...
    se queres ser adorada
    faze o mesmo ao teu Pedrinho.»


VI

    Adornada a capricho p'ra este dia,
    da fazenda a pequena capellinha
    estava que era um mimo de bom gosto,
    tão faceira! tão bem arranjadinha!

    Sanefas de setim verde e amarello,
    nas paredes damasco alaranjado,
    alampadas de prata, quatro lustres,
    e um soberbo tapete avelludado.

    O todo era singelo, doce e grave,
    incitava não sei que ao coração!
    noss'alma sem querer a Deus se erguia
    nesse encanto mental de uma oração.

    Lá fóra repicava alegre o sino...
    festões, arcos e flôres no terreiro,
    convidados, amigos e parentes,
    e sempre satisfeito o fazendeiro.


VII

    São horas, tudo está prompto;
    todos seguem p'ra capella.
    Na frente caminha ella
    pelo braço da madrinha;
    logo atraz Pedro, Simão,
    Medeiros, uma sobrinha
    do vigario, e a multidão
    que caminha alegremente
    em ruidosa confusão.
    Era um quadro interessante
    de belleza original
    o que eu vi naquelle instante:
    cabeças brancas de neve,
    rostos graves enrugados
    pendidos p'ra sepultura,
    a par de frontes divinas,
    de olhos meigos namorados
    derramando mocidade!
    Oh! como é bella essa idade
    em que tudo é só prazer!
    em que a existencia é um sorriso,
    em que o amor é um paraiso,
    em que o sonhar é viver!
    O grupo entrou na capella
    ajoelhou-se, benzeu-se,
    resou e depois ergueu-se
    e cochichava em segredo;
    mas callou-se de repente
    quando o padre appareceu.
    Margarida estremeceu
    e disse machinalmente:
    «Agora vou ser feliz.»

    ..............................
    ..............................
    ..............................
    ..............................

    Estava emfim realisado
    aquelle sonho dourado
    de su'alma casta e pura!
    a embriaguez da ventura
    tornava-a mais que divina!
    aquellas faces rosadas
    levemente afogueadas
    de prazer e commoção,
    traziam-lhe tal encanto,
    que eu creio que até um santo
    succumbia á tentação!

    Era finda a ceremonia.
    Pedro, qu'inda não fallara,
    por pouco não desmaiara
    nos braços do fazendeiro,
    fulminado de alegria!
    e no sorriso nervoso
    que d'alma aos labios lhe vinha,
    quem é que não traduzia
    o que n'alma o pobre tinha?

    Passados alguns momentos,
    já depois dos comprimentos
    de todos que os rodeavam,
    sahiram de braços dados
    sob uma chuva de flôres
    que em cima lhe despejavam
    á porfia, os convidados.

    Chegados todos á casa,
    Simão e Pedro de um lado
    á meia voz conversavam.
    Dizia o velho alquebrado:
    «Nesta filha que te entrego,
    dou-te tudo quanto tenho,
    dou-te os olhos, fico cégo,
    mas risonho e satisfeito...
    eu já estava tão affeito
    que não sei como sem elles
    eu possa agora viver!...
    ella era o sol bemfazejo
    ao qual eu me ia aquecer;
    porém fico descansado,
    porque em ti achou arrimo....
    eu somente o que lastimo
    é ser velho e não ter nada,
    não p'ra mim que não preciso,
    era por ella, coitada!
    que é um anjo como tu sabes.
    Olha, Pedro, eu só te peço,
    se alguma cousa mereço,
    que trates bem minha filha!
    minha pobre Margarida!
    Ella ha de adoçar-te a vida
    porque é muito carinhosa,
    e como foi boa filha
    deve ser tambem esposa.»

    ..............................
    ..............................
    ..............................
    ..............................

    E em quanto o velho fallava
    da filha por quem vivia,
    dos olhos se lhe escapava
    uma baga que rolava
    e na barba se escondia.


VIII

    «--Forma a roda! oh! _seu_ Casusa
    não fuja, vamos brincar;
    vá decidir na viola
    para este povo dançar.

    «--Qual o que! o _seu_ Manduca
    é _cabra_ bom tocador,
    e eu não vou tirar a espada
    da mão de um tal jogador.

    «--Vamos então ver os dois
    no desafio pegados...
    Forma roda! forma roda!
    quero ouvir esses damnados.»


IX

    E emquanto sapateavam,
    os dois assim descantavam:

    «--Meu senhor, me dê licença
    que eu quero principiar:
    quero botar uma trova
    para quem me faz penar.

    «--Póde entrar que o matto é limpo,
    não tem onça, nem queixado,
    tem somente uma morena
    por quem ando apaixonado.

    «--Obrigado, companheiro,
    Deus te ajude nos amores;
    mas quem gosta das morenas
    soffre penas, sente dôres.

    «--Eu bem sei de quem tu gostas,
    p'ra ella podes cantar;
    é clara, tem olhos pretos,
    olhos que te hão de matar.

    «--Na barra do teu vestido
    anda preso um coração,
    menina, minha menina,
    da minha veneração.

    «--O sipó do matto virgem
    amarra o jacarandá;
    assim, morena, em teus olhos
    ando eu bem preso já.

    «--Fui ao matto cortar lenha
    e encontrei a jurity,
    ella tinha os seus amores
    como os eu tenho por ti.

    «--Larangeira é pau d'espinho,
    carangueijo anda na praia,
    tambem andam meus amores
    na renda de tua saia.

    «--Os teus olhos são de fogo,
    tua boca é uma roseira,
    menina, minha menina,
    quem te fez tão feiticeira?

    «--Cachorro ladra na cerca
    quando vem algum ladrão,
    assim ladra no meu peito
    por te ver meu coração.

    «--Menina, minha menina,
    se me não queres matar,
    dá-me um riso pequenino,
    que eu sou bom de contentar.

    «--No braço tenho talento,
    tenho prata na goiaca,
    p'ra quem duvidar, comigo
    na cintura trago a faca.

    «--Você me botou olhado,
    você mesmo ha-de tirar,
    e eu só posso ficar bom
    quando comtigo casar.

    «--Ó senhor dono da casa,
    mande vir alguma cousa;
    já está co'a guella secca
    o Manduca Zé de Souza.

    «--Sem leitão não ha pagode,
    sem bebida violeiros;
    o Casusa está com sêde,
    mande vir, Sr. Medeiros.»


X

    «--Muito bem, muito bem! gritaram todos,
    qualquer dos dois é um tebas p'ra cantar,
    e dansam que faz gosto e mette inveja
    a quem os vê n'um samba a requebrar.

    «--Vocês que tomam? vinho ou paraty?
    --Eu cá já tomei vinho e não misturo...
    --E dois.--Pois aqui tem, ataquem deste,
    que é bom, é de patente, é vinho puro.»

    Depois de beberem voltaram p'ra roda
    ao som da viola, tocando e cantando,
    ao longe se ouvia o tinir das chilenas,
    as palmas cadentes dos moços dansando.


XI

    A noiva estava com somno....
    o noivo.... não sei se o tinha,
    mas estava assim com cara
    onde logo se advinha....
    vontade de se ir deitar.

    A madrinha, disfarçando,
    para o quarto do noivado
    foi com ella, onde ajudou-lhe
    a tirar o véo bordado
    e a grinalda virginal.

    Desapertou-lhe o vestido
    e em saia branca a deixou....
    baixinho deu-lhe conselhos,
    depois a porta cerrou
    deixando-a ficar sosinha.

    De repente ouviu-se um grito!
    era a voz de Margarida,
    e um toque de campainhas,
    que prolongou-se em seguida,
    indicava o quarto della.

    Todos correm pressurosos,
    perguntam: «Que aconteceu?»
    Dona Olympia mais ligeira
    do que todos, lá correu,
    fechou a porta, e que viu?!

    Viu na cama semeados
    carrapichos aos milhões!
    alfinetes espetados!
    e por baixo dos colchões
    campainhas penduradas!

    E a pobre da menina
    que se foi sentar na beira...
    espetou-se não sei onde,
    nem como, de que maneira
    fez dobrar o carrilhão.

    Não pôde dormir na cama!
    foi p'ra o quarto da madrinha.
    O noivo tremeu com frio,
    a noiva ficou sosinha
    scismando.... nos carrapichos.

    ..........................
    ..........................
    ..........................

    Percebes, meu leitor, que eu não desejo
    entrar n'alguns detalhes melindrosos;
    respeito o sanctuario da familia
    e deixo a indagação aos curiosos.



XII

    Um anno já se passou
    Depois que vi estas scenas,
    mas inda tenho saudades
    d'aquellas boas pequenas.

    Ha tres dias, por acaso,
    n'um bond do Pedregulho
    encontrei o _seu_ Medeiros
    que levava um grande embrulho.

    «--Como vai? me disse elle,
    ó homem, não apparece!
    pois olhe, todo o meu povo
    do senhor nunca se esquece.

    «Já soube que a Margarida
    teve um filho o mez passado?
    --Não, senhor!--Pois é verdade!
    e p'ra o mez é o baptizado!

    «Não falte e leve os amigos,
    porque temos brincadeira;
    vim á côrte só para isto,
    e ando assim desta maneira!»

    E apontou-me o embrulho
    que mettera sob o banco,
    e nisto o maldito bond
    deu um enorme solavanco.

    ..........................
    ..........................
    ..........................
    ..........................

    Leitor, se lêste attento estes meus versos,
    é que és bom, condescendente e meu amigo.
    Has-de ir pagodear lá na fazenda,
    eu posso convidar-te: vais comigo.





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